Gevson Silva Andrade*
Pedro Ricardo da Cunha Nóbrega**
Robson Santana da Silva ***
Universidade de Pernambuco, Brasil
gevson@yahoo.com.br
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Resumo
A feira de Surubim é uma das maiores e mais importantes do Agreste Setentrional, exercendo um papel fundamental no raio de influência para um conjunto de cidades do seu entorno, e como tal apresenta papel de grande relevância para a circulação do capital da cidade e da microrregião em que está inserida; e de vital importância para o desenvolvimento econômico como elemento aglutinador de diferentes agentes da (re)produção do capital (ANDRADE, 2005) sob a ótica micro-econômica, estando inserida em uma realidade global através do processo de interligação dos mercados. Desta forma, impactando diretamente no processo de circulação de pessoas e mercadorias, apresentando seus efeitos no volume de trafego e na ausência de condições de acessibilidade ao centro urbano nos dias do acontecimento do evento feira.
Palavras-chave: Feira-livre; Comércio Informal; Acessibilidade urbana; circulação; Surubim.
La importancia del comercio informal y sus implicaciones en la dinámica socioespacial del municipio de Surubim – PE, Brasil
Resumen
La feria de Surubim es una de las más grandes y más importantes de la región Agreste Setentrional y por eso ejerce un rol fundamental en una zona de influencia de ciudades de su alrededor y con eso tiene grande relevancia en la circulación del capital de la ciudad y de su microrregión; contribuye directamente con el desarrollo económico y funciona como un eje aglutinador de distintos agentes de la (re)producción del capital (ANDRADE, 2005) bajo una perspectiva microeconómica, llegando a inserirse en una realidad global a través del proceso de circulación de personas y mercancías, influyendo en el volumen del tránsito y ayudando a revelar ausencias en la condición de accesibilidad al centro urbano en el momento del evento feria.
Palabras claves: Feria; Comercio informal; Accesibilidad urbana; Circulación; Surubim.
The importance of informal commerce and its implications in the socio-spatial dynamics of the municipality of Surubim
Abstract
The Surubim fair is one of the largest and most important in the Northern Agreste region and therefore plays a role in an area of influence of cities around it and with that has great relevance in the circulation of capital city and of its microregion; contributes directly to economic development and functions as an agglutinating axis of different agents of the (re) production of capital (ANDRADE, 2005) from a microeconomic perspective, reaching a global reality through the process of movement of people and goods , influencing the volume of traffic and helping to reveal absences in the condition of accessibility to the urban center at the time of the event fair.
Keywords: Fair; Informal commerce; Urban accessibility; Circulation; Surubim
Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:
Gevson Silva Andrade, Pedro Ricardo da Cunha Nóbrega y Robson Santana da Silva (2017): “A importância do comércio informal e suas implicações na dinâmica sócio-espacial do município de Surubim-pe, Brasil”, Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, Brasil, (octubre 2017). En línea:
http://www.eumed.net/cursecon/ecolat/br/17/comercio-informal-brasil.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/br17comercio-informal-brasil
Introdução
A feira de Surubim é uma partícula relacionada à dinâmica global das atividades de reprodução econômica ampliada do capital, uma vez que a cada dia mais se interliga e complexifica em razão dos diversos agentes envolvidos e principalmente por causa da própria dinâmica do capitalismo que ciclicamente apresenta crises e turbulências, como a que vivenciamos na atualidade.
Assim como todos os setores do mundo moderno, as atividades de produção, troca e consumo relacionadas à feira de Surubim foram sintomaticamente afetadas pelos desdobramentos da atual crise do capitalismo. Em uma escala tão direcionada os efeitos da crise atinge a esfera da reprodução da vida dos sujeitos implicados. Por isso, faz fundamental concordar com o Meszáros quanto ao custo humano que a reprodução das relações de produção implica.
Não se deve esquecer que o estado desastroso do atual sistema financeiro é nada mais que uma manifestação da fase atual de desenvolvimento tanto do imperialismo monopolista quanto das guerras por ele levadas adiante – e aquelas que ainda virão – com seu imenso desperdício material e de sacrifícios humanos. (MÉSZÁROS, 2008: 8)
Implicar a crise cíclica e sistêmica do capital com as relações de produção, troca e consumo em escala local materializada através da feira de Surubim indica um exercício metodológico capaz de enxergar a inter-relação dos diversos agentes envolvidos que atuam de diferentes modos na dinâmica econômico-produtiva e que exercem sua influência a níveis regionais e locais.
Para além de uma racionalidade econômica e economicista a questão da feira não se restringe a uma questão monocausalista, em que o fator econômico seja o único a ser considerado. Faz-se necessário considerar a feira em suas múltiplas dimensões que possibilitam entender mediações as mais complexas que se expandem para além do economicismo. Não se trata de diminuir a importância do fator econômico, uma vez que ele acaba influenciando sobre a percepção dos demais, mas se considerar que há uma rica diversidade relacionada ao fenômeno feira, considerando processos que são iniciados e ressignificados através dela, a feira se legitima como um lugar de forte intercâmbio cultural e humano.
Do ponto de vista social a feira apresenta-se como elemento atrativo e aglutinador de pessoas, serviços e instalações: “No Nordeste brasileiro os mercados periódicos ou feiras constituem um dos componentes fundamentais da rede de localidades centrais, coexistindo com outros componentes de localização fixa” (ANDRADE, 2001:66). Em outras palavras, a feira é responsável pela atração de compradores e vendedores de produtos do setor primário, em um primeiro momento, porém esses mesmos atores acabam que por consumir também artigos das mais diversas origens que são ofertados nas cidades. Desta Maneira, corroboramos com Andrade (2005) quando o mesmo afirma que a feira é o elemento primordial para o entendimento da funcionalidade urbana de Surubim, principalmente vislumbrando o papel de centro intermediário na rede urbana do estado de Pernambuco.
Em sua grandiosidade, o evento feira acaba que por impactar diretamente na organização do trânsito da cidade através do caos estabelecido pela grande quantidade de veículos em circulação e ausência de vagas de estacionamentos nos principais logradouros da área central desse tecido urbano.
Outro elemento a ser observado é relativo à circulação dos pedestres no espaço onde a feira se desenvolve, principalmente por conta do não cumprimento das leis que garantem acessibilidade aos cidadãos com dificuldade de locomoção, e, em segundo plano, para todos os cidadãos por conta do grande acúmulo de resíduos sólidos derivados dos produtos comercializados.
É justamente analisar a importância desta feira para Surubim e região, seus aspectos e elementos constitutivos e estruturadores, sua importância para a configuração sócio-espacial da cidade, e principalmente contribuir para sua melhoria no que diz respeito à atual disposição, bem como, otimizar seu processo de circulação de bens e pessoas que este trabalho se propõe.
Um olhar histórico para a feira enquanto fenômeno de vendas
Ludicamente a feira pode ser descrita como sendo
um lugar cheio de sons, movimentado e colorido. Talvez por isto chame a atenção numa primeira análise. O colorido das frutas e legumes nas barracas iluminadas pela luz do sol filtrada através dos toldos proporcionam um visual muito bonito. Em alguns lugares o sol passa direto pelas frestas e espaços entre as barracas criando uma luz incrível (AGAPIO, s/d:s/p)
O surgimento dessa tipologia do comércio tem suas raízes ligadas à restauração dos mercados europeus e de forte vinculação com o Oriente, como fornecedores de produtos. Logo:
Com a missão dos mercadores da Idade Média, estimulou-se a transação de compra e venda, e por extensão, a formação das feiras, envolvendo drogas, musselinas, sedas, especiarias e tapetes, expostos em feiras livres. Nesta estrutura comercial, determinam-se os preços pelas forças competitivas do mercado, surgindo lentamente a concorrência entre os comerciantes medievais (EUMED, 2004:s/p.).
Como pode ser observado, eram nas feiras, em um primeiro momento, que eram encontrados os produtos provenientes do oriente, considerados de luxo, porém, com o passar do tempo, as feiras deixaram de ser exclusivamente um local de atividades mercantis luxuosas, como se pode ver a seguir, e passaram a atender às necessidades das pessoas comuns:
Na idade média eram comuns as feiras livres, que se constituíam em um local onde as pessoas que tinham mercadorias para vender, e desejavam outras, encontravam-se com pessoas que queriam comprar produtos para as suas necessidades, bem como queriam também vender algumas de suas mercadorias. Essas pessoas caminhavam grandes distâncias para efetuar essa tarefa que seria a de participar do mercado, para dar evasão as suas mercadorias, e adquirir outras que lhes fossem necessárias (idem).
Dessa forma, a feira na idade média, deixa de ser apenas um “lócus” no qual é possível adquirir produtos supérfluos, mas também um local onde se estabelece as trocas de excedentes locais, constituindo-se assim, um local de (re)produção do capital(de forma inicial e/ou arcaica). Isso fez com que despertasse nas classes dominantes o desejo de que em suas vilas e cidades esses mercados fossem instalados, logo “as autoridades tinham grande interesse quanto à colocação de feiras em suas regiões, porque, em verdade, aumentaria o fluxo de recursos para aquele ambiente, como da mesma forma se negociariam os da própria localidade”(idem).
Ressalta-se que a instalação dessas feiras era normatizada, isso pode ser ilustrado a partir da leitura a respeito da organização das cidades no período medieval, onde essas detinham o papel de “centros de defesa, de administração, de indústria e de comércio. Uma feira semanal, se a possuía, e leis proibindo a existência de uma feira concorrente em um raio de sete a dez quilômetros” (PROST, 1965 apud Andrade, 1970, p. 13), essa afirmação revela a importância da feira na delimitação dos espaços de influencia de uma determinada localidade.
Na atualidade a feira se apresenta de duas formas, como atesta Gilmar Mascarenhas de Jesus, essas formas levam em consideração a dimensão do mercado atendido. Desta maneira, a feira
é adotada em todo o Brasil para designar as feiras semanais de caráter intra-urbano (de âmbito praticamente restrito ao bairro), diferentes daquelas tradicionais que reúnem compradores e vendedores oriundos de áreas distantes, muito comum no Nordeste, e que preferimos denominar feiras regionais” (JESUS, 2004:s/p).
Ao depararmo-nos com a importância da feira, como elemento regional do Nordeste, faz-se necessário, vê-la
(...) ao lado de pequenos e médios estabelecimentos comerciais, aparecem às feiras como ponto de encontro entre o meio rural e o urbano; [...] e nelas os comerciantes da cidade oferecem produtos industrializados ou artesanais [ ...] ao mesmo tempo que os agricultores e criadores vendem os produtos que dispõem [ ...] na região agrestina, policultora, ela toma grandes proporções, ocupando muitas vezes quase toda a área urbana e permanecendo o dia todo. (ANDRADE, 1970: 35).
Com base nas características discutidas por Andrade percebe-se um conjunto de características relacionadas à morfologia da feira associadas a um temporalidade marcada pela simplicidade de bens ofertados, por exemplo. Atualmente, as feiras têm diversificado ao máximo possível o seu lastro de comércio, possuindo desde produtos sofisticados até mínimas coisas que a classe mais pobre precisa ” (EUMED, 2004:s/p.).
Os produtos classificados como simples podem ser entendidos como aqueles de necessidades básicas, e/ou artesanais, já os produtos mais sofisticados se apresentam através dos produtos eletroeletrônicos (como games portáteis, calculadoras, Cd’s, brinquedos, etc.) que em sua maioria tem o Paraguai e a China como origem de importação.
Visto os aspectos de origem e formatação das feiras, cabe aqui recuperar a descrição da feira apresentada por Araújo e Rodrigues, utilizando a obra de Galvão (1994), indica que
a feira livre é uma instituição do setor informal da economia que tem características próprias, tais como: a) é regulamentada; b) seu funcionamento é possível dentro do modo de produção capitalista, por estar ligado ao capital comercial, e tende a crescer devido à realização constante da mais-valia, sem precisar reduzir a taxa de lucro do capital; c) dentre as ocupações de baixa renda, a condição de feirante é privilegiada devido ao apoio legal.” (GALVÃO,1994 apud ARAÚJO & RODRIGUES, 2003:s/p).
A partir dessas afirmações, tem-se a feira como um organismo, que mesmo com as suas características de informalidade, apresenta regras capazes de torná-la um elemento da urbanidade, pois a sua regulamentação se dá a partir da gestão do parcelamento do uso e ocupação do solo da cidade, e também de acordo com os espaços destinados à realização dessa atividade.
A decisão de sua instalação é feita a partir de regras pré-estabelecidas pelo governo municipal, através da escolha/determinação dos logradouros que podem ser utilizados para o desenvolvimento dessa atividade, bem como a forma na qual serão distribuído cada um dos setores de produtos.
Outra característica necessária ao entendimento da feira diz respeito a (re)produção do capital, pois, é através da feira que parte considerável dos produtores (principalmente rurais classificados na categoria de agricultura familiar) estrategicamente a utilizam de forma direta na comercialização de produtos com uma menor carga de impostos e sem a presença de atravessadores podem oferecer os seus produtos com valores mais baixos ao consumidor final, e dessa forma tendem a entrar na concorrência direta do mercado.
O apoio legal é dado a partir das regulamentações citadas, faz com que haja uma maior possibilidade de acumulação do lucro, dessa forma o feirante destaca-se em meio aos demais membros da classe social a qual pertence, por estarem de certa forma protegidos pela regulamentação do uso do espaço urbano.
A feira de Surubim: elementos para o entendimento do seu funcionamento, organização e centralização
A cidade de Surubim localizada no Agreste Setentrional pernambucano e na microrregião do Alto Capibaribe, situada a 124 km da cidade do Recife apresenta uma população de 58.515 habitantes, segundo os dados do último Censo Demográfico realizado pelo IBGE em 2010 (de acordo com o mesmo órgão, na secção cidades de sua website a estimativa populacional é de aproximadamente 63.780). Faz divisa ao norte com Vertente do Lério e Casinhas (que outrora eram distritos do município em tela); ao sul com Riacho das Almas e Cumaru; a leste com Orobó, Bom Jardim, João Alfredo e Salgadinho; a oeste com Frei Miguelinho e Santa Maria do Cambucá. A cidade de Surubim apresenta-se como polo econômico desta região, exercendo seu raio de influência direta e indiretamente para todas essas e para outras localidades da microrregião.
A feira de Surubim reúne pessoas de diferentes origens e com diferentes finalidades além da compra, estas pessoas afluem ao centro urbano que muitas vezes não dispõe de infraestrutura para uma boa circulação de pessoas e mercadorias, como é o caso de Surubim que aos sábados em sua área central, apresenta sérios problemas de locomoção. Esses problemas de mobilidade se processam na circulação de veículos, nas vagas para estacionamento (foto1) e consequentemente na circulação das pessoas (foto 2).
A feira, por diversos motivos, apresenta uma dinâmica que não se resume ao aspecto econômico de compra e venda em seu meio, (pois, até o comércio formal é favorecido com a sua realização) (ANDRADE, 2005). Extrapola o aspecto da mera circulação de pessoas, ela também apresenta um caráter simbólico muito grande.
Sua movimentação, seus sons, suas cores e aromas (fotos 3 e 4) apresentam uma sinestesia que faz com que todos os atores que participam dela de forma direta ou indireta, seja como vendedores ou compradores, tenham um sentimento de simpatia e pertencimento para com este rico e variado fenômeno que ultrapassa o lado econômico e se entrelaça na vida das pessoas envolvidas e que é reflexo de uma dinâmica global de forma conjuntural e estrutural.
Deve-se salientar que esta sua importância não se deu exclusivamente através de instalações produtivas formais, como as que hoje observamos com a indústria de confecção, do qual Surubim faz parte do Polo Têxtil do Estado, com unidades de produção de diversos tamanhos. Antes da indústria de confecção Surubim já era um polo atrativo de pessoas e capital representando um nó na rede em escala microrregional no que diz respeito à circulação de bens e pessoas, bem como de compra e venda dos mais variados produtos, justamente em virtude da realização da feira e que hoje apresenta-se como de fundamental importância para a cidade em seus mais variados aspectos: sociais, culturais, políticos e principalmente econômico, sendo a feira um espaço propricio para a comercialização de parte dessa produção (foto 5 e ¨6)
A feira, enquanto exemplo deste processo, apresenta-se como contínua transitoriedade em seus elementos constitutivos. Em razão disto este trabalho não pretende ser conclusivo quanto a este fenômeno, mas sim propiciar um melhor entendimento desta realidade e contribuir para sua otimização.
Estes termos acima descritos revelam a necessidade de se observar a feira de forma dialética, na qual se privilegie uma visão de conjunto do objeto em análise. Essa visão de conjunto ou totalidade se faz necessária ao entendimento de elementos estabelecidos e estruturadores do espaço, no mais:
A visão de conjunto – ressalve-se - é sempre provisória e nunca pode pretender esgotar a realidade a que ela se refere. A realidade é sempre mais rica do que o conhecimento que agente tem dela. Há sempre algo que escapa às nossas sínteses; isso, porém, não nos dispensa do esforço de elabora sínteses, se quisermos entender melhor a nossa realidade. A síntese é a visão de conjunto que permite ao homem descobrir a estrutura significativa da realidade com que se defronta, numa situação dada. E é essa estrutura significativa – que a visão de conjunto proporciona – que é chamada de totalidade1 (KONDER, p.37)
Logo:
a Totalidade está sempre em movimento, num incessante processo de totalização, nos diz Satre. Assim, toda totalidade é incompleta, porque está sempre buscando totalizar-se [...] Tal evolução retrata o movimento permanente que interessa a analise geográfica: a totalização já perfeita, representada pela paisagem e pela configuração territorial e a totalização que esta fazendo, significa pelo que chamamos de espaço [...] assim o espaço, é, antes do mais, especificação do todo social, um aspecto particular da sociedade global. A produção em geral, a sociedade em geral não são mais que um real abstrato, o real concreto sendo uma ação, relação ou produção especifica, cuja historicidade, isto é, cuja a realização concreta, somente pode dar-se no espaço. Por isso como afirma E. Dardel (1952, p.59) [...] ´o espaço terrestre aparece como condição de realização de toda a realidade histórica, como aquilo que lhe da corpo e atribui um lugar a cada coisa existente. Pode se dizer que é a terra que estabiliza a existência. (SANTOS, 1997, p.96)
Procura-se estabelecer um quadro que busque revelar todo o processo ocorrido no objeto em estudo, o qual podemos vislumbrar seu papel e suas potencialidades perante a rede urbana a qual Surubim está inserido, seja como elemento receptor, seja como centro (ponto) difusor de ideias, comandos e mercadorias (fotos 7 e 8).
De acordo ainda com a história oral, esse desenvolvimento em ritmo acelerado (para a época), afirma que em 1905 a feira já era um elemento bastante importante na vida da localidade, sendo as suas instalações
em frente ao mercado velho, hoje Edifício José Miguel. Naquele tempo uma casa antiga e aberta. Na frente tinha um frondoso pé de gameleira 12 e ao redor ficavam os bancos de tecido, miudezas, perfumaria, charque, bacalhau e açúcar. Por perto estava o pessoal que vendia corda, queijo de coalho e mel de uruçu. O povo todo circulava no patiozinho da igreja Matriz de São José. (BARBOSA, 1995, p.62)
A feira desde os primórdios era o principal acontecimento da localidade, tendo sido destaque na condição de vila e essa importância foi crescente até os dias atuais.
Segundo o Senhor Nelson Barbosa, “em 1914 ... Surubim já possuía cerca de cento e cinqüenta casas. Muitas delas porém, viviam fechadas e suas portas só se abriam aos sábados pois pertenciam as famílias residentes no mato 14 e naquele dia vinham para negociar na feira.” (BARBOSA, 1979, p.2)
Além da feira, enquanto tradição que se consolida na dinâmica econômica do município, Barbosa 1979, afirma que:
A povoação começou a desenvolver-se rapidamente, já que seus habitantes podiam trabalhar sem coações. Assim , a produção foi aumentada e houve progresso no comércio e no campo ... confirmando a previsão, surgiram casa nos ramos de tecido, ferragens, estivas e miudezas, fazendo bons negócios (Idem, p.5).
Considerando o processo histórico, a feira em Surubim teve início de forma modesta na atual praça principal da cidade, a Praça Dídimo Carneiro por volta da década de 30 onde se vendia principalmente cereais, carnes e materiais agrícolas (enxadas, facões, foices etc.) no qual aos sábados ocorria um grande fluxo de pessoas residentes de toda região para consumir e comercializar seus produtos (BARBOSA, 1979). Posteriormente, na primeira gestão do prefeito Nelson Barbosa, com o objetivo de organizar a feira e facilitar o processo de compra e venda desses materiais, foi inaugurado o Mercado Público Municipal em 1939 (foto 6), porém a feira de rua aos sábados continuava a acontecer e a crescer espalhando-se pelo entorno da praça. Paralelo a isto e também sendo seu reflexo, Surubim continuava a crescer populacionalmente sendo preciso que sua estrutura econômica se adaptasse às novas mudanças, neste contexto houve a criação da feira de quarta que em conjunto com a de sábado, cresceram substancialmente, principalmente a do sábado.
A feira foi(é) de essencial importância para todas as etapas do desenvolvimentos pelos quais a cidade passou, porém seu crescimento foi bastante acelerado e não ocorreu de forma planejada, apresentando hoje uma série de problemas, principalmente no que diz respeito ao acesso e locomoção.
Conforme já foi exposto, a feira é o principal fenômeno atrativo de consumidores para Surubim, porém este processo crescente de atração de pessoas não se deu conjuntamente com uma ação efetiva do poder público no que diz respeito às suas vias e ao processo de locomoção e acessibilidade, pois o que hoje esta cidade de “porte médio” vive aos sábados, guardadas as devidas proporções, é similar ao que os grandes centros vivem nas horas de pico. Com o intuito de melhorar/otimizar este rico fenômeno próprio da periferia do capitalismo que é a feira (SÁ, 2011,), e democratizar/facilitar sua circulação, seja de veículos, pedestres, vendedores, compradores ou transeuntes que analisaremos alguns pontos:
Segundo a Secretaria de Agricultura e Desenvolvimento Econômico do município de Surubim, atualmente a feira apresenta um total de 796 feirantes cadastrados distribuídos por um total de 15 logradouros do centro da cidade, por esses números os oferece pistas acerca da importância que a feira para o comércio da cidade, principalmente pelo fato de haver um constante crescimento no número de feirante, de acordo com a Andrade (2006) o número total de feirantes era da ordem de 650 em 2006. Esse crescimento é possível graças ao crescente número de consumidores.
Mesmo sem se apresentar no cadastro da Prefeitura, ainda se identifica pontos dispersos na Praça Dídimo Carneiro, Rua Dr. Estácio Coimbra. Além da Avenida Monsenhor Luiz Ferreira Lima e Travessa do Mercado, unidades de feirantes que são atraídos pelo mercado publico municipal2 .
Ainda assim estes números não resumem a real dimensão da feira, pois estes dados dizem respeito aos feirantes legalmente estabelecidos, com cadastros na prefeitura. Mas existe um grande número de feirantes que não estão nesta situação de legalidade (frente ao registro das atividades nos cadastros municipais), este número também não contempla os que exercem suas atividades dos vendedores ambulantes, que se deslocando pela feira, vendem seus produtos, principalmente: lanches, acessórios, roupas etc., sendo este segmento de presença bastante elevada.
Outro segmento que a simples análise dos números não contempla é o do setor formal, pois como já foi exposto o comércio formal: supermercados, farmácias, restaurantes, padarias etc., pois não se realizou levantamentos oficiais por parte dos órgãos de gestão e pesquisa públicos, nem mesmo por pesquisadores vinculados a academia para a obtenção de dados referentes ao reflexo da feira no volume de venda desses estabelecimentos vinculados ao comercio formal, acredita-se que sem a existência da feira todo o setor comercial de Surubim teriam suas receitas drasticamente reduzidas, pois não por acaso são justamente os dias de feira os dias de maior volume de vendas no comercio geral da cidade.
Observa-se ainda que a feira é um exemplo claro do dinamismo e adaptabilidade que as atividades econômico-produtivas exercem sobre a sociedade, chegando ao ponto de transformar sua configuração sócio-espacial, pois embora “A decisão de instalação da feira sendo feita por regras pré-estabelecidas pelo governo municipal (o cadastro na prefeitura exemplifica isso) através da escolha dos logradouros que podem ser utilizados” (ANDRADE,200:126), o dinamismo e a necessidade de (re)produção econômica faz com que modelos ainda mais alternativos de comércio se instalem nas vias publicas do centro da cidade em tela:
Têm-se a feira como um organismo que mesmo com as suas características de informalidade, apresenta regras capazes de torná-la um elemento da urbanidade, pois sua regulamentação se dá a partir da gestão do parcelamento da cidade que a mesma irá delimitar. (ANDRADE, 2005:126)
Pois desde os primeiros anos da cidade (emancipação política) a atividade econômico-produtiva que mais alterou a configuração e a dinâmica sócio-espacial do centro foi justamente a feira. Desde a gestão do ex-prefeito Nelson Barbosa na década de 30 do século passado com suas ações com o intuito de organizar/melhorar a feira; como a inauguração do Mercado Público, ela continua crescendo e transformando-se continuamente em algo mais complexo, dinâmico e interligado.
A dinâmica urbana, reflexões e impactos na organização da circulação nos dias de feira
Fazendo uma análise crítica de sua dinâmica observamos que a questão do acesso e locomoção interna é vital, pois para que as pessoas possam comprar e vender, elas precisam antes chegar até a feira através de suas vias de acesso, para que os consumidores possam escolher o que comprarem eles precisam antes locomover-se pelo seu interior, para que todos possam participar deste intercâmbio econômico cultural elas precisam ter seu acesso facilitado para cadeirantes e idosos com a utilização de rampas e calçadas livres. Para que ela possa continuar se desenvolvendo ela precisa de novas vias de acesso e locomoção tanto de veículos quanto para pedestres, pois as atuais apresentam-se sufocadas. Isto foi algo que ficou evidente com a observação em campo, no qual através da indagação aos frequentadores da feira foi possível observar in loco sua real dimensão, pois foi observada a circulação de pessoas das mais diversas origens.
Foi detectado que uma grande parcela destas utiliza de algum tipo de veículo em razão da feira, seja para chegar até ela, seja para voltar para casa, ou ambos, e não apenas as pessoas residentes em outros municípios, ou zona rural (que utilizam costumeiramente o transporte coletivo intermunicipal para as cidades próximas: Casinhas, Vertente do Lério, João Alfredo, Umbuzeiro-PB etc.), como também o transporte intra municipal para os bairros, sítios e vilas. Muitos de carro ou moto próprios ou fazem uso dos serviços dos taxistas. Temos que salientar que o fluxo maior de veículos acontece na via principal da cidade, a Avenida São Sebastião.
Acrescentando-se a esse fluxo o fato de inúmeros carros estacionados em ambos os lados da avenida, bem como uma grande quantidade de veículos que carregam e descarregam suas mercadorias nesta via, teremos em razão disto uma via de grande circulação com espaço para fluxo bastante reduzido. Mas este é um problema que afeta todas as ruas de grande movimento da cidade, como a Rua Estácio Coimbra, onde está localizado o ponto de transporte coletivo para a cidade de Casinhas, em toda a sua extensão há um grande movimento de veículos e pedestres com uma grande quantidade de vendedores, o que em diversos momentos torna bastante trabalhoso trafegar e se locomover por essa via.
Outros pontos de muito movimento com a mesma problemática são as Ruas Monsenhor Luís Ferreira Lima, Sete de Setembro, Cônego Benigno Lira, Urbano Vieira, Jerônimo Heráclio. Em todas essas vias, algo que foi bastante observado foi o processo de circulação dos pedestres, pois nas ruas onde ocorre a feira as calçadas ficam intransitáveis em razão dos mais diversos objetos que são colocados no passeio público (veículos estacionados, barracas, materiais dos mais diversos para venda) impossibilitando a circulação dos pedestres. Esta realidade choca-se com o que está no próprio Plano Diretor da cidade, pois em seu Capítulo VI, Artigo 15, que trata da política de mobilidade estabelece:
O Inciso III, trata diretamente da questão da acessibilidade das pessoas com deficiência garantindo segurança e conforto, nisto observamos um claro contraste com a realidade. Este foi um dos problemas mais gritantes observados: a dificuldade de locomoção de pessoas com algum tipo de deficiência, pois faltam rampas e as calçadas completamente intransitáveis para esses.
O Artigo 16 do mesmo Plano Diretor, estabelece quais são as ações estratégicas prioritárias da política de mobilidade:
Analisando alguns incisos comprovamos um total desacordo com o que acontece de fato, pois como já foi exposto, a realidade encontrada no centro urbano a respeito da acessibilidade se contradiz com o Inciso III, bem como o que está previsto no IV, pois o que observamos nas vias principais da cidade está em clara contradição com estes, já que as ruas mais parecem pontos de carga e descarga de veículos, como também não observa-se o que está previsto no Inciso VII: não observa-se na cidade um tratamento, muito menos investimentos para o sistema cicloviário e calçadas visando a segurança, mobilidade e acessibilidade da população, tal qual prevê o Inciso VIII.
Outro ponto muito presente na questão da mobilidade em Surubim são os transportes coletivos, pois mesmo este ponto estando previsto no Inciso X, o que existe na maioria das vezes é uma “auto-organização” destes motoristas quanto à questão das paradas, estacionamentos e circulação, o que muitas vezes não acontece de forma adequada. Não observa-se também o que está previsto no Inciso XII, pois não ocorre programas efetivos de educação contínua para mobilidade urbana. Neste ponto deve-se salientar o que prevê o Inciso V – implementar plano de disciplinamento dos transportes alternativos – nesta questão dos transportes alternativos o que deve ser efetuado não é extinguir o fluxo destes veículos da e para a feira, pois isso seria prejudicial em muitos aspectos, principalmente social e econômico.
Também não se trata de proibir a circulação de veículos de passageiros (coletivos, taxis, motos, etc.) até porque isto é algo de extrema importância para a feira, pois esta atividade bem como as demais desenvolvidas nela é de grande importância para Surubim. Trata-se de uma maior atuação do poder público municipal de pôr em prática algo que já está previsto no Plano Diretor com uma maior fiscalização e trabalho em conjunto com os motoristas, com atividades contínuas de educação de trânsito.
Considerações finais
O objetivo deste trabalho não foi apresentar a feira de Surubim em seus pontos negativos, muito pelo contrário, apresentou-se seus pontos que precisam ser melhorados (principalmente locomoção e acessibilidade) com o objetivo que estes sejam superados para que a feira possa continuar sendo este fenômeno riquíssimo e multicultural, que é responsável pela subsistência/existência econômica de inúmeros profissionais que sobrevivem diretamente dela como de outros que atuam indiretamente (comércio formal).
O que se propõe para melhorar o atual quadro é uma maior atuação do poder público em parceria e dialogando com toda a sociedade e agentes envolvidos (consumidores, feirantes, motoristas...) para detectar de que forma os problemas atuais possam ser superados, aplicando a legislação específica para os problemas existentes (trânsito e locomoção e acessibilidade).
Foi justamente para contribuir na melhora do atual quadro que este artigo se propôs através de sua análise crítica, contribuir para que este fenômeno possa continuar existindo e sendo tão importante para Surubim, porém com sua forma e estrutura melhorada através da superação dos problemas que foram apresentados. Pois o principal elemento atrativo e circulatório de dinheiro da cidade e responsável pela configuração de Surubim enquanto cidade média e pelo processo e dinâmica sócio-espacial da cidade não pode continuar com seus problemas crônicos de circulação e acessibilidade, tal qual se encontram. “Os intelectuais terão que ultrapassar o fato de apenas escrever livros; mas dar a conhecer, e no caso do trabalho acadêmico, possibilitar pensar todos os setores da sociedade” (GRAMSCI, 1978,pg 151), desta maneira, para não encerrar as discursões, cabe apontar a necessidade de se revisitar e entender o processo de totalidade e totalização, que permite o entendimento dinâmico do objeto.
Visto toda a diversidade de produtos ofertados na feira, leva-se ao encontro do que Corrêa afirma sobre esta forma de comércio quando diz que “no Nordeste brasileiro os mercados periódicos ou feiras constituem um dos componentes fundamentais da rede de localidades centrais, coexistindo com outros componentes de localização fixa”(CORRÊA, 2001, p.66).
Desta maneira, fazendo um paralelo entre a diversidade de produtos oferecidos e o excerto sobre as feiras, retirado de Corrêa, afirma-se aqui o papel fundamental desta na observação das articulações do volume de consumidores oriundos de outras unidades municipais, o que nos permite entender a dinâmica das atividades terciárias e sua representatividade na formação da rede urbana articulada a partir de Surubim.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGAPIO, Roberto, Feira Livre. Portfólio. Disponível em: <http://www.robertoagapio.fot.br/texto01.htm>
ANDRADE, Gevson Silva. Análise da funcionalidade urbana de Surubim-PE: Um olhar em sua função enquanto cidade média. (Dissertação), Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2005,144 pgs.
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* PhD em Geisteswissenchaten pela Universidade Técnica de Berlin, atualmente Professor Adjunto do Curso de Licenciatura em Geografia da Universidade de Pernambuco.
** Doutor em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo, atualmente Professor Adjunto do Curso de Licenciatura em Geografia da Universidade Federal do Vale do São Francisco.
*** Licenciado em Geografia pela Universidade de Pernambuco, Ex-Bolsista do Programa de Fortalecimento Acadêmico da Universidade de Pernambuco
1 Grifos nossos
2 O Mercado Público Municipal é um equipamento urbano de fundamental importância para o entendimento de funcionamento da feira, pois o mesmo congrega em si um numero de 60 boxes, onde são comercializados principalmente produtos agrícolas desidratados (o mercado também é chamado de mercado dos cereais), como a farinha, milho, feijão, arroz, etc. e pouquíssimos produtos industrializa, e tem como principais clientes a população residente na zona rural, que geralmente são clientes fies, e que mesmo com a mudança do local de realização da grande feira, mantiveram seus hábitos consumindo neste mercado.
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