Revista: Caribeña de Ciencias Sociales
ISSN: 2254-7630


PESCA ARTESANAL E CONFLITOS AMBIENTAIS: O CASO DA ZONA COSTEIRA DO RIO GRANDE DO SUL

Autores e infomación del artículo

Ederson Pinto da Silva *

Tatiana Walter **

Universidade Federal do Rio Grande - FURG

ederson.tga@gmail.com

RESUMO

O presente trabalho propõe-se a desenvolver um mapeamento dos conflitos ambientais envolvendo pescadores artesanais na zona costeira do estado do Rio Grande do Sul. Busca desenvolver uma análise crítica de como a sociedade capitalista tem afetado o modo de vida destas populações tradicionais. O estudo baseia-se em pesquisa bibliográfica e documental, bem como pelas experiências vivenciadas pelos autores, tanto na gestão pública como na realização de pesquisas relacionadas à pesca artesanal nas diversas regiões do estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Em especial, a recente pesquisa sobre a cadeia produtiva do pescado oriundo da pesca artesanal no estado do Rio Grande do Sul que sistematizou a produção científica  e realizou oficinas com os pescadores artesanais do complexo estuarino lagunar Patos-Mirim e Litoral Norte, em que os mesmos relataram os conflitos vivenciados. Assim, foi possível identificar a pesca artesanal da zona costeira gaúcha enfrenta diversas situações de conflitos ambientais com atividades como: agronegócio; atividades portuárias e petrolíferas; barragens-eclusas; espécies invasoras; especulação imobiliária; esportes náuticos; pesca amadora e pesca industrial; e implementação de unidades de conservação. Verificou-se que seja pela expropriação dos territórios tradicionais, pela destruição dos ecossistemas ou mesmo pela disputa desigual pelo acesso aos recursos naturais, tais conflitos, muitas vezes resultantes de políticas públicas que buscam responder às demandas de uma sociedade capitalista em desenvolvimento, têm colocado em risco a sustentabilidade da pesca artesanal e a consequente garantia de sua reprodução social. Concluiu-se ainda que a situação de vulnerabilidade das comunidades de pescadores artesanais é extrema, o que torna fundamental a luta conjunta para a garantia às comunidades de pescadores do direito constitucional a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, garantindo assim o seu modo tradicional de vida.

Palavras-chave: Pesca Artesanal. Conflito. Meio Ambiente.

 

ARTISANAL FISHING AND ENVIRONMENTAL CONFLICTS: THE CASE OF THE COASTAL ZONE IN SOUTHERN BRAZIL (STATE OF RIO GRANDE DO SUL)

ABSTRACT
This study is aimed to develop a mapping of environmental conflicts involving artisanal fishing communities in the coastal zone of the State of Rio Grande do Sul, southern Brazil. A critical analysis is undertaken of how capitalist society has affected the way of life of these traditional populations. The study is based on bibliographical and documentary research in addition to experiences lived by the authors both in public management and in the performance of research related to artisanal fishing in the different regions of the state of Rio Grande do Sul, Brazil. In particular, there is a focus on the recent research on the fish supply chain from the artisanal fishery in the state of Rio Grande do Sul, which systematized scientific production and held workshops with the artisanal fishing community of the Patos-Mirim lagoon estuaries and the North Coast of the State, where the conflicts experienced were reported. Thus, it was identified that artisanal fishing in the coastal zone of the State of Rio Grande do Sul faces various environmental conflicts with activities such as: agribusiness; port and oil activities; dams-locks; invasive species; real estate speculation; water sports; amateur and industrial fishing; and implementation of Conservation Units. Therefore, it was verified that the expropriation of traditional territories, the destruction of ecosystems and the unequal dispute over access to natural resources are nuclear conflicts (often resulting from public policies that seek to respond to the demands of a developing capitalist society) that have put in risk the sustainability of artisanal fisheries and the consequent guarantee of their social reproduction. It was further concluded that the situation of vulnerability of artisanal fishing communities is extreme, which makes it urgent joint efforts to assure that fishing communities have the constitutional law of an ecologically balanced environment, thus guaranteeing their traditional way of life.

Keywords: Artisanal Fishing. Conflict. Environment.

 

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Ederson Pinto da Silva y Tatiana Walter (2017): “Pesca artesanal e conflitos ambientais: o caso da zona costeira do rio Grande do Sul.”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (septiembre 2017). En línea:
https://www.eumed .net/rev/caribe/2017/09/pesca-artesanal-riogrande.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/caribe1709pesca-artesanal-riogrande


INTRODUÇÃO

Em 2012, ao analisarem os dados relativos ao Registro Geral de Pesca – RGP, mantido pelo Ministério da Pesca e Aquicultura - MPA, Walter et al. (2015) encontraram 17.323 pescadores artesanais registrados no Rio Grande do Sul. Em julho de 2015 o número de pescadores artesanais no Rio Grande do Sul caiu para 15.163 (Brasil, 2015), confirmando uma tendência de queda nos últimos anos. Uma das justificativas para tal queda seria o aprimoramento, se é que da para assim classificar, do processo de gestão e controle do RGP que vem sendo implementado pelo Estado. Contudo, esta parece ser uma justificativa simplista ao negligenciar as demais situações enfrentadas pelas comunidades de pescadores artesanais, entre elas a expropriação de seus territórios tradicionais que têm colocado em risco a sustentabilidade desta atividade como meio de vida tradicional para diversas comunidades localizadas na zona costeira do estado do Rio Grande do Sul.
Com o crescimento econômico em expansão, conflitos ambientais de diversas formas passaram a fazer parte do cotidiano das comunidades de pescadores artesanais que lutam para garantir sua sobrevivência e os meios necessários para sua reprodução social. Acselrad (2004) define os conflitos ambientais como oriundos de modos diferenciados de apropriação, uso e significação do território, tendo origem quando pelo menos um dos grupos tem ameaçada a continuidade de suas formas de apropriação por impactos indesejáveis em decorrência do exercício das práticas de outros grupos. Em Acselrad (2010) o autor afirma que o que está em jogo no centro do embate acerca da questão ambiental é o modo como se organizam e distribuem no território as diferentes formas de apropriação dos recursos ambientais e como a existência de determinadas formas pode afetar as demais. Desta forma, ao afirmar que a noção de “justiça ambiental” expressa um movimento de ressignificação da questão ambiental, resultando de uma apropriação singular da temática do meio ambiente por dinâmicas sociopolíticas tradicionalmente envolvidas com a construção da justiça social, destaca também que este processo de ressignificação está associado a uma reconstituição das arenas onde se dão os embates sociais pela construção dos futuros possíveis.
Diegues (1973) apresentou significativa contribuição para a compreensão da a forma como o pescador, através de seu trabalho, se relaciona com o ambiente. Para ele, pescador artesanal é aquele.
[...] que na captura e desembarque de toda a classe de espécies aquáticas, trabalha sozinho e/ou utiliza mão-de-obra familiar ou não assalariada, explorando ambientes ecológicos limitados através de técnicas de reduzido rendimento relativo e que destina sua produção, total ou parcial, para o mercado. (DIEGUES, 1973: 111)

Com esta compreensão, é possível perceber que a existência do pescador artesanal é condicionada pela existência de um território onde ele possa exercer seu trabalho, ou seja, um ecossistema que lhe ofereça as condições necessárias para, ao exercitar “ser pescador artesanal”, obter o pescado como fruto de seu trabalho. Para Marx, em “Formações Econômicas Pré-Capitalistas” a natureza, mais precisamente a terra, é a base das comunidades, o primeiro passo como apropriação das condições objetivas de vida.
A terra é o grande laboratório, o arsenal que proporciona tanto os meios e objetos do trabalho como a localização, a base da comunidade. As relações do homem com a terra são ingênuas: eles se consideram como seus proprietários comunais, ou sejam membros de uma comunidade que se produz e reproduz pelo trabalho vivo. (MARX,1985: 67)

Assim, ao vivenciarem os conflitos ambientais, as comunidades de pescadores artesanais resistem ao processo de expropriação do meio físico natural a que são submetidas, pois sem seus ambientes ecológicos não há como se manter enquanto pescadores artesanais. Em “Manuscritos Econômico-Filosóficos”, Marx discute a importância da natureza para que, através do trabalho, o homem se efetive como ser.
O trabalhador nada pode criar sem a natureza, sem o mundo exterior sensível. Ela é a matéria na qual o seu trabalho se efetiva, na qual [o trabalho] é ativo, [e] a partir da qual e por meio da qual [o trabalho] produz. Mas como a natureza oferece os meios de vida, no sentido de que o trabalho não pode viver sem objetos nos quais se exerça, assim também oferece, por outro lado, os meios de vida no sentido mais estrito, isto é o meio de existência física do trabalhador mesmo. (MARX, 2004: 81)

            Boa parte dos conflitos existentes estão relacionados a políticas públicas que ao serem implementadas acabam beneficiando um segmento da sociedade em detrimento das comunidades de pescadores artesanais. Assim, leis, decretos, programas, normas, etc. surgem de processos assimétricos de correlação de forças onde os pescadores artesanais, quando participam, são os que possuem menores recursos de poder para interferir no resultado das políticas. Ao abordar o tema de políticas públicas, Rua (2009) explica a importância dos recursos de poder na construção de uma política pública.    
Recursos de poder são capacidades que um ou vários atores podem utilizar para pressionar por decisões que sejam favoráveis aos seus interesses. Podem envolver desde reputação, posição social, contato com redes de influência, controle de dinheiro, de armas, capacidade de denunciar e chantagear, inserção internacional, poder de mobilização de grandes grupos [...], controle de recursos tecnológicos [...] capacidade de infligir prejuízos [...]. Os recursos de poder são os elementos que sustentam as alianças e as barganhas ou negociações em torno de uma política pública. (RUA, 2009: 44)

Neste contexto, a garantia da continuidade da pesca artesanal como meio de vida passa pela compreensão da necessidade de reafirmação de uma gestão ambiental pública, entendida por Quintas (2006) como mediadora de conflitos entre atores que agem sobre os meios físico-natural e construído, com o objetivo de garantir o direito constitucional ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Para este autor, quando o Estado autoriza o uso do meio ambiente, há apropriação deste por um ente privado, excluindo os demais grupos sociais que dele faziam uso. Este processo, além de conflitivo, resulta em uma assimetria estrutural, dado que os benefícios e prejuízos desta decisão são distribuídos socialmente e geograficamente desiguais. Assim, conforme Quintas (2006), a mediação promovida pela gestão ambiental pública não é neutra e deve estar orientada aqueles que assumem o ônus das decisões do Estado e por vezes são privados de um meio ambiente equilibrado.
 No que se refere a pesca artesanal, um importante passo a ser dado com vistas à promoção da justiça ambiental por meio da mediação dos conflitos ambientais é justamente a explicitação dos mesmos, muitas vezes encobertos pela ação das forças hegemônicas. Desta forma, a presente pesquisa aborda os conflitos ambientais enfrentados pelas comunidades de pescadores artesanais situadas na zona costeira do estado do Rio Grande do Sul, Brasil.
O percurso investigativo partiu da experiência acumulada pelos autores na militância social, na gestão pública e na realização de pesquisas relacionadas ao tema. Em especial, a recente pesquisa sobre a cadeia produtiva do pescado oriundo da pesca artesanal no estado do Rio Grande do Sul que no período de 2012 a 2014 sistematizou a produção científica relativa aos pescadores artesanais do complexo estuarino lagunar Patos-Mirim e Litoral Norte. De forma complementar, foram realizados procedimentos de pesquisa bibliográfica e documental.

CONFLITOS AMBIENTAIS DA PESCA ARTESANAL NA ZONA COSTEIRA DO RIO GRANDE DO SUL

 

A pesquisa identificou sete conflitos ambientais que atingem diretamente as comunidades de pescadores artesanais da zona costeira do Rio Grande do Sul. Tais conflitos são apresentados, em ordem alfabética, com uma breve contextualização e com a identificação de como as comunidades estão sendo impactadas.  
 

Agronegócio

A expansão do agronegócio tem gerado grandes impactos à pesca artesanal. Via de regra estes impactos são causados pela degradação dos ecossistemas por meio da drenagem dos banhados para expansão de áreas de pastagem e de orizicultura, bem como pelas mortandades de alevinos que são transportados das margens de lagoas e rios para as lavouras orizícola, por meio das bombas de irrigação, sendo a maioria destas bombas devidamente licenciadas pelos órgãos competentes.  Outra denúncia recorrente diz respeito à contaminação das águas pelo uso de agrotóxicos nos cultivos de arroz. A expansão do agronegócio, não só coloca em risco a sustentabilidade das espécies, como limita o território tradicionalmente utilizado pelos pescadores. Este conflito ocorre em todas as regiões onde há presença da pesca artesanal e orizicultura, porém com maior intensidade na zona costeira onde tem sido pautado pelos pescadores nas reuniões do Conselho Cooperativo para Ações nas Lagoas Mirim e Mangueira no Âmbito Pesqueiro – COMIRIM e dos Fóruns da Lagoa dos Patos, do Delta do Jacuí e do Litoral Médio e Norte do Rio Grande do Sul. Na região sul ainda existe o conflito gerado pela construção da barragem-eclusa do Canal de São Gonçalo para impedir a entrada de água salgada na lagoa Mirim. Os pescadores relatam que após a construção desta barragem, passaram a ter grandes perdas, pois esta impede a entrada de importantes recursos pesqueiros utilizados pelos pescadores artesanais da Lagoa Mirim antes de sua construção.

Atividades portuárias e petrolíferas

 

As atividades portuária e petrolífera são analisadas conjuntamente por se tratarem de atividades correlatas, seja em relação à forma de apropriação do território, como no que tange à desestruturação das comunidades de pescadores artesanais. Para Dos Santos (2013), a expansão dessas atividades econômicas infere, particularmente, nas formas de reprodução do espaço geográfico, já que envolve a mobilização de um aparato técnico significativo, a implantação de outras formas de produção econômica, desloca um relevante contingente populacional e transforma as relações sociais locais, seja pelos novos sistemas técnicos e econômicos alocados, seja pelos novos moradores, fixos e/ou temporários, que trazem suas leituras de mundo para estes espaços.
Outro elemento que justifica a análise conjunta deve-se ao processo atual de expansão do Porto Organizado do Rio Grande estar intimamente ligado à expansão de estaleiros navais destinados à construção de plataformas e embarcações de apoio à atividade petrolífera. Na última década, além de obras de modernização do Porto Novo, reestruturação do Porto Velho, ampliação do Super Porto e construção de três Estaleiros no município de Rio Grande, o complexo Polo Naval se estendeu para além do município através da construção de uma unidade do Estaleiros do Brasil Ltda. (EBR) no município São José do Norte.
Somam-se a eles, os conflitos vivenciados pelos pescadores artesanais de Tramandaí e Imbé que convivem com derramamentos de óleo crônicos e agudos oriundos da operação de uma monobóia da Transpetro, destinada ao escoamento de óleo para o Polo Petroquímico de Triunfo. Situação relatada em Perucchi et al.(2012).
Os conflitos ambientais oriundos da atividade petrolífera-portuária são decorrentes do aumento de taxas de migração oriunda de trabalhadores que vem em busca de melhores oportunidades de emprego e renda, o que resulta em expansão urbana desordenada, aumento do custo de vida, aumento da demanda por equipamentos e serviços públicos, choque cultural, degradação e poluição ambiental.
Contudo, uma das maiores expressões dos conflitos ambientais entre a atividade pesqueira e atividade portuária-petrolífera decorre do processo de apropriação privada da orla e da intensificação de uso, e até mesmo apropriação do espaço aquático, em detrimento da atividade pesqueira.
Ao autorizar um determinado empreendimento – a exemplo de uma plataforma de petróleo ou de um porto – há a apropriação privada daquele espaço, por um determinado agente econômico, e a exclusão de outras atividades econômicas, a exemplo da pesca artesanal. Quão mais há intensidade da atividade petrolífera, maior é a exclusão das demais atividades econômicas e dos grupos sociais que dependem deste território para sua reprodução social. Contudo, o fato dos pescadores artesanais historicamente fazerem uso de bens comuns para sua reprodução social, tanto em terra como em mar, não tem sido suficiente para definição de instrumentos jurídicos e/ou administrativos capazes de indenizá-los ou de mantê-los em seus espaços tradicionais. (WALTER et al., 2012: 90).

Em relação à Rio Grande, verifica-se à ameaça constante de deslocamento compulsório das comunidades lindeiras ao Porto do Rio Grande situadas na Vila Mangueirinha e 4ª Secção da Barra, ainda que sua ocupação reporte ao próprio processo de construção do porto e cujas comunidades de pescadores são tão tradicionais nestes locais quanto à presença do porto. Processo tão preponderante de desestruturação das comunidades pesqueiras, que Da Rosa (2015) ao desenvolver sua pesquisa sobre os conflitos ambientais vivenciados pelos pescadores artesanais na comunidade de Santa Tereza identificou que atualmente apenas cinco famílias se mantém na atividade. Os pescadores destacam o processo acentuado de desestruturação frente à diminuição dos recursos pesqueiros e conflitos devido à presença da atividade portuária e, em especial, à proximidade de um dos estaleiros navais recém instalados e a obras de expansão deste, que dificultam a navegação e o acesso aos pesqueiros.
Silva et al. (2014) ao analisarem os conflitos ambientais oriundos da implantação do estaleiro naval em São José do Norte reportam que os pescadores da comunidade da Vila Nova sofreram deslocamento compulsório. Os conflitos ambientais reportados na pesquisa são decorrentes de três aspectos inter-relacionados, desestruturantes da tradicionalidade da pesca e emblemáticos na relação com o território e de sua apropriação por parte do empreendimento: i) a negociação em torno do deslocamento dos moradores que segundo as autoras foi feita através de indenizações em torno do valor material do imóvel, não sendo reconhecida a territorialidade do meio aquático caracterizada pela fixação de andainas para pesca do camarão rosa; (ii) a tradicionalidade e artesanalidade desta comunidade que é oriunda, também, das relações familiares e de vizinhança, em que pescar com o irmão, com o pai, o vizinho estabelecem os laços comunitários. Com o deslocamento mediante indenização, tais laços foram rompidos, uma vez que “o novo local de moradia” difere família a família; (iii) o valor das indenizações pagas, que não acompanhou a especulação imobiliária que ocorreu no município devido à chegada do empreendimento. Segundo as autoras, dessa forma ocorreu uma dificuldade de aquisição de nova moradia nas mesmas condições de proximidade às margens do estuário e também no centro da cidade.
Em relação ao espaço aquático, além da apropriação de áreas de pesca em que se encontram fixadas as andainas, a atividade pesqueira foi proibida em todo o canal do porto, como medida de segurança. Assim, o empreendimento impõe à pesca uma área de exclusão relevante, em especial, àqueles pescadores cujas comunidades são adjacentes ao canal.

Espécies invasoras

 

Segundo a Secretaria de Meio Ambiente do Rio Grande do Sul, existem no estado dez espécies de peixes exóticas invasoras (4 na categoria 11 ; 6 na categoria 22 ), seis espécies de peixes nativos do Rio Grande do Sul, mas considerados exóticos em outras bacias hidrográficas do estado (4 na categoria 1; 2 na categoria 2) e sete espécies de invertebrados exóticos (6 na categoria 2; 1 na categoria 1). Tais espécies estão distribuídas entre ambientes de água doce, lagoas costeiras, estuários e a costa marinha. No que se refere aos peixes, a maioria dos casos de introdução de espécies invasoras está relacionada à aquicultura e a pesca esportiva. Já em relação à introdução de espécies de invertebrados invasores, muitos dos casos, senão a maioria está relacionada á água de lastro de navios.

Especulação imobiliária

Associado ao crescimento econômico vivenciado no país nos últimos anos está o processo de expansão das áreas urbanas e a consequente intensificação dos conflitos por especulação imobiliária. A realização de grandes empreendimentos econômicos que aumentam a demanda por moradia nas regiões em “desenvolvimento”, o crescimento da renda que possibilita a aquisição ou construção da “casa de praia”, ou mesmo as instalações de empreendimentos imobiliários ligados às políticas habitacionais acabam gerando forte pressão sobre os territórios tradicionais dos pescadores artesanais. A expulsão dos pescadores artesanais de suas comunidades, seja de maneira aparentemente amistosa pela comercialização de seus terrenos, ou pelo uso da força do Capital e/ou do Estado por meio de desapropriações e despejos judiciais, acabam desestruturando o modo de vida das comunidades de pescadores artesanais construído ao longo de gerações. No que se refere à disputa territorial e a resistência dos pescadores, um dos casos mais emblemáticos é o da comunidade do Pontal da Barra no município de Pelotas, onde há décadas os pescadores lutam e resistem às pressões exercidas pelo Capital, pelo Estado e pelo movimento ambiental orientado no conservacionismo, conforme destacado em Fiocruz (2015) e por Nebel (2014). Perucchi et al., (2012) ao reportarem os conflitos recorrentes aos pescadores do Litoral Norte explicitam a dificuldade de acesso aos ambientes de pesca e à beira da lagoa devido à presença de condomínios, o processo de expulsão dos pescadores da orla resultando na desestruturação das comunidades pesqueiras e o processo avançado e desordenado de urbanização.

Esportes náuticos

 

O conflito ambiental envolvendo pescadores artesanais e praticantes de esportes náuticos é um conflito eminentemente territorial e têm imposto significativas e progressivas perdas aos pescadores artesanais. Um dos seus expoentes é o conflito entre surfistas e pescadores artesanais no litoral norte do Rio Grande do Sul, descrito em Hellebrandt et al. (2013). Diante de tal conflito o Estado vem construindo normas para o ordenamento da ocupação territorial, criando áreas específicas para a prática de esportes náuticos. Contudo, tanto estas normas como o processo de “mediação” realizado pelo Ministério Público Estadual, que forçou os pescadores a retirarem seus petrechos e suspenderem a atividade no período de veraneio, não preveem qualquer medida compensatória para os pescadores afetados. Além do conflito com surfistas os pescadores do litoral norte relatam um intenso conflito com o trânsito de motos aquáticas em seus pesqueiros, o que acaba afugentando os peixes e também pode estar interferindo na sua reprodução, uma vez que no período de piracema a utilização destas motos aumenta significativamente. Já na região sul do estado, mais especificamente no município de Rio Grande há um crescente conflito com praticantes de Kitesurf. O aumento da prática deste esporte na região tem colocado em disputa os locais tradicionalmente utilizados pelos pescadores artesanais das comunidades próximas a zona urbana. A exemplo do que ocorreu com o Surf, os praticantes de Kitesurf tem reivindicado a demarcação de uma área exclusiva para a prática de esportes náuticos. Por não envolver diretamente um interesse econômico, pelo fato de a maioria dos esportes náuticos que entram em conflito com a pesca artesanal estarem sob o apelo de serem “ecológicos”, além, claro, de serem praticados por uma parcela da sociedade que têm amplos recursos de poder, não faltam justificativas para que o processo de demarcação de áreas avance.

Pesca amadora e pesca industrial

Embora de origens e características distintas, os conflitos com a pesca amadora e com a pesca industrial foram agrupados pelo fato de ambos envolverem disputas de acesso ao recurso. No que se refere à pesca industrial, trata-se de um conflito estreitamente ligado ao histórico das políticas públicas, especialmente à política de desenvolvimento da pesca industrial implementada a partir da década de 1960. Com a criação da Superintendência de Desenvolvimento da Pesca – SUDEPE, em 1962 e com a publicação do Decreto-Lei nº 221 de 1967, teve início uma política pública claramente orientada para o fomento à pesca industrial em detrimento da pesca artesanal. Diegues (1988), ao analisar a evolução dos sistemas pesqueiros no Brasil, sintetiza os resultados desta política para a pesca artesanal.  
O resultado dessa política de incentivos maciços, com volumosa importação de tecnologia não foi animador: grande parte das empresas (muitas firmas fantasmas) depois de realizarem pesados investimentos em infraestrutura da terra foram à falência, pois, como resultado da sobrepesca, os recursos pesqueiros procurados começaram a escassear. [...] Por outro lado, a pesca artesanal, ainda que responsável por uma parcela importante da captura, recebeu recursos escassos. Além disso, passou a sofrer as pressões da pesca empresarial-capitalista, cujos barcos pescavam em regiões interditadas, dentro de baías e estuários, causando uma enorme devastação de recursos pesqueiros, representada, sobretudo pela "fauna acompanhante" (trash fish) do camarão, jogada ao mar. Inúmeros conflitos se verificaram entre as duas formas de organização da produção (DIEGUES, 1988: 6-7)

O conflito envolvendo pesca artesanal e pesca industrial persiste e no Rio Grande do Sul afeta comunidades de pescadores artesanais de distribuídas ao longo do Litoral e nos estuários. Além de enfrentar a competição desleal com embarcações industriais altamente equipadas, os pescadores artesanais ainda são afetados por normas de gestão que não fazem a diferenciação entre quem pesca para sobreviver e quem pesca para acumular capital. Exemplo típico destas normas é o recente Plano de Gestão da Tainha elaborado pelo Governo Federal. Embora o documento reconheça a importância da tainha para as comunidades de pescadores artesanais do Estuário da Laguna dos Patos, entre as medidas de gestão consta a “proibição do uso de todos os tipos de redes, nas áreas estuarino-lagunares [...] de 1º de abril a 31 de maio”(BRASIL, 2015: 168), que coincide com o período tradicional da pesca da tainha no estuário da Laguna dos Patos.
Já a dita pesca amadora tem provocado muita indignação nos pescadores artesanais. Com fortes recursos de poder, esta modalidade de pesca exerce influência tanto nos órgãos do Estado como nas representações oficiais dos pescadores, inclusive propondo e aprovando normas que buscam legitimar seu alto poder de captura, como é o caso da Lei nº 12.557 de 2006. Construída com apoio da Federação dos Pescadores do Rio Grande do Sul esta Lei, que amplia os direitos de acesso aos recursos para a pesca “amadora”, foi aprovada na Assembleia Legislativa por ampla maioria dos deputados e ainda não foi implementada por ser alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3829) que tramita no Supremo Tribunal Federal. 

Unidades de conservação

Em recente pesquisa, Pereira (2013) descreveu o conflito ambiental instituído devido à criação do Parque Nacional da Lagoa do Peixe - PNLP. Situada entre os municípios de Tavares e Mostardas no litoral norte do Rio Grande do Sul esta unidade de conservação, criada em 1986, colocou os pescadores artesanais que já sobreviviam da pesca na Lagoa do Peixe, muito antes de sua criação, em um processo de “extinção social”. Associado a uma série de limites impostos que têm como objetivo a inviabilização da permanência da atividade na área do Parque, foi instituído um cadastro dos pescadores “autorizados, provisória e excepcionalmente, a realizar a pesca do camarão-rosa” na área onde o Parque foi criado. Pereira (2013) relata a angústia dos pescadores em não poder cadastrar seus filhos e mulheres, uma vez que o cadastro foi fechado no ano de 2000 e não admite novos pescadores, inviabilizando a sucessão familiar e a manutenção da tradicionalidade daquela pesca artesanal. Revisitando diversas pesquisas, Pereira (2013) demonstra que passada mais de uma década de criação do Sistema Nacional de Unidades Conservação – SNUC, o qual prevê entre seus objetivos que os meios de vida, o conhecimento e a cultura de populações tradicionais devam ser protegidos e valorizados, o conflito entre pescadores artesanais e a administração do PNLP ainda persiste  e “por mais que existam estudos comprovando a tradicionalidade da comunidade pesqueira da Lagoa do Peixe[...], os pescadores ainda não são reconhecidos como tais”(PEREIRA, 2013: 51).

CONCLUSÕES

Ainda que a metodologia tenha feito um recorte para a zona costeira do Rio Grande do Sul, considerando-se o estágio atual de desenvolvimento do Capitalismo na sociedade brasileira, não é difícil deduzir que os conflitos aqui apresentados também são vivenciados por pescadores artesanais de outras regiões do estado e do país.
A utilização de uma abordagem crítica para desenvolver uma análise conjunta sobre os conflitos ambientais que os pescadores artesanais da zona costeira do Rio Grande do Sul vêm enfrentando ao longo das últimas décadas permite identificar como o modelo capitalista tem afetado o modo de vida destas comunidades. Pressionadas por uma sociedade capitalista em expansão as comunidades de pescadores artesanais têm lutado para tentar reverter seu lento processo de extinção.
Embora negligenciada por diversos segmentos da sociedade, inclusive por teóricos identificados com o pensamento crítico, a vulnerabilidade dos pescadores artesanais não pode ser ignorada. A destruição dos ecossistemas necessários ao equilíbrio dos recursos pesqueiros, associada à expropriação dos territórios tradicionais e à disputa desigual pelo acesso aos recursos pesqueiros, impedem que os pescadores artesanais exerçam o trabalho que os constitui como homens livres, colocando em risco sua reprodução social.
Diante do exposto, mostra-se de suma importância que lutadores sociais e pesquisadores identificados com a teoria crítica atentem para a realidade que vem sendo enfrentada pelas comunidades de pescadores artesanais. A busca por uma gestão ambiental pública que garanta às comunidades de pescadores artesanais o direito constitucional ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, fundamental para a sua reprodução social, mais do que nunca é uma tarefa de todos.

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* Universidade Federal do Rio Grande - FURG; Programa de Pós-Graduação em Gerenciamento Costeiro CV: http://lattes.cnpq.br/5291808303059665 ederson.tga@gmail.com


** Universidade Federal do Rio Grande FURG; Laboratório de Gerenciamento Costeiro do Instituto de Oceanografia. CV: http://lattes.cnpq.br/2694850769036355 tatianawalter@gmail.com


1 Categoria 1 – Refere-se a espécies que têm proibido seu transporte, criação, soltura ou translocação, cultivo, propagação (por qualquer forma de reprodução), comércio, doação ou aquisição intencional sob qualquer forma (RIO GRANDE DO SUL, 2013).

2 Categoria 2 – Refere-se a espécies que podem ser utilizadas em condições controladas, com restrições, sujeitas à regulamentação específica (RIO GRANDE DO SUL, 2013).

 


Recibido: 23/09/2017 Aceptado: 28/09/2017 Publicado: Septiembre de 2017

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