Wellington de Pinho Alvarez*
Christian Nunes da Silva**
João Marcio Palheta da Silva***
Ricardo Ângelo Pereira de Lima****
Universidade Federal do Pará, Brasil
walvarez@ufpa.brRESUMO
Na atualidade, a qualidade de vida na área urbana é uma característica da busca das políticas públicas nos setores de educação, saúde, mobilidade, segurança etc. Nesse sentido, para se medir a qualidade de vida nesta área são apresentados diversos índices que demonstram os aspectos dos modos de vida da população, sendo que neste manuscrito, buscou-se analisar os dados do Observatório das Metrópoles, no relatório nomeado de Índice de Bem-estar Urbano (IBEU), que baseia-se nas territorialidades analisadas pelo Instituto de Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no que se refere à identificação dos aglomerados subnormais do censo 2010, sendo que o foco principal do texto é na Região Metropolitana de Belém (RMB). Por meio da discussão deste índice e das representações cartográficas geradas, procura-se identificar e apresentar os principais indicadores do IBEU e como eles estão espacializados na RMB.
Palavras-chave: Qualidade de Vida, Índice de Bem Estar Urbano, Região Metropolitana de Belém.
RESUMEN
En la actualidad, la calidad de vida en el área urbana es una característica de la aplicación de políticas públicas en los sectores de la educación, la salud, la movilidad, la seguridad, etc. En este sentido, para medir la calidad de vida en esta zona se presentan diversos índices que muestran aspectos de los estilos de vida de las personas, y este manuscrito, hemos tratado de analizar los datos del Observatorio de las Metrópolis, el informe denominado Índice de Bem-estar Urbano (IBEU), que se basa en la territorialidad analizada por el Instituto Brasileño de Geografía y Estadística (IBGE), en relación con la identificación de las aglomeraciones del censo subnormales 2010, y el texto de la atención se centra en la Región Metropolitana de Belém (RMB). A través de la discusión de este índice y las representaciones cartográficas generadas, busca identificar y presentar los principales indicadores del IBEU y cómo se espacializa en la RMB.
Palabras Clave: Calidad de vida, el bienestar Índice urbana, región metropolitana de Belém.
Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Wellington de Pinho Alvarez, Christian Nunes da Silva, João Marcio Palheta da Silva y Ricardo Ângelo Pereira de Lima (2016): “(Des)ordenamento territorial (?) e qualidade de vida em uma metrópole amazônica”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (julio-septiembre 2016). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2016/03/qualidade-vida.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/CCCSS-2016-03-qualidade-vida
INTRODUÇÃO
Os problemas sociais identificados nos espaços ocupados pelos mais pobres, na periferia urbana, apresentam-se como reflexos das condições de habitação dos hegemonizados. São nestes espaços que ocorrem as principais violências: a exploração econômica, social e política. Dessa forma, o processo de sobreposição dos poderes, ou melhor, sua manifestação em face da territorialização, cria espaços dicotômicos, isto constitui um dos artifícios provenientes das relações de hegemonização social, indicando a gênese particular dos territórios. Nesse sentido, o “território é o produto de uma relação desigual de forças, envolvem o domínio ou o controle político-econômico do espaço e sua apropriação simbólica, ora conjugados e mutuamente reforçados, ora desconectados e contraditoriamente articulados” (HAESBAERT, 2004, p. 121).
O espaço segregado da periferia urbana abre campo para diferentes formas de territorialidade, ou melhor, possibilita inúmeras formas de territorialização, tanto de cunho econômico, quanto cultural e político; bem como possibilita a territorialização pelo laço da identificação de um determinado grupo e sua estratégia de sobrevivência, ou de hegemonização. É na periferia urbana, principalmente nos espaços criados para abrigar os pobres expulsos do centro urbano, que ocorre de forma constante todo tipo de violência estabelecida como crime pela moral dominante, este se descreve como toda ação que aplicada desafia os princípios sociais já estabelecidos, o crime é então umas das formas de coagir ações que cominem em “desordem”1 .
No entanto, mesmo com o estabelecimento do crime e sua constituição punitiva evidenciam-se nestes espaços, principalmente nos periféricos urbanos, a grande ocorrência da violência, mais frequentemente os crimes contra o patrimônio e contra a vida. O homicídio é hoje o crime que mais chama atenção da sociedade, por ser o tipo de violência que se dirige contra o maior de todos os patrimônios: a vida. Deste, dar-se-á enfoque as relações anteriores ao crime, de forma a compreender o nascedouro particular deste problema social e a continuidade da violência homicida.
Para elucidar as análises, foram utilizados os dados do Observatório das Metrópoles, no relatório nomeado de Índice de Bem-estar Urbano (IBEU, além dos estudos do Instituto de Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no que se refere aos aglomerados subnormais do censo 20102 , ambos com foco na Região Metropolitana3 de Belém (RMB). Por meio da discussão deste índice e das representações cartográficas geradas, este manuscrito busca identificar e apresentar os principais indicadores do IBEU e como eles estão espacializados na RMB.
2. A ORDEM QUE ESCAPA: A PERIFERIA E A REGIÃO METROPOLITANA DE BELÉM
O espaço periférico é hoje o cerne das principais questões que envolvem a violência urbana. Não por acaso, ocorrem ações com vista à organização e reconquista, a ponto de tornar-lhe elemento central dos embates, destacando o controle e vigilância policial. Por isso, a periferia está na linha de ataque, entre alça e a massa, no foco das ações cujo objetivo é conter a violência que generaliza todo tecido urbano. A evolução dos sistemas sociais há muito vem engendrando modificações nos sistemas produtivos. Estes derivam em novas modificações, o que torna determinante o refazer como elemento constante. Este refazer incute variações de ações e sua consequente materialização, na heterogeneidade do espaço social.
A heterogeneidade do espaço é manifesto e medido na estruturação, aparelhamento e oportunização que neste se verifica. Não por acaso, a periferia representa a negatividade, de maneira geral, não apresenta estrutura urbana adequada, tão pouco possibilita grandes elevações sociais. A periferia é, sobremaneira, um aglomerado, espaço subdesenvolvido 4 e com caráter especifico (SANTOS, 1980), aparentando exclusiva organização local e, em geral, são socialmente conhecidas como favelas, baixadas, etc. O surgimento ou a concentração destas aglomerações denuncia a forma de ocupação do espaço citadino, tal que o espraiamento do povoamento dos núcleos pioneiros - e até as áreas longínquas, atesta a ocupação pela necessidade e oportunidade, a qual define o caos da insalubre moradia na cidade, principalmente na periferia urbana.
Desse modo, o avanço das atividades produtivas na periferia do sistema capitalista, ou melhor, a dinamização e desenvolvimento industrial nos países em desenvolvimento reverberaram nos países subdesenvolvidos, como no Brasil, em necessidade expansionista do mercador consumidor e mão de obra, combinado em grandiosos processos migratórios para as áreas urbanas.
Isso fez com que as cidades mudassem drasticamente para abrigar a dinâmica produtiva, principalmente industrial, de forma a concentrar expectativas e esperanças. Contraditoriamente, tornar-se-á pólo concentrador e reprodutor de pobreza, nesse sentido, o espaço periférico urbano emerge como espaço de ocupação dos pobres, mesmo que em condições sub-humanas (SANTOS, 2009). Além disso, a urbanização ligada às determinações sociais arroladas nos processos produtivos ratificou a polarização econômica existente, bem como consolidou os grandes centros regionais como áreas de maior verticalização econômica, o que influenciou a imigração e consequentemente o crescimento populacional.
A grande cidade segue um caminho de ocupação e povoamento duradouro, verificado principalmente no século anterior. É neste que a periferia e centro emergem juntos. Centro e periferia, pares, elementos desconexos de uma dialética complexa, pois, a periferia é necessária, sua manutenção conecta-se a permanência da classe pobre, sua reprodução, colabora decisivamente para o desenvolvimento e permanência de atividades múltiplas, como a produção, o comércio e os serviços. Assim, a ocupação do espaço citadino descreve um processo dialético e corrosivo, verificado na constituição e na manutenção da aviltante realidade periférica. Isto por que:
A cidade em si, como relação social e como materialidade, torna-se criadora de pobreza, tanto pelo modelo socioeconômico, de que é o suporte, como por sua estrutura física, que faz dos habitantes das periferias (cortiços) pessoas ainda mais pobres. A pobreza não é apenas o fato do modelo socioeconômico vigente, mas, também, do modelo espacial (SANTOS, 2009, p. 10).
A lógica de mercado instalada na cidade direciona o acesso e os usos do espaço urbano. O custo do centro empurra grande parte dos habitantes antigos e também os novos para outros espaços, geralmente nas redondezas. Devido à necessidade, instalam-se nos limites da infraestrutura urbana, geralmente em movimentos populares conhecidos como invasões ou ocupações, que ocupam áreas particulares ou públicas, com fins de moradia ou comércio, de áreas que não abrigam condições urbanas adequadas, porém, são fundamentais para manutenção da ordem social.
Se a ordem social não construísse barreiras legais e direcionadas apenas à mais valia predatória do capitalismo, que inviabilizam o uso e ocupação de todos, o espaço social seria uníssono, abrigo verdadeiro de todas as classes sociais. Isto conduziria a uma socialização plena dos usos, assim tornar-se-ia a periferia uma lenda. Não obstante, a realidade prova o inverso, pois é verdade que há pobres no centro e ricos na periferia. Essas exceções se explicam pela relutância do primeiro e a busca de amenidades ambientais e econômicas do segundo. O processo de ocupação da periferia pela classe hegemônica, apoia-se principalmente nas intervenções públicas, isto pois:
Enquanto os imóveis não têm valor como mercadoria, ou têm valor irrisório, a ocupação ilegal se desenvolve sem interferências do Estado. A partir do momento em que os imóveis adquirem valor de mercado (hegemônico) por sua localização, as relações passam a ser regidas pela legislação e pelo direito oficial (MARICATO, 1995, p. 12).
O desenvolvimento da periferia, ou a descoberta de amenidades ambientais socialmente valiosas (CORREA, 1989), torna a periferia abrigo de ações de diversos agentes sociais, principalmente do Estado e da iniciativa privada, ambos tentando ocupar a periferia urbana, ordená-la e, por conseguinte, torná-la novo centro.
A ação empreendedora do Estado e da iniciativa privada visa homogeneizar materialmente seu poder, transformando grande parte da cidade de acordo com suas prioridades. É neste contexto que a cidade ilegal (MARICATO, 1995) passa a ser palco de ações vertiginosas de transformações materiais e novas ocupações sociais. Isto ocorre porque o espaço periférico é também um espaço de valor e largamente requisitado no contexto das novas necessidades sociais, estando à mercê das determinações dos hegemônicos.
Neste sentido, o urbano “Poderia, portanto, ser definido como lugar da expressão dos conflitos, invertendo a separação dos lugares onde a expressão desaparece, onde reina o silêncio, onde se estabelecem os signos da separação” (LEVEBVRE, 1999, p. 158). Assim, a dissimulação do real faz a cidade ilegal 5, somente rompida quando o caos se instala e se deflagra para além de seus limites.
Constata-se que as lutas e as determinações sociais são responsáveis pela produção e reprodução do espaço, nas variações existentes. Centro e periferia conjugam e aglutinam possibilidades: espaço magnífico, moderno, a frente do tempo, ao espaço da pobreza extrema, da luta pela sobrevivência, de espaço marcado pela violência e das infinitas estratégias de sobrevivência.
Em geral, conectada a periferia, ocorrem os atos de violência, obra humana mais aterradora. Ação que determina o fim de um direito, um patrimônio, a vida, que se realiza por infinitos motivos, onde o desejo de dominação, vingança e infelizmente por reconhecimento social são os mais recorrentes. Pelo medo, grandes sistemas de vigilância e proteção são montados na cidade, pois vigiar, proteger e policiar é fundamental na dinâmica do temor. Isto para criar estruturas “protetoras” que determinam os que a veem, o temor da invasão e da prisão, que por isso, impede o cometimento do crime. Invariavelmente, estas estruturas são montadas tanto no espaço dos ricos, como no flagelado pela pobreza, o que os difere são as estruturas e o grau de organização e resposta, principalmente, no que couber a segurança pública.
Assim, centro e periferia se conectam na necessidade de vigilância e proteção. Por isso, a violência urbana é o foco central das políticas públicas, pois a periferia urbana é vista como cerne do problema, em geral é o local onde grande parte das ações violentas se realiza, sendo por isso, onde é incutida a maioria das ações para a “manutenção da ordem”. Não por acaso a periferia é visualizada como espaço do temor, da atividade criminosa e da “desordem social” e, como o crime é também indutor de transformações, a produção e reprodução deste, se fará segundo determinações sociais provindas das estratégias sociais ligadas ao crime, a violência e as atividades ilegais, as quais se alinham à manutenção da vida, o que necessariamente promove a rearticulação da vida social.
Nesse sentido, o espaço urbano na Região Metropolitana de Belém (RMB) é uma composição de conjuntos habitacionais elitizados ou não, e áreas de invasão, ou seja, é uma conjunção de áreas com excelente infraestrutura e áreas insalubres e precárias, que faz da RMB um típico representante do espaço periférico metropolitano no Brasil.
A formação e a periferização da Região Metropolitana de Belém, principalmente pelo vultuoso quadro segregador, ratifica e testifica a precariedade social dos viventes em grande parte de sua área habitacional de Belém, pois o processo social que expandiu o sítio urbano para além das áreas urbanizadas promove o surgimento de um entorno complexo, desalinhado e subordinado. A fragmentação urbana cominou com a formação de uma rede espacial dispersa e precária em toda região metropolitana, dando origens a diversos núcleos de ocupação, principalmente, nos municípios de Ananindeua e Marituba.
Assim inicia-se a construção de uma morfologia metropolitana, cuja característica principal é a ocupação extensiva de novas áreas, espaços insalubres, cujo movimento tornar-se-á maior nas áreas de conurbação entre os municípios de Belém, Ananindeua, e Marituba, que são espaços constituintes e subordinados à RMB (PENTEADO, 1968). Esta conjuntura promove a constituição de formas de ocupação que reedita e reacomoda práticas de uso para fins habitacionais, cujo o cenário é o da valorização do solo nas áreas centrais, de modo que converge e catalisa o surgimento vultuoso de novas áreas de ocupação em toda região metropolitana.
Assim, a capital expandiu-se para além de seus limites, materializando o processo agregador de áreas de ocupação sob a influência das relações políticas, econômicas e sociais, principalmente, estabelecidas em Belém. Logo, a fragmentação urbana é sensível, produto das ações hegemônicas do centro à periferia e a dispersão urbana:
Se caracteriza pela expansão do tecido urbano, de forma intensa, mas descontínua, marcada pela desconcentração territorial que, por sua vez não pode ser compreendida pela negação da aglomeração, mas como condição e expressão de novas lógicas de localização, que engendram novas práticas sociais e se realizam redesenhando essa nova morfologia (SPOSITO, 2008, p. 31).
O movimento de fragmentação urbana ocorrido em toda grande Belém transformou a periferia urbana em um grande aglomerado sem infraestrutura. Por isso, é a região metropolitana que apresenta a maior concentração de aglomerados subnormais em relação ao total de domicílios ocupados entre todas as regiões metropolitanas do Brasil, cerca de 52,5%, o que corresponde a maioria dos domicílios em toda grande Belém (IBGE, 2010) e das áreas de habitação nos municípios de Ananindeua, Marituba, Benevides, Santa Barbara, como será representado na figura 1, onde se destaca a contiguidade dos aglomerados que unem as cidades de Belém, Ananindeua e Marituba, apresentando a espacialização das ocupações ilegais.
Na figura 1, verifica-se a ocorrência concentrada de ocupações ilegais nas três principais cidades da RMB (Belém, Ananindeua e Marituba), as quais segundo o IBGE (2010), detém grandes áreas insalubres e em precárias condições urbanas, abrigando grande contingente populacional, verdadeiras cidades ilegais (MARICATO, 2005), especialmente no caso de Marituba. A grande faixa de aglomerados subnormais na RMB permite a constatação de ser esta região metropolitana um grande aglomerado subnormal.
Não obstante, a constituição do espaço metropolitano é condição fundamental para a manutenção das atividades produtivas e não produtivas ligadas diretamente ao núcleo hegemônico central. Por isso, a periferia metropolitana de forma visível representa a materialização das ordens e da segregação de seus habitantes, por efeito, a periferia como corpo espacial desagregado representa a predação social e politica de seus integrantes, o que marcadamente se expressa na nova denominação dos espaços de exclusão e segregação, remetendo a solidificação da marginalidade e da incongruência social. Assim, a seleção de ações, principalmente a organização das funções e dos usos no espaço metropolitano permite ordens e ações sociais no corpo espacial e social, pois:
A cidade constitui, em si mesma, o lugar de um processo de valorização seletivo. Sua materialidade é formada pela justaposição de áreas diferentemente equipadas, desde as realizações mais recentes, aptas aos usos mais eficazes de atividades modernas, até o que resta do passado mais remoto, onde se instalam usos menos rentáveis, portadores de técnicas e de capitais menos exigentes. Cada lugar, dentro da cidade, tem uma vocação diferente, do ponto vista capitalista, e a divisão interna do trabalho a cada aglomeração não lhe é indiferente. Assim, as diversas combinações infraestruturais correspondem diversas combinações supraestruturais especificas (SANTOS, 2009, p. 125).
Nesse caso, se destaca o papel organizador das estruturas socioeconômicas sobre a cidade, manifestado principalmente na forma de reorganização e ordenamento dos espaços, cujo objetivo principal é potencializar a função econômica e política deste. Isso por que, “quanto mais intenso o processo de divisão do trabalho de que uma cidade é teatro, tanto maior será a sua subdivisão em espaços particulares, organizados para servir de suporte às atividades correspondentes” (SANTOS, 2009, p. 125).
Sobre isso, diversos são os argumentos que relacionam a periferia com a força avassaladora do capital, cujo raciocínio é: mercado, consumo e trabalho derivam em ações operacionais sobre o espaço quase que total, e consequentemente, promovendo a diferenciação deste e dos grupos que o habitam. Em relação às atividades econômicas na cidade. Santos (2009), afirma que:
Nas regiões metropolitanas se trabalha como se o poder fosse somente do Estado, o município ou entidades regionais. Todavia, o poder efetivo que se realiza sobre a atividade e os cidadãos, que muda as posições dos atores da economia e altera as posições dos próprias cidadãos dentro da região metropolitana, vem, em grande parcela, das firmas dominantes (SANTOS, 2009, p. 128).
Nesse sentido, nas regiões metropolitanas acontecem as proposituras de uma articulação em diversas linhas de atuação, ou melhor, em um campo de forças onde diversos agentes promovem e contribuem de forma decisiva para a organização da periferia metropolitana, de modo que, o conjunto das articulações políticas, constituem um complexo organismo social que dirige e que organiza e desorganiza espaços e relações sociais. O desmembramento dos entes hegemônicos e hegemonizados, e os conflitos entre ambos submergem a conjectura das ações e o raciocínio organizador, o que simplesmente promove disparidades de acessos, estruturas, funções e usos do espaço metropolitano.
Por isso, é imponderável desprender a expansão dos usos sobre o sítio urbano da metrópole e sua periferia, os quais conjugados, representam a realização de uma estratégia de ação cujo o espaço periférico é foco de ocupação. Assim, a periferia urbana emerge como espaço germinado por ações territoriais que promovem e potenciam sua ocupação e organização. Desta forma:
O crescimento metropolitano resulta de um conjunto de processos sistematicamente interligados, entre os quais a integração do território, a desarticulação das economias tradicionais e dos cimentos regionais, os novos papéis da circulação no processo produtivo, o desencadeamento de grandes correntes migratórias, paralelamente ao processo de concentração das rendas. Esse conjunto de processos traz às grandes cidades numerosas levas de habitantes do campo e das cidades menores, que se instalam como podem e, via de regra, terminam por se aglomerar nas enormes periferias desprovidas de serviços e onde o custo de vida, exceto o da habitação assim conquistada, é mais caro que nas áreas mais centrais (SANTOS, 2009, p. 53-54).
Posto isto, o sistema hierárquico, manifesto no lado hegemônico, produz as bases que fundam o espaço metropolitano periférico, tal como este se apresenta, onde o ordenamento transforma a necessidade de moradia e o apelo popular em ação concreta, cujo movimento teve por efeito a segregação no centro e a ocupação do entorno. Tal relacionamento mantém a fidelidade e a correspondência hegemônica, bem como sua supremacia social. Por isso, a manutenção da estrutura central situa-se como prioridade, a periferia urbana surge como polígono calculado, alicerçado em processos que mitigam direitos, fundando um espaço onde as relações sociais e políticas são em linhas gerais, limitadas ou ignoradas, pois as ações desenvolvidas como exterioridade pelo Estado e iniciativa privada quase sempre ferem a ordem local.
Destarte, surge neste contexto de desconstrução política da sociedade local, cristalizando-se em cidade ilegal (MARICATO, 1995). Nesta, um avassalador processo de territorialização se delineia de maneira multiescalar, ordenado para desconstrução e desorganização política de seus integrantes, colaborando para o surgimento de estratégias sociais de sobrevivência e organização pautadas na legalidade ou mesmo na ilegalidade jurídica.
Como anteriormente descrito, a construção política e social da periferia metropolitana significa por sinônimo a desconstrução politica e social das populações locais, pois se vê a crescente destruição humana pelo alimento da incoerência e da antipatia política, cujo fruto primeiro é a maturação de uma cidadania solitária que tem como paralelo um espaço marcado para separação e subdesenvolvimento, cujo vazio é a raiz e produto da disputa predatória. Isso possibilita que o espaço periférico abrigue relações sociais com vista à sobrevivência, ainda que seja ilegal e violenta.
Isso porque, na periferia, comumente convive-se com todo tipo de carência, como na educação, saneamento básico, segurança, mobilidade, entre outras. Não obstante, a resistência e a necessidade fazem com que seus habitantes convivam e promovam dia-pós-dia uma renitente cruzada pela sobrevivência, mesmo que aviltante. Assim, verifica-se a constituição de uma sociabilidade marcada pela resistência e empatia com o meio que lhe abriga. A periferia metropolitana não é euclidiana, pois o processo social que lhe cria, mantem a reprodução da força de trabalho e da ordem social, embora esta última lhe escape.
3. A INSALUBRIDADE URBANA, CONDIÇÕES DE VIDA E BEM-ESTAR NA RMB
Com grandes problemas, a periferia urbana, se manifesta como ponto alinhado, homólogo a todas as principais problemáticas que assolam a periferia da região metropolitana de Belém. De forma agregada, as carências no espaço da cidade promovem elevado mal-estar social, consequentemente, o desconforto. Por conseguinte, a baixa renda se comunica à aceitabilidade desta população em viver em ambientes precários, como os existentes na RMB, onde os serviços sociais não atendem com qualidade a população, por acréscimo propiciam maior segregação, desestabilidade social e política. O enfoque produzido pelo Observatório das Metrópoles (2013, permite a conexão do bem-estar que os serviços oferecidos com excelência podem causar a sua população. Em contrapartida, suas carências tornam os espaços ainda mais segregados, fomentando ainda mais separação e subdesenvolvimento, podendo coincidir em atitudes ilegais no que tange à organização espacial, social, politica e econômica.
O Índice de Bem-Estar Urbano (IBEU) é ainda mais agudo nos aglomerados subnormais e vincula questões complexas da vida urbana e os converte em parâmetro para identificação do bem-estar, permitindo a análise e compreensão de conflitos sociais, principalmente, a violência na periferia urbana.
Assim, a RMB que já se destaca em concentração de aglomerados subnormais (IBGE, 2010), também é expressão negativa em bem-estar a seus habitantes, pois o estudo publicado pelo Observatório das Metrópoles, no relatório do IBEU (2013), aponta a RMB como a pior em bem-estar urbano entre todas as pesquisadas no Brasil.
O Índice de Bem-Estar Urbano (IBEU) é um mecanismo criado para medir quanto as cidades e regiões metropolitanas promovem em termos de qualidade de vida a seus habitantes, principalmente de forma coletiva. Com o IBEU é possível verificar quanto de bem-estar as cidades podem oferecer, isto é matéria fundamental para compreender a complexidade dos problemas locais e metropolitanos. Assim, o Índice de Bem-Estar Urbano “decorre da compreensão daquilo que a cidade deve propiciar às pessoas em termos de condições materiais de vida, a serem providas e utilizadas de forma coletiva” (IBEU, 2013, p. 9).
O índice tem a capacidade de demonstrar de forma clara quanto as cidades promovem o bem-estar a seus moradores. Neste indicador, quanto mais próximo de 1 (um) melhor a distribuição e a qualidade dos serviços, ou seja, melhor o bem-estar urbano, em contrapartida, quanto mais próximo de 0 (zero) pior o bem-estar urbano. Este é fundamental para entender a complexidade local e assim promover o desenvolvimento social da comunidade. Isto porque o aparelhamento e o desenvolvimento organizado e equilibrado das cidades podem promover a ascensão de relações sociais que produzem a empatia geral, podendo reinventar as periferias urbanas, especialmente a metropolitana de Belém.
Essencialmente, o espaço metropolitano de Belém, já anteriormente apresentado como um grande aglomerado subnormal (IBGE, 2010), constitui segundo o IBEU, uma grande área desconexa, pois a Região Metropolitana de Belém destaca-se por apresentar municípios com IBEU entre 0 e 0,5. Na RMB, “71,4% de seus municípios são classificados nesse nível; como esta região metropolitana só possui 7 (sete) municípios, significa que destes, cinco estão classificados no nível mais baixo de bem-estar urbano. Estes municípios são: Santa Isabel do Pará, Ananindeua, Benevides, Santa Bárbara do Pará e Marituba” (IBEU, 2013, p 33).
Os atributos da pesquisa revelam a necessidade de reinventar as cidades, ou melhor, promover ações que possam tornar o espaço urbano mais adequado, e por isso mais benigno, de tal modo que seja possível um equilíbrio, uma humanização e requalificação dos serviços “em cinco dimensões: mobilidade urbana, condições ambientais urbanas, condições habitacionais urbanas, atendimento de serviços coletivos urbanos e infraestrutura urbana” (IBEU, 2013, p. 18), além disso:
Vale destacar que todos os municípios da região metropolitana de Belém (total de 7) estão entre os 40 piores em relação ao IBEU. E, portanto, Belém é o único núcleo de região metropolitana classificada entre os últimos 40 municípios no IBEU. Desses municípios, 11 estão no pior nível do IBEU (entre zero e 0,500) (IBEU, 2013, p. 35).
A classificação obtida a partir da metodologia do IBEU permite-nos ratificar o profundo processo de segregação social visível na periferia da capital, assim como nos municípios que compõe sua região metropolitana, com 0, 251 (IBEU, 2013), o pior entre todas as regiões metropolitanas. Para demonstrar a precariedade do bem-estar urbano na Região Metropolitana de Belém, destacamos a seguir a gráfico 01 (índice de bem-estar urbano nas regiões metropolitanas em 2010), o qual destaca a RMB, como a pior em bem-estar urbano entre todas as pesquisadas.
O gráfico 01 descreve o grave problema na RMB, pois esta apresenta-se em último lugar entre todas, deixando claro o quadro de subdesenvolvimento local, como descreve a tabela 01, que identifica os municípios de Belém, Ananindeua, Castanhal, Marituba, Santa Izabel e Santa Barbara do Pará, entre os piores em todas as regiões metropolitanas brasileiras.
A tabela 01, elaborada pelo Observatório das Metrópoles, apresenta os 40 (quarenta) municípios brasileiros com os piores índices do referido instituto. Dos localizados na RMB somente a capital obteve resultado mediano, os outros municípios, ficaram abaixo de 0,500 IBEU.
A criação do IBEU com 5 (cinco) variáveis de pesquisa: mobilidade urbana, condições ambientais urbanas, condições habitacionais urbanas, atendimento de serviços coletivos e infraestrutura urbana, possibilita uma maior compreensão da realidade vivida pelos, pois as 5 (cinco) variáveis quando agrupadas indicam o grau de bem-estar urbano intra-metropolitano ou municipal. Assim, cada variável descreve sua importância para uma vida de menos estresse, saudável e com mais oportunidades, o que é fundamental para compreender os diversos problemas sociais, em especial a violência.
De maneira geral, a Região Metropolitana de Belém não constitui um espaço de bem-estar urbano. É um espaço de exclusão, onde grande maioria de sua população vive e reside em áreas que não oferecem condições de desenvolvimento social, cuja qualidade de vida converta-se em novas oportunidades, de modo a permitir o rearranjo das relações sociais nas diversas comunidades. Não por acaso, a figura 2 apresenta a maior parte da área urbana da RMB como insalubre.
Dos municípios metropolitanos, somente Belém em sua região central apresenta IBEU entre 0,801 e 1,000. Por outro lado, as áreas de Belém que não são centrais e os municípios metropolitanos tem IBEU entre 0,001 e 0,700. Ainda, segundo esta figura, o município de Marituba apresenta áreas com IBEU que varia entre 0,001 e 0,700. Notadamente em toda sua área urbana não há espaço que possa gerar bem-estar urbano, ou seja, que possibilite qualidade de vida e desenvolvimento social.
3.1 Os Indicadores do IBEU na Metrópole Paraense
A partir de então apresentaremos uma desagregação dos resultados do IBEU, fazendo análise dos seguintes indicadores: mobilidade, condições ambientais urbanas, condições habitacionais, atendimento de serviços urbanos e a infraestrutura urbana.
A precarização dos transportes coletivos é uma das piores consequências do trato diferenciado dado pelo Estado e os agentes hegemônicos aos diferentes espaços. O subdesenvolvimento da malha de transportes, bem como o não aparelhamento e renovação de frotas e a articulação a novos modais de transportes transforma cada coletivo em verdadeiros “pau de araras”, visto que neste não há urbanidade, tão pouco qualidade e bem-estar. A precarização dos serviços de transportes torna o deslocamento do trabalho cansativo e oneroso, dificulta o fluxo de mercadoria e pessoas e isto reflete diretamente nas atividades comerciais e produtivas, que coincide na não criação de novas oportunidades de trabalho e conquista de renda, que são fundamentais para elevação social e para qualidade de vida.
Mesmo com um resultado superior à média do IBEU 0,718, a mobilidade urbana aqui analisada deve ser comparada ao engessamento dos membros, visto que na RMB existem apenas duas vias de ligação, sendo que somente a BR 316 interliga todos os municípios metropolitanos, logo o dado não revela um bem-estar, mas apenas a disponibilidade de linhas que percorrem a periferia metropolitana em direção ao centro da capital paraense.
A necessidade de mobilidade, está conectada ao desenvolvimento pleno deste, que por princípio é fundamental para os habitantes das cidades que compõem a RMB. Isto porque grande parte de seu pessoal ocupado tem vínculo empregatício na capital, que descreve a pendular ação diária em direção ao trabalho e a volta para casa. Não por acaso, a mobilidade urbana é fundamental para consolidação de oportunidades de emprego e ampliação da renda, de forma a possibilitar novos acessos ao mercado de trabalho e ampliação das relações sociais.
Aparecendo sempre entre os piores no ranking desenvolvido pelo Observatório das Metrópoles, o município de Marituba em termos de mobilidade urbana, de forma geral, está na posição nº 210, com 0,621 no IBEU, sua melhor posição. Entretanto, isto não reflete a realidade, pois a mobilidade urbana, ou seja, a possibilidade de deslocamento é realizada em apenas uma via de circulação, isto somado a precariedade do transporte coletivo urbano, torna o deslocamento para o trabalho uma verdadeira odisseia. A mobilidade não proporciona bem-estar social, bem como não fomenta a criação de novas oportunidades. A figura 3 apresenta o bem-estar social que a mobilidade traz aos habitantes da RMB.
A figura 3 apresenta uma generalização do índice para toda RMB. Isto que dizer, que todos os municípios obtiveram o mesmo IBEU para mobilidade, o que não representa fato positivo, pois, na maioria das vezes, os coletivos são insalubres e em geral circulam pela BR 316 em direção a Belém.
Em seguida, as condições ambientais urbanas fazem referência à qualidade ambiental e sanitária em ambiente urbano, elaborado “a partir de três indicadores: arborização do entorno dos domicílios, esgoto a céu aberto no entorno dos domicílios e lixo acumulado no entorno dos domicílios” (IBEU, 2013, p. 47). Estas são fundamentais para compreender a realidade local e suas condições de vida, assim, a figura 4 apresenta grande diferenciação das áreas centrais de Belém e seu entorno metropolitano.
Como pode ser visto, somente o centro de Belém apresenta áreas com índices entre 0,701 a 0,900, à exceção dessas áreas os valores variam entre 0,001 e 0,700. Quanto ao município de Marituba, este apresenta áreas com péssimo indicador, principalmente na sua região mais ocupada, que de maneira geral, tem índice de 0, 408 e está na posição nº 285, somente 4 (quatro) posições acima do último, Santa Barbara do Pará. A partir de então constatamos a carência de um ambiente urbano equilibrado, pois é próprio dizer que há coleta de lixo, mas não de forma satisfatória. O que se refere a esgoto é valido dizer que praticamente não há tratamento, o que significa exposição a céu aberto, além disso, verifica-se a pouca arborização e a inexistência de parques públicos.
Assim como as condições ambientais urbanas, as condições de habitação nesses munícipios são inadequadas. Segundo o censo 2010 do IBGE, existe um total de 21.220 domicílios particulares ocupados em aglomerados subnormais, de um total de 27.413, ou seja, 77,40 % vivem em aglomerados subnormais. Tal informação ratifica a insalubridade dos espaços para habitação, bem como, a precariedade de sua estrutura. “Os indicadores dessa dimensão foram selecionados a partir da compreensão das condições dos domicílios, bem como de suas características, que podem favorecer direta ou indiretamente o bem-estar urbano” (IBEU, 2013, p. 56). A figura 5 apresenta a variedade de condições de habitação na RMB
A legenda da figura 5 mostra um índice com maior variedade de indicadores na RMB. O centro de Belém apresenta os melhores indicadores entre 0,701 e 1,000. Áreas de Ananindeua e Benevides entre 0,7001 e 0,900, porém Marituba, como anteriormente descrito, é um grande aglomerado subnormal, que apresenta os piores índices, entre 0,001 e 0,500, especificamente 0,357, penúltima colocada nacional, posição nº 288. Assim, municípios com a dimensão de condições habitacionais abaixo de 0,500 encontram-se em apenas três regiões metropolitanas, sendo um em cada. Isto ratifica o denso problema social existente nos municípios, em grande parte, porque as habitações de maneira geral são precárias ou estão em locais insalubres, materializando os diversos problemas sociais na particularidade desses municípios.
O índice de atendimento de serviços coletivos abrange quatro indicadores: atendimento adequado de água, atendimento adequado de esgoto, atendimento adequado de energia e coleta adequada de lixo. A agregação destes indicadores deixou clara a carência dos serviços essenciais para população, como pode ser visto na figura 6, em que faz-se a representação da falta de investimentos públicos e privados na melhoria ou na criação destes serviços.
Na RMB, verifica-se uma variação do atendimento dos serviços essenciais, pois, conforme a figura 6, não há grande diferenciação entre o centro da cidade e a periferia. No entanto, mesmo algumas áreas centrais de Belém não se encontram condições adequadas dos serviços, porém na periferia verifica-se como um todo a ocorrência da ineficácia dos serviços, ou mesmo inexistência, isto principalmente no que se referir a água tratada e ao tratamento do esgoto.
Em sua última parte, o IBEU apresenta os resultados quanto à infraestrutura urbana, fundamentalmente, é uma junção das condições elementares para boa circulação de pessoas no espaço e objetos em ambiente urbano. Desse modo, a figura 7 mantem a tendência dos índices anteriores, porém, concentra ainda mais a RMB nas piores faixas do IBEU. Isso porque a maioria das áreas tem índice entre 0,001 a 0,500, o mais baixo entre as faixas, descrevendo quase totalmente a RMB como uma região com inexistente ou ineficiente infraestrutura urbana.
Assim, quanto a infraestrutura urbana, a RMB tem os piores índices do Brasil, não por acaso, os municípios metropolitanos situam-se nas últimas linhas do Índice de Bem-estar Urbano. Destarte, a infraestrutura urbana não destoa das demais, fundamentalmente apresenta-se conectada aos outros indicadores. Por efeito, o IBEU dos municípios para a infraestrutura urbana é o pior do Brasil, apresentando índice de 0,166 e ocupando a posição nº 287 a última do ranking.
Merece destaque, com o pior IBEU entre todos os municípios metropolitanos, o município de Marituba, que apresenta um quadro alarmante de desorganização e de subdesenvolvimento, é espaço propício a ações e estratégia sociais que se justificam em si e nas suas necessidades. Emergem da precariedade, insalubridade, da ordem e principalmente da (des)ordem, por isso, a violência urbana manifesta-se corriqueira e cotidianamente, polarizada na periferia, onde as condições sociais e urbanas são degradantes. A violência atinge principalmente a periferia, em seguida se deflagra em todas as direções. Na periferia, o surgimento e manutenção de estratégias de sobrevivência legais e ilegais são factíveis, pois controle, vigilância e desenvolvimento são ineficazes, permitindo segregação e principalmente um lento processo de socialização e territorialização onde os elementos da violência são necessários à afirmação e ao relacionamento social.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A singularidade das relações sociais é por consequência reverberação da ordem que gerou os espaços. A periferia e sua particularidade apresenta-se como manifestação de um longo processo de organização e desorganização da vida social em que se destaca a manutenção do sistema de produção econômica e a organização social. Por efeito, a constituição da periferia deve por correspondência, promover a revitalização e retificação da ordem social geral, de modo que, política e economicamente revigore e reproduza as relações de produção e a manutenção da ordem.
No espaço periférico, a constituição das relações sociais e suas prováveis reflexões na vida têm grande destaque na construção de estratégias de organização, sociabilidade e sobrevivência. Por conseguinte, os espaços insalubres da RMB constituem de forma contundente um exemplo de ordenação que promoveu a insalubridade e a desestabilidade social. Em decorrência disso, esses “territórios (des)ordenados” são a manifestação do clamor social por espaço, principalmente pela necessidade de moradia, onde nem mesmo a precariedade e a ilegalidade das áreas de habitação e moradia, ou seja, a falta de infraestrutura e a carência de desenvolvimento, são capazes de inviabilizar a construção social do espaço e da vida.
A complexidade, a peculiaridade e principalmente a gestão da diferença marca a vida social, sua representação em forma de espaço é manifesta nos bairros, pois demonstram os conflitos e contradições inerentes na forma de gestão e desenvolvimento do espaço, bem como o seu uso e reprodução, de modo que, principalmente a periferia seja materializada em aglomerados anormais: favelas, periferias, invasões ou baixadas, marcas da gestão social que rege e direciona para a ilegalidade.
A diferença, organização e a necessidade de sobrevivência produzem formas de relacionamento social que conectadas às ordens fomentaram a formação do espaço periférico em seu caráter insalubre e ilegal. Isto impulsiona um poderoso processo de organização de estratégias sociais de sobrevivência, onde agir de forma ilegal para a conquista diária da vida é mais importante e tem maior valor social que o respaldo legal do respeito e zelo pela ordem estabelecida, de certo, fortemente ideológica e classista.
Vive-se um progressivo processo adaptativo, pela visível estratificação e seleção de punidos e culpados no âmbito das regulações gerais. Ainda sim, é palpável compreender a gama de indivíduos agindo e reproduzindo vidas e relações tidas como ilegais. Por isso, na periferia, as relações sociais tendem para a flexibilidade e compreensão das necessidades. Conectadas a isso, compreendem-se as determinações e ilegalidades invisíveis na ordem que levou milhares de pessoas a aglomerar-se pela precisão em espaços insalubres. Isto propicia a formação de estratégia de organização, identificação e empatia nos ambientes criados na ilegalidade, onde não há a equidade das ordens e principalmente dos direitos.
Nesse sentido, toda a complexa rede de relações e suas manifestações em forma de problemas sociais, políticos, econômicos e ambientais são antes reflexos da gestão desumana e racional de organização da produção e desorganização social. Isto quer dizer que a manutenção e a readequação do aparato político e econômico determinam a forma e as relações sociais na vida periférica. Por isso, o que transborda da periferia certamente inundará o centro.
Por isso, as ações descritas culminam com a formação de um ambiente de disputas, de conflitos e de processos de hegemonização, pois a verificação de agitações e sua materialização em crimes demonstram a efervescência de disputas, de organizações e principalmente de conflitos pela hegemonização e por consequência de territorialidades. Os aglomerados subnormais são representações espaciais da violência continua, desorganizada, porém conflitiva, que está alinhada ao subdesenvolvimento educacional, nas desconstruções dos valores sociais, na desorganização da família, no contato íntimo com a violência e seu estabelecimento na organização diária da vida.
Por isso, a vida na periferia é insalubre, as relações sociais em geral estão em franco processo de transformação, passando das manifestações comuns de reconhecimento, empatia e vizinhança, para o distanciamento e intolerância. A violência que assola a periferia é uma manifestação da própria degradação da comunidade e do espaço, pois, as atitudes violentas, mais especificamente, os homicídios, são acontecimentos derivados da desestabilidade social e do subdesenvolvimento da comunidade em geral.
A territorialidade violenta é então um processo de integração sócioespacial, devendo ser combatida, a partir de ações de desenvolvimento social com justiça e equidade. Estas devem possibilitar a reconstrução das relações sociais e o desenvolvimento sócio econômico, que permita elevações sociais. Por outro lado, as ações objetivas, de saturação e repressão devem ser repensadas e convertidas em uma aproximação contínua de atividades e relacionamentos com a comunidade, a partir de ações não somente operacionais mais fundamentalmente sociais e intersetoriais, pois não basta combater a violência ocorrida ou prestes a acontecer.
REFERÊNCIAS
ALVAREZ, W. Geografia e violência nos aglomerados de exclusão na cidade de Marituba: 2011 a 2013. Belém: Programa de Pós-Graduação em Geografia Universidade, Federal do Pará, 2015 (Dissertação de Mestrado em Geografia)
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SPOSITO, E. S. Redes e Cidades. São Paulo: Editora UNESP, 2008.
* Mestre em Geografia pela Universidade Federal do Pará. Professor Assistente I da Universidade Federal do Pará (UFPA). Pesquisador do Grupo Acadêmico Produção do Território e Meio Ambiente na Amazônia (GAPTA/CNPq). E-mail: walvarez@ufpa.br
** Doutor em Ecologia. Pós-Doutorando em Desenvolvimento Regional no PPGMDR/UNIFAP. Bolsista FAPEAP/CAPES. Professor Adjunto II da Universidade Federal do Pará. Pesquisador do GAPTA/CNPq. Docente do Programa de Pós-graduação em Geografia (PPGEO/UFPA). Sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Pará. E-mail: cnunes@ufpa.com.br
*** Doutor em Geografia. Pesquisador em Produtividade do CNPq. Professor Associado III da Universidade Federal do Pará. Líder do GAPTA/CNPq. Docente do Programa de Pós-graduação em Geografia (PPGEO/UFPA). Sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Pará. E-mail: jmpalheta@ufpa.br
**** Professor Associado I – Universidade Federal do Amapá - UNIFAP. Pós-doutorando em Geografia PPGEO/UFPA. FAPESPA/CAPES. Pesquisador do GAPTA/CNPq. E-mail: ricardoangelo_pereira@yahoo.es
1 Essa “des”ordem está intimamente relacionada à fragilização coletiva, em sentido amplo, com a perda articulativa do grupo social, ausência ou fraco empoderamento coletivo que permita ampliação das conquistas sociais e qualidade de vida de forma local.
2 O setor especial de aglomerado subnormal é um conjunto constituído de, no mínimo, 51 (cinquenta e uma) unidades habitacionais (barracos, casas...) carentes, em sua maioria de serviços públicos essenciais, ocupando ou tendo ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular) e estando dispostas, em geral, de forma desordenada e densa, caracterizando-se da seguinte forma:
a) Ocupação ilegal da terra, ou seja, construção em terrenos de propriedade alheia (pública ou particular) no momento atual ou em período recente (obtenção do título de propriedade do terreno há dez anos ou menos) e; b) Possuírem pelo menos uma das seguintes características: urbanização fora dos padrões vigentes – refletido por vias de circulação estreitas e de alinhamento irregular, lotes de tamanhos e formas desiguais e construções não regularizadas por órgãos públicos; além da precariedade de serviços públicos essenciais (IBGE, 2010, p. 19).
3 Região metropolitana consiste numa realidade urbano-regional que se estende por um espaço geográfico dentro do qual se distinguem várias jurisdições político-territoriais, contíguas ou superpostas entre si, segundo o nível de competência, seja local ou regional, formando uma mesma unidade socioeconômica (GRAUS, 1975, p. 25).
4 Espaço onde as forças de modernização e desenvolvimento alcançam ao mesmo tempo que no centro, por efeito é impacto pelas forças do centro para máxima produtividade, estas quando emitidas dos centros mudam à medida que alcançam a periferia (SANTOS, 1980).
5 Ocupações de forma clandestina, onde se tem moradia, porém não o direito a cidade.
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