Karin Gabriel Moreno de Souza *
Universidade Estadual Paulista, Brasil
karin.gabriel_kg@hotmail.comResumo
Este artigo é parte integrante dos resultados de pesquisas realizadas na elaboração de Monografia de conclusão de curso em Geografia na Universidade Estadual Paulista, campus de Presidente Prudente. Tem como propósito analisar as modificações, que ocorreram no tempo, inserindo novas estratégias de organização no Sistema Cooperativista dos Assentados (SCA) do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST). Os assentamentos rurais surgem como resultados da luta dos movimentos socioterritoriais pela terra e reforma agrária, conforme apresentado no tópico anterior. Esse é o tipo de reforma agrária existente no país, a implantação de assentamentos rurais mediante a pressão popular. A construção de cooperativas surge nos assentamentos rurais objetivando a permanência na terra, pois após a conquista da terra, as famílias assentadas necessitam permanecer e reproduzir seus modos de vida, buscando ascenção social e emancipação econômica, o campesinato passa então a articular suas produções em cooperativas. Esse fator, é impulsionado pelo MST, que orienta as famílias assentadas, com estratégias de produção, e essas estratégias de produção e de organização se modificam com o passar dos anos, possibilitando diferentes experiências as famílias rurais.
Palavras-chave: Cooperativismo- Assentamentos Rurais – Reforma Agrária - Campesinato
LOS PROCEDIMIENTOS DE MODIFICACIONES EN EL SISTEMA COOPERATIVISTA DE LOS ASENTADOS (SCA) DEL MST.
Resumen
Este artículo es parte integrante de los resultados de investigaciones realizadas en la elaboración de Monografía de conclusión de curso en Geografía en la Universidad Estadual Paulista, campus de Presidente Prudente. Con el propósito de analizar las modificaciones, que ocurrieron en el tiempo, insertando nuevas estrategias de organización en el Sistema Cooperativista de los Asentados (SCA) del Movimiento de los Trabajadores Sin Tierra (MST). Los asentamientos rurales surgen como resultados de la lucha de los movimientos socioterritoriales por la tierra y la reforma agraria, según lo presentado en el tópico anterior. Este es el tipo de reforma agraria existente en el país, la implantación de asentamientos rurales mediante la presión popular. La construcción de cooperativas surge en los asentamientos rurales objetivando la permanencia en la tierra, pues después de la conquista de la tierra, las familias asentadas necesitan permanecer y reproducir sus modos de vida, buscando ascensión social y emancipación económica, el campesinado pasa entonces a articular sus producciones en cooperativas. Este factor, es impulsado por el MST, que orienta a las familias asentadas, con estrategias de producción, y esas estrategias de producción y de organización se modifican con el paso de los años, posibilitando diferentes experiencias a las familias rurales.
Palabras clave: Cooperativismo - Asentamientos Rurales - Reforma Agraria - Campesinos
Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:
Karin Gabriel Moreno de Souza (2017): “Os processos de modificações no sistema Cooperativista dos Assentados (SCA) do MST”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (agosto 2017). En línea:
https://www.eumed.net/rev/caribe/2017/08/sistema-cooperativista-assentados.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/caribe1708sistema-cooperativista-assentados
Este trabalho tem como objetivo compreender o cooperativismo do MST, buscando analisar construção e atuação das estratégias pressupostas no SCA (Sistema Cooperativista dos Assentados), observando aspectos da estrutura, funcionamentos e organização das atividades nas cooperativas, analisando como são as estratégias de organização rural das famílias assentadas pelo processo de Reforma Agrária e que fazem parte do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra). Nos estudos analisamos as estratégias que são utilizadas pelas famílias assentadas, que inserem seus produtos na formação de agroindústrias, buscando contribuir com a construção do desenvolvimento territorial dos assentamentos em que as cooperativas e a agroindústrias estão atuando, compreendendo a reprodução do campesinato nos assentamentos, observando fundamentalmente a organização territorial no campo. Nós utilizaremos da ciência geográfica em conformidade com os resultados da pesquisa de monografia, para compreender, investigar, identificar e descrever, as atualidades e conflitualidades da Questão Agrária e do cotidiano camponês.
O referencial teórico desta pesquisa é o Paradigma da Questão Agrária (PQA), que compreende a questão agrária como um problema estrutural desencadeado pelo desenvolvimento desigual e contraditório do capitalismo na agricultura (FERNANDES, 2008; FELICIANO, 2009; OLIVEIRA, 2002). Sendo um problema estrutural, a questão agrária só pode ser resolvida mediante a construção de outra sociedade, mais equânime. O desenvolvimento do modo de produção capitalista na agricultura produz relações de produção capitalistas, como o trabalho assalariado, e, contraditoriamente, relações de produção não capitalistas, como o trabalho familiar (OLIVEIRA, 2002). O campesinato também é (re)criado por meio da ocupação da terra (FERNANDES, 2008). Assim, o camponês pode ser (re)criado pela compra, arrendamento ou ocupação da terra (FERNANDES, 2008). Após o acesso a terra, os camponeses se reproduzem subordinando-se ao capital (MARTINS, 1995) ou construindo alternativas aos impérios agroalimentares (PLOEG, 2008).
O processo de formação do campesinato remonta à gênese da história da humanidade (FERNANDES, 1999). Essa leitura histórica é importante para a compreensão da lógica da persistência do campesinato em diferentes tipos de sociedades. Dessa forma, a existência do campesinato nas sociedades escravocrata, feudal, capitalista e socialista é um referencial para entendermos o sentido da sua existência. A coexistência e a participação do campesinato nesses diferentes tipos de sistemas sociais, políticos e econômicos e a sua constância quando do fim ou crise dessas sociedades demonstram que a sua persistência precisa ser considerada como uma qualidade intrínseca dessa forma de organização social.
O camponês é um modo de produção não capitalista (CHAYANOV, 1974) e uma classe social que se opõe aos capitalistas-latifundiários (CARVALHO, 2012). Enquanto o objetivo do capitalista-latifundiário é a reprodução ampliada do capital, o intuito do camponês é a reprodução social da família. O princípio básico da unidade camponesa é a satisfação das necessidades da família e não a obtenção de uma taxa média de lucro. A importância do produto do trabalho camponês é determinada pela dimensão e composição da família, ou seja, pelo número de pessoas da família capazes de trabalhar e pelo seu grau de autoexploração. Esse último é determinado pelo equilíbrio entre a satisfação da família e a penosidade do trabalho.
O camponês é compreendido por sua base familiar, pelo trabalho da família na sua própria terra ou na alheia. A base familiar é uma das principais referências para delimitar o conceito de campesinato. Em toda a sua existência essa base foi mantida e é característica fundamental para compreendê-lo. O trabalho familiar é, muitas vezes, articulado a outras relações de trabalho no âmbito da unidade camponesa, como a ajuda mútua, a parceria e, quando necessário, o trabalho assalariado (OLIVEIRA, 2002). Esse conjunto de relações é sempre estabelecido a partir da hegemonia do trabalho familiar na unidade de produção e consumo. No Brasil, a luta pela terra faz parte do processo de formação do campesinato que, desde a sua origem, é (re)criado ocupando terras ou resistindo à expropriação (FERNANDES, 1999). O campesinato é, portanto, (re)criado tanto no bojo do desenvolvimento desigual e contraditório do capitalismo como na luta pelo acesso a terra de trabalho. Ao ocupar terras, os camponeses sem-terra organizados em movimentos socioterritoriais possibilitam a sua (re)criação através da conquista de assentamentos rurais.
De acordo com Bergamasco (2003), os assentamentos rurais, espaços divididos em lotes onde os camponeses sem-terra passam a residir, permitem a reprodução de modos de vida fundamentados no trabalho familiar e, em alguns casos, coletivo, e, ainda, a continuidade da luta pela terra. A democratização do acesso a terra é relevante para o desenvolvimento rural, pois segundo Bergamasco (2003), contribui com a melhoria da qualidade de vida dos camponeses assentados, além do aumento da oferta de alimentos. Ademais, os territórios camponeses propõem a construção de outro modelo de desenvolvimento da agricultura, baseado na agroecologia e soberania alimentar.
Segundo Ribas (2002), as experiências produtivas que ocorrem nos assentamentos rurais estão voltadas para a reprodução do modo de vida camponês, levando-se em consideração a convivência harmônica com o meio ambiente e a produção de alimentos.
De acordo com Mazzini (2007), a política de assentamentos rurais gera impactos no desenvolvimento regional, pois os assentamentos rurais são produtores de novas feições e organizações espaciais em substituição ao latifúndio e de contraposição ao agronegócio. A política de assentamentos rurais foi colocada na agenda do Estado a partir da pressão dos movimentos socioterritoriais, dos conflitos e enfrentamentos protagonizados pelos sem-terra.
Os assentamentos rurais, independente da vontade do poder público, materializam-se como territórios de luta pela/na terra, sendo inegável os benefícios que a inserção dos assentamentos tem proporcionado no desenvolvimento regional, em diversas áreas do país, tanto no campo, como na cidade, melhorando a qualidade de vida das famílias assentadas e tornando-se exemplo de luta para tantas outras famílias despossuídas. É preciso destacar, de acordo com Bergamasco (2003), os assentamentos rurais também são carentes de infra-estrutura, em algumas localidades, existe falta de coleta de lixo, falta de saneamento básico, além de muitas vezes, faltar transporte coletivo, para os jovens irem frequentar as escolas, ou seja, ainda que os assentamentos representem um aporte para o desenvolvimento regional, existe a necessidade de políticas emancipatórias para o desenvolvimento das famílias assentadas, que muitas vezes, continuam excluídas, mesmo após a conquista da terra.
É no processo de luta pela terra, reforma agrária e desenvolvimento dos assentamentos rurais que outras lutas vão sendo forjadas pelos camponeses, sobretudo aqueles organizados em movimentos socioterritoriais como o MST. A luta dos camponeses pela organização da produção de alimentos através de cooperativas agropecuárias, cooperativas de prestação de serviços e cooperativas de crédito agrícola se faz parte desse contexto (FABRINI, 2007). A luta pela terra se desdobra, necessariamente, na luta pela viabilização econômica dos assentamentos rurais (RIBAS, 2002). De acordo com Fernandes (1999), a construção do cooperativismo nos assentamentos rurais organizados pelo MST é resultado do multidimensionamento da luta pela terra e reforma agrária.
Logo, essas lutas se desdobram em outras, como as lutas por moradias, infraestrutura, educação, saúde, produção, processamento, comercialização, entre outras. Nesse sentido, o associativismo e o cooperativismo nos assentamentos rurais se inserem nas estratégias camponesas de construção da autonomia e emancipação no cultivo, no processamento e na comercialização de alimentos, normalmente, agroecológicos, fortalecendo as lutas dos camponeses contra o modelo de desenvolvimento da agricultura hegemônico, o agronegócio, que desterritorializa, subordina e marginaliza os camponeses. Uma das soluções encontradas pelos membros do MST para resolver os problemas em relação à produção é desenvolver formas de cooperação que permitam aos agricultores assentados superarem em conjunto as dificuldades que recaem sobre eles quando atuam isoladamente. Para o movimento, através do trabalho em conjunto os assentados podem encontrar formas de adquiri equipamentos, tecnologias, assim como comercializar os seus produtos com preços mais favoráveis, evitando a pauperização dos camponeses (FABRINI, 2007). O cooperativismo é exercido como parte integrante da luta pela permanência na terra e da luta pela conquista da terra.
2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Os procedimentos metodológicos utilizados para a análise do SCA, assim como da sua estrutura organizativa, foram levantametos bibliograficos analisaes de dados levantados pelos técnicos do MST durante o evento “Escola de Inverno - Extensión, Integralidad y Desarrollo en Territorios Campesinos” sobre a organização dos lotes das famílias interessadas em produzir alimentos para as cooperativas. Os procedimentos metodológicos são fundamentais para as análises científicas e podem ser entendidos como um conjunto de técnicas que permitem ao pesquisador interagir com o seu objeto de estudo de diferentes formas, dependendo dos objetivos da pesquisa.
As estratégias metodológicas utilizados no desenvolvimento desta pesquisa, propõe a análise das práticas organizativas de um grupo social no interior da sociedade capitalista, os camponeses rurais. Em função disso, a pesquisa parte do reconhecimento da luta de classes e, portanto, da conflitualidade presente nas relações sociais. Nesse sentido, procuraremos primar pela perspectiva crítica.
Umas das atividades iniciais desse estudo é o levantamento bibliográfico, pelo qual realiza-se a busca de publicações e trabalhos acadêmicos, que possam contribuir no desenvolvimento da pesquisa. Compõem também esta etapa, o levantamento de dados secundários, nos institutos e órgãos oficiais, bem como o de fontes históricas nos lugares de memória das cidades (como bibliotecas e arquivos históricos).
Além da pesquisa documental, realizamos trabalhos de campo, buscando analisar o surgimento e estrutura organizativa de cooperativas, assim como a construção de agroindústrias. Os primeiros trabalhos de campo foram realizados no decorrer do evento “Escola de Inverno - Extensión, Integralidad y Desarrollo en Territorios Campesinos”, organizado pelo NERA e FCT/UNESP. Outros trabalhos de campo foram realizados nos meses de Janeiro e Fevereiro de 2017, no qual dialogamos com os coordenadores de cooperativas e membros do MST envolvidos na construção de agroindústrias. Também participamos das reuniões entre os membros do MST, e representantes do poder público, para a discussão e elaboração da gestão e logísticas de agroindústrias. Nessas reuniões, discutimos quem são os assentados que produzem para a agroindústrias e as formas de proução que realizam, se a produção é agroecológica ou convencional, qual é geralmente a produção inicial de agroindústrias (produtos e quantidade) e quais são os canais de comercialização (Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), feiras e cestas agroecológicas).
3. ANALISE DAS EXPERIÊNCIAS COOPERATIVISTAS NA DÉCADADA DE 1990
A ocupação da terra é por si só uma experiência de cooperação em que os sem-terra, coletivamente, organizaram-se e lutaram pelo acesso a terra. A discussão sobre o cooperativismo propriamente dito no âmbito do MST surge apenas com a conquista dos primeiros assentamentos rurais, a partir do desafio de viabilizar a produção agropecuária. Fundado oficialmente em 1984, o MST possui assentados e militantes em diversas regiões do país. São sem-terras que lutam pelo acesso a terra e assentados que lutam para permanecer nos lotes após a conquista dos assentamentos rurais. Neste capítulo expomos uma das estratégias de organização da produção agropecuária, o cooperativismo.
De acordo com Fernandes (1999), entre 1985 e 1989 surgem os primeiros grupos de associações nos assentamentos rurais. As atividades se baseavam em elaborar planos de trabalho em conjunto, coletivamente, sobretudo através de mutirões. Nesse período, havia certa restrição ao termo cooperativismo, porque logo se pensava em cooperativas tradicionais, que por lei eram vinculadas aos ditames e restrições do INCRA.
O MST compreende que as cooperativas de assentados são diferentes das cooperativas tradicionais. No quadro abaixo são apresentadas essas diferenças:
A partir de 1990, a questão da produção agropecuária começa a ficar mais preocupante para o MST, visto que mesmo com o aumento do número de assentamentos rurais, a fome a e miséria no campo não diminuíam. De acordo com os escritos, de (MORAIS, 1986), é possivel analisar que em 1985, a ideia de cooperativismo entre os assentados do MST, se baseava basicamente em:
● Fazer a limpa da planta dos assentamentos, atuando em coletivo;
● Lavrar e plantar em conjunto, essa é uma estratégia nacional do MST, sempre reapresentada em congressos do movimento;
● Realizar a aquisição de um trator em conjunto, para lavrar as terras individuais;
● Construir um galpão em conjunto, para guardar sementes, produtos e adubos;
● Fazer empréstimo rural, em conjunto no banco, em um só contrato, facilitando a forma de pagamento; ● Comercializar a produção em conjunto para pegar o melhor preço;
● Comprar mercadorias em conjunto, para conseguir pagar mais barato;
Entre as principais ideias que marcaram a orientação política do MST sobre o cooperativismo no início dos anos 1990 se destacam: passar da produção de subsistência para a produção de mercadorias, o que significa acúmulo de capital para investimentos em agroindústrias, e estabelecer uma fase de transição entre o camponês-artesão e o operário, transformando a consciência camponesa em consciência operária (RIBAS, 2002).
É nesse período também que nos cadernos de formação do MST aparecem as diretrizes para a constituição de uma cooperativa, salientando os instrumentos jurídicos, econômicos e estratégias de tal processo. No quadro 2, podemos observar os tipos de cooperação agrícola existente nos assentamentos rurais de acordo com o MST.
A partir de 1994, o MST elabora o caderno de formação “Cooperação agrícola nos assentamentos”, no qual explica o cooperativismo, a sua importância e como pode ser implementado, incentivando ações coletivas. Após o ano de 1995, segundo Fernandes (1999), surgem as ideias de construir Cooperativas de Crédito, por que as associações anteriores não estavam conseguindo avançar sem ter acesso ao crédito. Depois apareceram as experiências de Cooperativas de Comercialização e, em seguida, de Cooperativas de Produção. Já em 1997, o MST passa a explicar em seus cadernos de formação questões sobre como ampliar o capital Constante e o capital Variável. Esses termos são utilizados por Karl Marx no seu livro “O Capital”. O capital constante é a parte do capital que se transforma em matérias primas, em matérias auxiliares, isto é, em meios de produção. Já o capital variável correspondente à parte do capital que é empregada no pagamento de salários, que tem seu valor aumentado no processo de produção.
Capital constante são máquinas, insumos industrializados, são frutos dos dias de
trabalho acumulados. O capital variável é o trabalho vivo, incorporado ao processo produtivo, para produzir uma nova mercadoria (MARX, 1889, p. 229)
Dessa forma, o grande trunfo do cooperativismo do MST no ano de 1997 é elaborar estratégias de compra de mais maquinários, de acordo com o “Documento Histórico. Caderno de Formação do MST. BRASIL; Movimento Sem Terra; N 09”, uma forte estratégia é agir juntando as pequenas sobras das vendas de produtos agrícolas, e aderir as questões práticas, propostas pelo movimento socioterritorial: a) aumentar a produtividade do trabalho, em uma pequena propriedade rural, o trabalhador faz todas as partes do trabalho, desde a lavração, a colheita e a venda dos produtos. No cooperativismo, cada trabalhador faz apenas uma parte do trabalho, sendo um tratorista, outro cuida da conservação das máquinas, outro fica responsável pelas vendas e assim por diante; b) ampliar a divisão e especialização do trabalho; c) racionalizar a produção de acordo com os recursos naturais disponíveis; d) conseguir melhores preços para os produtos no mercado; e) construir agroindústria;
Através dessas experiências o MST conseguiu formular uma proposta geral de Cooperação Agrícola, criando um Sistema Cooperativista dos Assentados (SCA).
O SCA é o setor que cuida dos assuntos de produção, comercialização e formação de agroindústrias, e está vinculado a Confederação da Cooperativas de Reforma Agrária no Brasil (CONCRAB), fundada em 1992.
Segundo Fernandes (1999), o cooperativismo adotado pelo MST estava associado a construção de uma estrutura política e organizacional pautada em objetivos que assegurassem a minimização da pobreza no campo, através do desenvolvimento das relações de trabalho superiores àquelas tradicionalmente constituídas. Para alcançar esse patamar, o Movimento organizou, a partir de seu Setor de Produção, o Sistema Cooperativista dos Assentados, 56 denominado SCA, responsável pela organização da produção, por meio da implantação de cooperativas
O plano da produção é unificado e todos os participantes trabalham de forma coletiva. A cooperação funciona como uma empresa, procurando desenvolver a produção, a comercialização e a industrialização dos produtos. A divisão social do trabalho se dá através de especializações (CONCRAB, 1996, p. 06).
O cooperativismo evolui no processo de luta pela terra, e em análises de campo, entrevistas, é possível notar que a participação dos assentados nos congressos nacionais do movimento possibilita a geração de novos conhecimentos para serem inseridos nas experiências de cooperativismo.
Uma das mudanças no cooperativismo do MST, é a inserção do debate sobre agroecologia, sobretudo a paritr dos anos 2000, embora a transição à agroecologia seja um elemento novo na questão do cooperativismo, a estrutura pensada pelos membros do MST, é a mesma das décadas de 1980 e 1990, se mantém a estrutura de tentativa de coletivização da produção, como é destacado nas reuniões realizadas pela diretoria da COCAPAR e exposto nas entrevistas realizadas em nossas pesquisas, o modelo de gestão das cooperativas é o socialista. Embora existam mudanças, a estrutura pensada para as cooperativas do MST, é a mesma desde a década de 1980 e 1990.
A experiência de trabalhar em conjunto é uma das formas mais complexas de cooperação que vem sendo praticada pelo MST. Essa forma organizativa exige bastante dos assentados. Conforme expõe Fabrini (2007), as propostas de constituição de cooperativas do MST estão inseridas num contexto de luta dos trabalhadores do campo. Nos assentamentos rurais, as cooperativas surgiram num contexto de resistência e luta contra o poder do grande capital e do latifúndio.
Apesar do incentivo à criação de cooperativas agropecuárias nos assentamentos, muitas experiências não foram exitosas, razão pela qual o movimento passou a repensar essa proposta de organização, principalmente a modalidade de coletivos. De qualquer maneira a incessante busca do desenvolvimento dos assentamentos rurais, tornando-os viáveis do ponto de vista socioeconômico, tem trazido à tona discussões relevantes, renovando a ideia de que uma simples política de distribuição de terras não basta.
4. A PRODUÇÃO, COOPERAÇÃO E MEIO AMBIENTE
Uma das principais contribuições dos assentados à sociedade brasileira é a produção de alimentos. No caso dos assentamentos organizados pelo MST a estruturação da produção agrícola ocorre a partir de associações, cooperativas e agroindústrias que visam desenvolver a cooperação, solidariedade e ajuda mútua entre os assentados. Melhorando, assim, as condições de renda e de trabalhos dos assentados.
A construção de cooperativas é difícil diante da diversidade econômica e social do campesinato no país. Esse fator, assim como a ofensiva governamental contrária às ações do MST, desencadeou, em alguns locais, o esgotamento do modelo cooperativista. É nesse contexto que novas estratégias vão sendo estruturadas. Uma delas é a aproximação do MST com a questão da sustentabilidade através de práticas agroecológicas. Desse modo, “a luta por Reforma Agrária deve caminhar junto com a luta em defesa da natureza, da água, da biodiversidade e da produção de alimentos baratos e livres de agrotóxicos e transgênicos para a população” (MARTINS, 1995). Assim, a partir dos anos 2000, algumas perspectivas foram inseridas na concepção de cooperativismo do MST.
Todavia, o seu objetivo principal que é a organização da produção agrícola buscando a emancipação socioeconômica dos assentados é o mesmo. Uma mudança importante é a questão da agroecologia. Os assentados, organizados em cooperativas ou não, estão optando pela produção de alimentos em consonância com o meio ambiente, uma prática que possibilita a melhora da qualidade de vida dos assentados, consolidando-se enquanto uma forma de resistência ao modelo do agronegócio baseado no monocultivo em grandes extensões de terras, na destruição da natureza e na exploração do trabalho.
As cooperativas têm um papel importante na transição agroecológica nos assentamentos rurais, pois está, cada vez mais, dedicando-se à expansão da produção de alimentos agroecológicos. A agroecologia é uma forma de produzir que não é nociva ao meio ambiente ou a saúde humana, por isso os assentados se orgulham de praticar esse tipo de agricultura que se aproxima da natureza e se distancia do agronegócio, das sementes transgênicas e dos agrotóxicos.
A transição agroecológica em curso tem sido concebida como um processo lento e gradual, que deve ser avaliado e melhorado constantemente para que os projetos de desenvolvimento dos assentamentos rurais estejam articulados com as necessidades construídas localmente. As estratégias cooperativistas são regionais, funcionam de diferentes formas, de acordo com as estruturas regionais de cada localidade, mas seguindo a mesma lógica: a de preservação ecológica, buscando estar sempre de acordo com as diretrizes nacionais do movimento. Outro elemento importante, mas não recente, é a participação da mulher e dos jovens no cooperativismo.
Embora essa discussão seja antiga no MST, atualmente ela tem sido cada vez mais enfatizada, sendo um dos principais enfoques nos assentamentos rurais. Assim, de acordo com o “Caderno de Formação: Experiências Históricas da Cooperação Nº 02 – O Cooperativismo no pensamento Marxista em 1995”, o MST tem enfatizado os seguintes pontos na organização da produção agricola nos assentamentos rurais: a) Participação da Mulher de forma ampla. B) Inserção do jovens nas tomadas de decisões; c) Comercialização em feiras livres e por encomendas. d) Cursos preparatórios e também de formação técnica. e) Processamento dos produtos. f) Produção de alimentos sem o uso de agrotóxicos. g) Emancipação financeira das famílias envolvidas.
Dados do MST de 2015, disponíveis no endereço eletrônico www.mst.org.br, apontam que o Movimento Sem Terra está organizado em 24 estados nas cinco regiões do país, reunindo milhares famílias que por meio da organização e da luta conquistaram diversas áres de terra. Essas famílias depois de assentadas ainda permanecem organizadas no MST como estratégia para consolidar o movimento e avançar na conquista de direitos básicos, benfeitorias nas terras, saneamento, energia elétrica, acesso à cultura e lazer.
É necessário destacar também, as avaliações existentes à concecpção de cooperativismo do MST, de acordo com FABRINI (2007), nas últimas décadas, esse movimento tem modificado radicalmente o seu discurso ao modo de produção que deve ser adotado pelos agricultores em seus assentamentos, migrando de um discurso com forte viés produtivista, para outro mais aderente à visão agroecológica e ambientalista, passando a incorporar ao centro de seu ideário conceitos como o de respeito e resgate da agricultura camponesa, bem como as diretrizes da agroecologia.
O que podemos concluir neste capitúlo da pesquisa, é que as estratégias de cooperativismo estão estruturadas ou se estruturando de forma qualitativa, pois cada vez menos necessitam de recursos de fora, buscando autônomia das famílias que participam do processo de luta pela terra, não dependendo somente de financiamentos do governo, e os cooperados vem gerando renda suficiente para a sua subsistência e de suas famílias, além da renda excedente que reinvestem na própria cooperativa, nos assentamentos rurais ou na qualidade de vida das famílias camponesas.
Contudo, esse aspecto não elimina as dificuldades, desafios, e défictis existentes nas construções das experiências cooperativistas, que possuem também defeitos, como por exemplo, falhas organizacionais, erros de logisticas, falta de infra-estrutura, questões que ainda necessitam serem desenvolvidas.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo objetivou analisar as estruturas de cooperativismo e os objetivos de comercialização e de Reforma Agrária do MST. Especificamente, analisamos o processo de modificações, as evoluções e a delimitação das estratégias de ações coletivas. Ao longo do trabalho, descrevemos também a organização do MST e as articulações centrais de cooperativismo. Para tanto, utilizamos os métodos qualitativo e quantitivo, analisando documentos e realizando a observação de dados.
O modelo de cooperativismo adotado pelo MST é o de cooperativas de comercialização e, por isso, está próximo ao modelo de cooperativas de compras e vendas proposto por Singer (2002). Como foi possivél observar, os principais benefícios do cooperativismo são, industrialização dos produtos, comercialização dos produtos, projetos de fi nanciamento e aluguel de máquinas agrícolas.
O que trazemos aqui é uma discussão sobre as relações de produção entre famílias assentadas, base fundamental para a compreensão a cerca da Reforma Agrária. Ao investigar os fatos históricos, as técnicas de comercialização e produção, e as maneiras como elas são utilizadas, é possível contribuir na qualificação das estratégias cooperativistas, no uso realizados pelos assentados, na melhor adaptação as adversidades produtivas, também contribui na criação de diferentes recursos para influênciar desenvolvimento na vida das famílias em assentamentos rurais, colaborado no desenvolvimento do trabalho de organização e também inserindo um novo estudo, que poderá ser utilizado como referência nas análises sobre luta pela terra.
As constatações a cerca das dificuldades de reprodução dos pequenos agricultores no Brasil e a existência de uma grande massa populacional de excluídos do campo, conhecidos como 'sem-terras', norteou o interesse da presente pesquisa.
Considera-se, como identificamos no trabalho, o grande objetivo do cooperativismo é auxiliar na construção de uma sociedade mais igualitária e se contrapor ao sistema de exclusão social imposta aos pequenos agricultores. Como a opção ideológica do grupo são ações coletivas, há um projeto de organização produtiva, estruturada dentro do próprio sistema de produção, embora com relações de trabalho diferentes, ou seja, uma organização que não é individualista, no sentido das formas de execer a mão de obra, que são organizadas coletivamente a partir dos métodos pressupostos pelo MST.
Por fim, é preciso destacar que o debate sobre cooperativismo mostra a importância da produção coletiva entre camponeses no espaço agrário. A Geografia e o estudo da questão agrária trocam contribuições em um contexto dialético, partindo do fato de que, em um dado momento, a ciência, as técnicas emergem como produtoras da história sobre a luta pela terra, e posteriormente se tornam produto do mesmo. Os estudos que investigão os modos de reprodução da vida nos ambientes rurais, exercem papel no processo de produção da ciência, através do desenvolvimento de pesquisas científicas, que posteriormente podem resultar em políticas públicas relacionadas ao desenvolvimento territorial.
Dessa forma, buscamos contribuir com a compreensão das práticas organizativas nos assentamentos rurais, visando um melhor entendimento sobre o ordenamento territorial nesses territórios que possuem a inserção do campesinato, utilizando-se da ciência geográfica e das investigações sociais, explicitando as formas de organização nos espaços rurais.
REFERÊNCIAS
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