Observatorio Economía Latinoamericana. ISSN: 1696-8352
Brasil


ESTADO INEFICIENTE PROMOVE RESERVAS EXTRATIVISTAS (IN) SUSTENTÁVEIS NA AMAZÔNIA

Autores e infomación del artículo

Vanessa Silva do Amaral*

Josimar da Silva Freitas**

Universidade Federal do Pará

chantal_nessa@yahoo.com.br

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Resumo
Nós avaliamos a Reserva Extrativista Mapuá com base em políticas públicas direcionadas a proporcionar conservação e desenvolvimento, considerando a percepção das populações tradicionais em relação ao Estado e as necessidades de subsistência. A pesquisa foi desenvolvida por meio de uma abordagem qualitativa em três comunidades da Reserva Extrativista Mapuá. Aqui, concluímos que somente o Estado dispõe de condições suficientes para mudar o cenário atual das RESEX, porque enquanto as populações tradicionais não forem prioridades no contexto de reservas extrativistas, distantes estaremos da tão vislumbrada sustentabilidade em unidades de conservação de uso sustentável da Amazônia.
Palavras-chave: Estado, Reserva Extrativista, Amazônia.

INEFFICIENT STATE PROMOTES EXTRACTIVE RESERVES (IN) SUSTAINABLE AMAZON

Abstract
We evaluated the Extractive Reserve Mapuá based on public policies to provide conservation and development, considering the perception of traditional populations regarding State and subsistence needs. The research was conducted through a qualitative approach in three communities of Extractive Reserve Mapuá. Here, we concluded that only the State has sufficient conditions to change the current scenario of RESEX, because while traditional populations are not priorities in the context of extractive reserves, far will be the tam envisioned sustainability in the Amazon sustainable use conservation units.

Keywords: State, Extractive Reserve, Amazon.


Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

Vanessa Silva do Amaral y Josimar da Silva Freitas (2016): “Estado ineficiente promove reservas extrativistas (in) sustentáveis na Amazônia”, Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, Brasil, (noviembre 2016). En línea:
http://www.eumed.net/cursecon/ecolat/br/16/estado.html

http://hdl.handle.net/20.500.11763/br16estado


Introdução

            A proposta de reserva extrativista tanto nasce da consciência empírica dos seringueiros e todos aqueles que dependiam de atividades florestais (Allegretti, 1989), quanto aos grupos sociais que têm sua sobrevivência dependente da utilização de produtos nativos da floresta. As RESEX foram efetivamente a primeira grande síntese amazônica moderna não-indígena de um novo modelo de desenvolvimento humano local, associada ao ideário de preservação dos ecossistemas naturais com base em áreas protegidas (Silva, 2007).
            A Reserva Extrativista Mapuá foi instituída juridicamente pelo Decreto 20 de maio de 2005, no município de Breves, estado do Pará. Como as demais, esta foi fundada com o objetivo de demarcar território e reduzir pressão humana aos recursos ambientais. As RESEX constituem uma possibilidade de sustar a degradação ambiental, resolver problemas sociais e viabilizar a exploração de produtos silvícolas de grande interesse para o mercado internacional (Fearnside, 1992).
            Contudo, baixo investimento financeiro e em recursos humanos (por meio de políticas públicas pelo o Estado) são dois fortes problemas que desestabilizam as metas de conservação ambiental e desenvolvimento social. Dentre tais instrumentos inadequados, outros problemas surgem, a exemplo de capital social reduzido, déficit de moradia, ausência de saneamento básico, saúde deficiente, assistência técnica inexistente, educação precária, entre os mais importantes (Costa, 2015; Silva et al., 2015).  
            Neste contexto, deu-se continuidade a uma política de gerenciamento ineficaz e com grande limitação na promoção de sustentabilidade ambiental, social e econômica que, aliás, essa perspectiva se reproduz em outras Reservas Extrativistas na região amazônica e em outras regiões do país (Freitas; Rivas, 2014; Freitas; Florentino; Souza, 2015; Freitas et al., 2015).
            Essa discussão nos leva a questionar: Por que o Estado não consegue implementar políticas públicas que garantam conservação ambiental e desenvolvimento social? E as populações locais, o que pensam do comportamento do Estado ao longo dos 11 anos de criação da Reserva Extrativista Mapuá? Nosso desafio é responder estas questões ao final deste paper.
Com base nestes questionamentos, nos avaliamos a Reserva Extrativista Mapuá com base nas políticas públicas direcionadas a proporcionar conservação e desenvolvimento, considerando a percepção das populações tradicionais em relação ao Estado e as necessidades de subsistência.

Método e Procedimentos

            A Reserva Extrativista Mapuá estende-se por uma área de 93.746,34 hectares as margens do Rio Mapuá e Rio Aramã, no extremo leste do município de Breves, arquipélago de Marajó, estado do Pará (Pinto, 2008; Renó; Renó; Santos, 2010; Amaral, 2016). A figura 1 apresenta as dimensões da RESEX Mapuá e suas respectivas comunidades.

                A Reserva Extrativista Mapuá é ocupa por 2.877 pessoas, das quais residem em 16 comunidades e sobrevivem da agricultura e do extrativismo (BRASIL, 2010). Os municípios de Anajás, São Sebastião da Boa Vista e Curralinho fazem limite na dimensão leste do município de Breves.
            Além disso, a pesquisa foi desenvolvida por meio de uma abordagem qualitativa em três comunidades da Reserva Extrativista Mapuá. Esse tipo de pesquisa é mais critica e potencialmente emancipatória (Bauer, 2002). Foram realizadas entrevistas e aplicação de formulários semiestruturados (questões abertas e fechadas) nas comunidades Bom Jesus, Nossa Senhora das Graças (Vila Amélia) e Lago do Socó.
As questões dos formulários evidenciaram informações detalhadas e abrangentes sobre dados e aspectos ambientais, sociais, econômicos e culturais das famílias residentes na RESEX. Observações diretas, conversas informais, entrevistas e registros fotográficos condicionaram o alcance dos resultados, assim como contribuem para a construção de novos paradigmas (Thompson, 2002).
A coleta de dados ocorreu nos meses de junho, julho, agosto, outubro e novembro, de 2015. Posteriormente houve coleta em janeiro de 2016. Seguindo um roteiro metodológico e com o protocolo de todas as informações coletadas de cada informante. A rigor, como critérios de inclusão foram entrevistadas lideranças comunitárias em razão de conhecimento de implementação de políticas públicas e gerenciamento pelo o Estado, na expectativa de alcançar maior representatividade.
Após esta etapa, o estudo contou com tratamento de dados, sistematização e conclusão da pesquisa. Dito desta maneira, as ideias emancipatórias e construtivistas colaboraram tanto com os procedimentos quanto as técnicas utilizadas (Creswell, 2007).

Desafios de Sustentabilidade Frente às Políticas Socioambientais

O surgimento de reservas extrativistas na Amazônia teve início em 1990 no estado do Acre, Amapá e Rondônia. A criação se fundamenta com base numa proposta de seringueiros, que teoriza extrativismo, regulação fundiária e utilização dos recursos da floresta por comunidades tradicionais de forma sustentável (Allegretti, 1989, p. 25; Allegretti, 2002; Freitas, 2012; Cardoso, 2015).
A título de exemplo, o extrativismo possui vantagens sociais e ambientais frente ao desmatamento (Fearnside, 1989). De acordo com Allegretti (2008), ao mudar a forma de exploração (como acontece nas reservas extrativistas) permanecem os recursos extrativistas florestais, o que demonstra que não é o extrativismo que inviabiliza o desenvolvimento da floresta, mas sim a maneira como as pessoas se organizam para explorá-lo.
É certo que a criação de reservas extrativistas foi uma "conquista política dos seringueiros como instrumento para conservar os recursos, garantir suas formas de existência e de organização política" (Cardoso, 2015, p. 131). Os seringueiros do Acre foram protagonistas e pioneiros no processo de expansão, ocupação e desenvolvimento da Amazônia contra os desmatamentos para a formação de pastagens (Allegretti, 2002, 138; Medeiros, 2006; Silva e Simonian, 2015).  
O Estado permitiu perda ecossistêmica e uso da terra na região Amazônica, quando ofereceu benefícios para pecuaristas de outras regiões. Incentivos agropecuários fundamentados em baixos preços de terras, suaves taxas de juros e subsídios governamentais atraíram investidores (Kirby et al., 2006). Os efeitos dessas decisões causaram (in) sustentabilidade política, econômica, ambiental e social, que ainda não foram superadas na região (Paula, 2013).
Equilíbrio entre comunitários e meio ambiente se caracteriza como um objetivo de conservação, e não o desenvolvimento socioambiental disseminado pelas instituições. O Estado brasileiro não tem gerenciado de forma eficiente e com a devida atenção as unidades de conservação (Rebia, 2015), mas contribuiu no surgimento e intensificação de conflitos sociais, econômicos, culturais e étnicos (Batista, 2010; Simonian, 2013; Silva et al., 2015).
Problemáticas e incongruência, articuladas a falta de eficiência do Estado e a participação da população local ainda se mostram muito presentes em Reservas Extrativistas (Freitas e Rivas, 2014). A maior dificuldade das populações locais que utilizam a pesca para subsistência é a política de desenvolvimento para a região, que não apresenta uma visão endógena, e isso influencia de forma negativa a vida de populações locais (Cardoso, 2015, p. 142).
Demasiado foco na conservação ambiental (e isso não significa eficiência) pelo Estado compromete a subsistência de milhares de famílias e, consequentemente, os recursos ecossistêmicos nas reservas extrativistas. Conforme apontado por Aragón (2013), o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) surgiu depois de mais de dez anos de criação da primeira RESEX, do qual foi instituído pela Lei nº 9.985 de 18 de julho de 2000. Isto confirma que a conservação é meta prioritária das instituições ambientais, e não o discurso bem elaborado direcionado a sustentabilidade das populações humanas nestas áreas.
O modelo de desenvolvimento norteou-se apenas na preocupação conservacionista vinculada à problemática ambiental universal e não nas especificidades do povo amazônico (CARDOSO, 2015, p. 146). Apenas a criação de unidades de conservação não é suficiente para garantir a sustentabilidade socioambiental, porque o capital social reduzido, o déficit de saneamento básico e o baixo investimento em saúde e educação são alguns problemas que ameaçam a manutenção do modelo (Freitas; Florentino e Souza, 2015).
Estas áreas são palcos de conflitos em virtude da ineficiência na gestão, e assim estão sujeitas ao descontrole (Pinto, 2008a; SILVA et al., 2015, p. 152). As reservas extrativistas ainda se encontram distantes dos conceitos de sustentabilidade por falta de opção econômica, uma vez que os moradores buscam solucionar esta problemática por meio de pecuária extensiva (Allegretti, 2008, p. 41).
Comodidade e o bom mercado bovino e bubalino dificulta a manutenção do extrativismo pelos os seringueiros. Isto está ligado às fragilidades institucionais na gestão e planejamento continuado e co-participativo dessas áreas, porque a insuficiência de recursos humanos e financeiros para realização de atividades como fiscalização e pesquisa são comuns em unidades de conservação de uso sustentável (Vianna, 2008; Dumith, 2013).
Com base nestes argumentos, a atividade extrativista não é um modelo economicamente viável para a região amazônica por conta da instabilidade e forte concorrência de outros produtos (Homma, 1989). As populações extrativistas estão sujeitas a prática exploratória por conta de intermediários na comercialização dos produtos extrativistas (Anderson, 1994; Cavalcante, 2002).
Em busca de subsistência, os seringueiros ampliam atividades produtivas para garantir alimentação e o mínimo de serviços sociais. As reservas extrativistas surgem com a finalidade de gerar conservação ambiental e desenvolvimento social, no entanto, há perda de cobertura vegetal, e surgimento de conflitos sociais, econômicos, cultural e étnicos (Simonian, 2013, p. 209; Silva et al., 2015, p. 156)
As realidades sociais, econômicas, ambientais e culturais são heterogêneas, por mais que a política ambiental de reservas extrativista seja única para todo o Brasil (Florentino; Silva e Freitas, 2016). Por tudo, a baixa condição a subsistência de comunidades tradicionais causa intensificação de atividades produtivas, à proporção que a criação de bovinos e a expansão agrícola causam maior perda ecossistêmica e aumento de queimadas.

Efeitos das Políticas Públicas no Cotidiano dos Moradores

            A teoria de convivência perfeita do homem com a natureza construiu bases sólidas para a criação de reservas extrativistas na Amazônia Brasileira, em 1990. Na prática, os resultados não responderam a teoria preestabelecida. De uma forma geral, as atividades extrativistas se iniciam, passam por uma fase de expansão, de estagnação e depois declinam, no sentido do tempo e da área espacial (Homma, 2014).
            As RESEX em várzea tendem ao extrativismo mais forte e/ou mais presente, mas não podemos afirmar como atividade produtiva principal. De acordo com Amaral (2016, p. 44), a Reserva Extrativista Mapuá possui a dinâmica estável de produção extrativista, mas não predominante. O extrativismo vegetal sempre esteve presente na região, primeiramente com a extração do látex e posteriormente com a exploração do açaí (Euterpe oleracea), palmito e madeira (Pinto, 2008b).
            No final dos anos de 1960, a economia da borracha foi substituída pela extração da madeira. De acordo o relato do ex-líder do Sindical de Breves, os patrõesnão quiseram mais trabalhar com o extrativismo.  

Exatamente no ano de 2000 teve um conflito agrário com a madeireira Ecomapuá que antes era Madeira Santana e o proprietário vendeu pro chinês chamado Lapichã aí o chinês colocou várias regras lá que impossibilitava os moradores lá da área a fazer as suas atividades que estavam acostumados a fazer. Aí gerou um conflito e a partir daí o sindicado entrou [...] tentando resolver o problema aí foi feita várias reuniões nas comunidades aí chegamos a conclusão que para resolver o problema teríamos que criar uma unidade de conservação. Aí depois a gente passou a discutir o modelo de unidade; se seria o PAEX, RDS ou se seria uma RESEX. Bom, todo mundo concordou que seria uma RESEX também porque a área lá era mais apropriada pro modelo de regularização. Então a partir daí a gente começou a trabalhar; a pegar as assinaturas. A gente pegou várias assinaturas lá e enviamos, na época era o CNPT, que era um, digamos assim, um braço do IBAMA que cuidava dessa parte de regularização fundiária dentro do IBAMA. E a gente solicitou a criação de unidade de conservação no modelo RESEX e a gente procurou também um apoio aí da prefeitura, dos órgão aí (EMATER) muitos desses órgãos aí que assinaram dizendo que eram favorável a essa criação e o CNPT mandou os técnico fazer a vistoria e achou viável a proposta. Então no dia 20 de maio de 2005 aí eu estive, fui convidado pra estar presente na assinatura do Decreto de criação da RESEX. Então foi dia 20 de maio de 2005 no Palácio do Planalto, eu estive lá, quando o presidente Lula assinou o Decreto (A. M., ex-líder sindical de Breves, entrevista realizada em janeiro de 2016). (informação verbal).

Do ponto de vista de demarcação de território, o uso da terra gera conflitos entre moradores locais, pois constatamos que há grande número de reclamações em relação aos conflitos por território. O problema está relacionado com a invasão de áreas tradicionalmente ocupadas por determinadas famílias que migram de outras localidades. Estes acontecimentos ocorrem entre próprios familiares, e são advindas de políticas de desenvolvimento que não proporcionam garantia do direito a terra, instituição do direito hereditário de uso (Redig; Silva, 2009; Silva, 2004) e a tradição como um “estilo” de desenvolvimento (Silva et al., 2015, p. 76).
            Estes eventos marcam a ausência e ineficiência gerencial do Estado, uma vez que o baixo gerenciamento, fiscalização e controle se tornaram responsáveis por conflitos locais que surgem entre comunitários. “[...] um dos problemas dos membros de comissões é de se convencer e convencer que não falam somente por si mesmos, mas falam em nome de uma instância superior a definir e fazer existir” e “essa comissão é mandatada pelo Estado e a regressão rumo aos mandantes não vão mais longe disso” (Bourdieu, 2014).
            Em termos sociais, a região do Marajó possui taxa de analfabetismo de 21% para pessoas com 15 anos ou mais de idade, a pobreza alcança 57% da população, e a mortalidade infantil é de 17% (BRASIL, 2010). A Reserva Extrativista de Mapuá está contida nestes números pela localização geográfica, e isto demonstra que o Estado por meio de efetivação de políticas públicas é ineficaz, e as famílias possuem eminentes dificuldades para subsistência alimentar.
            Os efeitos disso são violência interna, necessidade de implementação de um sistema de educação, saúde, saneamento básico, entre os principais relatos pelos os moradores.

Nas falas que a gente observa são mais na área social. Hoje, por exemplo, a questão da violência que é uma situação grave que se apresenta pra eles e que tem sido relatava pra nós. Essa violência ocorre de algumas práticas como o uso do álcool, comercialização de drogas de pessoas que saem da cidade para fazer a comercialização de drogas nessas áreas não só no Mapuá, mas em várias localidades onde tem uma população de juventude muito grande. Então essa questão da violência é muito relatada com a gente. Além da violência, demandas em relação à questão de saúde; a falta de postos de saúde inclusive em algumas localidades é preocupante. Já na área educacional nem tanto porque eles estabelecem uma relação mais direta com a prefeitura. Não a contento, mas eles conseguem encaminhar situações de reivindicações isso falando da área social. Já as demandas do ponto de vista econômico são essas que a gente tá conversando aqui que é o fortalecimento da sua base produtiva a partir dos produtos de destaque como é a questão da madeira e do açaí visando exatamente o fortalecimento da sua base produtiva então eles tem as demandas que são demandas reivindicatórias na área social, mas também apresentam demandas que envolvem já o processo de emancipação econômica deles que é o processo do fortalecimento da cooperativa (M. S., analista do ICMBIO, entrevista realizada em janeiro de 2016). (informação verbal).

Nesta direção, a Vila Amélia (comunidade composta por 60 famílias) sofre com problemas já citados anteriormente: sistema de saúde e educação precárias e violência entre comunitários. Esse conflito, segundo o relato de alguns moradores da comunidade, se dá por conta da invasão de terrenos de vizinhos para a extração de palmito e madeira. Conforme observado em campo, esses conflitos estão presentes na comunidade, como sendo problemas que atingem a maioria das comunidades da RESEX Mapuá (Amaral, 2016, p. 67).

Isso vem fortalecer o que ARCE et al. (2014): espaço que contém recursos naturais, há dimensões sociais importantes a considerar como a questão de moradia e sobrevivência (Little, 2001), no qual essas [...] disputas entre grupos sociais derivadas dos distintos tipos de relação que eles mantêm com o seu meio natural. O conceito socioambiental engloba três dimensões básicas: o mundo biofísico e seus múltiplos ciclos naturais, o mundo humano e suas estruturas sociais, e o relacionamento dinâmico e interdependente entre esses dois mundos (Little, 2001, p. 107).

 Em termos culturais, a educação é um direito humano e deve estar articulado com projetos de desenvolvimento, a exemplo de trabalho e cultura, respeito a diferença, tradições e valores e etc. (Hilário, 2010). Entretanto, ações parecem estagnar programas pontuais, à medida que a RESEX trilham lentamente em rumos indecisos da sustentabilidade, repetindo o que ocorre na realidade de outras unidades de conservação de uso sustentável (Costa, 2014).

As salas contam apenas [RESEX Arióca Pruanã] com a iluminação do dia, já que nem todas possuem gerador de energia, fato que inviabiliza a realização de aulas noturnas para o público adulto. Como a maioria dessas escolas tem paredes de madeira, ao longo do dia a temperatura é agradável, salvo os períodos de dias quentes quando o calor se torna excessivo, e tanto professores quanto estudantes acabam tendo seu rendimento comprometido. Ressalta-se que nas oito escolas não existem bibliotecas, apenas em uma delas existe uma sala que é destinada à leitura, mas que não dispõem de nenhum projeto educativo voltado para esta prática. A falta de bibliotecas, segundo a fala de professores das escolas investigadas, é um dos grandes problemas especialmente no momento de realização de pesquisas e demais atividades que exijam investigação em livros (Costa, 2014, p. 203).

Na comunidade do Lago do Socó, por exemplo, apesar de existir uma escola (figura 2), os moradores denunciam a falta de aulas, pois apenas 16 horas de aulas são ministradas pelo o professor durante o mês.
 
            Segundo relato dos moradores da Comunidade Bom Jesus (F. S. e C. M), a professora anterior (da referida comunidade) era contratada e ministrava aulas todos os dias, porém, com a chegada do novo professor, não há cronograma que especifique os dias que haverá aulas.

Olha, principalmente a educação não está boa...teve um professor praí mas ele era assim...ele era enxerido ele ficaria com qualquer uma aluna dele de menor. Teve até uma vez que uma filha minha mesmo ele prendeu ela pra dentro lá da secretaria e falou um monte de coisa pra ela que ele num devia de falar que ela me falou. Aí com outra aluna dele de novo ele tentou sair com ela e ela tem até marido. A minha tem 9 anos [...] esse causo aí aconteceu e eu até falei lá na SEMED. Ele era concursado. Só que assim o pessoal lá na SEMED me falou assim "ele é mesmo cheio de pobrema esse cara" ele já foi preso por através disso mas continuou dando aula. Era pra ele tá preso um cara desse. O que fizeram agora é que ele foi afastado. Ele não foi preso fizeram até um abaixo assinado agora querendo a mesma professora daí que era a professora contratada daí ela dava direitinho a aula. Ela era boa aí veio esse um na vaga dela e não prestou. Ele passou só um ano que ele passou dando aula. (F.S., Comunidade Bom Jesus, entrevista realizada em julho de 2015). (informação verbal).

A situação é bastante preocupante, ao passo de causar intervenção direta na vida de cada indivíduo da Reserva Extrativista Mapuá. A impressão que temos vai de encontro com a presente afirmação: “quanto mais ignorante melhor”, haja vista as políticas de comando e controle imposta pelo o Estado.

Limites da Política Ambiental na RESEX Mapuá

            Além do extrativismo, a criação de reservas extrativistas esteve pautada em reduzir o desflorestamento desordenado ocasionado pelo o crescimento do agronegócio na Amazônia. Incentivos agropecuários fundamentados em baixos preços de terras, suaves taxas de juros e subsídios governamentais atraíram investidores (Kirby et al., 2006, p. 442). Dito desta maneira, o desflorestamento da RESEX Mapuá é analisado no quadro 1.

Quadro 1: Desflorestamento da RESEX Mapuá


Reserva Extrativista

Área Total (ha)

Períodos

Desflorestação (Km²)

Percentual (%)

 

Mapuá

    93.746,34

1990-1999

0,1

0,01

2000-2004

27,06

2,89

2005-2009

0,74

0,08

2010-2014

1,34

0,14

                      29,24

3,12

 

 

 

 

 

 

 

 

Fonte: Adaptado do INPE/PRODES (2016)

            Com base nas informações, na década de 1990, a área teve perda ecossistêmica média de 0,01%, o que representa 10 hectares desmatados, no entanto, considerando a área total, o desgaste foi ínfimo. No segundo período, os 2,89% equivalem 2.706 hectares, o maior desflorestamento de todos os intervalos avaliados. As duas últimas fases seguintes referem ao tempo de existência da Reserva Extrativista Mapuá, entretanto, a pressão humana foi estável (0,22% = 22 hectares). Em síntese, dos 93.746,34 hectares, a RESEX perdeu 2.738 hectares de recursos ambientais.
            Em relação a política ambiental, os residentes enfrentam problema de destinação de lixo, pois o maior grupo queima o lixo, o segundo joga no rio, o terceiro lança nas proximidades de suas casas, e último não demonstrou preocupação com a questão ambiental. Dentre as três comunidades analisadas, a preocupação constante está presente na comunidade Bom Jesus (Amaral, 2016, p. 69).
            Outra situação que precisa de medidas emergenciais se refere a água para consumo das famílias. Durante as entrevistas realizadas no Lago do Socó, todos os entrevistados responderam que não fazem tratamento da água, apenas buscam do rio (Amaral, 2016, p. 71). A realidade é de abandono conforme relatado pelo senhor B. S.:

Praticamente nós vive isolado aqui só com a benção de Deus. Quando nós adoece é o jeito ficar aqui parado pra ver o que acontece. Nos casos em que a gente tem condição de ir de rabeta até um posto nós vai é pro Anajás por causa de que é mais perto pra nós ir pro Anajás do que praí pro Mapuá ou pra Breves (B. S., comunidade Lago do Socó, entrevista realizada em julho de 2015). (informação verbal).

E ainda, comunitários reclamam da falta de assistência do sistema de saúde por não contribuir com tratamento de água. Uma questão levantada por M.G., no primeiro dia de capacitação referente ao projeto SANEAR Amazônia foi a seguinte:

Aqui a situação estava muito complicada. Vou relatar aqui perante todos,  mas é algo que é do conhecimento de todos. Dificilmente temo cloro pra tratar da água que nós consome. A secretaria de saúde não fornece esse material todo o tempo pra nós. Temos 58 família na comunidade pra distribuir esse material para tratamento da água mas passa com 3 ou até 4 meses sem distribuição. Então como nós ia tratar? Ficar dependendo o tempo todo de ir na cidade buscar isso não tem condição alguma (M.G., comunidade Bom Jesus, entrevista realizada em julho de 2015).

A ineficácia da gestão pública causa transtorno aos moradores. Com base no relato de uma moradora da comunidade de Vila Amélia, a política de construção de banheiro foi um fracasso.

Lá em casa já foi feito banheiro do INCRA mas não serve pra nada. Dizendo eles o banheiro já tá é pronto mas ainda faltou o chuveiro e a torneira. No banheiro tem fossa mas não adianta muita coisa não porque vai tudo é pro rio. Eu não vi serventia nenhuma desse banheiro e seria bom que fizesse outro no lugar. Derrubar esse e fazer outro (O. F., na comunidade Vila Amélia, entrevista realizada em outubro de 2015).

Conforme outra moradora, os banheiros que foram construídos com os recursos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) ocorreram sem grandes explicações, porque ficaram faltando pia e torneira (F.S. comunidade Bom Jesus, entrevista realizada em julho de 2015). (informação verbal). Nestas circunstâncias, as vulneráveis políticas neste campo ambiental declinam em razão do tímido planejamento e gerenciamento.

Conclusões

            A Reserva Extrativista Mapuá vivencia os efeitos da ineficácia de políticas públicas ambientais, culturais, econômicas e sociais, com apenas 11 anos de fundada. O extrativismo foi transformado numa atividade produtiva complementar em detrimento a expansão mercadológica da extração madeireira e da agricultura. Por mais que cientistas sociais e ambientalistas assegurem que esta modalidade de produção seja a melhor alternativa para o futuro dos recursos ambientais e das gerações, o extrativismo não se mantém em longo prazo, porque não garante a subsistência das populações humanas desta e de outras áreas.
            A ineficiente atuação do Estado na saúde, educação, moradia resultou em mortalidade infantil, violência, pobreza, bem como promoveu conflitos em torno da utilização da terra e de recursos ambientais. Estas externalidades negativas conduzem o modelo ao esgotamento com o passar do tempo. A função do Estado é promover direitos sociais, entretanto, esta RESEX não desfruta destes direitos, uma vez que as populações locais estão descontentes e desacreditadas com o modelo de gestão que o Estado vem desenvolvendo.
            Aqui, concluímos que somente o Estado dispõe de condições suficientes para mudar o cenário atual das RESEX, porque enquanto as populações tradicionais não forem prioridades no contexto de reservas extrativistas, distantes estaremos da vislumbrada sustentabilidade em unidades de conservação de uso sustentável da Amazônia.

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* Mestra em Planejamento do Desenvolvimento (Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA/Universidade Federal do Pará – UFPA); Especialista em Áreas Protegidas e Unidades de Conservação (Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA/Universidade Federal do Pará – UFPA); e Turismóloga com ênfase em Ecoturismo (Instituto de Estudos Superiores da Amazônia – IESAM).

** Doutorando em Desenvolvimento Socioambiental (Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA/Universidade Federal do Pará – UFPA); Mestre em Desenvolvimento Regional (Programa de Desenvolvimento Regional - PRODERE/Universidade Federal do Amazonas – UFAM; Graduado em Gestão Pública (Faculdade de Tecnologia Internacional – FATEC); e Pesquisador Bolsista da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Amazonas – FAPEAM.


Recibido: 01/11/2016 Aceptado: 11/11/2016 Publicado: Noviembre de 2016

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