Revista: Caribeña de Ciencias Sociales
ISSN: 2254-7630


DIMENSÕES TÉCNICAS E HUMANAS NA SUSTENTABILIDADE DA PESCA DO CAMARÃO DA AMAZÔNIA

Autores e infomación del artículo

Renan Albuquerque Rodrigues*

Tomaz Lima Gualberto**

Francisco Alcicley Vasconcelos Andrade***

Universidade Federal do Amazonas, Brasil

falcicley@gmail.com

RESUMO

Na Amazônia, camarões da espécie M. amazonicum se destacam pela grande quantidade em ambientes de várzea e alta aceitação em mercados. Devido abundância e distribuição geográfica, apresentam potencial biológico e são a única nativa explorada comercialmente pelo setor da pesca artesanal (ODINETZ- COLLART, 1987). Na comunidade de São Sebastião da Brasília, zona rural de Parintins, o camarão destaca-se como um dos principais recursos explorados no estuário amazônico, embora a importância seja baseada na economia extrativista, necessitando de estudos que subsidiem o manejo racional (VIEIRA, 2003; FREIRE et al., 2012). O estudo pretendeu i) estudar a viabilidade da criação em cativeiro do crustáceo, tomando-o enquanto possível atividade manejada que ofereça renda fixa a pescadores locais e incida positivamente sobre dimensões sociais; e ii) sugerir contribuições aos pescadores de S. S. de Brasília no tocante a informações que possam subsidiar o manejo sustentável desse recurso natural, de forma que minimize a predação. No estudo, pode-se notar que: i) implicações da testagem no âmbito da conjuntura social proporcionaram entendimento de que períodos mais distribuídos para a conservação de unidades, em função da composição em tanques-viveiro, geram rendimentos adicionais a longo prazo a comunitárias; ii) geram ainda inserção de mais pessoas na atividade, dada a característica do acondicionamento de camarões, facilitando a entrada de mais pessoas no mercado de trabalho; e iii) de igual modo, também estimulam a comunidade a ter mais horas de folga para atividades tradicionais de transmissão de conhecimentos nativos relacionados à pesca.

PALAVRAS-CHAVE: Amazônia; Pesca; Camarão; Sustentabilidade.

RESUMEN
En la Amazonía, las especies de camarón M. amazonicum por mucho en los ambientes de tierras bajas y de alta aceptación en los mercados. Debido a la abundancia y distribución geográfica, potencial biológico presentes y son nativos solamente explotados comercialmente por el sector de la pesca artesanal (ODINETZ- Collart, 1987). En la comunidad de San Sebastián de Brasilia, Parintins rurales, camarones se destaca como uno de los principales recursos utilizados en la desembocadura del Amazonas, a pesar de la importancia que se basa en la economía extractiva, lo que requiere estudios que apoyan la gestión racional (Vieira, 2003; FREIRE et al., 2012). El estudio tuvo como objetivo i) estudiar la viabilidad de la cría en cautividad de crustáceos, tomándolo como una posible actividad administrada que ofrece la renta fija a los pescadores locales y se relaciona positivamente en las dimensiones sociales; y ii) proponer contribuciones a los pescadores de San S. Brasilia con respecto a la información que puede apoyar la gestión sostenible de este recurso natural, con el fin de minimizar la depredación. En el estudio, se puede observar que: i) las implicaciones de pruebas en el entorno social siempre entendiendo que la periodicidad de las áreas protegidas más distribuido, de acuerdo a la composición en estanques de cría, generan ingresos adicionales a largo plazo de la Comunidad; ii) generar aún más personas de inserción en la actividad, dado el carácter de los envases de camarón, lo que facilita la entrada de más personas en el mercado laboral; y iii) de la misma manera también estimular a la comunidad para tener más tiempo libre para actividades tradicionales de transmisión de conocimientos indígenas relacionados con la pesca.
PALABRAS CLAVE: Amazonia; Pesca; Camarones; Sostenibilidad.

Para citar este artículo puede utilizar el siguiente formato:

Renan Albuquerque Rodrigues, Tomaz Lima Gualberto y Francisco Alcicley Vasconcelos Andrade (2017): “Dimensões Técnicas e Humanas na Sustentabilidade da Pesca do Camarão da Amazônia”, Revista Caribeña de Ciencias Sociales (mayo 2017). En línea:
https://www.eumed.net/rev/caribe/2017/05/pesca-camarao-amazonia.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/caribe1705pesca-camarao-amazonia


Introdução

O camarão de água doce Macrobrachium amazonicum (HELLER, 1862), o camarão da Amazônia, da espécie da família Palaemonidae, é encontrado em ampla ocorrência em lagos e rios da Amazônia Central (CHAVES e MAGALHAES, 1993). Além de sua diversidade e importância ecológica como componente da macrofauna bentônica de rios e lagos, esse camarão tem despertado interesse econômico por possuir potencial de produção e comercialização e representar uma possibilidade de renda sustentável no contexto da carcinicultura de água doce (VALENTI, 2002; SAMPAIO et al., 2009).
Na Amazônia, camarões da espécie M. amazonicum se destacam pela grande quantidade em ambientes de várzea e alta aceitação em mercados. Devido abundância e distribuição geográfica, apresentam potencial biológico e são a única nativa explorada comercialmente pelo setor da pesca artesanal (ODINETZ- COLLART, 1987). Na mesorregião do Baixo Amazonas, a leste de Manaus, divisa com o Estado do Pará, a espécie é importante para comunidades ribeirinhas como fonte proteica e econômica. Além do consumo no âmbito familiar, o M. amazonicum tem sido comercializado em centros urbanos próximos a comunidades rurais. Na comunidade de São Sebastião da Brasília, zona rural de Parintins, o camarão destaca-se como um dos principais recursos explorados no estuário amazônico, embora a importância seja baseada na economia extrativista, necessitando de estudos que subsidiem o manejo racional (VIEIRA, 2003; FREIRE et al., 2012).
Considerando o disposto e procurando ponderar sobre a pesca do camarão na região, o estudo pretendeu i) estudar a viabilidade da criação em cativeiro do crustáceo, tomando-o enquanto possível atividade manejada que ofereça renda fixa a pescadores locais e incida positivamente sobre dimensões sociais; e ii) sugerir contribuições aos pescadores de S. S. de Brasília no tocante a informações que possam subsidiar o manejo sustentável desse recurso natural, de forma que minimize a predação.

            Revisão de literatura
            A produção sustentável é uma necessidade global. No que tange à Amazônia, há muito o que ser debatido acerca de projetos e programas que se justifiquem pela sustentabilidade, ou seja, que gerem emprego e renda a povos locais sem alterar seus modos de vida (REIS, 1968). Para a região, o resultado de imbricados processos de produção nos séculos XIX e XX foi a não concretização de um desenvolvimento que pudesse enfatizar a pessoa, a produção social e as gerações futuras. Com isso, o domínio sobre saberes que interessassem a amazônidas como um todo escassearam, sobretudo até antes da abertura democrática, em 1985.
A partir do período, a ideia de produção sustentável passou a vigorar de maneira popular, mas ainda não com adesões eficazes. Somente em 2007, a partir do 4º Relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), governos nacionais e locais passaram a ser um tanto mais instigados pela academia e por conjunturas políticas a fomentarem iniciativas socioecológicas e produzirem para mercados de acordo com normas de sustentabilidade. A ação fez aumentou a quantidade de atos condizentes à realidade do bioma, mas não sem conflitos em decorrência da abertura à mercantilização da natureza.
Os conflitos até hoje ocorrem, tanto porque existem complexidades e diversidades tamanhas referentes a modos de produção e vida de povos amazônicos, e em grande parte dos casos existe a necessidade de se especificar detalhadamente a cada cadeia produtiva local e se planejar estratégias diferenciadas. Outrossim, as dimensões humanas dessa questão dizem respeito ao conjunto de atividades caracterizam modos de vida de sociedades, tradicionais ou não tradicionais, as quais vivem em áreas onde são sentidas fisicamente mudanças no uso do solo ou alterações na biodiversidade em função de processos técnico-produtivos. Nesse contexto, trata-se de uma conjuntura que pode induzir a impactos em nível de crenças, atitudes, valores e ideologias.
Ainda no tocante às dimensões humanas em destaque, foram considerados no levantamento aspectos afetivos, emocionais e de valor; e ainda relações sociais articuladas de maneira complexa e não conectadas apenas entre si, mas necessariamente tecidas em contexto e elementos da técnica e da experiência, bem como do conhecimento e em razão da compreensão do ser humano na sua inteireza. Os aspectos humanos desenvolvidos, portanto, durante o processo de maturação (biológico) e socialização (cultura), constituem-se como cenários plurais nomeados como sociais, políticos, emocionais, biológicos e culturais.
 
            Metodologia
            Abordagem experimental (dimensões técnicas)
            Sobre a viabilidade da criação em cativeiro do crustáceo, foram realizados testes no Laboratório de Aquicultura do Instituto de Ciências Sociais, Educação e Zootecnia da Universidade Federal do Amazonas (ICSEZ/Ufam), em Parintins, município a extremo leste de Manaus/AM. Camarões foram adquiridos vivos de pescadores da comunidade de São Sebastião da Brasília, margem esquerda do Rio Amazonas, próxima à sede do município de Parintins/AM. O experimento teve duração de quatro meses, de setembro a dezembro de 2015.
            Espécimes foram transportadas até o laboratório em caixas térmicas de isopor com sistema de aeração portátil. Após o transporte, foi feita aclimatação em caixa circular de PVC com capacidade para 150 litros. Foram selecionados machos e fêmeas para o experimento. A alimentação dos camarões foi realizada com ração comercial peletizada para peixes com 34% de PB (proteína bruta). Foram utilizados cinco aquários de fibra de vidro de 40L, com volume útil de 35L. Em cada aquário foram colocados um macho e uma fêmea não ovígera, ambos de tamanhos aproximados. Os indivíduos foram observados diariamente até ocorrer a primeira reprodução.
            A relação entre fertilidade e comprimento total da fêmea foi analisada por regressão linear simples, na qual se adotou o comprimento total como variável independente e o número de larvas como variável dependente. As análises foram realizadas pelo software BioEstat 5.0 e apontaram que a viabilidade de produção do crustáceo em cativeiro é positiva, considerando que o período de incubação dos ovos varia em média 14 a 15 dias, sendo que o intervalo médio entre uma reprodução e outra varia de 3 a 5 dias e fertilidade absoluta foi 400 e 1835 larvas nascidas por fêmea.
           
            Abordagem inferencial (dimensões humanas)
O universo abordado no diálogo do experimento de Ciências Agrárias com a intencionalidade das Ciências Humanas – no que tange às dimensões socioculturais e econômicas do estudo, dentro de uma perspectiva interdisciplinar – foi, igualmente, situado em Parintins. Foram entrevistados comunitários de São Sebastião da Brasília, no intuito de serem coletadas informações referentes à prática artesanal de criação de camarões.
            Foram realizadas entrevistas semiestruturadas, de campo, em uma investigação de contexto social, juntamente às pescadores artesanais de São Sebastião. Dados históricos referentes à consolidação, em escada familiar, da pesca do crustáceo, foram requisitados a partir da interação com elas. As respostas das participantes apontaram que a atividade sempre foi realizada por mulheres, tendo em vista a intenção delas em obter renda e manter a alimentação doméstica.
            Não há registros oficiais de quando se iniciou o trabalho das camaroeiras de S. S. de Brasília. Por ser atividade considerada tradicional (ALENCAR, 1993), estima-se que mesmo antes da consolidação legal da comunidade a pesca ocorria entre mulheres, tendo sido desde os anos 2000 estudada de modo funcional, em razão da implantação de três centros universitários na cidade de Parintins: Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e Instituto Federal de Educação Tecnológica (Ifam).
           
Resultados e discussão
Tempo de reprodução, fertilidade e controvérsias sobre a atividade
Considerando os dados hard, foram notadas possibilidades para se descrever inferências acerca do fomento ao cultivo de camarões. Durante a incubação, o volume dos ovos cresceu gradualmente e o olho embrionário apareceu com pigmentação poucos dias antes de sair da casca do ovo. O período de incubação dos ovos iniciou com a postura e culminou com a eclosão das larvas. Segundo Magalhães (1985), o período de incubação dos ovos de M. amazonicum é de 15 a 17 dias, sendo superior a valores encontrados neste trabalho, de 14 a 15 dias de incubação. Guest (1979) obteve em seu experimento o período de incubação variando de 12 a 15 dias, a 30±1°C, e de 19 a 24 dias, a 24±2°C.
Com relação a aspectos reprodutivos, M. amazonicum tem pico de reprodução no meio da vazante do rio, sendo a estratégia típica de camarões de rios costeiros. Nos lagos e rios da Amazônia Central, são encontradas fêmeas ovígeras durante o ano todo, mas com predominância no meio da vazante, na seca e no meio da enchente (ODINETZ COLLART, 1987, 1988, 1991; ODINETZ COLLART & MAGALHÃES, 1994). Contudo, não se identificaram registros na literatura sobre períodos entre uma reprodução e outra de uma mesma fêmea, ou seja, de quanto em quanto tempo a mesma fêmea se reproduz. Partindo-se da lacuna, o trabalho contribuiu com essa informação, sendo o período de 3 a 5 dias para que uma fêmea após a eclosão dos ovos se reproduza novamente.
Esse conhecimento constitui, em suma, ferramenta importante na criação de M. amazonicum, auxiliando como componente para o manejo no cultivo e também para colaborar na exploração racional de estoques naturais. Além do mais, fêmeas tiveram comprimento total variando entre 5,6 e 6,7 cm. Os valores indicam que ocorreu correlação entre comprimento e fecundidade. A fertilidade absoluta foi 400 e 1.835 larvas nascidas por fêmea. Os valores obtidos neste trabalho para fêmeas de M. amazonicum são inferiores aos relatados por Guest (1979), com 2.200, e superiores ao encontrado por a Sena et al. (2010), que teve fertilidade de 115 e 1.765.
Dados de Scaico (1992) apontam que o camarão-da-amazônia possui fertilidade baixa quando comparado com outras espécies de interesse comercial, como M. rosenbergii. Mas pode ser encontrado o ano todo em fase reprodutiva, o que poderia compensar os baixos valores de fertilidade e fecundidade. Testes de Cavalli et al. (1998) relataram que fêmeas menores apresentam maior frequência de mudas e, consequentemente, ficam ovadas mais vezes.
Levando em conta dados do tipo soft, o resultado demonstra que o tamanho do animal não é empecilho à produção em cativeiro, o pode ser favorável ter várias reproduções o ano todo. Outrossim, mesmo que a fertilidade dos crustáceos apresente grande variação, nota-se a necessidade de refletir acerca de diferentes estratégias reprodutivas e ecológicas diferenciadas entre as espécies, para que se gerem subsídios para a avaliação do potencial reprodutivo e impacto na produção familiar e em pequena escala. O fornecimento de informações que podem ser utilizadas no cultivo de determinada espécie para comércio local é, de toda forma, importante na conjuntura sociocultural (LOBÃO et al., 1986).
Com o conhecimento dessas informações, os interioranos podem usar estratégias de pesca, a fim de não causar impactos de amplas dimensões na população de camarão da localidade estudada. Além disso, saber em que época camarões estão se reproduzindo diminui a pressão em coleta de fêmeas ovadas. E uma das estratégias de manter a espécie explorada sustentável é não capturar na época em que ela está ovada, obedecendo a todo o ciclo de desova do animal e evitando a perda de milhares de ovos.
Os dados tendem a se mostrar determinantes na sustentabilidade na medida em que devem ser transmitidos aos ribeirinhos, para que saibam em que época há mais fêmeas ovadas, evitando a pesca em períodos de fertilidade ou desenvolvendo outras formas de manejo. Assim, como se nota a proposta de manejo no período de defeso dos peixes, poderiam haver também indicativos em relação a semelhante período dos camarões, como já existe em outros lugares. A estratégia seria a mesma: a proteção dos indivíduos jovens, em fase de recrutamento e desova, com qualquer petrecho de pesca.

É por que quando nos pescamos na safra não dá camarão miudinho, dá um camarão normal pra gente vender, só da camarão miúdo depois da safra, tem muita gente que continua a pesca, mas nos não, a gente para. Vamos pra outra profissão, que é o peixe. Se tivesse assim um manejo pro camarão seria melhor, por que tem muita gente que não tem consciência e continua a pescar, ai estraga, por que na camaroeira vem muito filhinho, ai agente tem que escolher dando mais trabalho pra gente. Quando a gente coloca a camaroeira na canoa pra escolher a metade acaba morrendo (DONA SUZETE, CAMAROEIRA, 55 ANOS, FEIRA LIVRE DE PARINTINS, PESQUISA DE CAMPO, 2016).

Os relatos mostram preocupação com a pesca fora de época, com a falta de conhecimentos específicos para a prática da sustentabilidade no segmento, sobre a questão do manejo igualitário do camarão e ainda abre uma discussão questionadora: de que forma levar até os comunitários mensagens de conscientização sem mudar a rotina ou até mesmo a cultura da pesca? Problemáticas relacionadas ao número de pescadores por família, à idade e ao tempo em que se atua na pesca, além do tipo de associativismo efetivado para o trabalho conjunto na comunidade, da forma de comercialização, das atividades econômicas complementares e do rendimento médio mensal por atividade produtiva foram lançadas para se ponderar acerca da atividade.
Os principais conflitos estiveram relacionados à fiscalização sobre a pesca, considerada inadequada, e à falta de conscientização sobre a captura do camarão fora de época. Cenários sobre a problemática mostraram expectativa negativa concernente ao aumento de conflitos na localidade, atribuindo a redução na quantidade de camarão nas áreas de pesca da comunidade da Brasília a migrações de pescadores. O conhecimento gerado tende a contribuir para a identificação de aspectos sociais da prática pesqueira na região estudada e poderá subsidiar gerenciamentos de recursos na comunidade de Brasília.
Na comunidade da Brasília, notou-se, há potencial para a pesca do camarão, no entanto existem inúmeras dificuldades para a realização da prática. Camaroeiras vivem em situação de vulnerabilidade social. A dificuldade na pesca do crustáceo inicia já na ida para o lago, que ocorre em pequenas embarcações medindo cerca de 4 metros de comprimento e 1 metro de largura, cabendo somente a pescadora e seu material de trabalho. Sem falar no horário, que também é um tanto complicado. Elas saem às 18h e ficam até 21h, dependendo da quantidade de camarão capturado. Em meio à escuridão e sobre o emaranhado de plantas aquáticas, a ação é executada.

É sacrificoso a pesca, por que olha agente apanha de carapanã, a vezes tem o jacaré grande, a vezes tem a surucucu que entra dentro da camaroeira, ai agente tem que bater pra ela voar pra fora se não ela morde na mão da gente, e aí agente não pesca nada. Dá medo (MARIA DE JESUS, CAMAROEIRA, 65 ANOS, FEIRA LIVRE DE PARINTINS, PESQUISA DE CAMPO, 2016).

Considerando a periculosidade e referendando a ideia de manejo, importa destacar que tem sido transmitido às pescadoras de Brasília, por conta do Poder Público, a possibilidade de construção de viveiros nas áreas de pesca, mas por falta de incentivos e recursos do próprio Estado o projeto não saiu do papel. Na produção em viveiro, camarões podem adquirir tamanho e aparência representativa, para serem comercializados. As pescadoras teriam oportunidade, portanto, de reunir volume de produção razoável antes do processamento, o que otimizaria esforços e elevaria ganhos financeiros na hora da venda.

Falaram isso aqui pra gente sobre o viveiro, já apresentaram um projeto mas ainda não foi a frente. Só disseram que aqui é baixo e que se tivesse uma associação forte pra tomar a frente desse projeto seria bom. Já tentaram até criar, mas não foi pra frente e estamos na mesma situação de pesca à noite, com todas as dificuldades que já se sabe (DONA SONIRA, CAMAROEIRA, 51 ANOS, FEIRA LIVRE DE PARINTINS, PESQUISA DE CAMPO, 2016).

A construção do viveiro seria a solução para a grande problemática da ação em campo, diminuiria o impacto na captura da espécie e contribuiria para o aumento da renda das famílias, bem como tornaria possível a prática da pesca durante todo o ano. Enfim, o viveiro é de grande valia tanto para o ambiente quanto para as pescadoras. A atividade seria facilitada, e por consequência a vida produtiva na comunidade de Brasília, além de proporcionar segurança às mulheres.
Desta forma, elas não enfrentariam intempéries da pesca tradicional nos lagos, correndo o risco de serem picadas por cobras e mordidas por jacaré – estes os maiores temores, segundo depoimentos das camaroeiras. A renda fixa e a segurança são dois pontos efetivos, portanto, assim observados, que poderiam melhorar bastante em função da construção de viveiro – não deixando de mencionar o quão satisfatório seria para a clientela de Parintins poder desfrutar de camarão de água doce o ano todo. Analisando a partir deste ponto de vista, o viveiro possibilitaria comercialização, pesca e renda sustentadas e bem-estar social.
Não menos importantes são as alterações que as camaroeiras fazem no meio ambiente por conta de técnica rudimentar utilizada, prejudicando a reprodução da espécie Macrobrachium amazonicum e por conseguinte a pesca e sustentabilidade da própria comunidade. A rede de coleta, denominada de “camaroeira”, é apetrecho utilizado na pesca artesanal e não possui mecanismo para que haja a seleção de camarões capturados. Boa parte do quantitativo de crustáceos jovens coletados, sem valor e impróprios para o consumo, são devolvidos ao lago, mas já sem vida.
Esse cenário concorre para o lento e menos volumoso desenvolvimento de indivíduos adultos em Brasília. Impactos socioambientais, mesmo sem intenção, porém promovidos utilizando-se da “camaroeira”, como se notou, indicam que se faz necessária uma melhor política de conscientização dentro do âmbito dessa atividade artesanal, específica da área rural de Parintins. 

Na minha opinião, mesmo se tivesse uma coisa dessa, proibisse o camarão. Até porque os bicho precisam de viver, seria muito estrago mesmo é porque se fizesse isso daí olha de fazer uma proibição do camarão e que todo mundo tivesse sua consciência isso daí seria melhor porque pelo menos os bicho aumentavam e cresciam mais. (DONA MARIA DE JESUS, CAMAROEIRA, 55 ANOS, COMUNIDADE DE SÃO SEBASTIÃO DA BRASÍLIA, PESQUISA DE CAMPO, 2016)
                                                                                                   
Concernente ao armazenamento do camarão, a atividade não é realizada por todas as pescadoras em razão de falta de estrutura e organização interna, bem como apoio do Poder Público para o financiamento de melhores aportes socioprodutivos. Seria importante se fosse possível realizar a atividade na própria comunidade, tendo em vista que a produção diária tem que ser comercializada no mesmo dia, tornando a ação extremamente cansativa. “Se a gente tivesse um frigorífico pra armazenar o camarão, dava pra ter uma venda pra fora, porque no período que dá muito o camarão cai de preço” (LUCINÉIA JACAUNA, CAMAROEIRA, 55 ANOS, SÃO SEBASTIÃO DA BRASÍLIA, PESQUISA DE CAMPO, 2016).
A construção de um frigorífico para o armazenamento do camarão aumentaria o valor em até R$ 4,00 por quilo para a venda na cidade. Essa cobrança iria recair sobre o lucro nominal das pescadoras e geraria custo adicional, afetando diretamente o faturamento com a pesca. E ainda, no contexto global, o armazenamento proporcionaria tempo para tratamento e escolha das melhores unidades e, com a conservação, o desperdício seria menor, o que, a médio prazo, compensaria o investimento.
É uma relação plausível, já avaliada por produtores rurais de Brasília e também pela Secretaria de Produção de Parintins, mas que até o momento não foi implementada por conta de entraves no trâmite de incentivos financeiros e técnicos aos moradores da comunidade, os quais quase que diariamente estão vendendo camarão na feira de Parintins, de modo artesanal, o que gera maiores perdas às pescadoras.     

Conclusão
Observa-se neste trabalho interdisciplinar – primeiramente, quando aos aspectos técnicos da produção – que o período de incubação dos ovos não varia muito em comparação a outros autores, e isso indica que a espécie se reproduz rápido, sendo esse ponto de grande importância na sua criação. O intervalo entre a reprodução encontrado neste trabalho, vale ressaltar, parece ser peculiar, posto que tal informação serve de complemento para se manejar, de forma adequada, sem perda econômica na produtividade em cativeiro ou na pesca artesanal, o camarão de Brasília, o que pode levar à conscientização para a captura apenas de animais ovígeros. Há a correlação entre o comprimento e fertilidade, notamos, e a partir desses resultados podemos dizer que M. amazonicum apresenta menor fecundidade que outras espécies comercializadas.
Partindo-se do experimento, e transpondo tais resultados para o quesito humano da questão, pode-se notar que: i) implicações da testagem no âmbito da conjuntura social proporcionaram entendimento de que períodos mais distribuídos para a conservação de unidades, em função da composição em tanques-viveiro, geram rendimentos adicionais a longo prazo a comunitárias; ii) geram ainda inserção de mais pessoas na atividade, dada a característica do acondicionamento de camarões, facilitando a entrada de mais pessoas no mercado de trabalho; e iii) de igual modo, também estimulam a comunidade a ter mais horas de folga para atividades tradicionais de transmissão de conhecimentos nativos relacionados à pesca.

Referências

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* Doutor em Sociedade e Cultura na Amazônia. Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação Sociedade e Cultura na Amazônia (PPGSCA) da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Lidera o Núcleo de Estudos e Pesquisas em Ambientes Amazônicos (Nepam/CNPq). Suas áreas de interesse são i) comunicação social e ii) sociedade-ambiente na Amazônia (subárea interdisciplinar).

** Mestre em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia - PPGCASA/ UFAM. Possui graduação em ADMINISTRAÇÃO pela Universidade Federal do Amazonas (2011), graduação em GEOGRAFIA pela Universidade do Estado do Amazonas (2010), Especialização em Turismo e Desenvolvimento Local pela Universidade do Estado do Amazonas (2011) e Pós-Graduado em MBA em Gestão em Logística e Operações Globais pela Universidade Estácio de Sá. Foi professor de Geografia, Ecoturismo e Ecologia Básica do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas/ Campus Parintins e professor assistente do Curso de Tecnologia em Gestão Pública da Universidade do Estado do Amazonas/ Núcleo de Estudos Superiores de Borba. Atualmente é professor de carreira do curso de Administração no Instituto de Ciências Sociais, Educação e Zootecnia – ICSEZ/ UFAM. Membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Ambientes Amazônicos (Nepam/CNPq).

*** Mestre em Ciências Biológicas, na área de Entomologia, pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (2003), Graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Amazonas (1998). Atualmente é Professor auxiliar do Curso de Zootecnia da Universidade Federal do Amazonas Campus Parintins. Atuou como Professor Tutor Presencial do Curso de Biologia, Modalidade a Distância da Universidade Federal do Amazonas, como Professor de Biologia da Rede Estadual de Ensino e Técnico do Laboratório de Zoologia da Universidade Federal do Amazonas. Tem experiência na área de Zoologia e atualmente desenvolve pesquisa sobre a biologia, ecologia e pesca de camarão de água doce.


Recibido: 03/03/2017 Aceptado: 17/05/2017 Publicado: Mayo de 2017

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