Danieli Veleda Moura*
Carlos Frederico Bernardo Loureiro**
Lúcia F. S. de Anello***
Universidade Federal do Rio Grande, Brasil
danieliveledamoura@yahoo.com.brRESUMO
Este trabalho que versa sobre a forma como os pescadores artesanais da Colônia Z-3 (Pelotas, RS, Brasil) estão organizados em classe, é fruto das entrevistas semiestruturadas realizadas com estes trabalhadores no período de 2012 a 2015. Entendemos que compreender a forma como os trabalhadores da pesca artesanal vem se organizando para existirem, contribui para pensarmos o processo de enfrentamento dos desafios impostos pelo modelo de sociedade vigente no País, o qual vêm colocando em risco a reprodução social, cultural e econômica das comunidades pesqueiras e a manutenção da qualidade ambiental de seus tradicionais territórios de pesca. Primeiramente situamos o lugar do qual estamos falando, ou seja, a Colônia Z-3, bem como de que sujeitos trabalhadores estamos tratando - os pescadores artesanais. Só então, partimos para a discussão dos conceitos de organização de classe e movimento (ou organização) social, do qual destacamos as contribuições dos autores Carlos Montaño e Maria Lúcia Duriguetto. A partir daí, apresentamos a forma como os pescadores artesanais estão organizados em classe na Z-3: Sindicato, Colônia, Fórum, Cooperativa, Movimento dos Pescadores Artesanais e as Mulheres da Z-3 e concluímos que na Colônia Z-3 há fortes lideranças e organizações sociais, muitas das quais tem desenvolvido a consciência de classe no sentido de seu reconhecimento enquanto classe trabalhadora. De modo geral, a comunidade como um todo funciona com diferentes organizações sociais, cada uma com seu grau de maturidade em relação ao desenvolvimento desta consciência, mas que estão caminhando no sentido de seu desenvolvimento, do reconhecimento desses grupos enquanto partes de uma luta por outras relações sociais que não essas que os oprimem de modo que o projeto de construção da hegemonia da classe trabalhadora da pesca artesanal no espaço da Z-3 possa se desenvolver. Logo, a organização social dos pescadores artesanais da Colônia Z-3 é um elemento necessário à luta de classe, imprescindível à construção da hegemonia da classe trabalhadora.
Palavras-Chave: pesca artesanal, pescadores artesanais, Colônia Z-3, organização de classe, movimento social.
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Danieli Veleda Moura, Carlos Frederico Bernardo Loureiro y Lúcia F. S. de Anello (2016): “A organização de classe dos pescadores artesanais da colônia Z-3 no município de Pelotas-RS (Brasil)”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (octubre-diciembre 2016). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2016/04/pescadores.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/cccss201604pescadores
O intuito deste trabalho é apresentar a forma como os pescadores artesanais da Colônia Z-3, localidade situada na zona rural do município de Pelotas, no estado do Rio Grande do Sul, estão organizados do ponto de vista de classe. Para tanto, partimos dos resultados das pesquisas1 realizadas durante os anos de 2012 a 2016 junto a estes trabalhadores, o que nos possibilitou conhecer a forma como estes estão se organizando de modo a não sucumbirem enquanto categoria profissional diante da crescente poluição das águas e o consequente declínio do chamado recurso pesqueiro, seja pela pesca predatória, pela pesca industrial, mudanças climáticas, especulação imobiliária em áreas litorâneas, turismo, dificuldade de acesso às políticas públicas e de compreensão e adequação ao excessivo e, muitas vezes, contraditório regramento para o setor, além de tantos outros fatores que intervém direta e indiretamente nesta atividade” (MOURA, 2016).
Diante desses fatores, entendemos que o exercício da pesca artesanal para seus trabalhadores apresenta-se como uma situação-limite tendo em vista todos estes obstáculos que são barreiras à possibilidade dos pescadores artesanais serem mais2 . Portanto, estes condicionamentos precisam ser transpostos, por meio de um ato-limite que vem a ser outra postura frente a esta realidade que se apresenta como dada.
Em nosso entendimento, este ato refere-se à ação sobre o mundo visando transformá-lo e isso está diretamente ligado à participação efetiva destes trabalhadores em organizações sociais, de forma crítica, criando as condições materiais necessárias de alcance do inédito viável, ou seja, de algo ainda não claramente conhecido e vivido, mas sonhado pelos que pensam utopicamente e agem para torná-lo realidade.
Diante disso, nos propomos a apresentar a forma como os pescadores artesanais, da Colônia Z-3 (Pelotas, RS, Brasil) vem se organizando em classe, tendo em vista os crescentes desafios que a pesca artesanal tem enfrentado diante do modelo de desenvolvimento em curso no País, cujas consequências vêm colocando em risco a reprodução social, cultural e econômica das comunidades pesqueiras e a manutenção da qualidade ambiental de seus tradicionais territórios de pesca.
A Colônia Z-3 ou Colônia São Pedro é o 2º Distrito do município de Pelotas, no estado do Rio Grande do Sul e está localizada na área rural, a 20 km do centro do Município. Ao contrário dos outros municípios da região, onde os pescadores estão dispersos em diversas comunidades pesqueiras, tanto nas áreas urbana quanto rural, em Pelotas, os pescadores artesanais encontram-se concentrados em sua grande maioria na Colônia Z-3.
A Colônia foi fundada em 29 de junho de 1921, como produto da política de criação das Colônias de Pescadores no Brasil. Nessa época, as Colônias tinham como objetivo principal cadastrar pescadores para uma possível convocação para a guerra e como força de trabalho para a política de nacionalização da pesca. Em 1921, moravam na Z-3, 40 famílias que viviam exclusivamente da pesca3 e, atualmente, residem aí 3.166 habitantes, segundo dados do IBGE, 2010.
A atividade pesqueira artesanal constitui a identidade da Colônia de Pescadores Z-3 e encontra-se manifestada em elementos patrimoniais culturais e ecológicos em um ambiente geopolítico e produtivo único enquanto sociedade. São patrimônios refletidos em sua culinária, folclore, ritos, mitos, crenças religiosas, festas populares, paisagens e outras tantas singularidades de seu cotidiano que vêm a formar a sua identidade própria, como a participação e celebração em procissões e festas religiosas, jogos de futebol, entre outras atividades de cunho comunitário, mas marcadamente impressos na reciprocidade para responder a interesses comuns que envolvem geração de renda, bem como preservação de hábitos e costumes (FIGUEIRA, 2009). Neste contexto de vida social, as pessoas definiram sobre este espaço suas atividades de trabalho. Assim, faz parte do “cenário” da Z-3, trapiches, atracadouros, peixarias e, galpões onde estão concentrados os equipamentos e utensílios para a prática da pesca.
O art. 4º da Lei nº 11.959/2009 define o que é considerado como atividade pesqueira artesanal:
Art. 4º A atividade pesqueira compreende todos os processos de pesca, explotação e exploração, cultivo, conservação, processamento, transporte, comercialização e pesquisa dos recursos pesqueiros.
Parágrafo único. Consideram-se atividade pesqueira artesanal, para os efeitos desta Lei, os trabalhos de confecção e de reparos de artes e petrechos de pesca, os reparos realizados em embarcações de pequeno porte e o processamento do produto da pesca artesanal.
É no interior da atividade pesqueira realizada dentro dos moldes da pequena produção mercantil que se encontra a pesca artesanal, a qual se caracteriza pela reprodução de técnicas, conhecimentos, instrumentos para a captura de pescados, construídos no fazer de sua atividade e repassados por memória oral entre as gerações. Outra característica é a dependência intrínseca da qualidade ambiental, ou seja, ecossistemas bem preservados e produtivos são essenciais para sua permanência como comunidades tradicionais4 .
Apesar da falta de uma definição universal, a pesca artesanal pode ser amplamente reconhecida por algumas de suas características mais comuns, dentre as quais destacam-se: o manejo comunitário dos recursos pesqueiros com base em conhecimentos tradicionais dos ecossistemas marinhos e costeiros, captura multiespecífica de espécies-alvo (peixes, crustáceos, moluscos, algas) em águas rasas (praias, baías, lagunas, lagoas, estuários, ilhas), baixa autonomia de navegação com proximidade da linha da costa e produção econômica de subsistência para a reprodução social dos pescadores artesanais (CARNEIRO et al., 2014, p. 83).
E é a organização de classe desse sujeito pescador artesanal que vive na Colônia Z-3 que apresentamos aqui. Para tanto, primeiramente, apresentamos o nosso entendimento acerca dos conceitos de organização de classe e movimento (ou organização) social, conforme segue.
Neste ponto, procuramos apresentar ainda que de forma sucinta, a nossa compreensão sobre a organização de classe e movimento social, tendo como referencial teórico, principalmente Montaño e Duriguetto (2011). A opção por um item específico sobre o tema se dá em função de que, em tese, estes dois conceitos não se traduzem na mesma coisa. No entanto, por em certas circunstâncias estarem articulados, também não podem ser tratados como conceitos distintos, pois há um continum entre suas dimensões que é o que nos interessa dialogar aqui.
Estamos entendendo que o sentido da organização de classe é mais amplo do que o de organização ou movimento social, pois nem todo movimento social realmente possui uma organização de classe efetiva. Os movimentos sociais possuem em si uma organização social que vai variar conforme a maturidade do próprio movimento e esta maturidade é que vai determinar se esta organização social é ou não, uma organização de classe (para si), ou seja, a formação de grupos sociais organizados por sua posição no processo geral de opressão, os quais encontram-se comprometidos com o processo de ruptura com o modelo de sociedade excludente.
Logo, as organizações de classe são coletividades que elaboram uma identidade pautada no seu reconhecimento enquanto classe trabalhadora e se organizam a partir de práticas por meio das quais buscam defender seus interesses e expressar suas vontades, no sentido de superar sua condição de subalternidade, conquistando hegemonia sobre a sociedade. Este é o instante em que os trabalhadores organizados em sua luta, conscientes de sua posição no mundo, deixam de ser “classe em si”, ou seja, de apenas estarem no mundo, para de fato serem no mundo, momento em que ocorre o salto qualitativo, a transformação em “classe para si”.
Os Movimentos Sociais Populares emergiram no contexto social e político brasileiro com uma fantástica capacidade criativa, organizativa e mobilizadora, principalmente na década de 1980, sendo responsáveis por expressivas conquistas que garantiram melhorias na qualidade de vida de amplos setores sociais, afirmação de direitos e exercício da cidadania para um número cada vez maior de agrupamentos humanos, construção de identidades coletivas e autoestima pessoal e social de setores e grupos historicamente discriminados ou oprimidos, intervenção nas políticas públicas, modificando ou inibindo as seculares práticas assistencialistas e clientelistas, contribuindo assim para mudanças em nível do poder local e da política tradicional. Tais conquistas são permeadas por processos educativos, tanto dos participantes diretos de tais movimentos, quanto das pessoas e grupos atingidos por sua ação. Portanto, podemos considerar como Paulo Afonso Barbosa de Brito (2005a), os movimentos sociais como sendo agrupamentos de pessoas que agem coletivamente, com algum método, realizando parcerias e alianças, abrindo diálogos e negociações com interlocutores, como processos articulados para conquistas de direitos e exercício da cidadania.
Esses movimentos sociais multiplicaram-se no Brasil durante a década de 1980 e, principalmente nos anos de 1990, onde houve progressiva ampliação e diversificação de organizações populares, com diversos modelos organizativos, formas de mobilização, bandeiras de luta, relações com mediadores e interlocutores, processos de formação das lideranças populares. Neste período, se consolidaram muitos grupos e entidades locais e, também expressões de movimentos nacionais, principalmente aqueles que lutam mais diretamente em torno de questões centrais da sobrevivência das pessoas, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) (BRITO, 2005b).
Então, o movimento social contém em si a organização social para um determinado fim que varia no seu propósito e que pode ser desde a luta de classe para si a qual, por sua vez, pode estar atrelada à outras lutas, como pode ser também um movimento com um objetivo mais limitado, desde a indicação de representantes para a participação nos Conselhos setoriais de proposição e gestão de políticas públicas, nas passeatas e nas ocupações de terras rurais e urbanas, até as campanhas de amamentação, de uso do “soro caseiro”, ou outras pequenas iniciativas populares capazes de ter incidência na diminuição da mortalidade infantil, ou seja, uma série de distintas iniciativas que dialogam de forma diferenciada, mas complementar, com resultados para melhorar a qualidade de vida das pessoas e o seu modo de vida (BRITO, 2005a).
Segundo Sztompka (1998) apud Rodrigues (2012), há movimentos sociais que, sendo limitados em seus propósitos, objetivam modificar apenas alguns aspectos da sociedade, não tocando no núcleo de sua estrutura institucional. Constituem-se assim, movimentos sociais reformistas, em que o modo de produção capitalista continua existindo, já que as mudanças que acontecem servem apenas para acalmar os ânimos coletivos diante de crises do capital. Todas estas são possibilidades e experiências educativas fora do sistema formal de ensino vivenciadas por meio dos movimentos sociais que tem o seu valor enquanto organização social que poderá vir a ser de classe ou não. Logo, representam um momento dentro da luta, com possibilidades de vir a ser algo a mais na luta pela transformação da realidade vigente, pois há movimentos sociais que pretendem mudanças mais profundas, que atingem as bases da organização social e produzem, então, transformações da sociedade ao invés de mudanças na sociedade. Trata-se, assim, de movimentos radicais, revolucionários, cujas mudanças pretendidas abarcam todos os aspectos básicos da estrutura social (políticos, econômicos e culturais) e são orientados para a total transformação da sociedade segundo alguma representação de sociedade alternativa.
O que queremos dizer é que os movimentos e organizações sociais podem ser ou não de classe. E, aqueles que não são de classe, com o tempo, por meio de suas práticas, podem ir criando as condições necessárias à lutas mais amplas e que expandem a busca pela garantia de direitos na sociedade, o que implica num patamar utópico, na luta por outro tipo de sociedade, já que embora as lutas por direitos e pela cidadania sejam extremamente legítimas, os trabalhadores não terão suas necessidades plenamente atendidas neste modo de produção econômico. De fato, eles podem com sua organização tencionar as relações estabelecidas, mas nesta sociedade nunca as terão plenamente atendidas porque este modo de organização da sociedade legitima a prevalência de uma classe sobre a outra e esta supremacia de classe não é a que privilegia o trabalhador.
A prática e a temática das organizações de classe e dos movimentos sociais se incorporam como objetos de estudo das ciências humanas e sociais, projetando-se em seguida, como um novo paradigma devido à grande importância prática e analítica que tais objetos de estudo atingiram, tanto na sua concepção empírico-analítica, quanto na sua dimensão de categoria teórica (BRITO, 2005a).
Os principais estudiosos dos movimentos sociais no Brasil gravitam entre as correntes teóricas neomarxistas5 e a corrente teórica culturalista-acionalista 6. Esta última foi gradativamente se consolidando como teoria dos novos movimentos sociais (NMS), que surgem principalmente em meados do século XX, tendo por vezes o objetivo ou a função de ser um complemento das lutas de classes dos movimentos clássicos (e, portanto, somando-se a essas lutas) e, outras vezes, são vistos como alternativos aos movimentos de classe tradicionais e aos partidos políticos de esquerda (substituindo tais lutas)” (MONTAÑO e DURIGUETTO, 2011, grifos do autor).
Já as organizações de classe, tem como referencial teórico o marxismo, em que a crise capitalista, os novos centros de conflitos e suas novas formas de organização e expressão sociais nada mais são do que novas e diversas maneiras de manifestações da fundante contradição capital/trabalho, fundamento da chamada questão social, que se expressa das mais variadas formas e, as quais os sujeitos enfrentam com um infindável leque de possibilidades. Antes de negar a contradição capital/trabalho como categoria fundante da sociedade capitalista, esses fenômenos a confirmam (MONTAÑO e DURIGUETTO, 2011).
No pensamento marxista, a centralidade econômico-produtiva, fundante da questão social e suas manifestações expressas na pobreza, desemprego, questões de gênero e ambiental, xenofobia, discriminação racial, etc., não desvanece com as significativas mudanças no mundo capitalista contemporâneo, confirmando, assim, a atualidade da teoria marxista na análise das questões sociais:
Assim, o contexto dos anos 1960-1970, de “Guerra Fria”, das lutas sociais inspiradas no Maio de 1968, da crise capitalista e da crise soviética, confirma a continuidade de uma sociedade capitalista, industrial, monopolista, imperialista, mantendo as relações de exploração entre capital e trabalho, que funda e se expressa em variadas formas de contradições e relações sociais (MONTAÑO e DURIGUETTO, 2011, p. 324).
Como ressalta os autores supracitados, nessa perspectiva, Estado, sociedade civil e mercado (produtivo e comercial) são esferas da mesma realidade social e histórica. Portanto, todos espaços de lutas e demandas sociais são passíveis de conflitos e disputas. As ações sociais e os movimentos sociais podem se organizar em torno de demandas pontuais e podem se desenvolver em espaços localizados, mas isso não retira o fato de nessa perspectiva, se ter a compreensão de terem vinculação com a forma dada no modo capitalista de produção e distribuição da riqueza, fundada na relação de exploração entre as classes antagônicas, capital e trabalho. Sendo assim, as organizações e movimentos sociais tem impactos positivos ou negativos, transformadores ou mantenedores das relações e estruturas nas esferas estatal, mercantil e da sociedade civil. Logo, não podem, nesta perspectiva, ser pensados e compreendidos “de forma desvinculada da produção e do consumo, das esferas política e econômica, e do Estado e do mercado”, pois “apenas a sociedade civil e a dimensão cultural pouco nos diz sobre estes movimentos” (MONTAÑO e DURIGUETTO, 2011). E, ao fazermos o diálogo com a teoria marxista, enfatizamos a questão de classe como o cerne dos debates acerca da transformação social, pois certamente ela é um dos motores da história (FREIRE, 1992, p. 91).
Embora os espaços coletivos sejam ocupados e valorizados como o ambiente de todos, da pluralidade de ideias, de opções políticas, de credos religiosos, a existência da organização se configura também como espaços onde se consolidam direções, se tomam decisões majoritárias, o que necessariamente apresenta os movimentos como ambientes de disputas. Mas, para além das disputas internas, expressam disputas gerais que existem na sociedade, num exercício, muitas vezes, difícil de se poder constituir acordos. E, entre as diversas organizações e movimentos para enfrentamentos, temos a existência de conflitos estruturais, presentes na sociedade e nas relações de poder e de propriedade (RODRIGUES, 2012).
Em termos operacionais, entendemos os movimentos ou organizações sociais como formas organizadas de ação coletiva, que têm como objetivo mudanças sociais no sentido de modificar bases sociais e políticas que lhes impõem condições opressoras de vida. Essas mudanças podem se realizar na perspectiva de introduzir algo que não existe como decisões participativas em uma entidade, bem como na perspectiva de se oporem a ações que oprimam o modus vivendi ou a postura ideológica assumida. Em termos de causa e efeito, partimos do pressuposto de que os movimentos sociais contribuem para a mudança (SZTOMPKA, 1998 apud RODRIGUES, 2012).
Porém, com base em nosso referencial teórico, compreendemos que a produção de mudanças planejadas em uma sociedade não pode se eximir de um alto nível de organização formal e de um grau relativamente compromissado com as lutas da classe trabalhadora. Sem esses elementos, corre-se o risco de não se estabelecer uma organização social realmente comprometida com mudanças para além do imediatismo, tornando-se apenas mais uma organização de trabalhadores a ser utilizada pelo capital (RODRIGUES, 2012).
A pesca artesanal enquanto atividade humana representa uma modalidade de uso do espaço por meio da apropriação da natureza para o sustento das famílias dos pescadores. “Como modalidade de uso do espaço, a atividade pesqueira interage com as demais formas que a sociedade produz e reproduz seu espaço”. Neste sentido, não encontra-se alheia aos processos de urbanização, industrialização, degradação ambiental, turismo, além dos organismos de gestão das águas. “Frente a todos esses processos, pescadores defrontam-se com um amplo campo de embate e a politização de seu movimento alcança as discussões dessas questões que envolvem seus espaços de vida, moradia e trabalho, seu espaço geográfico e seus territórios” (CARDOSO, 2001, p. 101). Deste modo, queremos destacar a emergência de um novo personagem social – os pescadores artesanais enquanto organização de classe ou movimento social.
Nosso objetivo aqui é apresentar o processo de organização de classe dos pescadores artesanais da Colônia Z-3 (Pelotas-RS/Brasil). Então, a partir de conversas e entrevistas realizadas nesta comunidade no período de 2012 a 2015, podemos sintetizar que tendo-se como foco a organização de classe, a pesca artesanal nesta localidade encontra-se socialmente organizada em Sindicato, Colônia, Fórum, Cooperativa, Movimento dos Pescadores Profissionais Artesanais (MPPA) e na atuação das Mulheres no campo da participação nos assuntos de interesse da classe e na luta por melhores condições de vida para os moradores da Z-3. Neste contexto, buscamos apresentar aqui cada uma dessas organizações para em seguida, apresentarmos nossa compreensão acerca da organização social destes pescadores artesanais. Sendo assim, temos a Z-3 organizada em:
A Colônia de Pescadores Z-3 possui um Sindicato, que em sua fundação em 1921, recebeu a denominação de Colônia, mas que no ano de 1987 trocou sua razão social para Sindicato. Mais recentemente, em 2012, foi criada na Z-3, além do Sindicato, uma Colônia de Pescadores e Aquicultores Artesanais.
Apesar da Constituição Federal em seu art. 8º consagrar o Princípio da Unicidade Sindical, entendendo-se que não poderá haver a existência de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa da categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, há hoje na Z-3 uma disputa entre essas duas entidades.
Se por um lado, este fato pode gerar uma relação complicada para a definição de representação legal dos pescadores artesanais junto aos órgãos regulamentadores do setor, por outro, este tensionamento causado pela disputa de espaço de representação entre ambas acaba gerando um movimento de atuação dos representantes para ao atendimento de seus filiados e, assim, enquanto segue o curso legal para decidir esta questão, ambas vem desempenhando os papeis de entidades representativas da pesca artesanal, com atividades que giram em torno da legalização profissional do pescador e de sua inserção no âmbito dos direitos e benefícios sociais, como seguro defeso, aposentadoria, auxílio doença, auxílio maternidade, entre outros.
O Fórum da Lagoa dos Patos é uma importante instância representativa dos pescadores artesanais da região sul do estado do Rio Grande do Sul, compreendendo os pescadores artesanais dos municípios de Rio Grande, São José do Norte, Pelotas, São Lourenço do Sul e, mais recentemente, também o município de Tavares.
Foi criado em 1996 como espaço de formulação e mediação de conflitos que buscam a democratização das ações de fiscalização e controle para a gestão dos recursos pesqueiros. Surgiu com uma finalidade esperançosa de criar possibilidades para o setor, confirmando uma premissa básica do materialismo histórico-dialético de que na crise é que se desenvolvem as possibilidades de criação do novo. O novo, que no caso em questão é o Fórum da Lagoa dos Patos, se apresenta como um movimento social em processo de desenvolvimento para a superação das situações-limite que no caso concreto é a escassez do chamado “recurso pesqueiro” e que fazem, nesta sociedade, o pescador artesanal ser menos.
Ao longo de vinte anos de existência do Fórum, os pescadores vão mantendo presença em alguns temas de maior interesse da categoria, em outros temas que julgam menos importantes, não tanto. No entanto, nas conversas e entrevistas realizadas com os trabalhadores da pesca artesanal da Colônia Z-3, foi possível observarmos que eles reconhecem a importância e representatividade do Fórum.
As reuniões do Fórum acontecem mensalmente, nas últimas quintas-feiras de cada mês em sistema de rodízio entre os municípios. O sistema de rodízio contribui para não concentrar somente em um município o poder de reunir seus pescadores, tendo em vista que há dificuldades de mobilidade, em função, principalmente, dos gastos com transporte.
Então, o Fórum da Lagoa dos Patos pode ser entendido, em tese, como um espaço de educação, na medida em que nele pode ser propiciado o desenvolvimento de uma experiência coletiva de diálogo, como palavra que não pode ser privilégio de poucos, pois é no diálogo uns com outros que a consciência crítica sobre a realidade vai tomando forma e é por meio do diálogo que o Fórum vem existindo, com avanços e tropeços, inerentes aos próprios movimentos sociais.
Em 2005 uma fábrica de gelo foi instalada na comunidade, utilizando recursos obtidos através de política pública. Na ocasião, uma Cooperativa fez a gestão do estabelecimento, mas acabou contraindo muitas dívidas que, inclusive, resultaram na interrupção do funcionamento da fábrica. Mas, no ano de 2011, um grupo de mulheres se reuniu para dar um novo rumo à fábrica de gelo da Colônia Z-3, formando a Cooperativa Mulheres da Lagoa, com registro oficial de abertura datada em 09 de abril de 2013.
A atuação desta cooperativa que reunia vinte e duas mulheres fornecia à comunidade o gelo que necessitam. A jornada de trabalho era dividida entre as cooperadas, sendo que algumas trabalhavam no turno da manhã, revezando com as que trabalhavam no turno da tarde, dentro do horário de funcionamento das 7:00h até as 20:00h, sem fechar ao meio dia. Quanto à renda das vendas, após eliminadas as despesas, o lucro era dividido entre as cooperadas 8.
Com base nesta organização de mulheres, é possível observarmos que a classe trabalhadora, objetivando a sua hegemonia, vem buscando a socialização dos meios de produção, o que por extensão vem a contribuir para com a descentralização da propriedade privada. Ainda que as mulheres da Cooperativa possam não ter ainda o desejo de se organizar em uma luta política, a garra de movimentar-se para fazer diferente, faz com que estas mulheres sejam lembradas como organizações da pesca artesanal da Colônia Z-3.
Apesar das dificuldades, a cooperativa vinha se mantendo, no entanto, de acordo com relatos das participantes do Seminário “Mulheres da Cadeia Produtiva da Pesca Artesanal”, ocorrido em 24 de Junho de 2015, em Rio Grande, a Cooperativa Mulheres da Lagoa teve suas atividades suspensas. Os motivos destacados para a interrupção das atividades foram as dificuldades de manutenção, associado à ocorrência de duas safras frustradas de camarão, em anos subsequentes.
Na Colônia de Pescadores Z-3, temos como movimento constituído, o Movimento dos Pescadores Profissionais Artesanais, o MPPA. Este movimento surgiu no ano de 2003 a partir da relação que foi se estabelecendo entre a organização social dos pescadores artesanais da comunidade e suas lideranças e intelectuais orgânicos9 que viam a necessidade de uma organização que desse coesão ao movimento como modo de se poder avançar na luta pela hegemonia desta comunidade pesqueira artesanal.
Suas principais bandeiras de luta são:
Esta organização facilitou a relação da comunidade zetrense com o Poder Público. Assim, o Movimento que hoje é liderado na Z-3 por uma pescadora que é uma forte liderança na comunidade, é o responsável pelas articulações que se dão na Z-3, desde articulações internas, fazendo ligações entre os interesses da classe como um todo, assim como articulações externas, por meio da relação com o Estado, o que pode ser observado pela relação com a Cooperativa organizada pelas mulheres da Z-3, a organização das Feiras do Peixe e hoje também a organização da Associação destes feirantes, além do desenvolvimento das casas do Programa Nacional de Habitação Rural (PNHR).
A Colônia Z-3 possui na figura da mulher zetrense, o que chamaríamos de representante da classe da pesca artesanal na Z-3. Como nos disse o pescador artesanal aposentado, de 87 anos: “Aqui mais forte é a mulher, até na política, a mulher é quem anda na frente” (MOURA, 2016).
Pelo que pudemos entender das longas conversas com os pescadores artesanais da comunidade, o histórico da constituição da mulher nesse universo masculino da pesca, se deu não só em virtude de muitas delas irem para a água pescar e também trabalharem na despesca, mas principalmente por elas terem conquistado espaço naquilo que os homens deixavam de lado por acharem menos importante, que são as reuniões de interesse da categoria da pesca artesanal.
Indo por interesses próprios ou para representar seus companheiros pescadores, as mulheres da Z-3 foram conquistando seu espaço no que se refere aos assuntos de interesse da categoria, não somente na Colônia ou na Cooperativa, mas também tomando à frente na luta por políticas públicas que melhorem as condições de vida da comunidade. A conquista deste espaço, com certeza se deu por meio da participação, pois como relatado por elas mesmas, os homens só participam de reuniões “quando o sapato aperta, só quando é interesse deles, porque se não...é mais fácil pegar as mulheres...”. Segundo esta entrevistada, a mulher que participa das reuniões tem o poder de persuasão e conseguem organizar a homogeneidade da categoria porque conforme suas palavras “tu tem que trabalhar com a cabeça da mulher, pra mulher fazer a cabeça do homem dentro de casa...aqui é assim...até o político em que ele vai votar quem diz é a mulher...” (MOURA, 2016).
E, dessa forma a hegemonia da pesca artesanal na Colônia Z-3 vem sendo traçada conforme essas mulheres vem conquistando espaços, seja em entidades representativas, como os sindicatos e colônias, em suas participações no Fórum, no Movimento dos Pescadores Profissionais Artesanais ou em outras reuniões de interesse da categoria como as que promovem as Prefeituras, Universidades e entidades como Emater e, no campo das políticas públicas, pois ao estarem cientes do que vem ocorrendo no mundo, ao buscarem articulações e conseguirem feitos para a comunidade, passam não somente a serem respeitadas, mas admiradas pelo potencial do trabalho que desenvolvem, sendo grandes referências para a comunidade.
Sindicato, Colônia, Fórum, Cooperativa, Movimento dos Pescadores Profissionais Artesanais e o movimento das mulheres é aquilo que mais se aproxima do que estamos entendendo como organização de classe no âmbito da Colônia Z-3.
Sindicato e Colônia são as entidades representativas de classe, realizam o necessário para que o pescador artesanal filiado esteja com sua documentação em ordem para o exercício da profissão. Então, a burocratização dos seus serviços tem feito com que não consigam avançar para uma organização de classe.
Neste sentido, o Fórum da Lagoa tem conseguido suprir parte daquilo que poderíamos chamar de elementos necessários à organização de classe, à medida em que pescadores artesanais se juntam para debater questões relativas à atividade, o que colabora com o desenvolvimento da hegemonia destes trabalhadores. Porém, embora tenha o potencial de vir a se constituir como bloco histórico onde a consciência de classe seja o cerne das discussões travadas, as reuniões ainda versam muito sobre demandas pontuais da pesca. Além disso, o Fórum não é somente de pescadores artesanais, mas sim um Fórum da Lagoa, então, reúne em um mesmo espaço diferentes entidades com objetivos e interesses muitas vezes divergentes. Justamente por ser um espaço de disputa é que se faz tão importante o desenvolvimento dos pescadores artesanais da Lagoa dos Patos, como é o caso da Z-3, para suas atuações no Fórum, de modo que não sucumbam na luta pela classe e avancem na conquista da hegemonia.
A Cooperativa, por sua vez, era uma organização social das mulheres da Z-3. Trouxemos como parte da organização de classe porque o movimento destas mulheres de se desacomodarem diante da realidade e tocarem esta cooperativa com todas as dificuldades existentes, representa uma organização da classe da pesca artesanal da Z-3. Então, esta organização social das mulheres apesar da importância do trabalho de uma cooperativa dentro de uma sociedade capitalista, para nós, pode ser pensada enquanto uma organização que caminha rumo ao que pensamos ser uma organização de classe. Assim, o que faz a Cooperativa estar no rol das organizações sociais que vão ao encontro de uma organização de classe na Z-3 é a atuação das mulheres que a compunham.
O Movimento dos Pescadores Profissionais Artesanais (MPPA) é um movimento criado em 2003 e que funciona como articulador e desenvolvedor das diferentes organizações sociais existentes na Z-3 e também junto ao Poder Público. Por ser coordenado por uma forte liderança dos pescadores artesanais da comunidade, é muitas vezes confundido com a própria figura da liderança.
Deste modo, a prática das mulheres da Z-3 na Colônia, na Cooperativa, no MPPA, nas reuniões, nas políticas públicas é aquilo que mais se aproxima do que entendemos como organização de classe, porque buscam defender seus interesses e expressar suas vontades, no sentido de superar sua condição de subalternidade 10, contudo, ainda carecem de um reconhecimento enquanto classe trabalhadora, visando a conquista de hegemonia 11 sobre a sociedade e não somente na luta por questões mediatas que visam a melhoria da qualidade de vida dos envolvidos.
Compreendemos que na Z-3 há organizações sociais muito ativas com grandes movimentos por parte dos zetrenses, principalmente no que se refere ao trabalho das mulheres que participam das reuniões e vão criando as condições necessárias para que a vida na comunidade seja melhor. Assim, ganha destaque a Cooperativa, o Plano Nacional de Habitação Rural (PNHR), o Movimento dos Pescadores Profissionais Artesanais (MPPA), as Feiras do Peixe, as festas como a Festa do Peixe e de Nossa Senhora dos Navegantes. Em todas essas, há a forte atuação da mulher.
Nesse sentido, a Z-3 possui importantes organizações sociais, que encontram-se num forte processo de amadurecimento enquanto organizações de classe, por conterem em si fortes elementos para o desenvolvimento da consciência de classe. Ter consciência de classe é pressuposto do entendimento que vivemos numa sociedade de classes, que pode ser categorizada essencialmente a partir da ideia da propriedade privada como instituição fundante do capitalismo, que determina a fragmentação da sociedade e, por conseguinte, dos seres humanos em trabalhadores e não trabalhadores, estes organizados em classes de capitalistas, os proprietários (não trabalhadores) e proletários, campesinos, prestadores de serviços, pequenos artesãos, etc. (todos trabalhadores). A tensão social entre os trabalhadores e não trabalhadores, conhecida como luta de classes, é uma categoria fundamental para entender o sistema capital de organização da produção e da economia mundial e das desigualdades intrínsecas desse sistema (ANELLO, 2009).
Na Colônia Z-3 há fortes lideranças e organizações sociais, muitas das quais tem desenvolvido a consciência de classe no sentido de seu reconhecimento enquanto classe trabalhadora. De modo geral, podemos dizer que a comunidade como um todo funciona com diferentes organizações sociais, seja vinculados à colônia, sindicato, cooperativa, movimentos sociais ou a uma ou outra liderança e cada uma com seu grau de maturidade em relação ao desenvolvimento desta consciência, mas que estão caminhando no sentido de seu desenvolvimento.
Entendemos que é o reconhecimento da categoria pescador artesanal enquanto classe, o promotor do querer fazer mais e melhor e, isso faz com que se queira aprender e todas essas relações levam ao comprometimento com o mundo e sua transformação. Então, ao nosso ver, embasados nos ensinamentos de Sanchez Vásquez (2011), falta na Z-3 a prática para o atendimento não de uma necessidade prático-utilitária 12, mas para as necessidades gerais humanas, isto é, para além do atendimento às necessidades particulares dos envolvidos diretamente com as organizações sociais, ou seja, o sentimento de coletividade. Este sentimento é muito presente nas lideranças locais, mas precisa ser o sentimento também dos demais membros da comunidade. Mas isso se dá com o tempo, por meio do envolvimento dos sujeitos com o processo. E isso nunca é homogêneo.
A organização dos trabalhadores é condição importante para não se permanecer na posição de oprimido, subalterno. Sem ela, os trabalhadores continuarão fadados a contribuírem para com a hegemonia do capital, tanto que Marx e Engels (2008) em O Manifesto do Partido Comunista dirigiram suas práticas discursivas a necessidade de conclamar: “Proletários de todos os países, uni-vos!”, porque as condições materiais que estão postas para os trabalhadores no interior do capital, não condizem com uma vida plena. E, esta organização será tanto mais forte quanto mais se conseguir avançar no processo de participação dos grupos nos espaços de discussão das questões referentes ao trabalho que desenvolvem.
Logo, apesar da existência de muitas organizações sociais fortes e atuantes na Z-3, é preciso o reconhecimento desses grupos enquanto partes de uma luta por outras relações sociais em sociedade que não essas que os oprimem. É por meio desta articulação entre os grupos que lutam na Z-3 e a cooptação daqueles que ainda não compreenderam a importância da organização dentro de uma sociedade excludente e opressora, que o projeto de construção da hegemonia da classe trabalhadora da pesca artesanal no espaço da Z-3 poderá se desenvolver. Estamos advogando, portanto, que a organização social dos pescadores artesanais da Colônia Z-3 é um elemento necessário à luta de classe, imprescindível à construção da hegemonia da classe trabalhadora.
A construção da hegemonia da classe trabalhadora se efetiva principalmente quando homens e mulheres tornam-se sujeito e objeto da própria práxis, conduzindo grupos ou classes sociais a transformarem a organização e a direção da sociedade ou a realizarem mudanças mediante a atividade do Estado (VÁZQUEZ, 2011), aqui se configurando uma práxis de ordem política.
Para Gramsci (1989), somente a filosofia da práxis é capaz de unificar e elevar as pessoas simples ao nível de uma visão de mundo superior, pois ao contrário das outras filosofias, ela não tende a manter as pessoas simples em sua filosofia primitiva, o senso comum, mas tende a conduzi-las a uma concepção superior de vida. Ela afirma a exigência da relação entre intelectuais e as pessoas simples.
REFERÊNCIAS
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* Doutora em Educação Ambiental (PPGEA/FURG), Email: danieliveledamoura@yahoo.com.br
** Doutor em Serviço Social (UFRJ), Professor associado da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (URJ) e dos Programas de Pós-Graduação em Educação (PPGE) e em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social (Eicos), ambos da UFRJ. Líder do Laboratório de Investigações em Educação, Ambiente e Sociedade (LIEAS/UFRJ). Pesquisador do CNPq. Email: floureiro@openlink.com.br
*** Doutora em Educação Ambiental (FURG), Professora adjunta do Instituto de Oceanografia da Universidade Federal do Rio Grande (IO-FURG) e dos Programas de Pós-Graduação em Gerenciamento Costeiro e Pós-Graduação em Educação Ambiental, ambos da FURG. Email: luciaanello@hotmail.com
1 Projeto de Pesquisa Análise da Cadeia Produtiva do Pescado oriundo da Pesca Artesanal e da Aquicultura Familiar no Estado do Rio Grande do Sul , resultante do Convênio nº 2.401/2011, firmado entre a Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e a Secretaria de Desenvolvimento Rural, Pesca e Cooperativismo do Rio Grande do Sul (SDR). Este Projeto teve como objetivo analisar a cadeia produtiva do pescado produzido pela pesca artesanal e pela aquicultura familiar no estado do Rio Grande do Sul, identificando limitações, potencialidades e perspectivas, com vistas a uma interlocução mais qualificada entre as Políticas do Programa RS Pesca e Aquicultura e a realidade deste setor no Estado. Pesquisa que originou a Tese de Doutorado intitulada “A Organização de Classe dos Pescadores Artesanais da Colônia Z-3 (Pelotas-RS, Brasil) na Luta pela Cidadania e Justiça Ambiental: Contribuições à Educação Ambiental Crítica, de autoria de Danieli Veleda Moura, defendida no Programa de Pós-Graduação em Educação Ambiental na Universidade Federal do Rio Grande, no ano de 2016.
2 Necessidade ontológica do ser-humano de estar sempre em busca de sua humanização. Esse processo será tão maior quanto maior for o desenvolvimento da consciência crítica da realidade (MOURA, 2016).
3 Fonte: http://pontodecultura.ucpel.tche.br/?site=z3
4 O Decreto nº 6040 de 2007 que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais em seu art.3º, incisos I e II traz a definição de povos, comunidades e territórios tradicionais como sendo grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição.
5 “[...] grupo composto por segmentos marxistas e comunistas que se descolavam da dogmática stalinista e se preocupavam em incorporar as demandas dos ‘NMS’ nas lutas de classes e nas formas de organização clássicas herdadas do marxismo e do leninismo: partido e sindicatos. Ou seja, tratava-se de incorporar as lutas dos ‘NMS’ – lutas que se desenvolviam fora do mundo da produção – à luta política revolucionária. O desafio para esses segmentos era, assim, adequar as organizações clássicas dos trabalhadores e a estratégia revolucionária à essa nova conjuntura das lutas sociais” (MONTAÑO e DURIGUETTO, 2011, p. 311).
6 “A teoria culturalista-acionalista enfatiza a cultura, a identidade e a solidariedade entre as pessoas de determinado movimento social. Segundo esta perspectiva, os movimentos contemporâneos apresentam interesses difusos e não classistas. Por isso mesmo, há um redirecionamento do eixo central das demandas postas na esfera pública, as quais são deslocadas do campo da economia para o campo da cultura. Nesta abordagem, a ênfase está no papel dos indivíduos e não no da classe social e, na mesma lógica, os movimentos são vistos muito mais como agentes de pressão do que de transformação societária. Trata-se, portanto, de uma teoria que procura explicar a ação coletiva em uma perspectiva subjetivista dos fenômenos” (GUIMARÃES e GUERRA, 2013, p. 64).
7 Sobre a Cooperativa Mulheres da Lagoa, destacamos que os dados aqui elencados fazem parte principalmente do acompanhamento que fizemos da safra do camarão no ano de 2013, no município de Pelotas-RS, durante o Projeto Análise das Cadeias Produtiva das Pesca Artesanal e da Aquicultura Familiar no Estado do Rio Grande do Sul e que teve os resultados organizados no Relatório de Pesquisa As Mulheres da Cadeia Produtiva da Pesca Artesanal no Estuário da Lagoa dos Patos-RS, de autoria de Luceni Hellebrandt, Tatiana Walter e Lúcia Anello (2015).
8 Dados do Projeto Análise das Cadeias Produtiva das Pesca Artesanal e da Aquicultura Familiar no Estado do Rio Grande do Sul.
9 “O conceito de liderança pode ser entendido como um atributo do coletivo àqueles que encarnam o espírito da coletividade, levando-a a compreender a realidade e o melhor caminho a ser seguido num determinado momento histórico, com vistas ao alcance da autonomia, cada vez maior, de um grupo” (MOURA, 2016). Já, o conceito de intelectuais orgânicos, do qual compartilhamos, se baseia em Gramsci (1989) que compreende os intelectuais como funcionários da hegemonia, superando a visão tradicional de intelectual a qual sempre foi traduzida na figura do grande literato, do filósofo e do artista renomado, ou seja, um elemento da elite cultural. Para Gramsci ele, todo trabalho humano, até no mais mecânico deles, está presente a necessidade de certo esforço intelectual, por isso, todo homem e mulher é também um intelectual, pois para Gramsci, o ser humano é captado em suas múltiplas dimensões, sendo impossível separar o homo faber do homo sapiens, embora tenha sido esta a tentativa da burguesia industrial durante todo o século XX (GRAMSCI, 1989; BUONICORE, 2011).
10 “A categoria ‘subalterno’ e o conceito de ‘subalternidade’ têm sido utilizados, contemporaneamente, na análise de fenômenos sociopolíticos e culturais, normalmente para descrever as condições de vida de grupos e camadas de classe em situações de exploração ou destituídos dos meios suficientes para uma vida digna. No pensamento gramsciano, do qual compartilhamos, tratar das classes subalternas exige mais do que isso. Trata-se de recuperar os processos de dominação presentes na sociedade, desvendando ‘as operações político-culturais da hegemonia que escondem, suprimem, cancelam ou marginalizam a história dos subalternos’” (SIMIONATTO, 2009).
11 A hegemonia, que não se confunde com mera dominação, expressa a direção e o consenso ideológico (de concepção de mundo) que uma classe consegue obter dos grupos próximos e aliados. Logo, constituir-se como classe hegemônica significa construir e organizar interesses comuns e 'tornar-se protagonista das reivindicações de outros estratos sociais' (GRUPPI, 1991). Este é, portanto, um conceito de suma importância quando se trabalha com a questão da organização de classe de trabalhadores.
12 A necessidade de manutenção da existência faz com que muitas das ações sejam para o atendimento das necessidades mediatas de produção da vida o que, se por um lado, dificulta o processo emancipatório de desenvolvimento da consciência de classe, necessária à conquista da hegemonia da classe trabalhadora, por outro lado, podem levar à compreensão da opressão, impelindo a classe trabalhadora à luta, para a construção de uma outra hegemonia.
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