Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


GRAVIDEZ REINCIDENTE EM ADOLESCENTES: UMA REVISÃO TEÓRICA

Autores e infomación del artículo

Márcia Auxiliadora Fonseca*

Matilde Meire Miranda Cadete**

UEMG, Brasil

marciafonsecabio@hotmail.com

Resumo
Este artigo objetivou analisar, sob a ótica das adolescentes, as razões/motivações para a reincidência da gravidez na adolescência e de como percebem os cuidados recebidos no Hospital Júlia Kubitscheck (HJK) da cidade de Belo Horizonte (MG). A opção metodológica pela pesquisa qualitativa integrou 16 jovens assistidas neste Hospital. Em campo, os dados foram coletados por meio de questionário semiestruturado, posteriormente analisados com base em Bardin. Dos depoimentos emergiram algumas  categorias: “Sentir-se grávida novamente: razões, motivos para uma nova gravidez”; “Orientação sexual recebida na família e escola”; “Mudanças na e para a vida”; “O educar-se para trabalhar com as adolescentes”; “Reação do pai da criança à notícia da paternidade”;  A grande maioria das jovens diz que a carência de informações fornecidas pelas escolas e pelas famílias é um dos motivos da ocorrência de gravidez entre elas, além da lacuna concernente à orientação sexual pelos   meios de comunicação e nos espaços formais e não formais de educação, que contribuem para, o aumento do índice de gravidez na adolescência. É imperativo que as escolas, famílias e os meios de comunicação trabalhem conjuntamente em ações educativas que possibilitem aos adolescentes conhecimentos sobre a sua sexualidade e saúde reprodutiva de forma efetiva, crítica e com escolhas conscientes.

Palavras-chave: Educação, Adolescente, Gravidez, Reincidência, Desenvolvimento local.

Abstract
 This study aimed to analyze, from the perspective of teenagers, the reasons / motivations for the recurrence of teen pregnancy and how they perceive the care received at the hospital Julia Kubitschek ( HJK) from the city  Belo Horizonte MG. The methodological choice of qualitative research incorporated 16 young people attended this Hospital. In the field, the data were collected through semi-structured questionnaire, subsequently analyzed based on Bardin. The depositions very categories: "Feeling pregnant again, reasons, reasons for a new pregnancy"; "Sexual orientation received in the family and school"; "Changes in life and for life"; "The educating themselves to work with teens"; "The child's father's reaction to the news of paternity"; The vast majority of young people say that the lack of information provided by schools and families is one of the reasons for the occurrence of pregnancy among them, besides the gap concerning the orientation of the media and formal spaces and no formal tributam education, too of essential medium for increasing pregnancy rate in adolescence. It is imperative that schools, families and the media work together on educational activities that enable adolescents knowledge about their sexuality and reproductive health effectively, critical and conscious choices.
Keywords: Education, Teenager, Pregnancy, Relapse, Local development.

Resumen

En este artículo se pretende analizar, desde la perspectiva de los adolescentes, las razones / motivaciones para la recurrencia de embarazo en la adolescencia y cómo perciben la atención recibida en el Hospital Júlia Kubitschek (HJK) desde la ciudad de Belo Horizonte MG.  La opción metodológica para la investigación cualitativa incorporado 16 jóvenes asistieron a este hospital. En el campo, los datos fueron recolectados a través de cuestionario semiestructurado, a continuación, analizados a partir de Bardin. El testimonio surgido algunas categorías: "Sensación de nuevo embarazada, motivos, razones para un nuevo embarazo"; "La orientación sexual recibida en la familia y la escuela"; "Los cambios en la vida y para"; "El educarse para trabajar con los adolescentes"; "La reacción del padre del niño a la noticia de la paternidad"; La gran mayoría de los jóvenes dicen que la falta de información proporcionada por las escuelas y las familias es una de las razones de la ocurrencia del embarazo entre ellos, más allá de la laguna en relación con la orientación sexual en los medios y en los espacios formales y no formales de educación, contribuir al aumento de la tasa de embarazo en la adolescencia. Es imperativo que las escuelas, las familias y los medios de comunicación trabajan juntos en actividades educativas que permitan a las adolescentes el conocimiento acerca de su sexualidad y la salud reproductiva de manera eficaz, crítica y decisiones conscientes
Palabras clave : Educación, ,Adolescente, Embarazo - Recaída, Desarrollo local .



Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

Márcia Auxiliadora Fonseca y Matilde Meire Miranda Cadete (2016): “Gravidez reincidente em adolescentes: uma revisão teórica”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (abril-junio 2016). En línea: http://www.eumed.net/rev/cccss/2016/02/gravidez.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/CCCSS-2016-02-gravidez


Introdução

Nos dias atuais, a vida em sociedade, na maioria das vezes, se faz mediante um mundo de relações dinâmicas que se entrelaçam em contatos permanentes ou fugazes e em proposições cada vez mais complexas e, contraditoriamente, vazios de sentimentos duradouros e de afetos.
O ambiente social transpôs os muros do bairro, da cidade, do estado e do país. Entrar em contato com o outro, iniciar relacionamentos e trocar informações se faz de maneira ágil e instantânea. A tecnologia, cada vez mais potente, tomou conta do viver humano e, quiçá, da vida humana.
É nesse complexo mundo tecnológico, admirável, encantador e de extrema importância na socialização do conhecimento que se inscreve uma interrogação provocante e instigadora. Ainda, apesar da facilidade de se obter informações e de processá-las, o fenômeno reincidência de gravidez, na adolescência, é fato. Por que esse fenômeno é presente se há tantas informações veiculadas em meios impressos, falados e escritos? Quem (des)orienta/educa as adolescentes que se engravidam novamente? Que instituições se responsabilizam pela educação das crianças e adolescentes ou se corresponsabilizam: a família, a escola, a igreja, a comunidade, dentre outras? Como vivem essas adolescentes mães pela segunda ou terceira vez? Com quem residem ou dividem os ônus e os bônus da maternidade? São tantas interrogações!!!
Nesse contexto, uma questão emerge inquietante e que convoca a refletir a ir aonde o fenômeno ocorre para escutar, atentivamente, das próprias adolescentes: que razões e motivos as levam a se tornar mães novamente?
Afinal, o relatório da Situação da População Mundial, elaborado pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA, 2014), aponta que:

Nunca antes houve tantos jovens. É provável que nunca mais tenhamos tamanho potencial para o progresso econômico e social. A forma como atendemos as necessidades e aspirações desses jovens vai definir nosso futuro comum. A educação é fundamental. As habilidades e conhecimentos que as pessoas jovens adquirem devem ser relevantes para a economia atual e permitir que eles e elas se tornem inovadores, pensadores e solucionadores de problemas. Os investimentos em saúde, incluindo a saúde sexual e reprodutiva, também são fundamentais. Quando jovens conseguem fazer uma transição saudável da adolescência para a idade adulta, aumentam suas opções para o futuro (UNFPA, 2014, p. 2).

Esses dizeres convidam à reflexão: se a educação é fundamental para que crianças e adolescentes, neste caso em específico, sejam protagonistas da sua história e capazes de solucionar problemas conscientes e criticamente, que investimentos os profissionais da saúde e da educação estão disponibilizando a respeito da saúde sexual e reprodutiva? Estão em parceria com as famílias?
Em consonância com a exposição da UNFRA, torna-se basilar buscar informações acerca do que as adolescentes pensam a respeito da reincidência da gravidez, que ainda é um tema polêmico, e grande parte da sociedade tem uma visão míope sobre ele para encontrar alternativas/estratégias potencializadoras do desenvolvimento das adolescentes e da comunidade onde habitam.

As adolescentes reincidentes em gravidez precoce.

 A pesquisa aconteceu no, Hospital Julia Kubistchek (HJK) o mais antigo da região do Barreiro, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Foi inaugurado no dia 10 de setembro de 1960, pelo Presidente Juscelino Kubitschek. Inicialmente, foi designado para ser um quartel-general, mas um surto de tuberculose fez com que o Governo Federal, na regência do Presidente Juscelino Kubitschek, fizesse uma adaptação para atender os pacientes tuberculosos. A localização e a extensão de seu terreno se justificam pela importância que se atribuía, na época, à pureza do ar no tratamento da doença (FHEMIG, 2007).
A maternidade do HJK é referência estadual para gravidez de alto risco, com destaque para o atendimento de adolescentes grávidas. Também possui o projeto Mãe Canguru, em que o bebê prematuro fica em contato direto com o corpo da mãe durante um período do dia
Participaram do estudo 16 adolescentes que se dispuseram a falar espontaneamente de suas vidas. Como critério de inclusão definiu-se, a priori, que fossem adolescentes reincidentes na gravidez e consentissem ser partícipes, bem como autorizadas pelos seus responsáveis.
Lembrando Minayo (2010), a amostra não foi numérica, baseando-se na repetição e invariância dos discursos.
Os depoimentos das 16 jovens foram analisados a partir da técnica da análise de conteúdo proposta por Bardin (2010).

 Breve perfil dos sujeitos

A análise dos depoimentos se fez por meio de leituras atentivas com a intencionalidade de apreender sentidos e significados expressos e velados em cada um deles, por meio de um paralelo e diálogo entre o discurso dos 16 sujeitos da pesquisa e os apreços de diversos autores, bem como a visão da pesquisadora. No processo de leituras e releituras, construíram- se oito categorias temáticas.
Antes de especificar as categorias, serão apresentados os sujeitos deste estudo. A mestranda entrevistou 20 adolescentes, mas 4 não aceitaram gravar as entrevistas, sendo assim, essas 4 entrevistas não foram utilizadas, contabilizando 16 entrevistas. Das 16 adolescentes, 10 engravidaram, pela primeira vez, entre 13 e 15 anos. As outras 6 engravidaram pela segunda gravidez entre 16 e 18 anos. Nenhuma adolescente trabalhava e todas pararam de estudar. Todas elas cursavam o Ensino Fundamental II do Ensino Básico e somente uma chegou ao Ensino Médio.
Com relação aos pais das crianças, no que tange à ocupação profissional, são diversificados os setores do mercado do trabalho, tais como: operador de telemarketing, operador de caixa de supermercado, lava-jato, mecânico, montador de colchão, vendedor, cortador de roupas, montador de bomba de combustível, entre outras. Em relação à escolaridade dos mesmos, nenhum estuda e não chegou a completar o Ensino Fundamental II. Como afirma Oliveira et al. (2012, p. 565),

[...] estudos demonstraram que adolescentes instruídos são mais propensos a postergar a formação de família até o início da idade adulta, quando os riscos de uma gravidez são menores, e têm maior probabilidade de ter filhos mais saudáveis. A baixa escolaridade e baixa renda as tornam mais vulneráveis a uma gestação precoce, visto que a escola tem um papel preventivo importante, pois através dela são transmitidas informações sobre o corpo e também sobre métodos preventivos de gravidez.

A análise revelou que as idades entre as adolescentes e seus parceiros aproximam-se, fato que pode ser explicado pela circunvizinhança e compartilhamento dos mesmos espaços, tais como bailes, escolas, bares, músicas, instituições religiosas, dentre outros.
Ao ir-se ao encontro com as adolescentes para a coleta dos dados, percebeu-se que os companheiros estavam sempre presentes, mostrando interesse pelas adolescentes e o filho que acabava de chegar. Afirma-se que nenhum deles participou da entrevista.

Analisando as entrevistas

Inicia-se a construção desta seção com o depoimento de que a mestranda-pesquisadora perpetrou a desconstrução de um imaginário que foi criado, pensado, trabalhado a partir de algumas experiências em relação à reincidência da gravidez na adolescência. Havia a quase certeza de que a gravidez, nesse período da vida, era indesejada, não planejada; de que morariam sozinhas, abandonadas pelo parceiro; de que a vida, para elas, configurava-se como terrível, insuportável e inconcebível. Porém nada disso!
Segundo algumas das adolescentes entrevistadas, a primeira gravidez aconteceu, às vezes, por acaso. Mas algumas falas das jovens grávidas disseram que a segunda gravidez, foi planejada, a maioria das adolescentes está “casada” com o pai da segunda criança, e esse pai assume o primeiro filho, que, na maioria dos relatos, não é dele.
Lima e Correia (2015, p.158) afirmam que:

Quem estranharia ou lamentaria que uma mulher com menos de 20 anos de idade engravidasse, nas primeiras décadas do século XX ou no período colonial? Do mesmo modo que a juventude, como categoria social, é um fenômeno datado, configurado a partir de alguns acontecimentos históricos recentes e próprios das sociedades industriais ocidentais, a percepção da gravidez na adolescência como um problema é um dado histórico contemporâneo, relacionado a algumas condições de possibilidade específicas. Dentre elas, a conversão da maternidade numa atividade que exige preparação e orientação especializadas, como resultado de um investimento do movimento higienista, na passagem do século XIX para o século XX.

Retornando um pouco à história da sexualidade, na época do Brasil colônia, segundo Del Priore (2012), engravidar aos 14 anos era normal, e mulheres mais “velhas”, com 19 anos, eram ditas como “titias”. Grande parte das adolescentes se tornou mães aos 12 a 15 anos. Essa pouca idade trazia riscos fisiológicos para o bebê e para a mãe, pois havia imaturidade emocional que influenciava os relacionamentos: é um fato histórico reconhecido.
Casos de desajustes conjugais devido à pouca idade da esposa não foram raros e revelam os riscos por que passavam as mulheres que concebiam ainda adolescentes. Há casos de meninas que, casadas aos doze anos, manifestavam repugnância em consumar o matrimonio (DEL PRIORE, 2012, p. 44).

No mundo contemporâneo, com tantos avanços em todas as dimensões do viver humano, ao se conhecer uma jovem grávida aos 12, 13 anos de idade gera-se um estado de choque, ou impactos negativos, mas tempos atrás era “normal” as mulheres se casarem no início da adolescência.
Na visão de Oliveira et al. (2015, p. 16-22):

A gravidez na adolescência tem sérias implicações biológicas, familiares, emocionais e econômicas, além das jurídico-sociais, que atingem o indivíduo isoladamente e a sociedade como um todo, limitando ou mesmo adiando as possibilidades de desenvolvimento e engajamento dessas jovens na sociedade. Devido às repercussões sobre a mãe e sobre o concepto é considerada gestação de alto risco pela Organização Mundial da Saúde (OMS 1977, 1978), porém, atualmente postula-se que o risco seja mais social do que biológico.

Na busca de respostas e apreensão do porquê as adolescentes em tempos contemporâneos ainda engravidem de forma não planejada, mesmo com tantas informações vinculadas à mídia televisiva, internet, nas escolas, e outros meios de comunicação, faz-se necessário formular respostas a tais questões, a partir de informações coletadas das adolescentes com repetição em gravidez.

Sentir-se grávida novamente:  por que uma nova gravidez?

As unidades de registro que compõem essa categoria mostram que as adolescentes se sentem “normal” em relação a estar grávidas novamente, tendo em vista que grande parte delas estava esperando que a gravidez acontecesse pela segunda vez. Entretanto, algumas relataram que ficaram grávidas novamente porque houve um descuido.

Foi um descuido, não me cuidei direito (A1).
Levei um susto (A2)
Não foi fácil passei muito aperto, eu não queria foi descuido (A7).
Não imaginava que isso ia acontecer comigo, nem da primeira vez e nem da segunda vez (A8).
Falta de responsabilidade a gente sabe que é errado, mas arrisca (A9).
Fiquei chocada, só acreditei no final da gravidez (A10).
Nesses interditos, pode-se inferir que não era tão indesejado assim ficar grávida novamente. Levar um “susto” não significa o não querer, de fato, essa gravidez, e o “descuido” remete ao não pensar para agir, ao não envolver-se de forma suficiente com o que deve ser pensado antes de materializado. Infere-se negligência e a concretização do “pensamento mágico” do processo de adolescer “isso não acontece comigo, e sim com o outro.”
Contudo, outros depoimentos sugerem que a maioria das adolescentes aspirava ao segundo filho, que foi programado, não implicando uma gravidez (in)desejada. Ao contrário, a gravidez é fruto de uma união feliz e equilibrada. As adolescentes, inclusive, nomeiam seus parceiros como “maridos”, conforme se lê nas unidades de registro a seguir:

Ah! A gente esquece porque a gente vai crescendo. A primeira gravidez eu levei um susto, mas a segunda eu estava preparando um tempinho (A1).
Ah! Eu tinha programado (A3).
Me sinto normal, eu estava querendo (A6).
Ah! Isso de ficar grávida na minha família é normal (A5).
Falta de responsabilidade a gente sabe que é errado, mas arrisca (A9).
Os verbos “programar”, “preparar”, “arriscar” e “ficar” grávida reafirmam a intencionalidade da gravidez. “É normal ficar grávida na família.” É a representação do vivido na família, na comunidade no bairro. O que pensar diante dessa “naturalização” da gravidez na adolescência? Que ações planejar para mudar esse contexto? Ele precisa ser mudado ou é essa a nossa visão dos fatos? O nosso mundo está em contramão com o mundo dessas adolescentes?
Nesse sentido, pode-se dizer que a falta de informações que deveria vir das escolas e das famílias contribuem, tanto para o conhecimento das nuances de uma vida sexual quanto da vida reprodutiva. Para algumas adolescentes, a falta de maiores informações desencadeia falhas no uso de contraceptivos. Em relação às pílulas anticoncepcionais, há ainda muitas dúvidas no seu uso e o período certo para o intervalo entre cada cartela. O anticoncepcional certo para cada adolescente. Nesse contexto, destaca-se a fala de Oliveira et al. (2015, [s.p.]):

Muitas vezes o método contraceptivo pode estar disponível, mas o adolescente não sabe como usá-lo corretamente, apesar da grande variedade de informações, os jovens ainda têm dúvidas sobre o uso adequado e ideias equivocadas acerca dos métodos anticoncepcionais, como por exemplo, na colocação da camisinha e nas tomadas das pílulas, principalmente em relação ao intervalo entre as cartelas – muitas adolescentes se confundem e as iniciam erroneamente ou não respeitam o intervalo recomendado entre uma e outra cartela. O que levam aos adolescentes a utilização do coito interrompido, o qual apresenta um grau enorme de dificuldade, pois pressupõe controle da ejaculação, e, como nessa fase é comum a ocorrência de ejaculações precoces, torna-se complexa sua utilização.
Além do mais, em relação ao “pensamento mágico” do adolescente de que nada de  “mal” acontece com ele, independentemente das ações praticadas, ele se arrisca, inclusive, nas relações sexuais sem o uso de preservativo. Não vai engravidar-se e nem tampouco contrair alguma DST (doenças sexualmente transmissíveis).
Como grande parte dos adolescentes não gosta de usar camisinha, isso confere no número assustador de casos de AIDS e outras DST no Brasil e de gravidez reincidente na adolescência.
[...] Entretanto, o que tem sido mostrado é que a utilização de métodos contraceptivos não ocorre de forma adequada em razão de (o/a): própria negação do adolescente da possibilidade de engravidar; fato de os encontros sexuais serem casuais; o uso de métodos preventivos representarem assumir a vida sexual ativa e; pelo conhecimento inadequado relativo aos métodos (SOUSA; GOMES, 2009, p. 645).
Não há como negar que a atividade sexual inicia-se cada vez mais precocemente, o que se confirma pelas idades das “meninas mães” deste estudo. É sabido ser a adolescência uma fase de instabilidade emocional, hormonal, mudanças físicas, relações afetivas, sexuais e a busca de uma certa autonomia.
Ao serem questionadas sobre os motivos de nova gravidez, as adolescentes mostraram inconstância emocional, pois a maioria disse que levou um susto ao receber a notícia da maternidade, mas logo depois disseram que a gravidez foi programada. Isso mostra o desejo (in)consciente de estar grávida.

Orientação sexual recebida na família e na escola

Esta seção assinala o quanto são falhas ou ineficientes as orientações sobre a sexualidade: nem a família, nem a escola, as assumem. A maioria recebeu algum tipo de informação, mas não foram significativas para sua vida. Algumas relatam que as escolas tratam o assunto de forma superficial e o importante não é discutido de forma a sedimentar o conhecimento apreendido pelas adolescentes. Acredita-se que as jovens receberam algum tipo de informação das escolas e o restante aprendeu com amigas ou de forma autônoma.
De acordo Del Priore (2012, p.126) “[...] mais e mais jovens adquiriram seus conhecimentos de forma autônoma, pois sua curiosidade esbarrava no sigilo dos pais”, o que confirma os dizeres dos sujeitos deste estudo:

Sim, recebi orientação na escola, mas as professoras, parecem que não gostam de falar sobre o assunto, falam pouco (A1).
Sim, recebi orientações na escola, achei legal, mas não usei (risos). Na minha família não recebi, pois não tenho mãe e não ia conversar sobre isso com meu pai, minhas irmãs são mais novas do que eu (A2).
Não, só por alto, só escutando conversa atrás das portas. Na escola recebi orientações, mas só que nunca falou direitinho como são as coisas. Sempre falavam de forma superficial, nunca o que a gente precisa mesmo aprender (A3).
Em casa não recebi, sempre fui muito fechada. Mas na escola sim, um pouco as professoras, não gostavam de dar essa aula, os meninos ficavam rindo à toa, ela tinha que ficar brava para explicar (A4).
Dentre as várias lacunas existentes na educação, presencia-se que o enfoque sobre a sexualidade entre os adolescentes não é diferente. Ainda não é comum e generalizado o trabalho educativo, e preventivo do promotor de saúde, com base em ponderações assertivas, problematizando o saber e as dúvidas dos adolescentes e ampliando suas informações.
Retornando aos dizeres das adolescentes, percebe-se que a escola, de forma geral, não evoluiu no que tange ao seu papel de educadora em questões ligadas à sexualidade de seu alunado. Pelo menos, não se percebe a ocorrência de aprendizado e de transformações significativas na vida de seus alunos. Percebe-se essa ausência de conhecimento na temática sobre a sexualidade. Algumas adolescentes pronunciaram, neste estudo, que o assunto foi trabalhado na escola, mas não de forma significativa, e sim, superficial. A escola não está desempenhando o seu papel de ensinar, comunicar, como afirma Carbonell (2002, p. 16).

Ensinar adquire novos significados para relacionar-se com as novas tecnologias da comunicação, para ler e entender melhor a realidade e para assimilar, ao mesmo tempo, a rica tradição cultural herdada e muitas outras expressões culturais emergentes e mutáveis que, diga-se de passagem, continuam em boa medida ausentes da cultura oficial escolar.

Registra-se aqui que as adolescentes foram unânimes em falar que existe uma fragilidade nas informações sobre a temática “sexualidade” nas escolas e nas famílias.
Apreende-se, pelas falas e nas entrelinhas, que são necessários maiores investimentos para capacitar os profissionais da educação, da saúde e da família no tratamento de temas como sexualidade.
Quanto às famílias vulneráveis socialmente e com adolescentes mais “expostos”, é preciso criar estratégias que as envolvam e as tornem participantes ativas no processo educativo. Talvez essa participação possa vir das comunidades, dos encontros nos bairros e das igrejas. É respeitável ou desejável estabelecer relações de confiança entre os adolescentes e a família, criando um espaço de escuta para oportunizar crescimento para a família e para o adolescente, em que esse jovem possa dialogar, expor suas dúvidas, seus anseios, suas necessidades e criar um laço familiar.

Mudanças na e para a vida

Os discursos da maioria das adolescentes assinalam que tiveram a vida modificada pela nova situação – gravidez tão jovem; para outras, nada mudou, pois já não mais estudavam e cuidavam do primeiro filho e nem chegaram a ter oportunidade de trabalho. Destaca-se que a mudança a que se referem, basicamente, é relativa à primeira gravidez.

Mudou tudo, tive que parar de estudar, para cuidar do primeiro filho, agora vou cuidar de dois (A1).
Dá primeira vez mudou tudo, porque eu não estava com o pai da criança, mas agora de segunda vez foi planejada, ainda não mudou nada, porque esse bebe foi planejado (A3).
Mudou tudo, só fico tomando conta de crianças de casa e agora não consigo cuidar de mim (A5).
Mudou tudo, não faço mais nada a não ser cuidar de filhos. Nunca imaginei que isso ia acontecer comigo. Tinha planos de fazer faculdade, agora meu sonho foi adiado (A7)
Não mudou nada, continuo tendo minha vida como era antes (A8).
Ribeiro e Gualda (2011, p. 369-370) relatam que a mudança na vida advinda pela gestação na adolescência pode ser um acontecimento que traz satisfação e felicidade, apesar dos infortúnios. Que

[...] essa mudança que a gestação traz à adolescente mostra a autonomia que ela adquire quando se desenvolve como uma pessoa resiliente. Como mãe adolescente resiliente, se declara independente, responsável, segura e confiante no futuro.

Carvalho, Merighi e Jesus (2009, p. 20) assim se expressam:

Diante da parentalidade e de sua repetição os adolescentes vão elaborando as mudanças, realizando adaptações que acreditam ser necessárias e a partir do segundo nascimento não há grande estranhamento ou surpresa com o nascimento dos filhos.

De fato, as adolescentes mães falam com orgulho do cuidado dos filhos e da casa. Esquecem-se até do próprio cuidado, pois estão envolvidas no emaranhado mundo da criança pequena, que demanda atenção e cuidados 24 horas por dia. O plano de continuar os estudos foi adiado, mas não descartado. “Tinha planos de fazer faculdade, agora meu sonho foi adiado”, mas não o abandonou. Verifica-se que agora ela precisa redefinir sua identidade, reorganizar-se emocionalmente e de forma temporal, prorrogar seu sonho.
Sobre o foco de Oliveira et. al. (2015, p. 16-22) tem-se que

[...] a maternidade exige que a jovem redefina sua identidade levando em consideração o fato de que sua vida, da gravidez em diante, estará vinculada às demandas do filho. A projeção de si mesmo no futuro, elemento importante da construção da identidade na adolescência é substancialmente afetada no caso das adolescentes que engravidam onde precisam lidar com uma nova perspectiva temporal dada pelo desenrolar da gravidez e do próprio desenvolvimento do bebê após o nascimento.
Constatam-se, nas entrelinhas das falas, poucos sonhos, que elas não esperavam muito da vida, que a maternidade ia chegar mais cedo ou mais tarde. A maioria diz que não faria de novo, não pelos filhos, isso fica bem claro em suas falas, mas pela demanda que o nascimento de uma criança traz.
A precocidade das uniões conjugais pode contribuir para a perpetuação de desvantagem social, já que ao limitar-se ao papel de mãe e dona de casa, as adolescentes abandonam os estudos e possibilidades de qualificação profissional, prejuízo ao potencial produtivo desses jovens (SOUSA; GOMES, 2009, p. 648).

Detecta-se nas unidades de registro que há uma frequente afinidade entre gravidez e abandono dos estudos. O desamparo escolar pode trazer graves problemas socioeconômicos, uma vez que essas adolescentes entram mais tarde no mercado de trabalho. Com o mercado de trabalho cada vez mais competitivo, suas chances ficam comprometidas e cada vez mais se vê dependente do “marido” ou da família.

Reação do pai da criança à notícia da paternidade

As falas das adolescentes revelam a reação do pai da criança ao receberem a notícia da paternidade. Contraditoriamente ao imaginado pela mestranda, todas as adolescentes disseram que os pais de seus filhos ficaram muito felizes com a notícia da paternidade.
A visita ao hospital para conhecimento das adolescentes e o agendamento da coleta dos dados mostrou uma situação também nunca antes imaginada: a presença significativa do pai junto à mãe e ao bebê no HJK.
Vejam os fragmentos dos depoimentos:

Ele gostou sim, ele queria um filho dele, pois o primeiro ele assumiu, mas não é dele, mas ele considera como pai, e para mim e meu filho é mesmo (A2).
Ele ficou muito feliz (A3).
Normal, ele estava doido com um menino (A4).
Ficou feliz, eu e ele queríamos (A5).
Muito bem. Ele queria (A6).
Ele ficou muito feliz. Acompanhou até o final. Praticamente ficou grávido junto comigo (A9).

O estar “grávido” denota o querer do homem personificado no filho. E quem é pai é quem cuida, portanto, mesmo o primeiro filho não sendo fruto da relação com o atual companheiro, ele é filho de criação, de participação e de coração.
Todas as adolescentes acordaram com o bom envolvimento dos pais dos bebês. Ao questionamento de como os pais das crianças contribuíram com as despesas, todas desvelaram que colaboravam com tudo, assumindo o que fosse necessário. Para o espanto da mestranda, todas as adolescentes estavam morando com os “maridos”.
Talvez para um avanço na questão da reincidência de gravidez na adolescência, deva-se valorizar e entender os pais das crianças, pois na maioria das pesquisas eles são excluídos. Incluir dados dos pais da criança talvez possa trazer alguma “pista” para encontrar as respostas para essa falha na reincidência, pois nesta pesquisa os pais estavam sempre por perto.
Vale recordar o que diz o documento da UNFPA (2014, p. 2):

Nunca antes houve tantos jovens. É provável que nunca mais tenhamos tamanho potencial para o progresso econômico e social. A forma como atendemos as necessidades e aspirações desses jovens vai definir nosso futuro comum. A educação é fundamental. As habilidades e conhecimentos que as pessoas jovens adquirem devem ser relevantes para a economia atual e permitir que eles e elas se tornem inovadores, pensadores e solucionadores de problemas. Os investimentos em saúde, incluindo a saúde sexual e reprodutiva, também são fundamentais. Quando jovens conseguem fazer uma transição saudável da adolescência para a idade adulta, aumentam suas opções para o futuro.

 

Considerações finais

Muito se aprendeu da pesquisa e leitura do material bibliográfico identificado para este artigo. Contudo, a riqueza do aprendizado se fez muito mais perante as adolescentes, que descreveram seu mundo por meio de um corpo ainda em mudança pela idade e pela maternidade; pelos olhares brilhantes e orgulhosos de serem mães; pelo companheiro ao lado apoiando e pela família presente. Anexa-se a tudo isso o dizer de ser mãe adolescente e reincidente na gravidez.
Apesar dos vários programas do governo disponibilizados para os adolescentes objetivando ampará-los e orientá-los sobre a saúde sexual e a saúde reprodutiva, a gravidez é fato. É reincidente.
Percebeu-se que os programas do governo sobre saúde dos adolescentes são bem elaborados e abrangentes, mas quem os implanta e implementa, às vezes, não foi capacitado para tal.
Constatou-se que as ações delineadas devem ter como foco o adolescente ou a adolescente de acordo com suas expectativas, momentos vividos, angústias, desejos e grupos de amigos, invertendo a lógica posta e em vigor: deve-se horizontalizar o diálogo, tornar o adolescente sujeito ativo e ser facilitador de sua aprendizagem.
A análise das entrevistas mostrou que a maioria das adolescentes aspirava ao segundo filho, programando-o, desejando-o. Ao contrário do pensado anteriormente, a gravidez é fruto de união feliz e equilibrada. As adolescentes, inclusive, nomeiam seus parceiros como “maridos”.
Detecta-se que grande parte dos relatos dos sujeitos desta pesquisa revelou ser normal, natural, ficar grávida, ainda adolescente, na família. Pode-se dizer, ser a reprodução, o espelho refletido dos acontecimentos cotidianos vividos não apenas na família, mas também na comunidade.
Destaca-se, entretanto, que a maioria das adolescentes diz ter recebido algum tipo de informação sobre a sua saúde sexual na escola, mas que essas informações não foram suficientes para adquirirem novos significados para sua vida. Algumas jovens expuseram que as escolas tratam o assunto de forma superficial e o importante não é discutido de forma a tornar o conhecimento assimilado, o que as leva à procura de informações de amigas ou de forma individualizada, principalmente por meio da mídia.
No que diz respeito às famílias, é imperativo convidá-las a se integrarem às unidades de saúde ou às escolas, com vistas a que se envolvam e participem da vida integral de seus filhos, ou seja, criar espaços favoráveis a sua inserção no processo educativo. Talvez essa participação possa vir das comunidades, dos encontros nos bairros e das igrejas.
As adolescentes mães falaram com altivez do cuidado dos filhos e da casa. Gostam tanto do que fazem que se põem em último lugar no processo de cuidar de si. Citaram que os pais de seus filhos demonstraram felicidade com a notícia da paternidade e são envolvidos com os bebês; que de forma geral, contribuem com as despesas.
Esta pesquisa não se esgota aqui, porém ela contribuiu muito com alertas instigadores de ações a serem planejadas, programadas e concretizadas. Educar-se é permitir-se fazer escolhas conscientes.

Referências

BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2010.
CARBONELL, J. A aventura de inovar. A mudança na escola. Porto Alegre: Artmed, 2002. (Coleção Inovação Pedagógica)
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* Mestranda do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UMA.
** Orientadora e Professora Doutora do Programa de Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA.

Recibido: 13/05/2016 Aceptado: 25/05/2016 Publicado: Mayo de 2016

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