Revista: CCCSS Contribuciones a las Ciencias Sociales
ISSN: 1988-7833


A TERCEIRA MULHER SOMOS NÓS? UMA ANÁLISE SOBRE A IDENTIDADE DA MULHER CONTEMPORÂNEA*

Autores e infomación del artículo

Francielli Rubia Poltronieri

Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Brasil

franciellirubia@hotmail.com

Resumo: Este texto propõem desenvolver reflexões analisando como a construção das identidades de gênero feminino estão sendo produzidas ou reproduzidas, negadas ou ressignificadas na sociedade contemporânea, destacando o que caracteriza a feminilidade na pós-modernidade e, demonstrando que o estudo de gênero não é sinônimo do estudo da  história das mulheres, pois as masculinidades existentes são construtos culturais, que influenciam o comportamento e a história femininos, portanto, importantes objetos de análise e reflexão. O problema central deste estudo está em analisar a identidade da mulher contemporânea, respondendo a questão que dá título ao texto. Tratou-se de pesquisa bibliográfica, partindo da prática interdisciplinar compreendida na produção do conhecimento na pós-modernidade e percorrendo uma abordagem qualitativa da pesquisa.  Através de uma investigação com base nas abordagens descritivas do conceito de gênero, ressaltando os pontos pertinentes ao assunto abordados por Joan Scott (1995)1 , Gilles Lipovetsky (2000) 2 e Alain Touraine (2010) 3.

Palavras-chave: Feminilidade, Gênero, Identidade, Pós-modernidade, Terceira mulher.

1 Nascida em 1941 no Brooklyn, subúrbio de Nova York (Estados Unidos), historiadora  cujo trabalho, inicialmente foi dedicado à história francesa (movimento operário e história intelectual) foi direcionado na década de 1980 para a história das mulheres a partir da perspectiva de gênero, conceito criado pela própria autora.

2 Nascido em 1944 em Millau, sul da França; sociólogo e filósofo francês, professor de Filosofia na Universidade de Genoble (França) é um dos mais influentes pensadores atuais, teórico da Hipermodernidade, investigou o luxo, a beleza, os homens e as mulheres, o capitalismo e as artes dentro de uma vasta obra literária já publicada.

3 Nascido em 1925 em Hermanville-sur-Mer, França; um dos principais sociólogos da atualidade;  conhecido por sua obra dedicada à sociologia do trabalho e dos movimentos sociais, tornou-se conhecido pela primeira utilização da expressão "sociedade pós-industrial", faz parte de uma linha teórica pós-moderna, entretanto critica a mesma em alguns pontos e assume todas as teses dessa vertente teórico-metodológica.



Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

Francielli Rubia Poltronieri (2016): “A terceira mulher somos nós? Uma análise sobre a identidade da mulher contemporânea”, Revista Contribuciones a las Ciencias Sociales, (enero-marzo 2016). En línea: http://www.eumed.net/rev/cccss/2016/01/feminilidade.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/CCCSS-2016-01-feminilidade


Introdução  

            O presente artigo surgiu como fruto das discussões realizadas durante a disciplina Gênero, sociedade e contemporaneidade: abordagens interdisciplinares, do programa de Mestrado e Doutorado Interdisciplinar em Sociedade, Cultura e Fronteiras, discussões que aguçaram muito mais minhas inquietações enquanto mulher que conduz sua vida profissional, acadêmica e de mãe solteira; nesse momento é importante ressaltar que, quando se fala em mãe solteira na sociedade ocidental há “mães solteiras por opção” (Szapiro e Feres-Carneiro, 2002) e “mães solteiras por gravidez indesejada” (Zapiain, 1996); além da classificação que foi realizada por Lagenest (1990) resumida da seguinte forma: a) mulher solteira que adota um filho; b) mulher que quis ter um filho sem casar; c) mulher que se tornou mãe por ter sido violentada; e d) mulher que se tornou mãe por não ter tido precauções junto ao companheiro. A presente referência se dá em relação à minha realidade em particular, pois sou uma mulher que não mantém uma relação estável e que, desde o início da gestação, assumiu a responsabilidade de ter um filho/a sem a presença do pai biológico ou de alguém que o substituísse. Nesse sentido, na sociedade atual – eu enquanto mulher e muitas outras – não sabemos, exatamente, onde devemos estar, por isso a questão que dá título a este texto, que tem como objetivo analisar como a construção das identidades de gênero feminino estão sendo produzidas ou reproduzidas, negadas ou ressignificadas na sociedade contemporânea. Destaca-se o que caracteriza a feminilidade nesse período que  vários autores, entre eles Michel Maffesoli (1997), reconhecem como pós-modernidade e, além disso, demonstra que estudar gênero não é sinônimo de estudar a  história das mulheres, pois as masculinidades existentes são construtos culturais, que influenciam o comportamento e a história femininos e, portanto, importantes objetos de análise e reflexão.
            Esta investigação tem como base uma abordagem, inicialmente, descritiva através de revisão bibliográfica do conceito de gênero, de modo a ressaltar os pontos pertinentes ao assunto abordado pelos autores Joan Scott (1995), Gilles Lipovetsky (2000) e Alain Touraine (2010), a partir dessas discussões, este estudo propõem analisar, se, nós mulheres da sociedade atual, somos a terceira mulher de Lipovetsky, se somos aquelas mulheres indeterminadas pela ótica masculina, mas determinadas por nossas próprias escolhas, ou seja, se somos as mulheres autodeterminadas. O  texto desenvolve-se a partir de uma breve contextualização do cenário modernidade/pós-modernidade, desenvolvendo reflexões sobre como a contrução das identidades de gênero feminino estão sendo produzidas ou reproduzidas, negadas ou ressignificadas na sociedade contemporânea, visualizando a fragmentação e o imediatismo e, destacando o que caracteriza a feminilidade neste último período. Em seguida, discorrendo sobre a construção da identidade das mulheres, enquanto registros e expressões dinâmicas nas relações e grupos sociais dos quais fazem parte, finalmente demonstrando que estudar a gênero, não é sinômino do estudo da história das mulheres, pois as masculinidades existentes são construtos culturais, que influenciam o comportamento e a história femininos e, portanto, importantes objetos de análise e reflexão.
            Para o desenvolvimento do artigo, optou-se por uma prática interdisciplinar; pois, como afirma Frigotto “a necessidade da interdisciplinaridade na produção do conhecimento funda-se no caráter dialético da realidade social” (Frigotto, 2008, In. Ideação p. 43) e por uma pesquisa metodológica qualitativa, investigando e buscando o aprofundamento da questão entende-se que a pesquisa qualitativa tem uma preocupação com um nível de realidade que não pode ser quantificado e  “trabalha com o universo de significados, motivos aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis” (MINAYO 1994, p. 21-22).

 Modernidade e Pós-modernidade

            Segundo Smart (1993) “a ideia da pós-modernidade indica uma modificação ou mudança nas formas como experimentamos e nos relacionamos com o pensamento moderno, as condições modernas e as formas de vida modernas” (SMART, 1993, p. 46).
            O período, ou ainda, segundo Gadea (2007) “o fenômeno” pós-moderno é aquele posterior à modernidade, onde rompe-se com modelos clássicos e com o modo de ser desse período, consequentemente, há uma transformação na forma como o mundo é visto, a sociedade afasta-se da noção de centro enquanto: homem, heterossexual e branco, pertencente a classe média urbana e a visão volta-se para as margens da sociedade, mulheres, negros, minorias sexuais e étnicas. Há uma mudança na estrutura familiar, nas relações de trabalho e na divisão social em classes. “A pós-modernidade acarreta consigo, um questionar da razão e da ordem, e permite abrir um espaço de pensamento e de relação com o mundo, que poderá  alterar muitas noções, e particular, a de “feminino” e de “masculino”” (NOGUEIRA, 1996, p. 180). O que para alguns poderia representar uma simples ideologia ou moda intelectual gerada no (e para o) “primeiro mundo”, para outros o termo pós-modernidade se definiria como uma “nova sensibilidade, como novas formas de pensar, de compreender e atuar no mundo” (GADEA, 2010, p. 267).
            Nesse sentido, enquanto a modernidade era sólida, amparada em hierarquias e regras, separada por barreiras e fronteiras a pós-modernidade é fluída e descentralizada, não existem essas barreiras ou fronteiras. Partindo desse entendimento de pós-modernidade, enquanto uma sensibilidade contemporânea, é que se problematiza a construção da identidade da pós-mulher; a mulher que se constrói perante uma uma saturação das premissas, ditas, pertencentes às mulheres anteriores à ela.

 A construção de gênero e da  identidade feminina

            A construção da identidade feminina na pós-modernidade perpassa pelas análises e constribuições da inserção da categoria gênero, enquanto categoria de análise histórica, pois o conhecimento histórico, segundo Joan Scott (1995) é parte da política do sistema de gênero. Portanto, aborda-se, inicialmente, neste texto, as contribuições da autora no âmbito da problematização da concepção de gênero como categoria de análise.
            A referida autora constrói sua abordagem de gênero inspirada nas constribuições de Michel Foucaul e Jacques Derrida; para tanto, destaca três formas problemáticas, que historicamente, abordaram gênero: a primeira destaca o esforço do movimento feminista buscando explicar o gênero a partir das origens do patriarcado; Scott (1995) elabora críticas a essa abordagem, pautadas em algumas premissas:nesse tipo de abordagem a subordinação da mulher estaria associada às necessidades naturais masculinas de dominação em relação as mulheres; segundo ela, não há exploração de outras formas de desigualdades entre os gêneros, além daquelas de cunho físico e biológico; que expressariam-se durante toda a história da humanidade como imutáveis e universais.  “Uma teoria que se baseia na variável única da diferença física é problemática para os (as) historiadores (as): elas pressupõem um sentido coerente ou inerente ao corpo humano – fora qualquer construção sócio-cultural – e portanto, a não historicidade do gênero em si. De certo ponto de vista, a história se torna um epifenômeno que oferece variações intermináveis sobre o tema imutável de uma desigualdade de gênero fixa.” (SCOTT, 1995, p.78).
            A segunda abordagem utilizou como referência os pressupostos marxistas buscando “um compromisso com as críticas feministas” (SCOTT, 1995, p.77), a autora critica esta abordagem pautada na “exigência auto-imposta de que haja uma explicação “material” para o gênero”, (SCOTT, 1995, p. 78) afirmando que essa imposição retarda o desenvolvimento de outras linhas analíticas. A terceira, e última, abordagem preocupou-se em explicar a produção e a reprodução das identidades de gênero inspirada nas várias escolas da psicanálise, explicando a “produção e reprodução da identidade de gênero do sujeito” (SCOTT, 1995, p.77). Passível de críticas, segundo as palavras da autora “minha reserva para com  teoria de relações de objeto concentra-se em seu liberalismo, no fato de basear a produção de identidade de gênero e a gênese da transformação em estruturas de interação relativamente pequenas” (SCOTT, 1995, p.81), como a família.
            A construção de Scott sobre gênero ser uma categoria útil de análise dá-se da seguinte forma: “gênero é um elemento constitutivo de relações sociais baseadas nas diferenças percebidas entre os sexos e é uma forma primária de dar significado às relações de poder. [...] os símbolos culturalmente disponíveis que evocam representações simbólicas [...] os conceitos normativos que expressam as interpretações dos significados dos símbolos, que tentam limitar e conter suas possibilidades metafóricas. Esses conceitos estão expressos em doutrinas religiosas, educativas, científicas ou jurídicas e tornam a forma típica de oposição binária, que afirma de uma maneira categórica e sem equívoco o sentido do masculino e do feminino” (SCOTT, 1995, p.86).
            Nesse sentido, diferentemente do conceito de sexo adotado por Simone de Beauvoir (1970), que explicita as diferenças sexuais como dois pólos contrários: “o homem é pensável sem a  mulher. Ela não, sem o homem. Ela não é senão o que o homem decide que seja; daí dizer-se o  “sexo” para dizer que ela se apresenta diante do macho como um ser sexuado: para ele, a fêmea é sexo, logo ela o é absolutamente. A mulher determina-se e diferencia-se em relação ao homem e não este em relação a ela; a fêmea é o inessencial perante o essencial. O homem é o Sujeito, o Absoluto; ela é o Outro” (BEAUVOIR, 1970,  p. 10). Gênero, significa a compreensão produzida pelas sociedades e culturas a respeito das diferenças sexuais, e como essa compreensão leva a construção das relações de poder (dominação e subordinação). Segundo Beauvoir “A divisão dos sexos é, com efeito, um dado biológico e não um momento da história humana” (BEAUVOIR, 1970, p. 13). Para Scott (1995) é preocupante tratar as relações entre os gêneros a partir de um olhar que faça com que homens e mulheres sejam vistos em separado através da história - como no caso dos sexos de Beauvoir - pois a  identidade feminina foi um produto social e um reflexo do olhar masculino; assim, durante muito tempo, definiu-se pelos discursos de seu interlocutor, nas palavras da autora: “o  termo “gênero” além de um substituto para o termo mulheres, é também utilizado para sugerir que qualquer informação sobre as mulheres é necessariamente informação sobre os homens, que um implica o estudo do outro. Essa utilização enfatiza o fato de que o mundo das mulheres faz parte do mundo dos homens, e que ele é criado nesse e por esse mundo masculino” (SCOTT, 1995, p. 75).
            Analisando as premissas de Scott, vale-nos compreender como a sociedade entende e define as mulheres em relação aos homens e quais os significados que esses entendimentos têm para a maneira como as mulheres conduzem suas vidas.
            Assim, a construção da identidade feminina pode ser analisada historicamente, partindo-se de uma analogia às proposições de identidade construídas por Stuart Hall (2004), onde, simplificadamente, o autor  distingue três identidades, cujas mudanças ocorreram gradativamente e que utilizamos para nossas análises. A primeira diz respeito ao sujeito do Iluminismo, que baseava-se em uma noção do indivíduo como um ser totalmente centrado, unificado, possuidor das capacidades racionais, de consciência e de ação; dono de um núcleo interior oriundo desde o seu nascimento, desenvolvido ao longo da sua vida. Essa concepção além de ser individualista, descrevia o sujeito do Iluminismo como masculino. A segunda concepção faz referência ao sujeito sociológico, que devido a complexidade do mundo moderno, teria sua identidade formada através da interação com a sociedade. A ideia de essência interior permanece, mas é formada e modificada no contato contínuo com os universos culturais exteriores e as identidades ali inseridas. “Estabiliza tanto os sujeitos quanto os mundos culturais que eles habitam, tornando ambos reciprocamente mais unificados e previzíveis” (HALL, 2004, p.12). A última concepção trata do sujeito pós-moderno, que, segundo Hall, é destituído de  identidade fixa ou permanente; um sujeito que torna-se fragmentado e compreende várias identidades, sendo por vezes contraditórias ou não resolvidas. Assim “a identidade torna-se uma ‘celebração móvel’: formada e transformada continuamente em relação as formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam” (HALL, 1987, apud Hall, 2004).
            Podemos, a partir de agora, elaborar uma comparação entre as concepções de identidade criadas por Hall (1987) e as concepções de mulher elaboradas por Gilles Lipovetsky (2000), onde o referido autor distingue três identidades para as mulheres ao longo da história da humanidade levando-nos a pensar sobre todas as mudanças ocorridas no último século a respeito do novo lugar das mulheres na sociedade, pois, na sociedade contemporânea e pela primeira vez na história da humanidade “o lugar da mulher não é pré-ordenado, orquestrado de ponta a ponta pela ordem social e natural” (LIPOVETSKY, 2000, p.12). “As mulheres eram escravas da procriação, libertaram-se dessa servidão imemorial. Sonhavam ser mães no lar, agora querem exercer uma atividade profissional. Estavam sujeitas a uma moral severa, hoje a liberdade sexual ganhou direito e cidadania. Estavam confinadas nos setores femininos, ei-las que abrem brechas nas cidadelas masculinas, obtém os mesmos diplomas que os homens e reivindicam paridade em política” (LIPOVETSKY, 2000, p. 11).         
            A primeira mulher, – cronologicamente anterior ao Iluminismo – prevaleceu durante grande parte da história da humanidade, segundo Lipovetsky (2000) esta refere-se a uma concepção depreciada da mulher, por conta da valorização do masculino frente ao feminino; assim,  os discursos evocavam a inferioridade da mulher em relação ao homem “aos homens a glória imortal, as honras públicas, o monopólio da plenitude social. Às mulheres a sombra e o esquecimento, concedidos aos sujeitos inferiores” (LIPOVETSKY, 2000, p. 234) elas, as bruxas, feiticeiras e perigosas. Assim, nesse momento, a mulher gera depreciação quanto a sua identidade, só sendo reconhecido e valorado o resultado de sua função de procriação. O homem era visto como o ser centrado e detentor da razão, enquanto a mulher como o “mal necessário confinado nas atividades sem brilho, ser inferior sistematicamente desvalorizado ou desprezado pelos homens” (LIPOVETSKY, 2000, p. 234). A mulher é distanciada dos círculos públicos, sendo “apresentada como um ser enganador e silencioso, inconstante e ignorante, invejoso e perigoso” (LIPOVETSKY, 2000, p. 234). Um ponto que merece destaque nesse momento histórico sobre as mulheres é o fato de apesar de serem desprezadas, elas serem vistas como seres poderosos, detentoras de poderes selvagens e místicos, poderes que escapavam às explicações racionais da lógica masculina, por essa razão as mulheres eram seres temidos. Esse mito alimentou medos e anseios que, consequentemente, associaram as mulheres ao mal e ao diabólico.
            Posteriormente, no período conhecido por Idade Média surge a segunda mulher de Lipovetsky, ou “a mulher enaltecida” (LIPOVETSKY, 2000, p. 234) que passa a ser vista como uma criatura pura e inspiradora; essencial em todas as conquistas dos homens. Segundo o autor a partir do século XII (a segunda Idade Média) desenvolve-se o “culto da Dama amada e suas perfeições” (LIPOVETSKY, 2000, p. 235) feminina e submissa, a segunda mulher fundou um estatudo social inédito, exaltada em sua beleza, contemplada, sacralizada enquanto esposa-mãe-educadora, seus encantos já não eram tão perigosos, nesse período as manifestações do feminino puderam ser absorvidades de forma quase natural; a mulher é elogiada, “o “belo sexo” é proclamado mais próximo da divindade do que o homem; a mãe é enaltecida em efusões líricas. Ainda que muitas queixas permaneçam, eis a mulher, coberta de louvores e de honras” (LIPOVETSKY, 2000, p. 235). Entretanto, a mulher ainda é controlada pelo poder do marido, pai ou dos irmãos homens.  Esta foi colocada em um trono, vista como um ser divino digna de louvores e honra, mas sem nenhum poder em suas mãos, este ainda, exclusividade masculina. A mulher exerce poderes dentro de seu lar, onde ela é a rainha, reclusa às decisões sobre a vida familiar e a educação dos filhos, “a ela é negada a independência econômica e intelectual” (LIPOVETSKY, 2000, p. 235), o poder dado às mulheres permanece confinado ao âmbito doméstico.
            Percebe-se nessas duas formas de representação da mulher que “tanto a primeira como a segunda mulher estavam subordinadas ao homem” (LIPOVETSKY, 2000,  p. 237).
            A terceira mulher marca uma ruptura histórica, ela é a sujeita de si e rompe com a reclusão doméstica, “é um novo modelo que comanda o lugar e o destino social femino. Novo modelo que se caracteriza por sua autonomização em relação à influência tradicional exercida pelos homens sobre as definições e significações imaginário-sociais da mulher” (LIPOVETSKY, 2000, p. 236).  
            Assim, ela é reconhecida a mulher-sujeito que tem poder de decisão e autonomia dentro das relações de gênero. A pós-mulher representa uma ruptura histórica – característica da pós-modernidade – na maneira pela qual é constituída a identidade feminina. Nesse sentido, Lipovetsky afirma que “tudo na existência feminina tornou-se escolha, objeto de interrogação e arbitragem, nenhuma atividade está, em princípio, fechada às mulheres, nada mais fixa imperativamente, seu lugar na ordem social.” (LIPOVETSKY, 2000, p.237). Ela não mais é uma criação segundo a percepção do ideal masculino, é sim uma “auto-criação feminina” (LIPOVETSKY, 2000, p.237).
            A terceira mulher assume o controle do próprio corpo sem abrir mão do direito de seduzir, exercita sua sexualidade e a maternidade sem reduzir seus projetos, sejam eles de carreira profissional ou acadêmica, ela é a sujeita de si, são asmulheres criadas por mulheres e acima de tudo criadas por elas mesmas. Agora as mulheres querem circular publicamente, querem ser reconhecidas social e profissionalmente ganhando novos espaços: essa mulher estuda, trabalha, pratica esportes, faz ciência e política; domando fragilidades e deficiências que pareciam, aos olhos da sociedade – dominada pelo patriarcalismo – características das mulheres.  Ainda assim; “o estado social pós-moderno coincide, não com a indistinção dos papéis sexuais, mas com a diferenciação sexual da mesma lógica individualista;  não é um modelo de reversibilidade entre os sexos que nos governa, mas um duplo modelo individualista, reinscrevendo socialmente a diferença masculino/feminino” (LIPOVETSKY, 2000, p. 241).      
            Percebe-se que, frente às tradições do passado que reprimiam e anulavam as mulheres, houve uma liberação e independência femininas em relação ao sexo, assim a mulher pós-moderna impõe-se em muitas áreas, inclusive a sexual. Alain Touraine (2010) ataca os fundamentos da construção da identidade feminina, enfatizando que as mulheres hoje, se definem como mulheres, não mais como mães ou esposas, essa é a realização de si, ser a mulher de si, um sujeito autônomo e constituído sobre o próprio desenvolvimento de si enquanto pessoa. Nesse sentido, segundo Lipovetsky (2000) “O que se propaga não é a semelhança dos papéis sexuais, mas a não diretividade dos modelos sociais e, correlativamente, o poder de autodeterminação e de indeterminação subjetiva dos dois gêneros. A liberdade de autodirigir-se se aplica agora, indistintamente, aos dois gêneros, mas se constrói sempre “em situação”, a partir de normas e papeis sociais diferenciados, sobre os quais não há nenhuma indicação de que estejam destinados a um futuro desaparecimento” (LIPOVETSKY, 2000, p. 239); assim os autores afirmam, que as diferenças entre os sexos não irão desaparecer, mas que nesse momento a mulher pode decidir-se, pode dirigir sua própria vida, sua sexualidade, sem ser desenhada de acordo com o que os homens esperam.
            Considerando-se que, historicamente, as mulheres foram submissas aos desejos masculinos, às regras e às funções impostas pelos homens, percebemos que houve uma grande diferença, de acordo com o que afirma de Alain Touraine (2010), em sua obra O mundo das mulheres  “as mulheres são capazes de agir a fim de responder às suas exigências interiores e pessoais, e não somente para responder às sujeições exteriores” (TOURAINE, 2010, p.31). Segundo o referido autor as mulheres conquistaram a subjetividade na construção de si mesmas e a capacidade de pensar e agir sobre si, “”eu sou uma mulher” quer dizer: “mulher, eu tenho direito de ser uma mulher e de dar a este personagem o conteúdo que escolhi. Esta escolha é uma prova de minha liberdade, de minha capacidade de guiar-me e de valorizar-me”” (TOURAINE, 2010, p. 31). É este o chamado poder de auto-definir-se, de governar a si mesma citado por Lipovetsky (2000).

  A construção da feminilidade na pós-modernidade

             Há uma nova relação entre a feminilidade contemporânea  e as imagens que a mulher projeta de si, para si e para o mundo. Ao iniciar a discussão da feminilidade na sociedade contemporânea tenho em mente o que a sociedade chama de “nova mulher”, nossa recriação através de imagens e valores; eu diria, com a devida presunção que me cabe nesse momento, uma “nova Eva”; uma Eva liberta, sem o sentimento da culpa sexual que lhe atormentava, que não aceita ser chamada de “pecaminosa”, que é insubmissa. Podería-se dizer uma “Eva” com traços da lendária Lilith. Explico melhor: Lilith, segundo antigas tradições orais judaicas, teria sido a primeira mulher de Adão, mas por ter exigido direitos iguais aos dele, se rebelou e abandonou o paraíso. Deus enviou anjos para trazê-la de volta, mas ela negou-se a atender o “pedido” divino.
            Lilith tornou-se símbolo do movimento feminista nas décadas de 1960 e 19701 , após ter sido transformada em demônio na Idade Média – exemplo claro da demonização da feminilidade discutida por Lipovetsky na segunda mulher. A terceira mulher de Lipovetsky, ou a mulher da pós-modernidade é a mulher indeterminada no sentido de não permitir que outros determinem seu “lugar no mundo”, sua forma de agir, seu jeito de vestir, suas escolhas profissionais ou pessoais, ela determina a aparência que quer ter. Esta é uma imagem otimista e celebratória de jovens mulheres confiantes e assertivas que estão alcançando níveis de sucesso nos âmbitos público e privado e  que possuem o poder para se autodefinirem e precisam explorá-lo.
            Segundo Alves (2014) “estamos assistindo ao deslizamento da figura da mulher  submissa (mulher para o outro) da sociedade patriarcal. Em seu lugar, está emergindo a figura da mulher para si” (ALVES, 2014, p. 97). A feminilidade que avança é daquela mulher, que não deixa de ser mulher pelo simples fato de não ser submissa a um homem ou a qualquer sujeito, esta se assume enquanto “mulher liberada, independente e, principalmente, dona de si e de seus próprios gostos” (ALVES, 2014, p. 97).
            Ao contrário das mulheres anteriores, a mulher pós-moderna é senhora do seu desejo. Ela assume ser dona do seu corpo e usa-o como bem entende, preocupa-se em aprimorar sua aparência com exercícios físicos ou com cirurgias plásticas. Ocupa os espaços públicos e administra o seu tempo,  usufruindo e reconhecendo as conquistas das feministas dos anos 1970 – como a pílula anticoncepcional –,  mas  olhando para o futuro e não vitimizando-se pelo passado, pois seu olhar está para além das tradições e convenções sociais.
            Em busca de uma nova feminilidade a “nova mulher” estimula a emergência de novas formas de ser feminina, novas concepções de sexualização, beleza e sedução, que poderiam aproximar-se, daquilo que Foucault (2008) definiu como “artes da existência”, técnicas de se constituir a própria subjetividade, desenvolvidas a partir das práticas de liberdade; assim a mãe pós-moderna integrou-se a figura da mulher independente, pois além de emancipada e, muitas vezes, chefe de família, ela quer prazer sexual.
            Um movimento que busca a construção de sujeitos femininos, independentes e confiantes, promovendo a assertividade feminina e a autonomia sexual e social das mulheres contemporâneas é o girl power explicado claramente por Tatiane Costa: “O movimento do girl power é uma das correntes pós-feministas mais entrelaçadas ao âmbito midiático. O termo começa a ser propagado na década de 1990 com a banda inglesa Spice Girls, espalhando-se principalmente entre outros cantores e bandas pop, e marca uma revalorização da feminilidade como um meio de empoderamento feminino. Há uma crítica à ideia de feminilidade como marca da opressão patriarcal, conforme denunciava a segunda onda feminista, e símbolos como batom e salto alto são ressignificados, passando a ser vistos como formas de agenciamento feminino” (COSTA, 2013, p. 3).
            Em tempos pós-modernos, a construção de um modelo feminino universal,  imposto historicamente pelo discurso médico vitoriano, pela família, pela igreja, enfim, pelo olhar masculino e patriarcal, principalmente nos centros urbanos e pelos estímulos da indústria de consumo, já não pode se realizar, pois não existe mais uma essência ou identidade feminina e sim – várias – identidades femininas, somos mulheres, e reconhecemos que “as possibilidades para as mulheres se tornaram tão ilimitadas que ameaçam desestabilizar as instituições das quais depende uma cultura dominada pelos homens” (WOLFF, 1992, p. 21), nesse sentido um modelo de identidade masculina, tampouco, torna-se possível, pois a identidade masculina torna-se algo móvel, fragmentado, não mais visto como àquela dominante na sociedade.
           
Considerações finais  

            A terceira mulher, ou a mulher indeterminada como reflete Lipovetsky (2000) é um novo modelo de mulher, instalado na pós-modernidade, autônoma em relação às influências tradicionais de dominação masculina, pois a lógica da dependência feminina em relação ao homem já não rege mais sua condição social, e, em relação as representações que a sociedade faz delapois tem à sua disposição todas as esferas da sociedade onde pode ou quer estar inserida. Nós mulheres adquirimos direitos, e sim, somos indeterminadas porque ninguém vai nos dizer o que e como fazer, ou seja, ganhamos o poder de nos autogovernar.
            A pós-mulher é a geração de mulheres que foi criada com os mesmos moldes com que se educou os meninos durante muito tempo; fomos incentivadas a estudar, nos dedicarmos a uma carreira, falar outras línguas, fomos instigadas a construir nossa independência. Não aprendemos a costurar, bordar e muito menos aprendemos a dedicar nosso tempo em tarefas pouco intelectuais, apesar de ter aprendido a bordar aprendi sozinha, pois minha mãe e minha avó nunca souberam fazê-lo, não me foi imposto nada, para mim era um hobby, uma forma de me livrar dos “problemas” da adolescência. Lipovetsky (2000) chama a atenção para todas as mudanças que ocorreram quanto ao lugar da mulher na sociedade e critica autores como Pierre Bourdieu que não se deram conta dessa mudança. Assim a questão primordial dessas considerações é aquela formulada por Ruth Manus (2015) para a página Vida e Estilo do jornal O Estadão, “alguém lembrou de avisar os tais meninos que nós seríamos assim?”
            Na rotina diária de uma mulher contemporânea, ou seja, na minha rotina, percebo  claramente que as desigualdades entre os sexos, ainda não se desintegraram, mas, nesse momento, estão muito mais maleáveis e fluídas, assim como a sociedade está se redefinindo e novos paradigmas estão em construção. Uma das característas da sociedade pós-moderna é a  indefinição das identidades, a fragmentação e a possível multiplicação de novas  identidades por um único sujeito, seja ele feminino ou masculino.
            Não só os homens mas a sociedade, ainda, não estão preparados para nós, as mulheres criadas para o mundo, nós, as mulheres pós-modernas, não somos nada que o inconsciente coletivo espera de uma mulher, ainda assim podemos escolher não o ser, ou ser; é esse o enunciado da mulher sujeito de si, estamos celebrando a mobilidade de nossa identidade que se forma e pode ou não, se transformar em relação às representações feitas de nós e por nós mesmas.
            Os nossos avanços, sociais, culturais e de direitos são irreversíveis, nenhuma mulher vai voltar atrás, abrindo mão da liberdade de fazer escolhas por si só, a  progressiva conquista do espaço público trouxe para a mulher uma infinidade de ganhos;  entretanto, exigiu seu preço. Um preço que solicita uma mudança na posição subjetiva da mulher, e que exige uma passagem pelo momento de luto pelas perdas de garantias das antigas posições femininas. Um caminho tortuoso,  pois a estrada em direção à autonomia, única via de acesso ao encontro com novas realizações, exige que a mulher assuma o preço da responsabilidade de uma posição enquanto sujeito.
            Ainda estamos presas às necessidades dos ideais do espaço doméstico, reinado de nossas mães, nos vemos hoje, tendo de corresponder também àqueles ideais próprios do espaço público, antes exclusivo dos homens. Às voltas com a necessidade de percorrer o difícil caminho que qualquer mudança de posição subjetiva exige, nós nos deparamos, hoje, diante com um espectro amplo de ideais a buscar alcançar.

Referências
 
ALVES, Fabio L. Pós-mulher: corpo, gênero e sedução. Curitiba, Editora Champagnat, 2014.
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* O presente texto foi elaborado como objeto de avaliação da disciplina Gênero sociedade e contemporaneidade: abordagens interdisciplinares, ministrada pelo professor Dr. Fabio Lopes Alves do Mestrado e Doutorado Interdisciplinar em Sociedade, Cultura e Fronteiras, 2015.
1 O movimento feminista das décadas de 1960 e 1970 reconhecido como a Segunda Onda Feminista iniciou nos  Estados Unidos num momento de crise, ampliando o debate em relação aos direitos da mulher quanto à sua sexualidade, família, ao mercado de trabalho, direitos reprodutivos, desigualdades sociais e legais. Em uma época em que as mulheres alcançaram grandes avanços nas profissões este movimento também chamava a atenção para a violência doméstica e problemas de estupro conjugal, além de lutar pela criação de abrigos para mulheres maltratadas e por mudanças nas leis de custódia e divórcio. No Brasil, além de lutar pela valorização do trabalho da mulher, o direito ao prazer, contra a violência sexual, também lutou contra a ditadura militar. Essa fase identificava o problema da desigualdade como a união de problemas culturais e políticos, encorajando as mulheres a serem politizadas e combaterem as estruturas sexistas de poder.

Recibido: 07/01/2016 Aceptado: 16/03/2016 Publicado: Marzo de 2016

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