Carlo Alessandro Castellanelli*
Luise Medina Cunha**
Universidade Federal de Santa Maria, Brasil
castellanelli@bol.com.brResumo: A administração pública tem sido tema de discussão, especialmente considerando-se a evolução nas formas de gerir a coisa pública. Surgiram diversos programas e ferramentas a partir de iniciativas do governo, ou de iniciativas locais, na tentativa de modernizar e se desvencilhar de conceitos do passado que geram um grande entrave à máquina pública. Este trabalho visou entender o papel atual da gestão pública na busca por eficiência, através da discussão de dois eixos: possibilidades da geração de eficiência versus os limites que ainda se apresentam contra um pleno desenvolvimento da gestão moderna. Apesar da visão moderna empresarial estar buscando seu espaço na gestão pública, é possível perceber que algumas práticas e vícios são obstáculos para o pleno desenvolvimento.
Palavras-chave: Gestão Pública, Gestão Moderna, Desenvolvimento.
EFFICIENCY IN PUBLIC MANAGEMENT: CONTEMPORARY
LIMITS AND CAPABILITIES
Abstract: Public administration has been a subject of discussion, especially considering the evolution in ways of managing public affairs. Many programs and tools emerged from government initiatives, or local initiatives in an attempt to modernize and to shake concepts from the past that generate a large obstacle to public administration. This study aimed to understand the current role of public administration in the pursuit of efficiency through the two axes discussion: possibilities of generating efficiency versus the limits that are still present against a full development of modern management. Despite the modern business vision be seeking its place in public management, some practices and vices are obstacles to full development.
Keywords: Public Management. Modern Management. Development.
Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Carlo Alessandro Castellanelli y Luise Medina Cunha (2016): “Eficiência na gestão pública: limites e potencialidades contemporâneas”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (julio-septiembre 2016). En línea:
http://www.eumed.net/rev/cccss/2016/03/limites.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/CCCSS-2016-03-limites
1. INTRODUÇÃO
No contexto internacional, ainda nesta mesma tônica, mais recentemente, em setembro de 2011, um grupo de países instituiu-se, como membros da Parceria Governo Aberto, comprometidos com os princípios consagrados na Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Convenção da ONU contra a Corrupção, e outros instrumentos internacionais pertinentes relacionados aos direitos humanos e à boa governança. (Open Government Partnership, 2011). Oficialmente reconhecem que as pessoas em todo o mundo exigem mais transparência de seus governos, demandando maior participação popular nos assuntos públicos, e buscando maneiras de fazer seus governos mais transparentes, ágeis, responsáveis e eficientes. (Open Government Partnership, 2011). A declaração de intenções explicita um conjunto de princípios constituintes do assim denominado Governo Aberto e finaliza com o compromisso de adotar nos compromissos internacionais e a trabalhar para fomentar uma cultura global de governo aberto que fortaleça e produza resultados para os cidadãos, avançando os ideais do governo aberto e participativo do século XXI. (Open Government Partnership, 2011).
No Brasil, segundo os princípios da administração pública, as normas e procedimentos devem ser sempre atendidos de forma a respeitar-se a legislação vigente. Assim, os princípios constitucionais da Administração Pública (BRASIL, 1988, art. 37), são: a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência. Desta forma, a Gestão Pública precisa obrigatoriamente atender a tais princípios para ser excelente. Sucintamente, de acordo com o Documento de Referência 2008-2009 do Gespública (BRASIL, 2009a), os princípios podem ser compreendidos conforme: a) Legalidade: estrita obediência à lei. Nenhum resultado poderá ser considerado bom, nenhuma gestão poderá ser reconhecida como de excelência à revelia da lei; b) Impessoalidade: não fazer acepção de pessoas. O tratamento diferenciado restringe-se apenas aos casos previstos em lei. A cortesia, a rapidez no atendimento, a confiabilidade e o conforto são requisitos de um serviço público de qualidade e devem ser prestados a todos os cidadãos-usuários indistintamente; c) Moralidade: pautar a gestão pública por um código moral. Não se trata de ética (no sentido de princípios individuais, de foro íntimo), mas de princípios morais de aceitação pública; d) Publicidade: ser transparente, dar publicidade aos fatos e dados. Essa é uma forma eficaz de indução ao controle social; e) Eficiência: fazer o que precisa ser feito com o máximo de qualidade ao menor custo possível. Não se trata de redução de custo de qualquer maneira, mas de buscar a melhor relação entre qualidade.
No entanto, é necessário observar que a prática geralmente não obedece à sistemática dos princípios e das diretrizes propostas pelos programas ou ferramentas modernas ou mesmo pela legislação vigente. Discute-se a seguir as potencialidades e os limites presentes na gestão contemporânea.
2. POTENCIALIDADES PARA O PLENO DESENVOLVIMENTO DA MÁQUINA PÚBLICA
2.1 Aprendizagem no serviço público
A administração pública como uma atividade organizada do estado sofreu mudanças consideráveis, particularmente desde as primeiras décadas do século XX, como apontado por Osborne e Gaebler (1994). Dentro dessas mudanças alguns autores consideram que a gestão pública moderna, e de acordo Poom (2007), é um resultado dos desafios que envolveram encontrar respostas para os problemas complexos enfrentados pelo estado, e forncecem subsidios para esta nova cultura de gestão pública de modo a moldar as funções estratégicas, combinando as tarefas que derivam de uma administração pública menos hierárquica.
Neste contexto, o desenvlvimento da aprendizagem organizacional se caracteriza como uma ferramenta necessária para o desenvolvimento da gestão moderna como um todo. Para Senge (1998) o ponto de partida da aprendizagem organizacional está no comprometimento de todos os membros da empresa e na incorporação de cinco disciplinas de aprendizagem: domínio pessoal, modelos mentais, visão compartilhada, aprendizagem em equipe e pensamento sistêmico. Destaca ainda que as organizações que aprendem são aquelas nas quais as pessoas aprimoram continuamente suas capacidades de criar o futuro que realmente gostariam de ver surgir.
Ao que concerne as a gestão pública, sob a ótica de Moynihan e Landuyt (2009), as organizações públicas deveriam devotar mais energia em criar fóruns de aprendizagem na mesma medida em que criam sistemas de informações. Os fóruns de aprendizagem são espaços que valorizam o diálogo e a participação dos membros da organização, reforçando o compartilhamento de informações e experiências e apoiando a apresentação de diferentes visões e perspectivas. Desta forma, é preciso compreender como ocorre a aprendizagem do funcionário público, nos planos formal e informal, pois ela condicionará o seu desempenho nas funções que exercerá na máquina governamental.
A aprendizagem não está relacionada apenas ao que está armazenado no cérebro, apreendido em salas de aula ou nos livros, mas, também, ao conhecimento que vai sendo adquirido a partir de situações, vivências e desafios relacionados à prática (LAVE e WENGER, 1991).
Por aprendizagem formal pode-se relacionar o conhecimento teórico, num esforço organizado de formação, com tutores capacitados, tempo e saberes determinados, abrigados em instituições de ensino. A aprendizagem informal seria o processo de apropriação dos saberes práticos socialmente construídos no grupo a que pertence, dentro do seu espaço de trabalho.
Informalmente, durante toda uma carreira, a construção de conhecimento e o próprio aprendizado, dependendo das relações sociais existentes, pode ser amplamente influenciada pela convivência com os colegas de trabalho. Na prática, observa-se um certo isolamento entre os diversos setores de uma instituição e até mesmo entre os colegas, seja por receio de perder uma posição de destaque, falta de incentivos e promoção de atividades que proporcionem a trocas de informações pelos setores responsáveis e ainda pela própria cultura organizacional enraizada no indivualismo.
No campo formal, existem diversas oportunidades de aprendizagem, como por exemplo, A ENAP (Escola Nacional de Administração Pública), que proporciona diversos curtas de curta e média duração, nos mais diversos assuntos relacionados com metodologias e ferramentas modernas da gestão pública.
Ainda, em relação a qualificação formal do servidor, o governo necessita gerar políticas públicas para um amplo escopo de temas através de gestores capacitados na maior diversidade possível de formações universitárias. Neste sentido, programas de incentivo a graduação, especialização, mestrado e doutorado, são geridos e cada vez mais estão presentes na realidade da administração pública, até mesmo através de programas voltados para a realidade da gestão pública aplicada.
A aprendizagem ainda enfrenta alguns dilemas que precisam ser enfrentados. É preciso acompanhar e mensurar como o novo conhecimento é incorporado e disseminado e quais aspectos da gestão facilitam e dificultam a ativação do ciclo de aprendizagem. Observa-se que os conhecimentos são assimilados e disseminados, com baixa eficiência, havendo muita preocupação com custos. Da mesma maneira, é necessário desenvolver a dimensão cultural da capacidade de aprender para que essa resistência não continue a retardar e impedir o desenvolvimento da instituição.
Seja no âmbito informal ou formal, para haver bons resultados da aprendizagem organizacional, a legitimidade e o apoio da administração são imprescindíveis.
2.2 Gestão de competências no serviço público
A dinâmica de trabalho caracterizada como mutável também é uma realidade posta às organizações públicas. Um novo contexto de mudanças global afeta a organização estatal e o próprio Estado como empregador. A necessidade de descentralização, desburocratização, democratização do setor público, já referendado pela Constituição de 1988, torna-se emergente e exige cada vez mais uma nova concepção de relacionamento entre Estado, mercado e sociedade (Carvalho et al., 2009). Lidar com as novas formas de trabalho pressupõe servidores públicos preparados para atuarem em ambientes de gestão complexos e exigentes em termos de conhecimentos, habilidades e atitudes.
Sob a ótica de Ferreira (2002), a Gestão Pública também engloba o processo de transformação da sociedade, e é necessário para gerenciar instituições públicas, além de investir em novas tecnologias, investir no capital humano. Gerar mudanças no setor público é refletir sobre maneiras pelas quais o conhecimento individual seja incorporado ao conhecimento coletivo e organizacional, criando valores que não são tangíveis e que podem diferenciar eficientemente as organizações dessa natureza. Embora as mudanças no setor público não sejam rápidas como no privado, percebe-se a intenção de governos promoverem mais qualidade ao setor.
Wolynec (2005), acrescenta que o foco está no gestor público como principal agente de mudança e ciente de seu papel. É preciso investir em capacitação e valorização do servidor público; reduzir custos; otimizar arrecadação; e melhorar a qualidade dos serviços prestados. Corroborando com a ideia anterior e adentrando na ideia de gestão por competências, na década de 1990 em que o contexto das organizações é caracterizado pela globalização de mercados e consequente concorrência e competitividade, atividades de serviços, estratégias de customização, trabalhos informais e baixa previsibilidade de negócios, conforme (Ruas, 2005), surge o conceito de competências. A competitividade é caracterizada pela presença de novas tecnologias, fusões e aquisições, alta expectativa de consumo e crescente internacionalização nos mercados de trabalho e negócios (França; Kanikadan, 2008). A incerteza da economia competitiva leva gestores a valorizar a competência.
A moderna gestão de pessoas assenta-se em um tripé estratégico: gestão por competências; democratização das relações de trabalho para gerar ambientes adequados à inovação; e qualificação intensiva das equipes de trabalho, incluindo o uso de tecnologia da informação. A nova política de capacitação e de desenvolvimento de pessoas (Decreto no 5.707, de 23/02/2006, que revogou o Decreto no 2.794/1998), em implantação no governo federal, tem essa visão estratégica. Considera que a gestão de pessoas necessária é aquela que promove a gestão por competências. Desde 2006, esse modelo de gestão é considerado referência-chave. Ainda pouco conhecido no setor público, tanto no Brasil como no mundo, a gestão por competências significa olhar para o trabalho por uma lente que combina os conhecimentos, o saber-fazer, a experiência e os comportamentos exercidos em contexto específico. O foco não mais repousa sobre a atribuição formal de um posto de trabalho.
De outra forma, existem autores que como Kochanski (1997), Shippmann et al. (2000) e Markus, Cooper-Thomas e Allpress (2005) que afirmam que ainda há poucas evidências para sugerir que modelos de gestão de ou por competências fornecem qualquer capacidade preditiva incremental sobre as medidas existentes para indicar melhorias no desempenho global empresarial. Acrescentam ainda que seu uso inadequado implica grande desordem sobre suas reais finalidades. Em vista disso, mais estudos são necessários para validar a questão da disseminação e aplicação da gestão por competências;
Implementar a Gestão de Pessoas por Competências em uma organização pressupõe uma nova forma de gerir pessoas e uma consequente mudança nas políticas de pessoal, no envolvimento das lideranças com seus subordinados, nas práticas de treinamento, desenvolvimento e educação, e demais rotinas que envolvam pessoas.
Como exemplo de sucesso nas Instituições Federais de Ensino Superior, a Universidade Federal do Tocantins (UFT) instituiu o Plano de Desenvolvimento dos Integrantes do Plano de Cargos dos Técnico-Administrativos em Educação (PDIPCCTAE) que possui como base o Programa “Gestão de Pessoas por Competências”, que tem consonância com o planejamento estratégico da instituição e diretrizes do Ministério da Educação.
2.3 Inovação na gestão pública
É notório que quando se fala em inovação, este conceito é fortemente remetido à iniciativa privada. No setor público, as mudanças e inovações parecem caminhar em um ritmo diferente, com uma grande defasagem ou até mesmo sendo ignoradas ou esquecidas. É preciso considerar o papel político e a burocracia no entrave dessas mudanças no caminho para a inovação. Conforme afirma Saraiva e Capelão (2000), parece inegável a existência da burocracia como fator de racionalidade predominante na esfera pública, o que acarreta uma série de atitudes, por parte do corpo administrativo, voltadas à perpetuação dos processos existentes, condizentes com a lógica de sistema fechado que os rege.
No entanto, seja no campo público ou privado, na última década a inovação passou a ser reconhecida como um fator essencial para a competitividade das organizações. Importante lembrar as ideias de Joseph Alois Schumpeter (1997), para o qual, a inovação é o motor do crescimento econômico e o fator empresarial é o elemento chave no processo de geração de inovações.
No campo público, os governos precisam objetivar a promoção da inovação, criatividade e empreendedorismo, pois desenvolver o espírito empreendedor e inovador pode ser extremamente desafiador em um ambiente que desestimula atitudes inovadoras. Para atingir este objetivo, deve-se criar um clima e cultura organizacional adequada. Inovar implica introduzir mudanças dentro de uma ordem existente ou planejada, de modo a melhorar os processos existentes, contudo é necessário situar a inovação dentro do contexto da gestão pública. Em outras palavras, na gestão pública, ao se definir inovação, é necessário que se leve em conta um amplo leque de possibilidades, com a premissa da necessidade de se considerarem o conjunto do sistema e os alcances e limites dos processos políticos institucionais. A inovação, nesse caso, deverá sempre se referir a uma determinada institucionalidade, no terreno das práticas sociais e de políticas em curso (Veiga, Costa e Carneiro, 2006).
Com a evolução do pensamento administrativo e com a maior abertura e transparência das ações do governo, a inovação organizacional tem sido uma das categorias centrais nos discursos teórico-práticos dos projetos contemporâneos de estruturação da relação público-privado e Estado/Sociedade. Em vista disso, diversos programas e iniciativas visando a inovação, tanto nacionais quanto internacionais, tem sido criados e aperfeiçoados pelos governos.
Pode-se citar, nesse contexto, a Open Government Partnership (OGP), uma iniciativa internacional, criada com a finalidade de assegurar compromissos concretos por parte dos governos de diversos países que promovam a transparência, aumentem a participação cívica, combatam a corrupção e aproveitem novas tecnologias para tornar a gestão pública mais aberta, eficaz e responsável. Por meio da OGP, os países-membros relacionam-se com os pares, empresas e outras organizações que possam ajudar a desenvolver soluções inovadoras. No Brasil, o GESPUBLICA insere-se em um contexto mais amplo de mudança de paradigma administrativo: da administração burocrática para a administração gerencial. O Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização tem como características principais ser essencialmente público, contemporâneo, federativo e estar voltado à disposição de resultados para a sociedade. Seu objetivo é contribuir para a qualidade dos serviços públicos prestados à população e para o aumento da competitividade do Brasil.
O conceito de inovação é extremamente amplo, e no campo da gestão pública, diversas técnicas, práticas e metodologias estão sendo utilizadas e desenvolvidas. A Gestão de Projetos e a Gestão de Processos, por exemplo são iniciativas discutidas dentro do contexto do GESPÚBLICA, e que se pode observar, ainda que em ações isoladas, uma certa tendência de adoção pelos órgãos públicos, inclusive pelas Universidades.
Observa-se também, que algumas ações já permeiam o campo da participação e, segundo o pensamento, fazendo parte de uma segunda etapa do processo de inovação aberta na gestão pública Hilgers e Piller (2011). É importante considerar que os cidadãos possam ser inseridos no processo de formulação de políticas inovadoras do governo.
Além das tecnologias existentes e desenvolvidas, as quais também fazem parte da inovação (e-government, por exemplo), no setor público há necessidade de se desenvolver modelos de gestão que conduzam à excelência. Para isso, um dos fatores chaves é a introdução da Cultura de Inovação, influenciando as atitudes dos gestores e incentivando a participação do cidadão, visando romper a barreira política e burocrática que impede sua disseminação.
2.4 Liderança no serviço público
A liderança, de um modo geral, diz respeito à capacidade de os gestores dirigirem, influenciarem e motivarem os membros da equipe de trabalho para realizarem as tarefas necessárias ao bom andamento dos processos e rotinas.
Inicialmente, é importante mencionar a concepção do homem social nas organizações, substituindo a concepção da ênfase nas tarefas pela ênfase nas pessoas. Tal concepção se torna fundamental em no cenário competitivo, no qual a liderança pode ser o fator chave para o sucesso empresarial.
Embora pareçam evidentes as diferenças no que se refere às características requeridas à liderança nos setores público e privado, segundo a ótica de Lipietz (1985), a administração pública brasileira passa a incorporar, especialmente a partir de fins da década de 1980, início dos anos 1990, conceitos de gestão bastante similares aos observados em grandes corporações empresariais do pós-ruptura do ciclo virtuoso do fordismo,no contexto de um movimento que vem sendo denominado de nova administração pública.
Sendo a liderança uma direção no modo de influenciar as pessoas, tal definição pode ser aplicada tanto para organizações públicas, quanto para organizações privadas, pois apesar de se diferenciarem por processos, finalidades e objetivos, a influencia no comportamento de outros indivíduos sempre estará presente.
Prestes Motta (2007) relata que os movimentos em torno do liberalismo gerencial, do gerenciamento orientado ao mercado, do neogerencialismo e de uma administração pública ativista encontraram, no Brasil, terreno fértil, especialmente considerando os debates sobre o papel do Estado e da administração pública, no decorrer do processo de redemocratização do país, no final da década de 1980. Desta maneira, mesmo que tenha havido uma evolução no pensamento quanto à modernização do Estado e da Administração Pública, algumas características perduraram, como o personalismo, que concentra o poder na figura de um líder, porém não como o resultado de uma gestão e visão moderna.
Outro aspecto a se considerar sobre o desenvolvimento organizacional na gestão pública, é a influência da cultura para o desenvolvimento de práticas modernas de gestão. A cultura organizacional não é uma constante, visto que os valores e normas são influenciados por aspectos ambientais e se alteram na medida em que ocorrerem mudanças que afetam as pessoas que vivem ou convivem nesse ambiente (HALL, 2006). A cultura organizacional ainda é um forte entrave para o desenvolvimento de práticas modernas na gestão pública.
Uma cultura organizacional reconhecida e disseminada pode ser uma aliada ao desenvolvimento de uma liderança democrática e moderna. Conforme White e Lippitt (1939), em um estudo sobre a liderança em termos de estilo de comportamento do líder, na relação com o subordinado, consideraram que existem três estilos de liderança: - Autoritária, Democrática, Liberal - com o estilo democrático gerando melhores benefícios ao grupo. No entando é necessário considerar que houve uma evolução em normas, maneiras de gerir e o na própria maneira de pensar, e que é preciso uma ótica que vá além da destas delimitações sobre os estilos de liderança.
Diante das demandas do contexto da nova administração pública, o novo líder ainda deve ter como competências essenciais: conhecimento da máquina pública, capacidade de promover o envolvimento da sociedade, capacidade de lidar com o público, orientação para resultados, bom relacionamento interpessoal e visão sistêmica e bom-senso. Desta forma, pode-se incentivar uma liderança apta a enfrentar desafios nos contextos atual e futuro da gestão pública brasileira.
2.5 Motivação humana no serviço público
A motivação humana para o trabalho constitui um dos grandes desafios das organizações públicas e privadas. Mesmo com o aparecimento de novas teorias que reforçam a importância de se valorizar os indivíduos nas organizações, os efeitos da falta de motivação no trabalho, naturais de uma gama de políticas geradoras de incertezas e insegurança, podem resultar em graves problemas tanto para as organizações como para as pessoas.
Existem transformações constantes, sejam elas políticas, econômicas e sociais, gerando mudanças nas relações sociais no trabalho, alcançando e interferindo nas organizações, tanto públicas quanto privadas. Na administração pública a satisfação do cidadão é primordial, e para isso, é indispensável a existência de servidores comprometidos e motivados que mantenham esta relação de um modo harmonioso.
Conforme discorre Bergamini (1997), a motivação é um ponto crítico em qualquer organização, dessa forma torna-se fundamental o conhecimento das teorias motivacionais para se pensar sobre o comportamento nas organizações, essenciais para tomada de decisões e para o planejamento organizacional.
Sobre os fatores que determinam a satisfação no trabalho, Robbins (1999) menciona os seguintes: trabalho mentalmente desafiador, recompensas justas, condições de trabalho apoiadoras e colegas que deem apoio. Neste último, é importante destacar o comportamento do chefe como um grande determinante da satisfação. Outro fator apontado é a existência de uma boa personalidade, de um indivíduo que esteja ajustado em seu cargo.
Lévy-Leboyer (1994), analisa casos de certos funcionários bem enquadrados que estão satisfeitos, mas não motivados, ou seja, eles estão seguros dos seus empregos e contentes com a sua situação, mas pouco preocupados em serem eficazes.
Existem diversas teorias motivacionais ao que concerne a motivação, desde estudos clássicos até teorias modernas. Pode-se citar algumas teorias importantes:
- Teoria da Hierarquia das Necessidades de Maslow, na qual as necessidades humanas estão distribuídas em uma hierarquia, de forma que, quando uma necessidade é relativamente satisfeita, a necessidade seguinte torna-se dominante no comportamento da pessoa;
- Teoria dos Dois Fatores de Herzberg, o qual começou a levantar dados sobre atitudes em relação ao trabalho que servisse para deduzir hipóteses sobre o comportamento humano;
- A Teoria da Expectativa de Victor Vromm, baseada na Teoria da Hierarquia de Necessidades, de Maslow, e na Teoria dos Dois Fatores, de Herzberg, sendo que o elemento essencial desta teoria é de que as pessoas serão motivadas a fazer coisas para alcançar alguma meta na medida em que esperarem que certas ações, de sua parte, as ajudem a alcançar a meta;
Ainda pode-se mencionar a Teoria ERC de Clayton Alderfer, a Teoria de Necessidades de David McClelland e a Teoria de Avaliação Cognitiva, entre outras;
Apesar de muitas teorias tentarem alavancar a questão da motivação humana ou estudar seus fatores de aumento de desempenho, de acordo Faller (2004), em uma análise dos fatores organizacionais que influenciam na satisfação e motivação no trabalho dos servidores públicos, mostram os mesmos pontos em comum, ou seja, a falta de políticas públicas sérias para enfrentar o problema da falta de satisfação e motivação no trabalho, para o autor o quadro se repete quase que inevitavelmente nas repartições públicas, onde o modelo de gestão de recursos humanos na área pública parece continuar pautado nos princípios burocráticos da impessoalidade, do tecnicismo e do mecanicismo, e dissociado de qualquer fundamento teórico mais apropriado. Para este autor, ainda, os fatores motivacionais como a realização do trabalho, o reconhecimento e o gosto pelo trabalho, e os fatores higiênicos, estabilidade, coleguismo e relacionamento com superiores são os que mais influenciam os servidores, sendo os que mais contribuem para satisfação e motivação no trabalho, com relação à insatisfação, segundo sua pesquisa, é mais influenciada pelos fatores higiênicos, condições de trabalho, processo de comunicação, política salarial, descontinuidade administrativa e burocracia e pelos fatores motivacionais como: resultados e falta de reconhecimento profissional.
Em uma outra pesquisa, Affonso e Rocha (2010), relata a experiência de servidores que se encontram insatisfeitos em relação aos Fatores Higiênicos definidos por Herzberg, onde os mais relevantes que influenciam nesse estado são: ambiente físico, política salarial, salário, benefícios, oportunidade de crescimento profissional e treinamento.
2.6 Sistemas e tecnologias na gestão pública
O emprego das novas tecnologias, notadamente na Internet, no domínio econômico e político, tem alterado de diferentes modos e em diferentes graus as dimensões sociais, intervindo no relacionamento entre os indivíduos, entre grupos representativos da sociedade e entre Estado e cidadão. As questões da era da Informação e do conhecimento estabeleceram novos desafios na forma com que as organizações se estruturam e gerenciam recursos. Ainda, a capacidade de acumular, difundir e utilizar o conhecimento e a informação de forma vasta e democrática é entendida como fator primordial para o sucesso das nações.
Diversos programas de governo foram criados, processos foram aprimorados e inúmeras tecnologias de gestão foram implementadas. Neste contexto, por exemplo, o uso intensivo das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) permite aplicabilidade e monitorização do processo de ensino-aprendizagem, de forma abrangente, assim como permite a utilização das tecnologias (Internet, extranet, intranet e outras) com o objetivo fim de disponibilizar para a sociedade melhores condições de acesso à informação e serviços governamentais, ampliando seus serviços e oferecendo oportunidades de participação da sociedade na construção da democracia.
Quanto ao processo de ensino-aprendizagem, foi criado em 2005 e oficializado em 2006 com o Decreto n. 5.800 – pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), por meio do Fórum das Estatais pela Educação (composto pela Universidade Virtual do Brasil e a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior), o Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), tendo como meta democratizar o ensino superior brasileiro, através do aprendizado pela internet, no chamado eLearning, com vistas a disseminar o conhecimento e proporcionar acesso a diversos municípios brasileiros.
Ao que concerne a utilização das tecnologias para a melhoria geral de serviços governamentais, embora centrada na ideia de governo eletrônico gerindo informações no setor público, este conjunto de ações ultrapassa essa dimensão. Em alguns casos, está vinculada à modernização da administração pública por meio do uso de tecnologias de informação e comunicação (TICs) e na melhoria da eficiência dos processos operacionais e administrativos dos governos (Agune e Carlos, 2005; Osborne, 1997). Em outros casos, está claramente associada ao uso de internet no setor público para prestação de serviços públicos eletrônicos (Ronaghan, 2002; Medeiros, 2004; Grant e Chau, 2005).
Ainda, sob a ótica de Schubert e Hausler (2001) pode-se entender governo eletrônico como a inclusão na missão governamental de criação de um quadro jurídico válido para o uso efetivo da mídia eletrônica em uma sociedade, bem como a aplicação nesses meios de comunicação para os contratos públicos, serviços para as empresas e os cidadãos e a gestão do mercado interno.
A partir de 2000, o Governo Brasileiro passou a difundir o Programa de Governo Eletrônico, com foco pautado em três vertentes: interação com o cidadão, gestão interna e integração com parceiros e fornecedores. O Programa é gerido pelo Comitê Executivo do Governo Eletrônico (CEGE) que passou a ter o objetivo de formular políticas para a área.
A carta de serviços ao cidadão, por exemplo, preconizado pelo programa GESPÚBLICA, é um exemplo da aplicação e evolução do conceito de e-government. A Carta de Serviços ao Cidadão é um método gerencial que contribui para que os órgãos e entidades públicos brasileiros atendam aos referenciais de excelência do Modelo de Excelência do Programa GESPÚBLICA. A Carta de Serviços ao Cidadão é o documento no qual o órgão ou a entidade pública estabelece o compromisso de observar padrões de qualidade, eficiência e eficácia na execução de suas atividades, perante os seus públicos alvos e a sociedade em geral, especialmente aquelas de prestação direta de serviços públicos.
Outras diversas aplicações nos órgãos públicos só puderam ser concretizadas com o auxílio das TICs. No caso das Universidades Federais, utiliza-se a tecnologia para otimizar os processos internos, controlar com maior eficiência a tanto a vida da comunidade acadêmica quanto dos servidores.
3. ENTRAVES A UM PLENO DESENVOLVIMENTO ORGANIZACIONAL
3.1 Simbolismo e poder na gestão pública?
Diversos aspectos negativos na história da humanidade associaram-se ao conceito do poder, ligados aos abusos e injustiças. No entanto, seu conceito e suas implicações são muito mais amplos. De acordo com a tradição, o poder é compreendido como algo que é desempenhado por um agente capaz de impor o seu anseio a outra pessoa, independentemente da sua concordância. Essa noção tradicional está necessariamente ligada à ideia de liberdade, ou melhor, de restrição da liberdade individual pela dominação de um indivíduo por outro.
Historicamente, a questão do poder surge principalmente na intenção de entender a “política”, termo criado na Grécia antiga originário da palavra “polis”, que significa cidade, que já naquela época apresentava desilusão com os seus políticos. Este conceito era objeto de estudo de Aristóteles, discípulo de Platão. Corroborando com esta ideia, o estudo de poder e das relações de poder, de acordo com Faria (2003), é, sem dúvida, um dos mais polêmicos e antigos das ciências humanas, uma vez que, pode ser encontrado já nos primeiros escritos dos filósofos Platão e Aristóteles (430 a 320 a.C).
Avançando na história do pensamento humano, Maquiavel procurou desmistificar o poder, criando as ciências políticas, demonstrando que o homem poderia exercê-lo. No seu discurso, focalizava o exercício e manutenção do poder e o movimento das pessoas no interior das redes de influência. Hobbes, centrou seus estudos no Poder Estatal - relatando o desejo incessante de poder e o conjunto dos meios que são empregados para obter uma aparente vantagem futura. Hume, por sua vez, centra-se na noção de regularidade e causalidade - destaca o poder como fator desencadeador /causal. Há um iniciador que detém o poder. Russel analisa a noção de intencionalidade, no qual o poder é a produção de efeitos intencionais envolvendo dois atores. Finalmente, fechando o ciclo do pensamento clássico sobre o assunto, Foucault descreve o poder como algo que atravessa todo o corpo social, permeando relações, produzindo coisas, induz ao prazer, e construindo uma prática discursiva que legitima as práticas sociais.
Ao que concerne às organizações, o poder é definido como a capacidade de conseguir que alguém faça algo que você quer que seja feito, ou a capacidade de fazer as coisas acontecerem do modo que você quer (Schermerhorn; Hunt; Osborn, 1999). Max Weber (1991, p.33) apresenta um clássico conceito de poder ao asseverar que: “poder significa toda probabilidade de impor a vontade numa relação social, mesmo contra resistências, seja qual for o fundamento dessa probabilidade” (WEBER, 1954).
Diversos modelos de relações de poder podem ser observados ao longo do tempo como o modelo de French e Raven (1959), o modelo de Galbraith (1986), o modelo de May (1986), o modelo de Krausz (1991), entre outros.
No sentido de organizações formais, observa-se a figura do poder institucionalizado, o qual pode ser substituído pelo poder personalizado ou jurídico. O poder institucionalizado, conforme Lapierre, existe quando "há uma estrutura organizada para cumprir a função social do poder e quando essa estrutura obedece a normas preestabelecidas, independente da vontade própria dos que exercem o poder". O poder institucionalizado preenche os fins do poder político, fins que só a ele pertencem e que não se confundem com os objetivos das diversas associações que os homens formam.
Quanto a relação de poder exercida, alguns autores defendem que o coronelismo se remodelou para um novo contexto social e se adaptou às reconfigurações sociais, econômicas, demográficas, culturais e tecnológicas dos nossos dias. Esse fenômeno continua impregnado nas relações entre as esferas de poder da administração pública e a sociedade, aparecendo, ainda nos dias de hoje, como uma ameaça ao processo de difusão da cidadania e, consequentemente, uma considerável ameaça à verdadeira democracia.
3.2 O fator político
Morgan (1996) propõe a metáfora das organizações vistas como Sistemas Políticos, para compreender a relação entre interesses, conflitos e poder. Para Morgan (1996), a política organizacional nasce quando as pessoas pensam diferentemente e querem agir também diferentemente. Por interesses, o mesmo autor entende ser um conjunto complexo de predisposições que envolvem objetivos, valores, desejos, expectativas e outras orientações e inclinações que levam a pessoa a agir em uma e não em outra direção. Os interesses podem ser concebidos em termos de três domínios interligados (Morgan, 1996): · interesses da tarefa: dizem respeito ao trabalho que alguém deve realizar; · interesses de carreira: são as aspirações e visões à cerca do futuro pessoal que os empregados carregam consigo; e · interesses extra-muro: consistem nas personalidades, atitudes pessoais, valores, preferências, crenças e conjuntos de comprometimento com a realidade externa. A multiplicidade de interesses gera múltiplos objetivos pessoais e grupais, o que torna complexa a definição de objetivos organizacionais.
Diante da multiplicidade de objetivos e das configurações internas de poder, surgem as coalizões. De acordo com Morgan (1996), o desenvolvimento da coalizão é uma estratégia para favorecer o interesse particular das pessoas e é uma maneira frequentemente utilizada pelos membros da organização para aumentar o seu poder e influência. Ainda segundo Morgan (1996), algumas vezes as coalizões são iniciadas por atores com menos poder que procuram o apoio dos outros; outras vezes podem ser implementadas pelos poderosos para manter seu poder. Independentemente de serem formais ou informais, restritas ao interior da organização ou expandidas para abranger interesses externos, as coalizões e os grupos de interesses frequentemente oferecem formas importantes para garantir os fins desejados (Morgan, 1996). Essa forma de entender os objetivos envolve a questão do poder, principalmente de como é distribuído entre os indivíduos e grupos da organização.
De acordo com Pfeffer (1981), a maioria das definições de poder incluem um elemento que indica que poder é a capacidade que um ator social tem de vencer resistência em obter um objetivo ou resultado desejado. Quando a organização está inserida na arena política, os interesses e objetivos, especialmente dos líderes políticos, ganha uma dimensão ainda mais significativa. Samper (1998) cita uma pesquisa realizada em municípios venezuelanos, cuja conclusão é de que a interferência partidária limita a capacidade de gestão da administração municipal. Os funcionários assumem a lealdade ao partido, mas não ao cargo, nem à instituição onde trabalham. Como observa Clegg (1990), o líder político está envolvido com a luta pelo poder, que é um de seus fins últimos. Na busca desse poder, o líder político tende a utilizar sua autoridade e a estrutura burocrática da organização, de forma que esta se constitua num instrumento em suas mãos. A contraposição ao poder político encontra-se no poder fundamentado no conhecimento técnico da burocracia, verificando-se uma situação de tensão entre o caráter técnico e impessoal da burocracia e os interesses dos dirigentes.
Weber (1982) observa que, às vezes, a política se contrapõe à eficiência burocrática. De acordo com esse autor, sob certas condições, a democracia cria rompimentos óbvios e bloqueios à organização burocrática (1982). Em outro momento, Weber (1982) vê o político na condição do diletante que se opõe ao perito, enfrentando o funcionário treinado que se coloca dentro da direção da administração. Ainda conforme Weber (1982), o processo de eleição popular do chefe administrativo e de seus subordinados normalmente pode pôr em risco o sistema de qualificação do funcionário, bem como o funcionamento do mecanismo burocrático. Desta forma, pode-se inferir que o personalismo, que é uma característica cultural que afeta a administração de organizações públicas e privadas nos países latinos em geral (Hickson e Pugh apud Vieira, 1997), é um traço importante na administração pública e tem efeito sobre o desempenho organizacional. Conforme observa Machado-da-Silva (1991), a burocracia ganhou relevância no Brasil inserida num contexto marcado pela tradição patrimonialista do país, especialmente no seu conceito de pessoalidade, que pode ser definido como a lealdade diretamente reportada à pessoa. Em vista dessa circunstância, é comum verificar-se nas organizações uma tensão entre a pressão burocrática pela impessoalidade e a pressão patrimonialista em direção à pessoalidade.
3.3 Burocracia no serviço público
Historicamente, a administração pública burocrática substituiu as formas patrimonialistas de gestão e ganhou importância em função da necessidade de maior previsibilidade e precisão no tratamento das questões organizacionais. O termo logo se difundiu, tendo sido, também, utilizado para atacar o formalismo e o espírito corporativo da administração pública, sobretudo (GIRGLIOLI, 1995).
Este conceito negativo de burocracia está enraizado nas organizações até os dias de hoje, e geralmente dá a idéia de ineficiência. Weber (1982) relata que a política se contrapõe à eficiência burocrática. De acordo com esse autor, sob certas condições, a democracia cria rompimentos óbvios e bloqueios à organização burocrática. O personalismo, por exemplo, é uma característica cultural que afeta a administração de organizações públicas e privadas nos países latinos em geral (Pugh e Hickson 2004, sendo um traço importante na administração pública e tem efeito sobre o desempenho organizacional.
Morgan (1996) propõe a metáfora das organizações vistas como Sistemas Políticos, para compreender a relação entre interesses, conflitos e poder. Para Morgan (1996), a política organizacional nasce quando as pessoas pensam diferentemente e querem agir também diferentemente. A multiplicidade de interesses gera múltiplos objetivos pessoais e grupais, o que torna complexa a definição de objetivos organizacionais.
Segundo Machado-da-Silva (1991), a burocracia ganhou relevância no Brasil inserida num contexto marcado pela tradição patrimonialista do país, especialmente no seu conceito de pessoalidade, que pode ser definido como a lealdade diretamente reportada à pessoa. Em vista dessa circunstância, é comum verificar-se nas organizações uma tensão entre a pressão burocrática pela impessoalidade e a pressão patrimonialista em direção à pessoalidade.
No serviço público, as relações entre o servidor e a própria organização são extremamente complexas e é difícil tecer um diagnóstico preciso sobre a função da burocracia. Ora, pode funcionar para que se evite que práticas erradas possam acontecer, por outro lado pode gerar entraves à eficiência organizacional. A idéia de imobilidade causada pela burocracia é presente nas organizações públicas, e sob esta ótica a administração pública reage de forma lenta e insatisfatória às mudanças econômicas e sociais que se processam à sua volta. Kliksberg (1994) compartilha desse ponto de vista, ao afirmar que a administração burocrática no serviço público, embora tenha sido criada para esse fim, não garante nem rapidez, nem boa qualidade, nem custo baixo para os serviços prestados ao público, sendo na verdade lenta, cara, auto referida, e pouco ou nada orientada para o atendimento das demandas dos cidadãos.
3.4 Cultura
Outra característica peculiar do setor público brasileiro é a sua cultura. Apesar da história da administração pública no Brasil ter menos de 500 anos, ela apresenta um modus operandi próprio (Carbone, 2000). Uma pesquisa realizada em secretarias de governo levantou práticas características de gerentes públicos, mostrando como o contexto sociocultural brasileiro condiciona a ação de ocupantes de posições de chefia (JUNQUILHO, 2004).
Entre as práticas, destacam-se: O sincretismo entre a pessoalidade e a impessoalidade – as amizades e a proximidade social, cultivada entre colegas de trabalho, podem ser utilizadas para facilitar o atingimento de objetivos e o cumprimento de tarefas por parte dos subordinados. Esta prática, contudo, dificulta a aplicação de regras formais. Cabe ao gerente ter a habilidade de conciliar o convívio informal com a legislação formal, atendendo conflitos entre interesses legais e pessoais; O comportamento centralizador – ao mesmo tempo em que age com afeto em relação aos subordinados, o gerente usa da hierarquia e da autoridade formal para agir com rigor em relação a um desafeto ou promover a centralização de informações ou decisões, dificultando uma configuração mais sistêmica e integrada. Sua liderança é construída por meio de um misto entre carisma e autoridade formal; A habilidade para contornar o “formalismo” – através de contatos informais ou utilização de procedimentos “criativos”; Aversão a controles formalizados – prática de não realizar avaliações formais de desempenhos individuais ou coletivos, ou seja, dificilmente são medidos metas e alcance de resultados. Existem outras características do setor público que exercem influência sobre programas de melhoria ou qualquer programa de mudança (MCadam e Donaghy, 1999). Entre elas, pode-se citar: Mudanças de direção política periódica, podendo ser drásticas; Interesses políticos, muitas vezes enfatizando mudanças de curto prazo; Sobreposição de iniciativas, muitas vezes criadas em períodos políticos diferentes. As evidências sugerem que, se não se considerar a estrutura, a burocracia, o ambiente político de organizações públicas e outras características específicas do setor, iniciativas de aperfeiçoamento podem vir a falhar. Há evidências, portanto, de que os modelos de aperfeiçoamento devam ser adaptados ao contexto do setor público.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A questão que deve ser respondida na gestão pública é: como se desvencilhar do emaranhado de normas e procedimentos que impedem o alcance de resultados? E ainda: como gerar e efetivar programas e ferramentas de eficiência no papel de aliados à gestão pública moderna?
No Brasil, para tentar dar um caráter eficiente à gestão pública foi criado o GESPÚBLICA. Esse guia é uma ferramenta de trabalho, a qual auxilia o alcance da eficiência nos processos dentro das instituições públicas. Foi elaborado com a finalidade de auxiliar as organizações em simplificar seus processos e normas, e com isso eliminar exigências de rotina que geram fluxos desconexos e não agregam valor ao serviço prestado à sociedade.
No entanto, um dos maiores desafios dos gestores públicos, atualmente tem sido o pensar e agir estratégicos. Igualmente, necessitam aprender com as práticas adotadas de forma a executar estratégias apropriadas que permitam vencer os atuais obstáculos que hoje desafiam essas organizações, de maneira a contribuir para que possam melhor cumprir sua importante missão. Este trabalho visou analisar como práticas conjuntas podem impactar a melhoria processual nas organizações.
É possível compreender também, que apesar de programas como o GESPÚBLICA serem um bom guia para a implementação de uma gestão eficiente, existem muitos entraves políticos, culturais e da própria criação e disseminação de ferramentas pelos gestores de modo a criar barreiras permanentes para as Instituições.
Através das diretrizes e dos pressupostos apresentados, sugere-se que, para que se possa dar um passo adiante, e que aos poucos sejam rompidas as amarras que fazem parte das práticas gerenciais das Instituições Públicas, é necessário o apoio incondicional de toda a comunidade envolvida, assim como da alta-administração, pois as questões políticas tendem a dominar o cenário público, fazendo com que as ferramentas modernas de gestão não atinjam o seu potencial.
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** Bacharel em Ciências Sociais e Jurídicas pela Universidade Federal de Santa Maria (2010). Mestranda em Gestão de Organizações Públicas. Atua na Pró-Reitoria de Planejamento da Universidade Federal de Santa Maria na área de Avaliação Institucional.
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