Samara Mirelly da Silva
PPGeog/UFSJ, Brasil
samaramirelly.silva@gmail.comRESUMO
Este texto contempla a categoria social Infância e a emergência de uma postura eticamente comprometida com o modo de fazer próprio das crianças também nas instituições escolares. Para isso, aborda-se em especial o ensino de Geografia, na perspectiva de estudo da Geografia da Infância. Esse campo de estudo concebe as crianças enquanto atores sociais, produtoras do espaço geográfico e dotadas de uma maneira particular de concebê-lo. Desta forma, buscamos com estudos bibliográficos relacioná-la com autores e saberes da Sociologia da Infância com vistas a fomentar novos olhares sobre as leituras das crianças de seus espaços de vivência. Assim, reconhece-se a participação efetiva das crianças na constituição da sociedade em geral e de suas cidadanias. Entende-se que ignorar esses saberes é também não respeitá-las. É não respeitar as pronúncias do mundo, de sujeitos que ocupam, constroem e ressignificam os espaços de maneira propositiva em relações inter e intrageracionais. E assim sendo, intervém e participam da construção do mundo, de seus lugares e paisagens.
Palavras-chave: Infância, Crianças, Espaço, Geografia, Escola.
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Samara Mirelly da Silva (2016): “Lugares e paisagens das crianças: suas leituras, suas vozes”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (abril-junio 2016). En línea: http://www.eumed.net/rev/cccss/2016/02/geografia.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/CCCSS-2016-02-geografia
As discussões realizadas neste texto debruçam-se sobre a singularidade e especificidades desses atores sociais igualmente importantes e que nas instituições escolares também são responsáveis pelo processo ensino/aprendizagem, ou seja, as crianças.
Destarte, na esfera do ensino de Geografia, a relação entre as crianças e suas produções simbólicas, nos ascendeu algumas indagações, como: Quais os espaços que as crianças ocupam e como estas os ressignificam a partir de suas próprias experiências? Esse modo particular de conceber os espaços pode ser contemplado no ensino de Geografia?
Nesse sentido, as reflexões aqui presentes, serão realizadas no âmbito da Geografia da Infância e sua afinidade com a Sociologia da Infância - um importante campo das ciências sociais contemporânea, em crescimento nas últimas décadas. Apresentamos também resultados de duas pesquisas internacionais que reafirmam o valor de se estudar a complexa relação entre as crianças e sua participação na (re) organização espacial.
Tendo em vista que as crianças são sujeitos de direitos, que possuem uma cultura (ou culturas) própria e assim, ressignificam, interpretam o mundo. Devendo, deste modo, serem tratadas enquanto seres em si e não um devir também nas instituições escolares, nas quais muitas vezes, predominam uma visão adultocêntrica e etapista de desenvolvimento.
Segundo Jader J. M. Lopes, a corrente de estudo denominada Geografia da Infância possui diferentes caminhos já trilhados. Um que compreende as crianças como condição estrutural presente nos dados demográficos; e outro que as entende enquanto agentes que transformam o espaço geográfico com suas ações e ocupações nos lugares, como por exemplo, a partir do brincar (LOPES, 2013, p.284). Nesse texto, em especial, abordaremos o segundo pressuposto apresentado, isto é, partiremos da perspectiva dos espaços ocupados, reorganizados não somente para as crianças, mas pelas crianças.
A Geografia da Infância é fortemente alimentada pela Geografia Humanista. Que por sua vez, considera as experiências, a objetividade e a subjetividade na constituição dos produtos do espaço geográfico, enquanto espaço da vida. E com isso, “busca a compreensão do contexto pelo qual a pessoa valoriza e organiza o seu espaço, o seu mundo, e nele se relaciona” (ROCHA, 2007, p.21).
Concomitantemente, os estudos sociológicos desenvolvidos no campo da infância nos últimos vinte anos, vêm postulando segundo Ângela Borba (2009) que as crianças “através das relações com seus pares e adultos, constroem, estruturam e sistematizam formas próprias de representação, interpretação e de ação sobre o mundo” (p.142).
A inter-relação entre sociedade e natureza, até mesmo o modo como a própria sociedade organiza seu espaço social, possui suas especificidades e constitui assim, diferentes paisagens, lugares, territórios.
Portanto, as crianças enquanto parte integrante da sociedade, estão vinculadas a esse processo de produção e organização espacial. E é nessa perspectiva que são estudadas neste artigo e pela Geografia da Infância, com vistas a entender as espacialidades que estas desenvolvem. Ou seja, compreender o ser e o estar da criança no espaço (LOPES, 2013).
A compreensão das pessoas sobre o meio ambiente em que habitam é um dos pilares da Geografia Humanista. Por conseguinte, a Geografia da Infância preocupa-se com essa dimensão subjetiva que as crianças carregam sobre o meio em que estão inseridas e atribuem significados.
Segundo Sarmento Pereira (2006, p.14), os desenhos das crianças são uma produção simbólica, enquanto atos simultaneamente sociais e individuais. Logo, são atos sociais onde se exprimem modos específicos de interpretação do mundo. Sendo também um procedimento de registro dos locais usado pela própria Geografia1 que adquire nesse campo, o status de forma de apreensão do mundo vivido, ou seja, aquele que adquire significados, sentimentos e é dotado de valor.
Pelo exposto, reflete-se sobre os lugares que, seletivamente podem compor as representações infantis. A técnica de produção e uso de mapas mentais é notória nos estudos da percepção ambiental e, consequentemente da Geografia Humanista. Isso porque os,
[...] mapas mentais (emocionais e cognitivos) que as pessoas fazem dos lugares que conhecem e dos locais em que vivem: a casa, o bairro e a cidade. O ‘método de loci’, como também é chamado, se refere à forma como os contextos espaciais e relacionais se entretecem na memória. (YATES, 1966 apud Christensen et al, 2014, p.703).
Os contextos espaciais se compõem na memória e, por vezes, são regados de afetividade. Os mapas mentais livres, ascendem o sentimento de pertencimento e identidade a partir dos vínculos afetivos que as pessoas, inclusive as crianças, estabelecem com os locais de vivência e convivência, lhes agregando valores subjetivos.
Concomitantemente, o conceito de lugar vincula-se às “referências pessoais e um sistema de valores que direcionam diferentes formas de perceber a paisagem e o espaço geográfico.” (PCN, 1997, p. 76). Sendo por sua vez, composto por paisagens, que são as formas vinculadas a historicidade destes. A percepção seletiva dos sentidos (tato, paladar, olfato e visão) das paisagens que compõem os lugares, assume diferentes significados de acordo com o “modo de olhar” ou visão de mundo, particular de cada sujeito (CABRAL, 2000).
A paisagem, conforme Cabral (2000) se pensada como mediação entre o mundo das coisas e aquele da subjetividade humana, faz com que “ao inventariar e decodificar os significados das paisagens à nossa volta estamos refletindo sobre nossos próprios papéis para reprodução cultural” (p. 43). Destarte, para o autor, o conceito de paisagem harmoniza-se como campo da visibilidade e também de significação individual e sociocultural.
Assim, a fenomenologia surge como aporte da corrente humanista do pensamento geográfico, que tem no mundo vivido um de seus conceitos chaves. Uma vez que entende o mundo como,
[...] o contexto dentro do qual a consciência é revelada. Não é um mero mundo de fatos e negócios... mas um mundo de valores, de bens, um mundo prático. Está ancorado num passado e direcionado para um futuro; é um horizonte compartilhado, embora cada indivíduo possa construí-lo de um modo singularmente pessoal. (BUTTIMER apud ROCHA, 2007).
Considera-se que a maneira como as crianças ressignificam o mundo, atribuindo-lhes valores e significados próprios a partir de suas vivências e experimentações é de suma importância. Pois oportuniza o despertar de suas consciências para as participações na constituição destes espaços. Ou seja, elas não somente estão inseridas no meio ambiente, mas são atores efetivos na sua (re) construção.
Para Castrogiovanni, o espaço é “conjunto de objetos e ações que revela as práticas sociais dos diferentes grupos que vivem num determinado lugar, interagem, sonham, produzem, lutam e o (re)constroem” (2009, p.7). No caso das crianças, onde elas moram, estudam, brincam, e por vezes, trabalham e são vítimas de uma série de violências e situações opressivas... “O espaço, por conseguinte, é isto: um conjunto de formas contendo cada qual frações da sociedade em movimento” (SANTOS, 1988).
Lopes (2013) afirma que sendo a infância uma construção social, são concepções sistematizadas em diferentes sociedades, portanto, apresenta uma dimensão plural. O que permitiria, segundo o autor, falar em diferentes infâncias a partir destas caracterizações. Consequentemente, as crianças influenciam e são influenciadas a partir do contato e interação com o meio histórico-social no qual estão inseridas.
Assim, para o entendimento da categoria social Infância – enquanto “fenômeno social” apontada por Jens Qvortrup (1993)2 , se deve considerar a influência sofrida e exercida pelas crianças na sociedade. Conforme apontou o sociólogo dinamarquês, as forças sociais que afetam os adultos, também as comprometem, embora de modo particular e podendo variar de acordo com a cultura na qual estão inseridas.
Esses “eventos sociais mais amplos”, com efeitos constantes impactam diretamente ou de forma mediada a vida das crianças e reafirmam, segundo o sociólogo, a importância de trazer o contexto estrutural da infância para análise.
Nessa perspectiva, Pia Christensen et al (2014), afim de analisar os padrões da mobilidade diária das crianças no âmbito de seus contextos sociais, materiais e culturais realizou um estudo na Dinamarca que contou com a participação de crianças que viviam em um subúrbio perto de Copenhagen, e outras que moravam em uma área rural na parte nordeste do país. Quarenta crianças com idades entre dez e treze anos e vinte e nove famílias participaram da pesquisa3 . Os resultados revelaram que diferenças geográficas como a comparação entre área rural/suburbana, culturas de coesão social dentro das famílias e os padrões de emprego dos pais são significativos para se compreender como acontecia a mobilidade das crianças.
Christensen et al (2014) reafirma assim, uma das teses de Qvortrup (1993, p.205-206) que as crianças interagem estruturalmente com os outros setores da sociedade, ocupam espaço na divisão do trabalho e sua presença influencia fortemente os planos do mundo social e econômico em contatos intra e inter geracional.
Sarmento; Pinto (1997) chamam a atenção para o fato de apesar da adesão de quase todos os países à Convenção dos Direitos das Crianças (ONU, 1989), esta não foi suficiente para melhorar a situação delas em todas as regiões do mundo. Pois ainda são o grupo etário onde há mais marcados indicadores de pobreza, situações de opressão e violência. Sendo vítimas dos conflitos contemporâneos, prostituição infantil, trabalho infantil, etc (ibidem, p. 12). Desta forma, os autores alertam para o “paradoxo da visibilidade contemporânea da Infância”, em que há uma extrema complexidade social e heterogeneidade das condições de vida das crianças. Isso posto, concluem que a realidade social não se transforma por efeito simples da publicação de normas jurídicas. É necessário tocar na estrutura social, nas variáveis econômicas, sociais e culturais.
Bem como,
[...] não é apenas errôneo, como pode ser perverso, o centramento dos direitos da criança na proteção e (mesmo) na provisão de meios essenciais de crescimento, sem que se reconheça às crianças o estatuto de atores sociais e se lhes atribua de fato o direito à participação social e à partilha da decisão nos seus mundos de vida. (SARMENTO; PINTO, 1997, p. 20).
O estatuto de atores sociais e direito à participação nas decisões referentes a seus mundos de vida destacado acima por Sarmento; Pinto (1997), reforça a importância das crianças nos processos de gerência e decisão. E como temos buscado sublinhar neste texto, o reconhecimento das crianças enquanto atores sociais, também pressupõe reconhecê-las como (re) construtoras dos lugares, das paisagens e de seus espaços. Respeitada, porém, a maneira particular de concebê-los.
Ao realçar que a complexa interação entre jovens e o espaço é perpassada por inclinações emocionais, que impulsionam outras ações e transformações, Stuart Aitken (2014, p.677) coloca duas questões que julgamos centrais neste estudo: o quê, exatamente, significa espaço e quem, precisamente, são os jovens? Pautado nos direitos e ativismo destes, o autor sugere outras formas de repensá-los, bem como suas participações/presenças no espaço urbano e na política, no que ele chamou de “do apagamento à revolução” ao destacar o movimento dos Izbrisani (os Apagados)na Eslovênia e a Revolución de los Pingüinos no Chile.
Vale ressaltar que em seu texto, o autor coloca ambos (crianças e jovens) Izbrisani como grupos excluídos dos espaços públicos, socialmente oprimidos e desapoderados de desempenhar um papel na política de (re) produção espacial.
Mas seriam quaisquer jovens “apagados” do protagonismo nos espaços urbanos? Quem são esses jovens que por temerem represálias e retaliações desapareceram das cidades eslovenas, mas que ainda desaparecem das escolas, hospitais e outros espaços públicos em diferentes regiões do mundo? Não seriam estes também marginalizados no contexto do sistema capitalista? Afinal,
[...] o ‘ser criança’ varia entre sociedades, culturas e comunidades, pode variar no interior da fratria de uma mesma família e varia de acordo com a estratificação social. Do mesmo modo, varia com a duração histórica e com a definição institucional da infância dominante em cada época. (SARMENTO; PINTO, 1997, p. 17).
Desta feita, é fundamental o quando (em qual época se é criança), e também o onde se é. Uma vez que o background familiar, seria basilar para a garantia dos direitos de proteção e provisão (que como já destacado, não são suficientes se não preservado o direito à participação). Assim, este onde se refere não só à localização geográfica, mas também sua colocação (e de sua família) na estratificação de classes sociais.
É também uma questão moral, se se pode defender que o direito à provisão é bastante variável, a depender do background familiar. Nas sociedades orientadas para o consumo, isso é contraditório, e pode somente acontecer porque crianças (a) são consideradas fora das sociedades utilitárias como não consumidoras e (b) são consideradas como propriedade dos pais e, portanto, dependentes do consumo destes. (QVORTRUP, 1993, p.206).
Contudo, foi na condição de sujeitos de direitos, de atores sociais que os Izbrisani pautaram suas lutas. Na não aceitação de serem transformados em apátridas por decretos, e assim, desaparecerem das ruas e ditos, espaços públicos das cidades eslovenas. Não aceitando também, a demissão da vida política restando-lhes apenas a vida biológica ou vida nua, que compreende um sério conjunto de privações em uma época de formação. “As consequências emocionais dessas privações se apresentam nas ações dos adolescentes, como delinquência, mau comportamento e mesmo suicídio, resultando em enormes consequências para as famílias e para as comunidades” (AKTIN, 2014, p.681).
O caso dos Izbrisani nos mostra como o direito à participação na (re) construção do espaço geográfico e a ideia de pertencimento a um lugar são inerentes ao sujeito, quem em muitos casos, tem até mesmo sua condição de cidadão extorquida.
Portanto, vale ressaltar que os estudos da Geografia da Infância emergem com interfaces nos postulados do espaço vivido e no reconhecimento da objetividade e subjetividade na constituição do sujeito e sua consequente visão de mundo, mas também;
[...] por onde se entrecruzam outros recortes, como o de gênero, o de idade e condição econômica, perguntam-se como meninos e meninas, de diferentes idades e pertencentes a diferentes estratos sociais concebem, percebem e representam seus espaços. (LOPES, 2013, p.289).
Entende-se assim, a pertinente relação da Geografia da Infância com este novo enfoque dado pela Sociologia ao passo que “seu ponto de partida foi uma tentativa de romper com as visões tradicionais e biologizantes de criança” (BORBA, 2009, p.141). Visto que a Sociologia da Infância “busca revelar a criança na sua positividade, como ser ativo, situado no tempo e no espaço, nem cópia nem o oposto do adulto, mas sujeito participante, ator e autor na sua relação consigo mesmo, com os outros e com o mundo” (ibidem).
De acordo com Qvortrup (1993), as crianças são co-construtoras da infância, da sociedade e do mundo. Pois interagem e se comunicam, envolvendo-se em ações propositivas com a natureza e com outras pessoas (adultos e seus pares). Portanto, contribuem assim, quer para a formação da sociedade quer para a formação da categoria Infância (permanente, embora variável histórica e intercultural).
O grande educador pernambucano, Paulo Freire, nos diz que “(...) toda compreensão de algo, corresponde cedo ou tarde, a uma ação. (...) A natureza da ação corresponde à natureza da compreensão” (FREIRE, 2014, p.138). Em outro momento, o autor afirma “A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa prescindir de continuidade da leitura daquele. Linguagem e realidade se prendem dinamicamente” (FREIRE, 1989, p.9). No ensino de Geografia, essa leitura do mundo relaciona-se diretamente com reconhecimento do lugar, da paisagem, do contexto social em que se encontram educadores e educandos.
Consequentemente, uma vez que as crianças são coprodutoras de espaços e tempos sociais, evidencia-se a importância de se considerar o espaço vivido por elas nas aulas de Geografia, sobretudo, nos AIEF a partir de suas próprias representações e visões de mundo. Com vistas à promoção de uma educação voltada para a formação de sujeitos autônomos, conscientes, críticos e reflexivos, capazes de ler as palavras, mas também o mundo. E assim, serem introduzidas, cada vez mais, nos processos de participação e gerência destes espaços. Conforme Callai,
Essa capacidade de interlocução (de saber ouvir, falar, observar, analisar, compreender) pode ser desenvolvida desde a educação infantil, e tornar-se assim um método de estudo – de fazer a leitura do mundo. Ao partir da vivência concreta, busca-se a ampliação do espaço da criança com a aprendizagem da leitura desses espaços e, como recurso, desenvolve-se a capacidade de “aprender a pensar o espaço”, desenvolvendo raciocínios geográficos, incorporando habilidades e construindo conceitos. (2005, p. 235).
A capacidade de “pensar o espaço” a partir da leitura que dele fazemos, se torna preponderante ao ensino crítico que verse para a cidadania. No entendimento e enfrentamento aos problemas e questões postas a vida individual e enquanto, pertencente a uma coletividade.
A intercessão da Geografia escolar com o espaço cotidiano dos alunos nos primeiros anos do Ensino Fundamental por meio da observação, descrição e análise, pode levar as crianças a identificarem nas paisagens que lhes são familiares, elementos da natureza e culturais. Sendo a paisagem cultural (humanizada ou geográfica), resultado da apropriação da natureza pela ação humana, através de seu trabalho e cultura.
Assim, “Ler o mundo da vida, ler o espaço e compreender as paisagens que vemos como resultado da vida em sociedade, dos homens na busca da sua sobrevivência e na satisfação de suas necessidades. Em linhas gerais, esse é o papel da Geografia escolar” (ibidem, p. 228-229). Isto em uma educação preocupada com a promoção da criticização dos sujeitos e do despertar de suas consciências enquanto atores sociais produtores de cultura e participantes ativos da construção de suas realidades.
Assim sendo, os professores juntamente com os seus alunos devem buscar a aprendizagem significativa por intermédio da interlocução do conhecimento geográfico com o lugar em que vivem, sobrepondo-o, intercalando-o com outras escalas geográficas de análise como a nacional e a global. Afinal, nenhum lugar se explica por si só, ele contém e está contido em contextos mais amplos.
Portanto, para o ensino de Geografia mesmo nos AIEF, os professores devem;
(...) fazer escolhas ou opções que elevem os alunos a patamares superiores do ponto de vista da abstração e da consciência sobre a importância do conhecimento do espaço geográfico para sua vida como ser humano e como cidadão participante deste mundo complexo. (PONTUSCHKA et al, 2007, p. 77).
Pois destacadamente é “(...) partindo do lugar, considerando a realidade concreta do espaço vivido. É no cotidiano da própria vivência que as coisas vão acontecendo e, assim, configurando o espaço, dando feição ao lugar” (CALLAI, 2005). Logo, cabe aos educadores “procurar desenvolver nos alunos uma atitude de agentes responsáveis pela construção de ambientes, mas como atuantes, cada um a seu modo, nessa construção” (CAVALCANTI, 2002, p. 43).
Com efeito, ouvir as leituras do mundo vivido das crianças é um começo fundamental para a necessária superação/produção de saberes. Pois é no lugar, enquanto construção histórica e social, que o espaço geográfico guarda o movimento da vida (CARLOS, 2007), da nossa vida.
Considera-se que a maneira como as crianças ressignificam os tempos e espaços que frequentam, atribuindo-lhes valores e significados próprios a partir de suas vivências e experimentações pode e deve servir de suporte para o ensino sistemático de Geografia nas instituições escolares.
Consequentemente, uma maneira de fazê-lo nos AIEF, é usar do desenho e/ou representações de mapas mentais que são emocionais e cognitivos. Esses procedimentos, adquirem na corrente humanista do pensamento geográfico o status de forma de apreensão e comunicação do mundo vivido, enquanto possibilidade de expressão da leitura que os educandos fazem do meio ambiente que não só estão inseridos, mas contribuem para sua (re) construção.
Para isso, torna-se essencial a mediação docente cuja opção político pedagógica deve ser pela conscientização crítica comprometida com o processo permanente de libertação e com a vocação histórica e ontológica de Ser Mais dos homens, conforme preconizado por Freire.
Portanto, parte-se da premissa que ignorar esse saber da qual as crianças são dotadas de seu próprio meio, é também não respeitá-las. É não respeitar suas pronúncias de mundo. Enquanto atores sociais ativos na sociedade e que ocupam, constroem e ressignificam os seus espaços de maneira propositiva em relações inter e intrageracionais. E assim sendo, intervém e participam da construção do mundo, de seus lugares e paisagens.
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PONTUSCHKA, Nídia Nacib.; PAGANELLI, Tomoko Iyda.; CACETE, Núria Hanglei. Para ensinar e aprender Geografia. 1ª Ed – São Paulo: Cortez Editora, 2007.
QVORTRUP, Jens. Nove teses sobre a “infância como um fenômeno social” (1993). Trad. Maria Letícia Nascimento. Pró-Posições, Campinas, v.22, n.1 (64), p.199-211. jan./abr.2011.
2 O dinamarquês Jens Qvortrup é considerado um dos fundadores da Sociologia da Infância. Ao ser responsável pela constituição do primeiro grupo de pesquisa no campo (RC53) na Associação Internacional de Sociologia (ISA) e pensar a infância como fenômeno social.
3 O estudo que combinou diferentes metodologias, como a pesquisa etnográfica, o uso da tecnologia de GPS (Global Positioning System) e um questionário interativo via telefone celular.
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