Observatorio Economía Latinoamericana. ISSN: 1696-8352
Brasil


UMA AVALIAÇÃO DOS IMPACTOS DAS CRISES POLÍTICA E ÉTICA NO DESEMPENHO DA ECONOMIA BRASILEIRA

Autores e infomación del artículo

José Matias-Pereira*

Universidad de Brasília

matias@unb.br

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Resumo: O objetivo principal deste artigo é avaliar os impactos das crises política e ética no desempenho da economia brasileira. O estudo apoia-se em três dimensões: econômica, política e ética. As análises e discussões se baseiam nos relatórios e bancos de dados das principais instituições multilaterais e nacionais brasileiras, em especial, as variáveis econômicas mais relevantes como: desempenho da economia, nível de emprego e inflação. Ficou razoavelmente demonstrado nas discussões e avaliações desenvolvidas neste estudo, de que houve uma conexão estreita entre as variáveis “economia, política e corrupção”. Dessa forma, a piora da crise política, contaminada pela corrupção institucionalizada nas estatais, impactou negativamente no desempenho da economia. Por sua vez, as condenações dos réus envolvidos no escândalo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal, e as revelações das investigações do escândalo de corrupção na Petrobras, deixou exposto para a sociedade um sistema político exaurido, corrompido pelo patrimonialismo, corporativismo e corrupção. Pode-se argumentar, assim, que os efeitos da crise política-econômica-ética foram determinantes para a instalação da crise de governabilidade no país, e para a admissibilidade do processo de impeachment pelo Senado Federal contra a presidente Dilma Rousseff.

Palavras-Chave: Economia, política, corrupção, governabilidade, impeachment, Brasil.

An assessment of the impact of political crisis and ethics in the performance of the Brazilian economy

Abstract: The main purpose of this article is to evaluate the impact of the political crisis and ethics in the performance of the Brazilian economy. The study relies on three dimensions: economic, political and ethical. The analyzes and discussions are based on reports and databases of major multilateral and national Brazilian institutions, in particular the most relevant economic variables such as: performance of the economy, employment and inflation. It was reasonably demonstrated in advanced discussions and evaluations in this study that there was a close connection between the variables "economics, politics and corruption." Thus, the worsening of the political crisis, tainted by institutionalized corruption in the state, had a negative impact on economic performance. In turn, the convictions of the defendants involved in the scandal of the monthly allowance by the Supreme Court, and the revelations of the corruption scandal investigations at Petrobras, left exposed to society an exhausted political system corrupted by paternalism, corporatism and corruption. It can be argued, therefore, that the effects of political-economic-ethical crisis were instrumental in the installation of the crisis of governance in the country, and the admissibility of impeachment by the Senate against the president Dilma Rousseff.

Keywords: Economy, politics, corruption, governance, impeachment, Brazil.

Una evaluación del impacto de la crisis política y la ética en el desempeño de la economía brasileña

Resumen: El objetivo de este trabajo es evaluar el impacto de la crisis política y la ética en el desempeño de la economía brasileña. El estudio se basa en tres dimensiones: económicas, políticas y éticas. Los análisis y las discusiones se basan en informes y bases de datos de las principales instituciones multilaterales y nacionales de Brasil, en particular, las variables económicas más relevantes, tales como: el rendimiento de la economía, el empleo y la inflación. Se demostró razonablemente en las discusiones y evaluaciones avanzadas en este estudio que había una estrecha relación entre las variables "economía, la política y la corrupción." Por lo tanto, el agravamiento de la crisis política, manchada por la corrupción institucionalizada en el estado, tuvo un impacto negativo en el rendimiento económico. A su vez, las condenas de los acusados ​​involucrados en el escándalo de la asignación mensual por el Tribunal Supremo, y las revelaciones de las investigaciones de corrupción escándalo en Petrobras, que quedan expuestos a la sociedad un sistema político agotado corrompido por el paternalismo, el corporativismo y la corrupción. Se puede argumentar, por tanto, que los efectos de la crisis política-económica-ética jugaron un papel decisivo en la instalación de la crisis de la gobernabilidad en el país, y la admisibilidad de juicio político en el Senado contra el presidente, Dilma Rousseff.

Palabras clave: economía, política, corrupción, gobierno, acusación, Brasil.



Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

José Matias-Pereira (2016): “Uma avaliação dos impactos das crises política e ética no desempenho da economia brasileira”, Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, Brasil, (agosto 2016). En línea: http://www.eumed.net/cursecon/ecolat/br/16/impeachment.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/br-16-impeachment


Introdução

As interfaces entre política e economia, conforme mostra a literatura, são um campo reconhecido de estudos, nos quais se aplicam as teorias política e econômica (Rawls, 2000). A compreensão da dimensão política na esfera econômica avança pelas áreas de políticas públicas e sociais, ações e decisões governamentais, os impactos da política econômica e nas estruturas de governança, no que diz respeito às ações e opções dos atores políticos. Governança é aceita aqui como a capacidade que determinado governo tem para formular e implementar as suas políticas. O termo governabilidade, em sentido amplo, refere-se às próprias condições substantivas e materiais de exercício do poder e de legitimidade do Estado e do seu governo derivadas da sua postura diante da sociedade civil e do mercado. Por sua vez, accountability é o conjunto de mecanismos e procedimentos que levam os decisores governamentais a prestar contas dos resultados de suas ações, garantindo-se maior transparência e a exposição pública das políticas públicas.

Recorde-se que o objeto de estudo da economia política consiste em observar o comportamento do homem confrontado com o problema de satisfação das necessidades individuais em condições de escassez de recursos. Trata-se de um campo de pesquisa muito abrangente, com destaque para dois ramos principais: microeconomia e macroeconomia. Enquanto a microeconomia estuda o comportamento dos agentes econômicos individuais, empresas e consumidores, e a forma como eles forma como eles interagem uns com os outros para formar unidades maiores, como os mercados e indústrias; a macroeconomia tem como foco de estudo os grandes agregados econômicos.

Torna-se oportuno destacar, após essas considerações iniciais, que o nosso propósito é explicitar os fundamentos da crise que está afetando de maneira grave o desempenho da economia brasileira. Assim, torna-se possível fazer a seguinte pergunta: Quais os principais efeitos da atual crise política e ética no desempenho da economia brasileira?

Com vista a permitir alcançar os propósitos deste trabalho, optamos em termos metodológicos, em apoiar o artigo em três dimensões: economia, política e corrupção. Os dados e indicadores da dimensão economia foram obtidas nos relatórios das principais instituições multilaterais e nacionais brasileiras, em especial nas variáveis econômicas mais relevantes como: desempenho da economia, nível de emprego e inflação; na dimensão política os relatórios do Congresso Nacional sobre a admissibilidade do processo de impeachment contra Dilma Rousseff, e o relatório do Tribunal de Contas da União que reprovou as contas do governo de 2014; e na dimensão corrupção o julgamento da Ação Penal 470 (mensalão) pelo Supremo Tribunal Federal (STF), e as apurações  feitas pela Polícia Federal, Ministério Público Federal e Justiça Federal do Paraná (Operação Lava Jato).

Trata-se de um artigo-ensaio, no qual pressupomos que o crescimento da economia, o nível de emprego e a inflação surgem como importantes variáveis macroeconômicas para avaliar o desempenho da economia brasileira na última década. Nesse esforço é necessário avaliar os resultados alcançados na gestão da economia pelos governos Lula e Dilma, bem como analisar se a leniência no combate à corrupção e os desvios éticos cometido por uma parcela dos atores que estavam vinculados direta ou indiretamente aos detentores do poder, tanto no Poder Executivo como no Legislativo, notadamente os escândalos do mensalão e do petrolão, contribuíram para agravar a crise.

É relevante, também, avaliar se a soma desses fatores foram, de fato, os principais responsáveis por provocar uma queda acentuada e persistente no PIB, notadamente no período de 2014 a 2016. Registre-se que esse péssimo desempenho do PIB causou a redução da demanda, aumento do desemprego, taxas de juros altas, inflação elevada, queda na arrecadação de tributos, e aumento da dívida pública bruta, produzindo efeitos negativos em larga escala na economia brasileira.  Reconhecemos, diante da dimensão e a complexidade do objeto de estudo do artigo, que o artigo apresenta algumas limitações, o que tende a refletir nas suas conclusões. Essas deficiências, no entanto, não retiram a validade do estudo, visto que cuida de um tema atual e relevante para a compreensão do atual cenário político e econômico do Brasil na atualidade.    

Referencial teórico
O referencial teórico deste artigo está apoiado nas teorias Keynesiana, neoinstitucional e das finanças públicas (KEYNES, 1983; MUSGRAVE, 1959; NORTH, 1997).
O Estado possui distintos instrumentos para intervir na economia. Por meio da política econômica o governo promove a intervenção na economia com o objetivo de manter o crescimento econômico e os níveis de emprego elevados, com estabilidade de preços. Destacam-se entre esses instrumentos as políticas: fiscal e monetária. Por meio delas torna-se é possível controlar, por exemplo, preços, salários, inflação, impor choques na oferta ou restringir a demanda (MUSGRAVE; MUSGRAVE, 1980; MATIAS-PEREIRA, 2016a).

Esses instrumentos e recursos utilizados pelo Estado para intervir na economia podem ser definidos da seguinte forma:

  • Política Fiscal - envolve a administração e a geração de receitas, além do cumprimento de metas e objetivos governamentais no orçamento, utilizado para a alocação, distribuição de recursos e estabilização da economia. É possível, com a política fiscal, aumentar a renda e o PIB e aquecer a economia, com uma melhor distribuição de renda.
  • Política Monetária – envolve o controle da oferta de moeda, da taxa de juros e do crédito em geral, para efeito de estabilização da economia e influência na decisão de produtores e consumidores. Com a política monetária, pode-se controlar a inflação, preços, restringir a demanda, etc.
  • Política Regulatória - envolve o uso de medidas legais como decretos, leis, portarias, etc., expedidos como alternativa para se alocar, distribuir os recursos e estabilizar a economia. Com o uso das normas, diversas condutas podem ser banidas, como a criação de monopólios, cartéis, práticas abusivas, poluição, etc.

Registre-se que a teoria das finanças públicas, de uma forma geral, preocupa-se com a existência das falhas de mercado, que torna necessária a presença do governo, do estudo das funções do governo, da teoria da tributação e do gasto público. As funções do Estado, conforme assinala Musgrave e Musgrave (1980) são as seguintes: função alocativa - fornecimento de bens públicos; função distributiva - ajustes na distribuição de renda de forma justa; e função estabilizadora - uso da política econômica para aumentar o nível de empregos, estabilizar os preços e obter uma taxa apropriada de crescimento. 
Dimensão econômica: desempenho da economia mundial e brasileira
Para permitir uma melhor compreensão sobre o desempenho da economia mundial, e em particular do Brasil, em 2015 e 2016, torna-se relevante analisar os relatórios divulgados recentemente pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial (BIRD), Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
 
. Relatório do FMI. A atualização feita pelo FMI no seu relatório "Perspectiva Econômica Global" (19 jan. 2016), reduzindo a previsão para o crescimento da economia mundial em 2016, de 3,6% para 3,4%, surge como um sinal de alerta sobre riscos substanciais que afetam especialmente as economias emergentes, como a do Brasil. A perspectiva de queda da economia brasileira em 2016 pelo Fundo é agravada pelo fato de ter sido descartada pela instituição a retomada do crescimento em 2017, como era previsto pela entidade em outubro de 2015. Prevê o Fundo que o PIB do Brasil, que caiu 3,8% em 2015, deve sofrer queda de 3,5% este ano (em outubro, a projeção era de contração de 1%). Para 2017, aponta que o Brasil deve registrar estagnação econômica (crescimento zero), em vez da expansão de 2,3% esperada antes.

. Relatório do Banco Mundial. O relatório do Banco Mundial (BIRD, jan. 2016), na mesma linha do FMI, assinala que a economia global deve ter uma aceleração modesta este ano, com crescimento de 2,9%, depois de se expandir 2,4% em 2015. Já os mercados emergentes deverão mostrar uma recuperação "anêmica", que vai conter o avanço do PIB mundial. As economias em desenvolvimento, por sua vez, deverão expandir 4,8% em 2016, menos do que o esperado anteriormente (5,4%), mas um aumento com relação à alta de 4,3% do ano passado. O crescimento da China deve desacelerar para 6,7%, depois de crescer 6,9% em 2015, e continuar perdendo força até 2018. Em relação ao Brasil, o Banco Mundial também reduziu significativamente as previsões para o desempenho da economia, estimando uma queda no PIB de 2,5% em 2016. Em 2015, o Banco estima que a economia brasileira tenha sofrido uma contração de 3,7%. O Brasil, ressalta o Banco, continua a lutar com incertezas políticas, enquanto o governo enfrenta obstáculos para a austeridade fiscal no Congresso. Em 2016, entre os países da América Latina e Caribe, o Brasil só deve ter desempenho "menos pior" que o da Venezuela, que tem previsão de contração de 4,8%.

. Relatório da OCDE. A previsão de crescimento econômico mundial, divulgadas no relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE, 1 jun. 2016), foi mantida em um "decepcionante" 3%, e uma expansão "modesta" de 3,3% em 2017. A OCDE pediu aos governantes a adoção de medidas urgentes para sair da "armadilha do crescimento frágil". O crescimento é fraco nas economias avançadas e desacelerou em muitas economias emergentes que haviam atuado como os motores da economia mundial depois da crise de 2008. A desaceleração das economias desenvolvidas e da China, assim como a persistente recessão na Rússia e particularmente no Brasil (que deverá repetir em 2016 a queda de 3,8% do PIB em 2015), que sofre o pior retrocesso de sua economia em quase um século

. Indicadores do IBGE. O desempenho do produto interno bruto (PIB) brasileiro, nos primeiros meses de 2016, mostra a dimensão da grave econômica que está levando o país para uma depressão. A recessão brasileira, conforme mostram os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), se aprofundou no primeiro trimestre de 2016, período em que o Produto Interno Bruto (PIB) teve queda de 0,3% em comparação com os três meses anteriores, a quinta queda trimestral seguida do PIB brasileiro. Em 2015, a economia brasileira encolheu 3,8%, o pior resultado em 25 anos. Em valores correntes, o PIB atingiu R$ 1,47 trilhão no primeiro trimestre de 2016. Na comparação com o mesmo período de 2015, houve queda de 5,4% no PIB – a oitava contração seguida da economia. Nos últimos quatro trimestres, a queda acumulada é de 4,7% frente aos quatro trimestres anteriores. Em valores correntes, o PIB acumulado nos quatro trimestres até março de 2016 somou R$ 5,94 trilhões, sendo R$ 5,088 trilhões referentes ao Valor Adicionado (VA) a preços básicos e R$ 855,1 bilhões aos Impostos sobre Produtos líquidos de Subsídios (IBGE, 1 jun. 2016),

A crise da economia brasileira, evidenciadas nos quatro documentos analisados, mostra que a crise política contribuiu de forma significativa para o agravamento econômico do país, notadamente, a partir do início de 2015. A inoperância do governo da presidente afastada Dilma, conforme demonstra os dados e indicadores socioeconômicos divulgado, ficaram explícitos na sua incapacidade de manter sob controle as contas públicas, e de promover as medidas econômicas e as reformas estruturais que o país necessita, agravado pela leniência com a corrupção.  

Dimensão política: fatores que contribuíram para o afastamento de Dilma Rousseff

Observa-se, numa retrospectiva sucinta dos principais eventos e atos que levaram ao impeachment de Dilma Rousseff da presidência, que a deterioração da política, das instituições, agravado pelo baixo desempenho da economia e a má gestão pública no país não ocorreu de forma repentina. Os descontentamentos com o baixo desempenho do governo Dilma começaram a ficar evidenciado a partir das megamanifestações populares ocorridas em nível nacional, em junho e julho de 2013, e que foram se intensificando pelos anos seguintes. Fortemente pressionado pela sociedade civil e pelos atores econômicos, o governo Dilma passou a ser instado a mudar a sua forma de gestão e promover um combate efetivo à corrupção. Diante das reivindicações, exigindo mudanças, o governo apresentou ao Congresso diversas medidas paliativas de reformas da economia e no sistema político. É quase desnecessário assinalar que, as reformas exigidas nunca foram realizadas na profundidade que o país necessitava.

As fragilidades e deficiências da administração são agravadas pelo modelo de coalizão presidencial, que visa garantir maiorias confortáveis de sustentação política ao governante, no qual as escolhas dos principais gestores são feitas pelo “político”. Nesse modelo injustificável de divisão do poder, que foi executado com intensidade no período dos governos Lula e Dilma, a competência técnica, a ética e o compromisso com a prestação de serviços públicos de qualidade ficam relegados a um plano secundário. Não se pode esperar que uma gestão que se apoia num contingente de pessoas estranhas ao serviço público, atuando em funções estratégicas, em geral, desqualificadas e dispostas a atender os interesses dos partidos ou políticos que os indicaram, obtenha bons resultados. Os seus limites de desempenho tendem a ficar entre o péssimo e o medíocre.
Esse cenário descrito foi agravado pelo viés centralizador, autoritário e intervencionista do modelo de gestão dos governos Lula e Dilma, que, entre outras distorções, executou uma política econômica inconsistente e dúbia, que resultou numa acentuada queda do produto interno bruto nos últimos anos; manipulação de dados e indicadores econômicos, notadamente das contas públicas, que levaram a uma perda de credibilidade do governo e do país junto ao mercado e os investidores externos. Tornou a administração confusa, com a adoção de mecanismos atípicos que retiram a credibilidade dos orçamentos públicos, além de ter centralizado as suas ações na Casa Civil e no Ministério do Planejamento, suprimindo de forma crescente a colaboração e a participação das áreas técnicas, especialmente dos servidores das carreiras típicas de Estado, na formulação, implementação, execução e avaliação das políticas públicas prioritárias.
Com a aproximação das eleições presidenciais de 2014, e com os indicadores econômicos e sociais indicando que a crise da economia iria se agravar, a então candidata Dilma, em busca de se reeleger, adotou uma estratégia pouco republicana, apoiada em marketing político e discursos com promessas que sabia de antemão que não poderia cumprir, e dessa forma conseguindo falsear a realidade econômica e social e convencer uma parte significativa de eleitores votar nela. As políticas de austeridades que teve que implementar, logo após ser reeleita, notadamente na gestão fiscal, na contramão dos seus discursos de campanha, trouxeram à tona a verdadeira realidade: um país com a economia arruinada e as contas públicas descontroladas. A rejeição decorrente da perda da credibilidade e da legitimidade da mandatária junto à opinião pública, conforme revelam as pesquisas, foi ocorrendo na mesma intensidade em que a crise da economia aumentava.  

A população, os empresários e os parlamentares de oposição, diante do agravamento da crise, intensificaram as cobranças de mudanças nos rumos do país. Eles passaram a exigir que os responsáveis pelo funcionamento do sistema político, notadamente dos dirigentes do parlamento, adotassem medidas para resolver o impasse político que paralisou o país. A saída constitucional para a crise foi a abertura do processo de impeachment contra Dilma Rousseff. Depois dos embates políticos entre os partidários de Dilma, contrários ao impeachment, e os prós-impeachment, o plenário da Câmara decidiu no dia 17 de abril, por 367 votos favoráveis e 137 contrários, pela admissibilidade do pedido de impeachment de Dilma. O processo aprovado pela Câmara foi encaminhado em seguida para o Senado Federal, onde recebeu parecer favorável na comissão especial de impeachment, e aceita a admissibilidade do processo de impeachment pelo plenário do Senado, em 12 de maio de 2016. Após essa decisão, a presidente Dilma foi afastada da presidência, por até 180 dias, assumindo em seu lugar o vice-presidente, Michel Temer, dentro do que determina as normas constitucionais.  

Implicações da rejeição pelo TCU das Contas do governo de 2014

É relevante destacar, no contexto da análise dos fatores que foram determinantes para a crise de governabilidade do país, a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que aprovou em 7 de outubro de 2015, por unanimidade, o parecer do ministro Augusto Nardes pela rejeição das contas do governo federal de 2014. As irregularidades apontadas pelo TCU, classificadas como “desgovernança fiscal”, recaíram sobre dois pontos: atraso no repasse de recursos para a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil, referentes a despesas com programas sociais do governo, o que configuraria operação de crédito; e edição de cinco decretos envolvendo créditos suplementares assinados pela presidenta Dilma Rousseff, sem autorização do Congresso Nacional. Esses artifícios contábeis somam R$ 106 bilhões, sendo R$ 40 bilhões referentes às chamadas “pedaladas fiscais”.

Para o TCU, o governo Dilma Rousseff, ao adotar manobras para aliviar, momentaneamente, as contas públicas, desrespeitou princípios constitucionais e legais que regem a administração pública federal. O que se observou foi uma política expansiva de gastos sem sustentabilidade fiscal e sem a devida transparência. Para o relator, as operações passaram ao largo das ferramentas de execução orçamentária e financeira instituídas. Nessa esteira, entende-se que os atos foram praticados de forma a evidenciar uma situação fiscal incompatível com a realidade. Por tratar-se de um parecer prévio, não cabe recurso da decisão no TCU. O parecer foi encaminhado ao Congresso Nacional, a quem compete examinar e aprovar ou rejeitar o parecer.  

No parecer prévio do TCU sobre as Contas da Presidente da República, no seu capítulo 1, está assinalado: “O Tribunal de Contas da União é de parecer que as Contas atinentes ao exercício financeiro de 2014, apresentadas pela Excelentíssima Senhora Presidente da República, Dilma Vana Rousseff, exceto pelos possíveis efeitos dos achados de auditoria referentes às demonstrações contábeis da União, consignados no relatório, representam adequadamente as posições financeira, orçamentária, contábil e patrimonial, em 31 de dezembro de 2014; contudo, devido à relevância dos efeitos das irregularidades relacionadas à execução dos orçamentos, não elididas pelas contrarrazões apresentadas por Sua Excelência, não houve observância plena aos princípios constitucionais e legais que regem a administração pública federal, às normas constitucionais, legais e regulamentares na execução dos orçamentos da União e nas demais operações realizadas com recursos públicos federais, conforme estabelece a lei orçamentária anual, razão pela qual as Contas não estão em condições de serem aprovadas, recomendando-se a sua rejeição pelo Congresso Nacional.” Em seguida, conclui: “O relatório sobre a execução do orçamento da União de 2014 demonstra, devido à relevância das irregularidades consignadas no relatório, não elididas pelas contrarrazões apresentadas pela Presidente da República, que não foram plenamente observados os princípios constitucionais e legais que regem a administração pública federal, bem como as normas constitucionais, legais e regulamentares na execução dos orçamentos da União e nas demais operações realizadas com recursos públicos federais, em especial o que estabelece a lei orçamentária anual (TCU, 7 out. 2015).” O Relatório e parecer prévio do TCU sobre as contas do governo da república de 2014, está disponível em: http://portal.tcu.gov.br.

Discussão sobre as motivações do processo de impeachment de Dilma
A admissibilidade e o julgamento pelo Senado Federal do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, que vem sendo conduzido dentro dos parâmetros constitucionais, foi a medida adotada para tirar o país de crise política. O afastamento de Dilma transfere para Michel Temer a responsabilidade de conduzir o Brasil na difícil travessia que tem pela frente. Enquanto aguarda a decisão do Senado Federal, a quem cabe decidir o afastamento de Dilma, Temer tem manifestado a sua preocupação com a gestão da “economia”. Os indicadores econômicos e sociais do país, que revelam um país com uma economia de terra arrasada: depressão econômica, queda na arrecadação, aumento acelerado do desemprego, inflação elevada, juros altos, crescimento da dívida pública bruta, entre outras fragilidades, comprova que Michel Temer tem razão em priorizar esse tema na agenda do novo governo.
É preciso alertar, no entanto, que a viabilização do governo Temer não se resume a geração de estímulos para a retomada da economia. Terá que resgatar a confiança dos agentes econômicos e os sonhos dos brasileiros. Diante da amplitude desses desafios, a agenda política do governo Temer deve levar em consideração a necessidade de melhorar a qualidade da maioria dos serviços públicos ofertados a população. Nesse sentido torna-se relevante chamar a atenção para a relevância do engajamento da administração pública para o sucesso do governo de reconstrução nacional que vai ser iniciado brevemente.
Dimensão ética: Balanços das ações para combater a corrupção 
Dos diversos escândalos de corrupção ocorridos nos governos Lula e Dilma, os dois que causaram os maiores prejuízos ao patrimônio público, e por consequência, os mais visíveis para a população foram: o mensalão (governo Lula), e o petrolão (governo Dilma), que diz com a operação Lava Jato, a maior investigação de corrupção e lavagem de dinheiro que o Brasil já teve, cujo volume de recursos desviados da Petrobras somam vários bilhões de reais. Esse esquema, que durou mais de uma década, contava com a participação de grandes empreiteiras organizadas em cartel, que pagavam propina para altos executivos da estatal e outros agentes públicos, para garantir contratos bilionários superfaturados. É importante reconhecer a importância da atuação de diversas instituições de controle, que mesmo pressionadas pelos que ocupam o topo do poder executivo, e uma parcela significativa do poder legislativo, apoiadas pela população, levaram adiante as investigações sobre uma corrupção desenfreada na administração pública.
É preciso ressaltar, também, que a contabilidade pública brasileira vem sendo aperfeiçoada, notadamente em relação a transparência da informação contábil. Observa-se, no entanto, que a grande maioria das entidades públicas ainda precisam de melhorar as suas formas de atuações, para se adequar às novas exigências, facilitando o acesso do cidadão no acompanhamento e na participação da gestão pública. Por sua vez, a efetivação do controle social, tema relegado a um plano secundário pelos governantes e políticos no Brasil, é resultado do desconhecimento da sua importância para a maioria da sociedade. Isso explica porque os diversos instrumentos de participação social, como conselhos de políticas públicas, observatório social, orçamento participativo, ouvidoria e audiências públicas, criados com o propósito de aproximar o cidadão do poder público, ainda não produzem os resultados desejáveis.
Avaliação do Brasil no ranking mundial da corrupção
O Brasil, com um índice de 38 pontos (a escala vai de 0 (extremamente corrupto) a 100 (muito transparente), ocupava a desconfortável 76ª posição no ranking sobre a percepção de corrupção no mundo em 2015, conforme revela o estudo divulgado pela organização Transparência Internacional, que analisa 168 países e territórios (TI, 27 jan. 2016). Em 2014 ocupava a 69ª posição, com 43 pontos. Foi o pior resultado de uma nação no relatório de 2015 comparando com o ano anterior. O escândalo na Petrobras, os problemas na economia e o crescimento do desemprego, são alguns dos motivos elencados pela ONG, para a deterioração do Brasil no ranking. O país divide a 76ª posição com mais seis nações: Bósnia e Herzegovina, Burkina Faso, Índia, Tailândia, Tunísia e Zâmbia. Veja no gráfico a seguir, o comportamento do Brasil no ranking mundial da corrupção, no período de 2008 a 2015.
Por sua vez, a Dinamarca, com um índice de 91 pontos, ficou em 1º lugar, como o país em que a população tem menor percepção de que seus servidores públicos e políticos são corruptos. Os países nas primeiras posições apresentam características comuns que são vitais: altos níveis de liberdade de imprensa; acesso a informação sobre orçamentos que permite à população saber de onde procede o dinheiro e como se gasta; altos níveis de integridade entre aqueles que ocupam cargos públicos. A tabela de honestidade na América do Sul tem o Uruguai como o país mais transparente no 21º, com índice de 74. O país mais corrupto é a Venezuela, com índice 17, na 158ª posição.
Balanço dos escândalos do mensalão e petrolão (operação Lava Jato)
Para uma melhor compreensão sobre as principais peculiaridades dos casos de corrupção nos governos Lula e Dilma, apresentamos a seguir, um balanço dos emblemáticos escândalos do mensalão e petrolão.  Registre-se que, o julgamento pelo STF da Ação Penal 470 (escândalo do mensalão), e as revelações das investigações da operação Lava Jato contribuíram para revelar à sociedade brasileira os graves problemas que o país enfrenta nos campos da política, economia e da ética.  
Mensalão. O julgamento da Ação Penal 470 (escândalo do mensalão) feito pelo STF, ficou comprovado que diversos parlamentares integrantes do PP, PL, PTB, PMDB e do PT, receberam dinheiro pessoalmente ou por intermediários, para apoiar projetos do governo federal, no primeiro mandato do ex-presidente Lula, por meio do esquema de lavagem de dinheiro. No julgamento, que durou quatro meses e meio, foram realizadas 53 sessões plenárias do STF, que levou à condenação 25 dos 37 réus do processo, e 12 foram absolvidos. O esquema foi organizado por um núcleo político chefiado por José Dirceu, então ministro da Casa Civil, e integrantes da alta cúpula do PT. O núcleo mineiro Marcos Valério foi apontado como operador do mensalão. Com o auxílio de seus sócios e funcionários, foi condenado pelo Supremo por utilizar suas empresas de publicidade para desviar dinheiro público e repassá-lo a parlamentares. Kátia Rabello, dona do Banco Rural e diretores da instituição financeira foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. Na ementa do acórdão, ficou explicitado a decisão do STF de retirar o mandato dos deputados federais condenados no processo. Foram quatro: José Genoíno (PT-SP), João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT). A síntese do julgamento do mensalão está explicitada na ementa do acórdão do julgamento da Ação Penal (AP) 470, publicada no dia 22 de abril de 2013.
Lava Jato. Os números da operação Lava Jato confirmam que se trata da maior investigação de corrupção e lavagem de dinheiro da história do Brasil (MPF, maio 2016). Na primeira etapa, a Lava Jato investigou crimes financeiros praticados por quatro organizações criminosas lideradas por doleiros. Num segundo momento, corrupção e lavagem bilionárias praticadas na Petrobras. Na terceira etapa, que é a atual, a Lava Jato tem revelado corrupção em outros órgãos públicos federais, como Ministério do Planejamento, Eletronuclear e Caixa Econômica Federal.
As investigações e condenações que resultaram da operação Lava Jato, iniciada em 17 de março de 2014, mostra o volume astronômico de recursos públicos desviados pela corrupção institucionalizada no governo federal. Apenas em propinas pagas, foram R$ 6,2 bilhões. Os prejuízos foram estimados pelo Tribunal de Contas da União em até R$ 29 bilhões e pelos peritos da Polícia Federal em até R$ 42 bilhões. Até junho de 2016 a Lava Jato á havia recuperado cerca de R$ 4,2 bilhões. Uma verdadeira fortuna que havia sido roubada do povo brasileiro pelos envolvidos. Esse montante é apenas uma pequena parte do que ainda irá retornar para os cofres públicos. Apenas em processos de cunho indenizatório, propostos pelo Ministério Público no âmbito da operação Lava Jato, estão sendo pleiteados cerca de R$ 21 bilhões contra 34 pessoas físicas e 16 pessoas jurídicas.
Dos 207 acusados, o juiz Sérgio Moro, 13.ª Vara Federal Criminal de Curitiba, já havia condenado 105 pessoas a um total acumulado de 1133 anos de pena. Inclui-se, nesse total, a sentença em que o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu do governo Lula e outras 10 pessoas foram condenadas pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e pertinência à organização criminosa. As penas aplicadas aos 11 réus desta ação penal chegam a 143 anos. A Lava Jato recuperou no exterior mais de R$ 546 milhões (MPF, jun. 2016). As informações oficiais do MPF sobre a Operação Lava Jato estão disponíveis no site www.lavajato.mpf.mp.br.
A forma como ocorreu os desvios de recursos públicos no caso do mensalão estão se mostrando idênticos a corrupção institucionalizada na Petrobras, conforme revelam as apurações da denominada operação Lava Jato (MPF, 2016).

Discussão sobre os instrumentos de prevenção e combate à corrupção 

As evidências colhidas nas inúmeras delações premiadas e nas gravações dos investigados pela operação Lava Jato (MPF, 2016), revelam que as instituições de controle, em especial, a Polícia Federal, Ministério Público Federal e o Poder Judiciário, apesar dos bons resultados já alcançados, continuam enfrentando forte resistências por parte dos investigados. Essas constatações contribuíram para alertar a sociedade da necessidade da aprovação de leis mais rígidas para combater a corrupção no Brasil. Nesse sentido, merece destaque, o projeto de lei de iniciativa popular protocolado na Câmara dos Deputados, resultado da campanha “10 Medidas contra a Corrupção”, propostas pelo Ministério Público Federal (MPF) para reforçar o combate à corrupção. Na mesma linha que levou a aprovação da Lei da Ficha Limpa, chega ao Congresso Nacional na terça-feira (29/03), as sugestões de alteração legislativa por iniciativa popular no campo do combate a corrupção. O projeto, sem vínculo partidário, propõe mudanças na legislação para coibir e punir com mais rigor os crimes de corrupção.
É perceptível, nesse cenário de conflitos, que o elevado nível de descontentamento da população, tem uma forte correlação com a condução equivocada da economia, da má gestão pública e da leniência no combate à corrupção. Esses argumentos são corroborados pela pesquisa divulgada pelo Ibope Inteligência (25/4/2016), que mostrou a insatisfação dos brasileiros com a democracia no país. O levantamento apontou que 83% dos brasileiros estão pouco ou nada satisfeitos com o funcionamento do sistema político. O índice de satisfação é o menor desde que o instituto iniciou a medição em 2008. O recorde anterior de insatisfação foi registrado em 2015, quando 81% declararam-se pouco ou nada satisfeitos com a democracia no Brasil, contra 15% que afirmaram estar satisfeitos ou muito satisfeitos. O resultado da pesquisa mostra a insatisfação da população com as instituições do Estado e o impacto dos casos de corrupção investigados, além de colocar o regime democrático em xeque.
Contrariando os discursos e os argumentos da presidente afastada, de ex-ministros, e de inúmeros políticos com envolvimento em escândalos de corrupção, é inegável que as instituições continuam sob ameaças, notadamente os órgãos de controle, afetadas por uma reconhecida falta de empenhos de lideranças políticas, governantes e de segmentos do setor privado, que se sentem ameaçados pelas ações anticorrupção. Isso explica porque se mostram tão relutantes em apoiar o fortalecimento do sistema de prevenção e de combate a corrupção, pois sabem que ele pode acabar com a impunidade no Brasil. Por sua vez, a mobilização maciça da população nas ruas e nas redes sociais, apoiando de forma incondicional as instituições Polícia Federal, Ministério Público Federal e Justiça Federal envolvidas nas investigações da corrupção institucionalizada, em particular a Operação Lava Jato, se apresenta como o fator decisivo para garantir a continuidade da “Operação Mãos Limpas” brasileira.  

Conclusões
Ficou razoavelmente demonstrado nas discussões e avaliações desenvolvidas neste estudo, de que houve uma conexão estreita entre as variáveis “economia, política e corrupção”. Dessa forma, a piora da crise política, contaminada pela corrupção institucionalizada nas estatais, impactou negativamente no desempenho da economia. Por sua vez, as condenações dos réus envolvidos no escândalo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal, e as revelações das investigações do escândalo de corrupção na Petrobras, deixou exposto para a sociedade um sistema político exaurido, corrompido pelo patrimonialismo, corporativismo e corrupção. Pode-se argumentar, assim, que os efeitos da crise política-econômica-ética foram determinantes para a instalação da crise de governabilidade no país, e para a admissibilidade do processo de impeachment pelo Senado Federal contra a presidente Dilma Rousseff.

Esse quadro de desajustes na economia, agravados pela insegurança no quadro político e pelas revelações das investigações da Lava Jato, está consubstanciado na queda acentuada do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, no biênio 2015/2016 (FMI, mar. 2016; OCDE, jun. 2016, IBGE; jun. 2016). Esses desequilíbrios estão levando o país para a depressão, provocando efeitos colaterais perversos no campo social, notadamente no aumento acelerado do desemprego e na queda da renda dos trabalhadores. A soma dos inúmeros equívocos cometidos pelos governos petistas, e de forma mais acentuada, no segundo mandato do governo Dilma Rousseff, erodiram gradativamente as bases da governança pública, notadamente pela perda de sua base de apoio político no Congresso Nacional e pela falta de credibilidade, evidenciado nas pesquisas de opinião pública que mostravam os baixos índices de aprovação pessoal e de seu governo junto à população.

A crise de governabilidade deixou evidenciado que não é mais possível continuar prevalecendo os interesses políticos, de grupos ou pessoais para a escolha dos dirigentes e gestores na administração pública. Ficou demonstrado que isso resulta num baixo desempenho da gestão pública, decorrente das fragilidades dos perfis desses atores, em geral, marcados pela falta de competência e propensos à corrupção. Essas fragilidades existentes na administração pública se exacerbaram com a retomada do modelo patrimonialista, executado por meio do aparelhamento político do Estado e o fisiologismo, base de sustentação do “modelo de coalizão presidencial”, utilizado de forma intensa pelos governos Lula e Dilma. Constata-se, assim, que a burocracia e a falta de transparência na administração pública, agravados pelos desperdícios decorrentes da incompetência na gestão pública, e a tolerância com a corrupção estão na base da crise.
Pode-se afirmar, ainda, apoiado na análise dos documentos, relatórios e indicadores econômicos e sociais, que os problemas a serem enfrentados pelos governantes e pela população nos próximos anos não se resume apenas ao baixo desempenho da economia. O país possui inúmeras fragilidades do ponto de vista político, social e de gestão pública, em especial, a baixa qualidade dos serviços públicos ofertados à população, desperdícios, corrupção e falta de transparência. Essas distorções, pode-se especular, caso não sejam corrigidas tempestivamente, irão continuar fomentando o nível de descontentamento da população com os governantes e políticos.
Torna-se possível argumentar, diante desse cenário crítico, que a solução desses complexos e amplos problemas, que foram agravados pela crise de governabilidade que afetou o Brasil, notadamente na fase final do governo da presidente afastada Dilma Rousseff, somente irá ocorrer com mudanças profundas nos campos da economia, da política e da boa governança, promovendo o enfrentamento aos desperdícios e à corrupção. Isso vai exigir reformas estruturais, em especial, a que promova a refundação da administração pública, apoiada na meritocracia, na ética e na transparência. É relevante reafirmar, por fim, que essas reformas são essenciais para a retomada do crescimento da economia brasileira.
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* Economista e advogado, doutor em ciência política pela Universidade Complutense de Madri e pós-doutor em administração pela Universidade de São Paulo. É professor de administração pública e pesquisador associado do programa de pós-graduação em contabilidade da Universidade de Brasília. E-mail: matias@unb.br

Recibido: 08/06/2016 Aceptado: 10/08/2016 Publicado: Agosto de 2016

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