Francisco Alcicley Vasconcelos Andrade
ICSEZ/ UFAM
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RESUMO
Este trabalho tem como objetivo geral identificar os gargalos do transporte de gêneros alimentícios por via fluvial de Manaus a Parintins. Os objetivos específicos são: discutir conceitos básicos de logística, modais logísticos e o papel do modal aquaviário para o desenvolvimento e integração da Amazônia; enumerar os tipos de embarcações que realizam esse transporte de gêneros alimentícios; conhecer os principais gargalos do transporte de gêneros alimentícios; e propor alternativas para otimização do transporte de gêneros alimentícios no trecho Manaus - Parintins. A pesquisa caracterizou-se como bibliográfica, descritiva, exploratória e explicativa. A amostra foi selecionada dentro de um universo composto pelos maiores supermercados do município, totalizando cinco empresários entrevistados, por volume de compra de gêneros alimentícios transportados através de barcos e balsas e donos de embarcações. Para mensurar esse volume de compras foi feito um pequeno levantamento de dados junto ao órgão responsável pela administração do Porto de Parintins. A pesquisa se deu entre os meses de julho a dezembro de 2014. A realidade da logística fluvial para Parintins, cujos avanços tecnológicos permitiram-na interagir com o restante do Brasil e do mundo, tem-se um município que consegue abastecer seu mercado de gêneros alimentícios com produtos oriundos de vários Estados do Brasil e de outros países. Com sua inserção no mercado globalizado surge a necessidade de acompanhar as mudanças e adaptações da economia mundial, visando oferecer uma vasta diversidade de produtos, com qualidade e garantias, suprindo as necessidades dos consumidores finais. Neste sentido, a logística torna-se uma ferramenta imprescindível no processo de abastecimento dos supermercados de Parintins. Transportar gêneros alimentícios em barcos e balsas é mais que uma opção para os supermercadistas de Parintins, é uma necessidade inerente ao processo de abastecimento dos supermercados. A falta de opções se dá em virtude do município ser uma ilha cujo acesso está limitado ao uso do transporte fluvial ou aéreo. A segunda opção constitui-se como alternativa inviável para o transporte desses gêneros, por apresentar custo elevado de frete, sendo mais utilizado para a condução de objetos cujo valor agregado seja suficiente para custear o transporte. Observou-se, durante a pesquisa, que há uma necessidade urgente de adequação do transporte fluvial para a condução dos gêneros alimentícios refrigerados. Neste sentido, propõe-se como solução para os barcos a adequação dos porões com instalação de câmaras frigoríficas, e para as chatas de ferro, a utilização de container para condução destas cargas.
Palavras-chave: Logística fluvial, Transporte, Gêneros Alimentícios.
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Francisco Alcicley Vasconcelos Andrade (2016): “Diagnóstico e caracterização do transporte fluvial de gêneros alimentícios no trecho de Manaus a Parintins”, Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, Brasil, (julio 2016). En línea: http://www.eumed.net/cursecon/ecolat/br/16/alimentos.html
http://hdl.handle.net/20.500.11763/br-16-alimentos
1 INTRODUÇÃO
A logística é uma atividade que acompanha o homem desde os primórdios de sua existência, sendo vastamente utilizada durante as guerras no passado e despontando atualmente como mecanismo que assegura às empresas de pequeno, médio e grande porte obter vantagem competitiva no mercado globalizado. Suas formas de uso e técnicas passaram por processos de aprimoramento e evoluíram gradativamente à medida que novas tecnologias foram surgindo.
Ballou (2008) destaca que a logística trata de todas as atividades de movimentação e armazenagem, que facilitam o fluxo de produtos desde o ponto de aquisição da matéria-prima até o ponto de consumo final, passando pelas etapas primárias, que estão subdivididas em Transporte, Manutenção de estoques e Processamento de pedidos; e as secundárias que são Armazenagem, Manuseio de materiais, Embalagem de proteção, Obtenção, Programação de produtos e Manutenção de informação.
Com os cenários da economia mundial em constante mudança, os países buscam meios para se tornarem cada vez mais competitivos através de métodos que possam maximizar seus lucros. Nesse processo crescente a logística desponta como um dos grandes diferenciais para empresas e países que pretendem se destacar no mercado globalizado.
Na região norte do país, a realidade da logística é diferenciada das demais regiões, devido a intensa malha hidroviária. É nessa vasta imensidão amazônica que a logística encontra grandes desafios e obstáculos para ser operacionalizada e de poder contribuir para a consecução dos objetivos das organizações que nela operam. E a logística do transporte sobretudo fluvial desponta como a mais importante devido às características da região. Bringel (2003) destaca que as características fisiográficas da Amazônia Ocidental desafiam a execução do transporte. As grandes distâncias a serem percorridas aliam-se às deficiências existentes nos diversos modais, onerando, sobremaneira, essa função logística.
De acordo com Passos (2012), foi discutida a questão da desoneração da operação logística na Amazônia brasileira e criação do Projeto Rodo-Fluvial, sendo que o coordenador do Grupo de Trabalho de Planejamento Estratégico do Amazonas 2012-2030 (Grupo vinculado à Secretaria de Planejamento do Estado do Amazonas), Luiz Almir Fonseca, apresentou a ideia do governo de conectar o Estado através do modal rodo-fluvial com os países do Pacífico (Peru e Equador) através do Acre, Caribe (Venezuela, Guiana e Suriname) através de Roraima, oceano Atlântico através do Pará e com o Centro-oeste do Brasil através de Rondônia. É mais uma alternativa que poderá concretizar-se no futuro, representando para os estados da Amazônia Ocidental uma oportunidade para o escoamento da produção e barateamento dos custos com o transporte de mercadorias e produtos.
Contextualizando com a realidade de Parintins, cujos avanços tecnológicos permitiram-na interagir com o restante do Brasil e do mundo, tem-se um município que consegue abastecer seu mercado de gêneros alimentícios com produtos oriundos de vários Estados do Brasil e de outros países. Com sua inserção no mercado globalizado surge a necessidade de acompanhar as mudanças e adaptações da economia mundial, visando oferecer uma vasta diversidade de produtos, com qualidade e garantias, suprindo as necessidades dos consumidores finais. Neste sentido, a logística torna-se uma ferramenta imprescindível no processo de abastecimento dos supermercados de Parintins.
Assim como toda pesquisa cientifica parte de um problema, buscaram-se respostas para a seguinte problemática: Quais os gargalos do transporte de gêneros alimentícios por via fluvial de Manaus à Parintins?
O Objetivo Geral é identificar os gargalos do transporte de gêneros alimentícios por via fluvial de Manaus à Parintins.
Os Objetivos Específicos são:
- Discutir conceitos básicos de logística, modais logísticos e o papel do modal aquaviário para o desenvolvimento e integração da Amazônia.
- Enumerar os tipos de embarcações que realizam esse transporte de gêneros alimentícios;
- Conhecer os principais gargalos do transporte de gêneros alimentícios; e
- Propor alternativas para otimização do transporte de gêneros alimentícios no trecho Manaus - Parintins.
A justificativa desse trabalho está na necessidade de se estudar o transporte de gêneros alimentícios para o município de Parintins dentro do sistema logístico para a compreensão mais detalhada da forma como esse processo é desenvolvido, uma vez que o transporte fluvial constitui-se como a alternativa mais viável para a condução destes itens de Manaus a Parintins.
Para alcançar o objetivo proposto, o presente Trabalho será apresentado em cinco partes: a primeira é a Introdução, que apresenta de forma sintática o tema em estudo; na segunda discutiu-se o Referencial Teórico, no qual foram abordados conceitos relacionados à logística, o potencial do Brasil para o transporte fluvial e os barcos e balsas no contexto amazônico; na terceira parte, apresentou-se a Metodologia utilizada para o desenvolvimento desta pesquisa; na quarta parte desenvolveu-se a Análise e Discussão dos Dados pesquisados, onde foi exposto todo o estudo realizado em campo pelo pesquisador; por fim, na quinta parte, as Considerações Finais, que foram apresentadas as propostas de melhorias para o processo de transporte de gêneros alimentícios na visão do autor com base nos conceitos abordados neste trabalho.
2 REFERENCIAL
2.1 CONCEITOS DE LOGÍSTICA
Sendo a Logística uma atividade que acompanha o homem desde os primórdios de sua existência, é comum encontrar relatos em livros de história sobre sua efetiva importância no meio político e militar. Na antiguidade a utilização da logística era mais restrita a grandes órgãos que detinham o poder e ambicionavam não perdê-lo, como era o caso dos exércitos, que montavam suas estratégias de guerrilha levando em consideração diversos conceitos logísticos. Era desta forma que conseguiam levar suas tropas a campo, mantê-los alimentados e com suprimentos suficientes para manter os soldados na luta. Além disso, eram traçadas estratégias logísticas para reabastecer os acampamentos, tornando desnecessário o transporte de carga em grandes quantidades, o que poderia comprometer seu êxito em campo. Castiglioni (2009) afirma que a logística existe desde os tempos mais antigos quando, na preparação das guerras, os lideres militares já utilizavam esse instrumento, o qual ficou associado às atividades militares.
Observa-se que, como todo processo, a logística também evoluiu gradativamente à medida que novas tecnologias foram surgindo. Se antes esta era restrita basicamente ao transporte e armazenagem de suprimentos, hoje se observa que seu campo de atuação se estendeu de tal forma que se torna quase impossível encontrar empresas ou grupos de pessoas que não dependam, de alguma forma, de procedimentos logísticos para se manterem vivos.
Com o advento da globalização, os cenários da economia mundial vivem em constante processo de mudanças, fato que obriga não apenas as empresas, mas os países a buscarem modos mais eficazes de se tornarem mais competitivos por meio de métodos que possam maximizar seus lucros.
Em meio a esse processo inconstante, a logística desponta como um dos grandes diferenciais para as empresas e países que pretendam se destacar no cenário mundial.
Todavia, com o advento da globalização, temos os cenários da economia mundial num constante processo de mudanças, fator que obriga não apenas as empresas mas, os países a buscarem meios para se tornarem cada vez mais competitivos através de métodos que possam maximizar seus lucros. Em meio a esse processo inconstante, a logística desponta como um dos grandes diferenciais para empresas e países que pretendem se destacar no cenário mundial. Ballou (2007) argumenta que, seguindo as tendências dos países que se sobressaem como potências mundiais torna-se relevante entender quais os modais que mais criam valor para as empresas e que minimizam os valores gastos com transporte.
É relevante, porém, enfatizar que a logística não se resume apenas ao transporte de produtos, sendo este uma das diversas atividades que integram o processo logístico. A logística “trata de todas as atividades de movimentação e armazenagem, que facilitam o fluxo de produtos desde o ponto de aquisição da matéria-prima até o ponto de consumo final” (BALLOU 2007, p. 24).
Logo, tem-se uma diversidade de etapas que compõem o processo logístico. Ballou (2007) divide essas etapas em: primárias e secundárias. As primárias por sua vez subdividem-se em: Transporte, Manutenção de estoques e Processamento de pedidos. A figura 01 mostra a relação entre as três atividades logísticas primárias de atendimento ao cliente.
As etapas secundárias são: Armazenagem, Manuseio de materiais, Embalagem de proteção, Obtenção, Programação de produtos, Manutenção de informação.
Barat (2007, p. 27) ressalta que
Os transportes, enquanto atividade meio de apoio à produção de bens e serviços, são essenciais para o aproveitamento do potencial produtivo de um País ou região. Estão na linha de frente das questões ligadas ao desenvolvimento econômico e social, à geração de empregos, à ocupação territorial, à energia e ao meio ambiente. Isto porque respondem por importantes parcelas da formação de capital, da ocupação da mão-de-obra, do consumo de insumos energéticos e eixos de desenvolvimento.
O transporte representa o elemento mais importante do custo logístico na maior parte das firmas, absorvendo cerca de dois terços do gasto logístico (BALLOU 2008, p. 24). Por esta razão torna-se importante para o desenvolvimento da economia dos países, estados e até pequenos municípios um sistema de transporte eficiente que facilite o escoamento da sua produção local bem como colabore para a aquisição bens produzidos em outras regiões. Barat (2007, p. 32) salienta ainda que os transportes interagem, primordialmente, com:
O desenvolvimento da economia como um todo, na medida em que sua disponibilidade tem implicações tanto com as modificações dos estoques e combinações relativas dos fatores de produção, quanto com as transformações na estrutura das demandas intermediária e final; e a estruturação do espaço geoeconômico, ao condicionar os padrões de organização do território e localização de atividades.
No Brasil, a logística ganhou mais importância com o surgimento do supermercado. Segundo Novaes (2007), foi em fins da década de 1950, com a implantação da indústria automobilística e com o uso crescente da geladeira no ambiente doméstico que se criaram condições para o surgimento do supermercado no Brasil. Segundo o mesmo autor:
Esse tipo de estabelecimento comercial surgiu nos Estados Unidos na década de 1930, durante o período da depressão com o objetivo de reduzir os preços dos produtos de primeira necessidade numa época de grandes dificuldades econômicas, alguns varejistas aproveitaram a disponibilidade de garagens e armazéns, utilizando-os sem quaisquer melhorias ou acabamento, e dispondo os produtos em caixas abertas, diretamente espalhados no piso. A cobrança era feita à saída, de forma que apenas uma pessoa, o proprietário, controlava todo o movimento.
Assim tem-se que, o supermercado foi o início de muitas das atividades econômicas existentes na atualidade. Surgem, posteriormente, os hipermercados, os shoppings, motivados pelas novas tecnologias passar a existir o varejo por maquinas e, com o advento da internet, as lojas virtuais.
Observa-se que todos esses processos têm algo em comum: a logística como fator imprescindível para sua existência e sobrevivência, pois seria impossível oferecer aos clientes de um hipermercado a variedade de produtos do qual dispõe esse tipo de estabelecimento, se não houvesse uma estrutura logística adequada e bem administrada.
Logo, um país como o Brasil, com características econômicas e geográficas díspares, necessita ter uma estrutura logística organizada, de forma a permitir interação entre os modais logísticos que predominam em cada região, tornando assim mais eficiente todo o sistema logístico.
A importância dos vários modais de transporte varia com o passar do tempo e estão diretamente relacionados às características geográficas e econômicas de cada país. Castiglioni (2009, p. 35 - 36) afirma que os modais constituem-se como meios de movimentação de transbordo de materiais, classificando-os em: terrestre (rodoviário, ferroviário e dutoviário), aquaviário (marítimo e hidroviário) e aéreo (aeroviário). Segundo o mesmo autor temos os seguintes conceitos:
a) Fluvial: considerando o potencial das bacias hidrográficas brasileiras, o transporte fluvial tem ainda utilização muito pequena. É um modal bastante competitivo, uma vez que apresenta grande capacidade de transporte, baixo consumo de combustível e é menos poluente que o modal rodoviário. O grande volume de mercadorias transportadas por esse modal é de produtos agrícolas, fertilizantes, minérios, derivados de petróleo e álcool;
b)Lacustre: é aquela realizada em lagos e tem como característica a ligação de cidades e países vizinhos. Trata-se de um tipo de transporte bastante restrito, pois são poucos os lagos navegáveis, e por isso não tem grande importância no transporte internacional. Também pode ser utilizada para qualquer carga, a exemplo do marítimo.
A partir dos conceitos acima citados torna-se mais simplificado o processo de escolha do modal que melhor se adeque ao transporte de cargas para cada região específica do Brasil e do mundo. Neste sentido Rodrigues (2007) elenca as principais variáveis de decisão para a seleção dos modais, sendo: natureza e características da mercadoria; tamanho do lote; restrições dos modais; disponibilidade e frequência do transporte; tempo de trânsito; valor do frete; índice de faltas e/ou avarias (taxa de sinistralidade); nível de serviços prestado;
Segundo o mesmo autor todos esses fatores devem ser levados em consideração pois o tempo de trânsito afeta diretamente o ressuprimento, abrangendo o tempo despendido pelo embarcador na consolidação e manuseios, o tempo de viagem propriamente dito, os tempos necessários de transbordo (caso haja) e o tempo necessário à liberação da carga por ocasião do recebimento. Assim, a análise minuciosa desses fatores faz-se indispensável aos usuários dos modais.
2.3 A MALHA HIDROVIÁRIA DO BRASIL
O Brasil comporta uma imensa hidrografia possuindo uma malha hidrográfica de extrema importância não só para o país, mas principalmente para o desenvolvimento ligado à região amazônica, visto o país ser cortado por diversos rios que podem ser aproveitados pelo modal fluvial com o fim de diminuir os custos logísticos das empresas que nele operam. Tomando como base a estrutura adotada em outros Países, Padovezi (2003) afirma que:
O Brasil tem condições (e, de certa forma, obrigação) de explorar seu potencial hidroviário de maneira mais racional do que a maioria dos países que construíram suas hidrovias há mais tempo. Para tanto, é importante rever alguns conceitos e projetos de hidrovias, baseados exclusivamente na experiência européia e norte-americana de meados do século passado, e buscar uma nova concepção que, pela aplicação da tecnologia mais desenvolvida de projeto e construção de embarcações e de vias navegáveis, resultara em ganhos sociais e econômicos.
Uma vez que já existe exemplo da utilização do potencial hidroviário no centro-norte do Brasil: o exemplo refere-se ao grupo André Maggi que até então ainda é o único grande aglomerado agroindustrial do centro do país a utilizar o gigantesco Rio Amazonas para escoar a sua produção de soja do Mato Grosso e Rondônia para a Europa e Ásia por meio de porto graneleiro do município de Itacoatiara no Amazonas.
Ainda assim, observa-se que o Brasil dispõe de uma vasta malha hidroviária, que até pouco tempo foi subutilizada para o transporte de cargas. Em países de grande dimensão territorial como o Brasil, a utilização das hidrovias fluviolacustres é fator fundamental para o processo de interiorização e posterior fixação da população.
Segundo a Agência Nacional de Transporte Aquaviário - ANTAQ a rede fluvial nacional é formada por 42 mil quilômetros de rios navegáveis. Deste total cerca de 30 mil podem ser considerados como vias navegáveis naturais, mas apenas 10 mil quilômetros são utilizados em escala comercial, os 20 mil quilômetros restantes ainda carecem de investimento em infraestrutura.
Segundo Rodrigues (2007 p. 78-79) o Brasil é um dos países mais ricos do mundo em recursos hídricos naturais, dispondo de diferentes bacias hidrográficas espalhadas por todo o território nacional, que servem para escoar mercadorias entre diferentes regiões produtoras e consumidoras. Na figura 02 é apresentado o mapa das hidrovias brasileiras.
Na região amazônica, por exemplo, os rios serviram por muitos anos basicamente para a locomoção da população ribeirinha que habitava, (e ainda habita) às margens dos rios. Esta população fixava sua moradia à beira dos rios para facilitar o acesso ao pescado e sua locomoção para outros povoados também localizados às margens dos rios. Nogueira (1999 p. 43) afirma que nada é mais agressivo, nada é mais impactante que transformar um caboclo em colono assentado num lote fora da margem de qualquer rio. Primeiro porque o lote limita espacialmente quem vive do extrativismo; segundo porque o rio também significa, além de caminho, fonte de alimentos. A figura 03 apresenta o mapa da Bacia Amazônica.
Por fim na figura 04 é apresentado o mapa do Estado do Amazonas com seus principais rios, rodovias pavimentadas, portos e aeroportos nacionais e internacionais.
Esta vasta malha hidroviária que se estende por todo o estado do Amazonas constitui-se como fator impulsionador do processo de ocupação desta região, sendo responsável pelo estabelecimento de muitas cidades que estão localizadas às margens dos rios, pois para algumas populações ribeirinhas as vias fluviais apresentam-se como único caminho para locomoção destas até os centros mais desenvolvidos.
Não se pode negar que todo o processo de conquista e ocupação da Amazônia seguiu a disposição da rede hidrográfica, sendo fundado em suas margens os primeiros núcleos de povoamento, muitos dos quais resultado de aldeamentos indígenas e fortificações. Como os rios favoreciam plenamente a navegação, na comunicação entre as pequenas vilas e a sede da província, não se preocupou em desenvolver outro tipo de ligação, até porque, dada a linearidade das cidades, as condições próprias da várzea amazônica, que podem atingir mais de 50 quilômetros inundáveis para além das margens, e o regime dos rios, cuja variação atinge a média de 16 metros, a construção de caminhos paralelos ao rio não facilitariam a circulação interior. (NOGUEIRA 1999, p.49)
O resultado deste processo é comprovado pela localização dos 62 (sessenta e dois) municípios que compõe o Estado, todos localizados à margem de rios ou muito próximos a estas vias de acesso.
2.4 A ORIGEM E O DESENVOLVIMENTO DO TRANSPORTE AQUAVIÁRIO REGIONAL AMAZÔNICO
A região Amazônica é conhecida no Brasil por suas peculiaridades que a distingue do restante do país. Ao contrario dos oceanos, os rios apresentam dificuldades importantes para a sua utilização como hidrovia, principalmente quando se deseja operar com embarcações de grande porte. Segundo Padovezi (2003)
os rios apresentam condições de navegabilidade diferentes ao longo do ano, enquanto que o oceano proporciona condições operacionais praticamente permanentes. Nos rios, geralmente, aparecem restrições de profundidade, trechos estreitos, curvas fechadas, que exigem cuidados especiais com os sistemas de propulsão e de manobras das embarcações.
Padovezi (2003) esclarece que a busca da eficiência econômica do transporte utilizando os rios leva, invariavelmente, a compensar as baixas velocidades típicas de embarcações de carga com um grande volume transportado. Neste sentido, há sempre uma pressão econômica para operar com as maiores embarcações possíveis em determinado rio. As restrições físicas existentes, específicas de cada trecho do rio, são as balizadoras das dimensões das embarcações.
Profundidades, largura, correntezas, material do fundo, condições de visibilidade (presença de neblinas), possibilidade de ocorrência d ventos fortes e até de ondas, presença de troncos flutuando ou submersos, existência ou não de obras como barragens, eclusas e pontes, etc., são características da via navegável que interagem com qualquer embarcação que por lá trafegue, influenciando no seu desempenho e no seu comportamento. Se a embarcação for adequadamente projetada, construída e operada levando em conta todas as características importantes da via, tanto a segurança como a eficiência do transporte fluvial estarão completas.
A história do transporte fluvial na Amazônia deve ser relaciona às fases econômicas pelas quais a região passou e pode ser dividida nos mesmos períodos que mostram o comportamento cíclico do desenvolvimento da vida amazônica, onde se alternam períodos de expansão e declínio das atividades da região.
Figueiredo (1982) procurou caracterizar a evolução do transporte fluvial de passageiros de baixa renda na região, a partir de nove períodos distintos, estabelecidos em função da tecnologia e desenvolvimento deste tipo de transporte. Tais períodos, para melhor compreensão, foram reagrupados pelo autor em apenas três períodos 1.
O primeiro período vai, aproximadamente, de 1500 a 1853 e pode ser caracterizado pela precariedade do transporte fluvial quanto às suas condições de funcionamento e pela sua não organização a nível estadual e sim particular.
Figueiredo (1982) subdivide este primeiro período em três fases:
A primeira fase, que se estende de 1500 a 1750, tendo como marco inicial a descoberta da foz do Rio Amazonas por Vicente Yanes Pinzone. É caracterizado pelas primeiras explorações e ocupações através de fortes militares e missões religiosas, durante quase 150 anos. Os rios apresentavam-se como o caminho natural e menos agressivo às penetrações. O transporte de passageiros e cargas era realizado nas canoas e nas frágeis ubás 2;
A segunda, que vai de 1750 a 1818, corresponde à primeira tentativa efetiva de organização territorial, vinculada às missões religiosas, ligadas ao ciclo das drogas do sertão. Neste período começa um tênue crescimento da Amazônia litorânea, onde se desenvolveu a agricultura do arroz e do algodão, voltados principalmente ã exportação. Outro fato relevante refere-se à fundação do Arsenal da Marinha no Pará, que inicio o desenvolvimento da tecnologia naval no trabalho com a madeira, até hoje presente nos diversos estaleiros da região; e
A terceira fase que vai de 1818 a 1853, onde a região apresenta um período desfavorável na sua economia, como consequência da desvalorização dos produtos tropicais brasileiros na Europa. Somam-se a esta questão mais geral, dificuldades especificas, tais como o problema das distancias fluviais agravado pela tecnologia de transportes da época – vela, remo e sirga, além do caráter extremamente particular deste transporte, pois, como ainda hoje é comum em algumas áreas, a estruturação de uma viagem (rota, tempo e percurso e numero de viagens) era estabelecida pelo próprio armador 3, de acordo com seus interesses, pois essa atividade não havia ainda adquirido integralmente o conceito de utilidade publica.
O segundo período vai, aproximadamente, de 1853 a 1941, sendo caracterizado pelo desenvolvimento de uma nova tecnologia baseada na introdução das embarcações a vapor e pelo controle dos ingleses da navegação no Amazonas, além da abertura da navegação fluvial internacional, encerrando-se com a criação do Serviço de Navegação da Amazônia e administração do Porto do Pará – SNAPP.
A introdução da navegação a vapor, na Amazônia, foi motivada por pressões externas, pois os grandes países em fase de industrialização na época, como Inglaterra, Estados Unidos e a França, necessitavam suprir suas demandas crescentes de borracha e, o Governo Imperial, preocupado com o jogo de interesses desses países em relação à região, resolveu introduzir na Amazônia um sistema de transporte fluvial mais poderoso e flexível. Os vapores traziam uma nova tecnologia que exigia novos padrões em termos de gerenciamento das rotas, da estrutura portuária, do abastecimento de combustível (lenha e carvão) e manutenção dos navios.
O terceiro período, correspondendo aproximadamente de 1941 até os dias atuais tem como marco inicial, na história do transporte fluvial na Amazônia, a consolidação e decadência do SNAPP – Serviço de Navegação da Amazônia e Administração do Porto do Pará, que mais tarde vem a ser extinto e substituído pela Empresa de Navegação da Amazônia S/A – ENASA.
O setor de navegação fluvial sempre foi operado praticamente por pequenos armadores que atendem inúmeras linhas com o transporte de cargas e passageiros, vale destacar aqui a atuação de duas empresas públicas, não por seu desempenho na navegação, mas pela sua dimensão política, que as destacaram no cenário da navegação na Amazônia, são elas: Empresa de Navegação da Amazônia S/A – ENASA e Companhia de Navegação Interior do Estado do Amazonas – CONAVI.
De acordo com Nogueira (1999, p.138)
A ENASA surgiu em 1976, com a destituição da SNAPP, controlada pelo governo federal, e contou àquela época com uma frota de navios muito antigos, herdados de sua antecessora. Por ser uma empresa estatal subsidiada a ENASA conseguia realizar o transporte de cargas com fretes mais baixos que o preço praticado pelos armadores das empresas de navegação privadas. Além disso, no seguimento de passageiros, era responsável por 90% do movimento efetuado pelo conjunto de 14 empresas que operavam neste seguimento em 1970.
Apesar dos subsídios4 , em 1973 a empresa passa por profundas mudanças e várias linhas deixam de existir, das quinze que operavam em toda a Amazônia, permanecendo somente algumas linhas que deixavam certa margem de lucro à empresa. Com a aquisição das embarcações tipo catamarã5 , em 1980, é que a empresa tenta retomar às suas atividades de transporte de passageiros, atuando basicamente na calha central da Bacia Amazônica, na linha Manaus Belém.
Àquela época essas embarcações diferiam bastante do padrão regional, pois proporcionavam conforto, segurança e velocidade, dispondo de capacidade para 500 passageiros, 360 toneladas de cargas e realizavam o percurso de Belém à Manaus em apenas cinco dias. Porém, no ano de 1990 a ENASA é atingida pelo programa de privatização das estatais e, por não conseguir comprador imediatamente, fica cerca de três anos parada, retomando suas atividades no ano de 1993, agora concorrendo de forma igualitária, sem os subsídios, com os barcos particulares que também estavam na linha.
Na tentativa de implantar um sistema de transporte fluvial que atingisse os mais distantes pontos do Estado do Amazonas, é criada a CONAVI no ano de 1980, Companhia esta que estava vinculada à Secretaria de Transportes do Estado do Amazonas e tinha por finalidade gerir a navegação no Estado, sem qualquer pretensão de possuir frota própria.
Para pôr em prática seus objetivos a Secretaria de Transportes, juntamente com a Superintendência da Marinha Mercante, encomendam ao Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT) um estudo técnico para projetar barcos que tivesse condições de navegar na Amazônia Ocidental, atendendo os requisitos de baixa profundidade dos rios, baixo custo de construção para que pudessem ser adquiridas pelos armadores e também grande versatilidade, podendo operar com cargas e passageiros.
Nogueira (1999), muito apuradamente disserta que o IPT usou como fonte de apoio à sua pesquisa um estudo realizado pela Comissão de Desenvolvimento do Amazonas – CODEAMA, onde havia sido identificada por este órgão a origem das receitas arrecadas pelos armadores, que em sua maioria vinha do comércio realizado por este na relação de compra e venda de produtos em seu itinerário.
Porém o IPT mostrou-se interessado em melhorar as embarcações nos quesitos segurança, higiene e conforto, sem levar em consideração a necessidade de o armador estabelecer comércio ao longo do seu percurso pelos rios, sendo que esta era uma fonte de renda necessária para custear uma parte das despesas de viagem.
Apesar de todo esse impasse, foram construídas 40 embarcações, que Lopes e Carvalheiro (apud Nogueira 1999, p. 67) analisaram como inadequadas para operar na região amazônica, pois naquela época a densidade demográfica era relativamente baixa, necessitando de subsídios estatais para manter-se operando regularmente. Segundo os mesmos autores o projeto original fracassou, recaindo sobre o IPT e consequentemente sobre a CONOVI todo o ônus do fracasso, fazendo com que a Companhia constituísse uma história de inexpressiva atividade fluvial dentro do contexto amazônico.
Posteriormente o período é marcado pelo uso da energia propulsora, de reboque para empurro, criando um sistema de Roll-on-Roll-off6 que logo ficou conhecido como Ro-Ro Caboclo (NAZARÉ, 1993, p.51, 54). É este mesmo autor quem caracteriza o sistema segundo a descrição que segue:
O sistema “Ro-Ro Caboclo” implantado e operado hoje com intensa movimentação rotineira em muitos dos rios da maior bacia fluvial do mundo é, na verdade, uma imaginosa adaptação do sistema internacional Roll-on-Roll-off. As operações são as mesmas no que respeita ao veículo transportado e sua movimentação de embarque e desembarque. Só que, ao invés do navio, utiliza-se na região um comboio de balsas de diferentes capacidades conforme se agreguem, frontalmente em linha, ou lateralmente a contra-bordo, um, dois, três ou até quatro balsas que são deslocados rio acima e rio abaixo por empurradores mono ou bimotorizados com potências variadas.
Este sistema tornou mais eficaz o embarque e desembarque de cargas nas chatas de ferro da região amazônica, facilitando o trabalho dos carregadores, cujo manuseio das cargas poderiam danificá-las, e ainda reduziu o tempo destas embarcações paradas nos portos, pois o processo de embarque e desembarque passou a ser feito com o auxilio de máquinas. A figura 5 ilustra o sistema Ro-Ro Caboclo.
Torna-se relevante analisar, dentro deste mesmo contexto, as vantagens e desvantagem na utilização do transporte fluvial, pelas peculiaridades que cercam este tipo de transporte. É Rodrigues (2007, p.85) quem apresenta essas características de forma agrupada:
Nos tópicos anteriores foram abordados, entre outras temáticas, as características peculiares da região Amazônica, destacando-se a importância dos rios para a população que habita esta região e que necessita destas vias fluviais para locomover-se, adquirir gêneros alimentícios e, em alguns casos, levar os produtos regionais para outros povoados, vilarejos municípios e até mesmo para as capitais.
Diferentemente dos outros Estados, que possuem como seu principal transporte o modal rodoviário, no Amazonas o transporte de pessoas é realizado em sua quase totalidade por via fluvial, uma vez que o Estado é composto por sessenta e dois municípios dispersos ao longo da calha dos rios (FROTA 2006. p.111).
Silva (2007) enfatiza que o transporte hidroviário de passageiros é realizado através de embarcações mistas para passageiros e cargas, que fazem, para muitos municípios e vilas ribeirinhas, o mesmo papel que o ônibus e o caminhão para o resto do país. Observa-se, com maior frequência, a importância deste meio de locomoção, quando Nogueira (1999, p.67) destaca o significado do transporte fluvial para a população amazonense.
Como modalidade de meio de transporte quase exclusiva no estado do Amazonas, o transporte fluvial tem um significado expressivo para a sua população, visto que o rio sempre foi o caminho natural desde as penetrações exploratórias. Até os dias atuais os fluxos de mercadorias e pessoas seguem, salvo raras exceções, a intrincada rede dendítrica da hidrografia regional, em virtude da quase totalidade dos núcleos populacionais estarem estabelecidos às margens dos diversos rios que compõem a bacia amazônica.
Diante deste cenário faz-se relevante caracterizar o meio de transporte utilizado por esta população, destacando suas características peculiares, bem como as adequações que foram feitas na tentativa de obter um transporte mais veloz e eficiente, capaz de proporcionar conforto, rapidez e segurança aos seus usuários.
É sabido que remos e velas dominaram por muito tempo a navegação na Amazônia, desde as primeiras expedições até praticamente a metade do século XIX, quando algumas companhias de navegação investiram em vapores para fazer o transporte na Amazônia (NOGUEIRA 1999, p.50).
Todavia o uso de embarcações feitas de madeira ainda é predominante no Amazonas, como relata Frota (2006, p. 115-116) ao afirmar que os cascos dos barcos de transporte de passageiros são, na grande maioria, construídos com pranchas de madeira fixadas longitudinalmente ao longo de uma estrutura também de madeira e calafetadas com material fibroso e resina, o que proporciona uma maior vulnerabilidade dessas embarcações. A figura 07 mostra a estrutura supracitada.
Devido à escassez de material bibliográfico com descrição mais detalhadas sobre as embarcações de madeira que trafegam na região amazônica, buscou-se coletar relatos com os construtores navais de Parintins. Em visita aos estaleiros7 do município observou-se que a estrutura dessas oficinas não acompanhou os avanços tecnológicos dos últimos anos, sendo as projeções de embarcações, muitas das vezes, rabiscadas em papel ou construídas na mente dos construtores navais.
Foi possível notar ainda que a utilização de madeira é frequente, pois trata-se de uma matéria prima abundante e de fácil aquisição na regia amazônica, sendo os demais materiais de difícil acesso para esses construtores. Frota (2006, p. 117) explica que, embora o aço naval seja o material ideal para a construção de cascos das embarcações que trafegam nos rios do Amazonas e apesar de haver recursos financeiros do Governo Federal, os fatores a seguir dificultam a efetiva implantação de projetos mais seguros: a) cultura dos caboclos do Amazonas, acostumados com a abundante matéria-prima fruto do extrativismo da própria região; b) a engenharia do projeto está na cabeça da maioria dos habitantes da região, além disso, a mão-de-obra é muito barata; c) Dificuldades relacionadas à burocracia para acesso ao crédito do Fundo da Marinha Mercante/ Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES.
Dados da Superintendência Estadual de Navegação, Portos e Hidrovias – SNPH, órgão responsável pela administração de diversos Portos do Amazonas, revelam que este não é uma caso típico apenas dos municípios do Amazonas. Segundo o Ministério da Marinha citado por Frota (2006, p.112)
A Amazônia Ocidental é uma região que merece uma atenção especial, pois cerca de um milhão de pessoas, na sua maioria de baixa renda, trafegam por ano nas 25 mil embarcações de médio porte, predominantemente construídas com cascos de madeira. Além disso, existe um grande número de pequenas embarcações, com as mesmas características, trafegando em rios de médio porte. Tal modalidade de navegação, pela grande frequência de utilização, é considerada de alto risco devido à superlotação e ao carregamento desordenado das embarcações, gerando sobrecarga nos barcos e aumentando as estatísticas de acidentes fluviais e naufrágios com morte.
Além disso, existem causas básicas como projeto, construção e manutenção inadequados, assim como despreparo da tripulação, que podem desencadear eventos que levem à ocorrência de acidentes. Há causas imediatas, geralmente ligadas a erros humanos ou falha de equipamentos que, somados ou nãos às causas básicas, também ocasionam acidentes.
Frota (2006, p. 114) afirma que, segundo a Capitania dos Portos, ao longo dos rios surgem perigos isolados à navegação. Nos períodos de águas mínimas (meados de outubro), estes perigos são concentrados em formação de praias, surgimento de bancos de areia8 e aparecimento de pedrais9 , além da presença de rebojos10 . No período de águas altas, há de se atentar para os troncos e galhadas de árvores que são arrastados pelas águas e transformam-se em sérios riscos à navegação, com tendência a se concentrar na parte mais profunda dos canais, onde a correnteza é maior, conforme mostrada na figura 08.
Padovezi (2003, p.30) acrescenta ainda a existência de problemas relacionados a condições ambientais adversas, como a falta de visibilidade e ocorrência de ventos de altas intensidades podem levar a perda de controlabilidade da embarcação e ao aumento de riscos de ocorrência de acidentes. A figura 09 mostra a formação de pequenas ondas ocasionadas pela ventania de temporal em um trecho do rio Amazonas.
Considerando os fatores acima mencionados, percebe-se a necessidade de implantação de um projeto para modificação da estrutura das embarcações, projeto este que possa levar em consideração as peculiaridades da região Amazônica.
Segundo Nazaré (1993, p.45), no caso particular da Amazônia há ainda que ser considerada a ação governamental para o zoneamento operacional do mercado e para o desenvolvimento de um protótipo de embarcação ou conjunto de embarcações modulares que levem em conta: a) a demanda mista de passageiros e carga na mesma viagem; b) a sazonalidade assimétrica das safras de produtos regionais e do maior fluxo de pessoas; c) as colossais distância entre portos de origem-destino que requerem definições exatas de tamanho da unidade produtiva em função da autonomia operacional, com vistas a obtenção de rendimentos de escala; d) a locação de terminais fluviais de passageiros e cargas de modo a obter a melhor relação custo/benefício dos gastos de sua implantação.
É relevante dar destaque para a demanda mista de passageiro supracitada, pois é uma realidade do transporte fluvial amazônico. Os barcos regionais, em sua maioria, estão estruturados com porão e área para condução de pessoas. Os porões ficam localizados na parte mais próxima ao casco, geralmente adjacente ao compartimento do motor da embarcação. Logo acima está a área reservada para a condução de pessoas. Essa estrutura é mais comum, podendo variar dependo do tamanho da embarcação.
A descrição acima seria a forma correta, segundo a Capitania dos Portos, de transportar passageiros e cargas, ambos separados em espaços pré-determinados, porém Frota (2006, p.112-113) destaca que quando a carga não pode ser alojada nos porões por falta de espaço, esta é empilhada no convés principal e amarrada de forma precária nas colunas de suporte do convés em meio a passageiros, que em geral se acomodam em redes estendidas em áreas de circulação juntamente com suas bagagens.
Outro transporte utilizado para condução de cargas na região amazônica são as chatas de ferro, espécie de barcaça larga e de pouca profundidade acoplada a um empurrador. Entre suas principais características está a sua capacidade para transportar grandes quantidades de carga. Difere-se dos barcos que operam na região pelo de fato de não dispor de estrutura para o transporte misto, de pessoa e cargas simultaneamente, com exceção da tripulação que participa das viagens fazendo uso do empurrador para dormir, cuidar da higiene pessoal e fazer suas refeições.
Ainda que sendo um transporte lento frente a outras modalidades concorrentes, o transporte fluvial compensa sua lentidão com a possibilidade de agregar uma capacidade de carga extremamente volumosa. É evidente que, como decorrência de sua lentidão, nem todos os produtos podem usufruir dessa modalidade, estando mais apto aos não perecíveis, pesados e de baixo valor comercial.
Evidencia-se a importância do transporte fluvial no contexto amazônico, seja pela abundancia de vias navegáveis existentes na região ou simplesmente pela popularidade deste modal. Em função de carência das rodovias e abundância de rios navegáveis, o transporte hidroviário na Bacia Amazônica reveste-se de grande importância econômica e social sobre os mais diversos aspectos, desde o de subsistência, com o transporte de pequenas cargas e passageiros, até o de maior vulto, isto é, de cabotagem ou de longo curso, onde são utilizadas embarcações de maior porte.
2.6 O TRANSPORTE DE ALIMENTOS
O processo de evolução da humanidade permitiu ao homem desenvolver novas formas de viver com conforto e comodidade, dispondo das condições necessárias para sua sobrevivência. Se antes ele era forçado a manter-se próximo às suas fontes de alimentação, com a evolução do sistema de transporte e o aprimoramento de técnicas de conservação de alimentos, atualmente é possível viver distante das fontes produtoras de gêneros alimentícios e dispor de uma vasta diversidade de alimentos.
Para efeito de compreensão faz-se necessário o agrupamento destes alimentos em dois grupos distintos, que segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA11 estão descritos da seguinte forma: Os alimentos não perecíveis são aqueles que possuem tempo de durabilidade longo e não precisam ser mantidos sob refrigeração, congelamento ou aquecimento. Podem ser armazenados à temperatura ambiente; os alimentos denominados perecíveis devem estar armazenados na temperatura recomendada pelo fabricante, não devendo ser mantidos à temperatura ambiente (fora da geladeira ou freezer), por tempo prolongado, pois sofrem alterações indesejáveis que muitas vezes não são perceptíveis, podendo causar mal à saúde.
Na área de alimentos, a ANVISA coordena, supervisiona e controla as atividades de registro, informações, inspeção, controle de riscos e estabelecimento de normas e padrões. O objetivo é garantir as ações de vigilância sanitária de alimentos, bebidas, águas envasadas, seus insumos, suas embalagens, aditivos alimentares e coadjuvantes de tecnologia, limites de contaminantes e resíduos de medicamentos veterinários. Essa atuação é compartilhada com outros ministérios, como o da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, e com os estados e municípios, que integram o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, visando garantir a qualidade dos alimentos aos consumidores.
Segundo o Código de Boas Práticas para o Transporte de Alimentos da ARESP12 os alimentos podem ainda ser agrupados e conceituados conforme é apresentado no Quadro 01:
Transportar gêneros alimentícios requer do transportador e dos agentes envolvidos no processo cuidados específicos, visando sempre a qualidade desses produtos. O transporte de alimentos pode ser realizado através de veículos rodoviários, ferroviários, aéreos e fluvial, desde que estes sejam preparados adequadamente.
Segundo o Código de Boas Práticas para o Transporte de Alimentos da ARESP (2006, p. 14, 34), os alimentos não perecíveis como arroz, massas, açúcar, farinhas e feijão são de consistência seca e baixo teor de água. Por esta razão, necessitam de menos cuidados na conservação, por períodos mais alargados.
Ao contrário dos alimentos perecíveis, que necessitam de cuidados extremos no seu transporte, devido à sua elevada susceptibilidade de contaminação, os alimentos não perecíveis devem ser conservados e transportados em ambiente seco, evitando oscilações de temperaturas capazes de provocar o efeito de “suor dos contentores”. O local dos veículos de transporte destinado a receber os alimentos deve estar em bom estado de higiene e de conservação e deve estar livre de dispositivos e acessórios não relacionados com estes produtos.
O transportador necessita, em termos práticos, adaptar seu transporte. Neste sentido o Código de Boas Práticas para o Transporte de Alimentos da ARESP (2006, p. 15) aponta algumas medidas a serem adotadas pelo transportador na tentativa de adequar o seu transporte para a condução de gêneros alimentícios, sendo:
2.7 COMÉRCIO VAREJISTA
A finalidade a qual se propõe o transporte de gêneros alimentícios é levar uma maior variedade de alimentos a locais onde a produção destes não existe ou simplesmente não consegue suprir a demanda existente. O comércio varejista desponta como um intermediador pelo qual o consumidor final tem acesso a esses produtos em pequenas quantidades. Las Casas 2010) define varejo como o processo de compra de produtos em quantidade relativamente grande dos produtores atacadistas e outros fornecedores e posterior venda em quantidades menores ao consumidor final. Kotler (2007, p.330) destaca que o varejo engloba todas as atividades envolvidas na venda de bens ou serviços diretamente a consumidores finais para seu uso pessoal, e não organizacional.
Las Casas (2010, p. 20) enfatiza que os registros mais antigos, junto com relíquias do comércio descobertas em antigas ruínas, relatam a existência de atacadistas e varejistas. Na época do Império Romano, as lojas tornaram-se muito numerosas em Roma e em outras cidades do Império. Neste mesmo período apareceram vários shopping centers em Roma. A maioria das lojas tinha uma placa do lado de fora para designar o tipo de mercadoria que era comercializada. Porém com a queda do Império Romano houve também uma queda da estrutura do varejo da época.
Entre os diversos tipos de varejo, está presente o supermercado, comércio comumente encontrado nas pequenas e grandes cidades. Este estabelecimento é popularmente conhecido pelas facilidades que oferece ao dispor de preços acessíveis às diversas classes sociais e por atender a maior parte das necessidades de alimentação dos seus clientes.
O supermercado, que surgiu nos Estados Unidos, teve seu desenvolvimento acentuado pelo uso do automóvel e o arrocho salarial que favoreceram o crescimento do auto-serviço. No Brasil, os supermercados apareceram na década de 50. Apesar de sua origem caracterizar-se pela venda de produtos alimentícios, no Brasil não foi isso que ocorreu. As pioneiras, no Brasil, no sistema self-service, foram as lojas Americanas no Rio de Janeiro, por volta de 1952. O supermercado do Disco foi inaugurado no ano seguinte, em 1953, também no Rio de Janeiro. Nesse tipo de varejo, há um crescimento no formato de hipermercados, uma mistura de supermercados com lojas de descontos, que vendem artigos do lar, eletrodomésticos, alimentos, artigos esportivos, etc. (LAS CASAS 2010, p.28).
Os supermercados são o tipo de loja de varejo a que os compradores mais vão. No entanto, atualmente eles enfrentam lento crescimento nas vendas, devido à escassez de mão-de-obra qualificada e ao aumento da concorrência das lojas de desconto de produtos alimentícios e superlojas, de um lado, e lojas de alimentos específicos, de outro. Os supermercados também foram atingidos duramente pelo rápido crescimento do hábito de comer fora de casa.
Las Casas (2010, p.22) sintetiza que no Brasil o desenvolvimento do varejo, na época colonial, estava dependente de Portugal, sendo os colonizadores os controladores de todas as operações em suas conquistas.
Destacam-se neste contexto as “companhias de comércio”, que tiveram importante atuação no mercado brasileiro, pois foram criadas com o objetivo de atingir uma economia de escala. Todavia como o comércio está em grande parte atrelado à indústria, que permite a freqüência da oferta, percebe-se a dificuldade inicial do varejo brasileiro. A inexistência de infra-estrutura, como estradas e meios de transporte, e a concentração para formar uma base de mercado fazem surgir também no Brasil a comercialização pelo peddler (caixeiro-viajante).
Desta forma fica evidente a falta de estrutura inicial do comércio varejista no Brasil, destacando-se neste contexto os problemas atrelados à dificuldade de locomoção dos produtos trazidos de outros países para adentrar as comunidades e pequenas cidades que iam surgindo no país àquela época. Essa realidade foi sendo modificada à medida que as estradas foram surgindo, rotas fluviais foram traçadas e companhias aéreas começaram a operar com atividades comerciais. Todavia toda essa estruturação ainda não se constitui como uma realidade existente em todas as regiões do país. Ainda é possível, nos dias atuais, encontrar municípios cuja falta de estrutura física das vias e/ ou dos modais existentes para abastecer o comércio varejista faz remontar aos tempos do Brasil colônia.
3 METODOLOGIA
Para abordar a temática estudada dentro do contexto amazônico torna-se necessário lançar mão de vários métodos e técnicas de pesquisa, elencados em um conjunto sistêmico e centrados em um objetivo maior que é o levantamento de dados relacionados ao tema em questão. Vergara (2009) classifica as pesquisas em dois tipos, utilizando dois critérios: quanto aos fins e quanto aos meios. Dentro da mesma linha de raciocínio Gil (2008) faz essa classificação utilizando os termos: pesquisas com base em seus objetivos e pesquisas com base nos procedimentos técnicos utilizados. Em ambos os casos os autores separam os termos para tornar mais didático a metodologia necessária ao desenvolvimento de trabalhos científicos. No presente trabalho a estruturação do método de pesquisa partirá da taxionomia que as classifica quanto aos fins e quanto aos meios.
Quanto aos fins as pesquisas exploratória, descritiva e explicativa complementaram-se ao longo do desenvolvimento deste trabalho. A pesquisa exploratória Vergara (2009) sugere que seja utilizada quando há pouco conhecimento acumulado e sistematizado em relação ao tema proposto e Gil (2008) reforça a necessidade de sua utilização quando objetiva-se o aprimoramento de ideias, que é o caso do transporte de gêneros alimentícios de Manaus para Parintins enfocando e os problemas decorrentes da utilização de balsas e barcos para esta atividade.
A pesquisa descritiva foi utilizada para desvendar um pouco mais as características de alguns aspectos das embarcações, da navegação, das relações de comércio, e outros tópicos relacionados ao tema proposto que ainda não haviam sido estudados ou eram de pouco conhecimento. Gil (2008) sustenta que a pesquisa descritiva tem como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômenos, ou então, o estabelecimento de relação entre variáveis.
E, para complementar, a pesquisa explicativa foi utilizada para compreender melhor os problemas enfrentados pelos supermercadistas do município que utilizam o modal fluvial pra condução de alimentos, uma vez que a investigação explicativa tem como principal objetivo tornar algo inteligível [...], visando esclarecer quais fatores contribuem, de alguma forma, para a ocorrência de determinado fenômeno (VERGARA 2009).
Quanto aos meios utilizados, inicialmente, a pesquisa bibliográfica que, segundo Vergara (2009), é o estudo sistematizado desenvolvido com base em material publicado em livros, revistas, jornais, redes eletrônicas, ou seja, material acessível ao público em geral. Gil (2008) destaca que a principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente. Assim tem-se a possibilidade de abranger amplamente os conhecimentos relacionados ao tema proposto, fundamentá-lo em pesquisas anteriores e confrontar os resultados obtidos por diversos pesquisadores.
Sendo necessário o conhecimento mais detalhado da estrutura das balsas e barcos que transportam gêneros alimentícios, bem como sua organização, armazenamento dos alimentos e desembarque destes no município de Parintins, utilizamos a pesquisa de campo, que Vergara (2009) define como uma investigação empírica realizada no local onde ocorre ou ocorreu um fenômeno ou que dispõe de elementos para explicá-lo, podendo incluir entrevistas, aplicação de questionários, testes e observação participante ou não. Assim, durante o levantamento de dados relacionados às balsas e barcos, a observação prevaleceu sobre os demais elementos, por meio do registro fotográfico.
No que tange a busca de informações com os supermercadistas do município, a entrevista foi utilizada como um meio de adquirir informações mais detalhadas, pois é possível ao entrevistador agendar vários pontos para serem explorados com o entrevistado (VERGARA 2009, p. 52), possibilitando assim que, à medida que a conversa for se desenvolvendo, novos pontos possam ser levantados dentro do assunto em questão.
Para transformar os dados coletados em campo em informação, foi necessário fazer a análise destes através de métodos específicos para dados qualitativos. Para tanto será utilizado um método que Appolinário (2009, p. 161-164) denomina de Análise de Conteúdo. Segundo este autor a Análise de Conteúdo tem por finalidade básica a busca de significado de materiais textuais, sejam eles artigos de revistas, prontuários de pacientes de um hospital seja a transcrição de entrevistas realizadas com sujeitos, individual ou coletivamente, sendo que o produto final desse tipo de pesquisa consiste na interpretação teórica das categorias que emergem do material pesquisado. Gil (2008) divide esse processo em uma seqüência de atividades, que envolve a redução dos dados, a categorização desses dados, sua interpretação e redação do relatório.
Observa-se que pelo método escolhido para realização desta pesquisa houve uma complementação entre pesquisa quantitativa e qualitativa, sem que haja dissociação das mesmas. Isso é justificável, pois Appolinário (2009, p. 59-60) afirma que:
É muito difícil que haja alguma pesquisa totalmente qualitativa, da mesma forma que é altamente improvável que exista alguma pesquisa completamente quantitativa. Isso ocorre porque qualquer pesquisa provavelmente possui elementos tanto qualitativos como quantitativos, ou seja, em vez de duas categorias dicotômicas e isoladas, temos antes uma dimensão contínua com duas polaridades extremas, e as pesquisas se encontrarão em algum ponto desse contínuo, tendo mais para um lado ou para o outro.
Quanto ao universo da pesquisa foi necessário selecionar uma amostragem significativa da população maior que são todos os grandes supermercadistas do município. Appolinário (2009, p. 125, 130-131) conceitua população como sendo a totalidade de pessoas, animais, objetos, situações, etc. que possuem um conjunto de características comuns que o definem, enquanto que a amostra constitui-se como um subconjunto de sujeitos extraídos de uma população por meio de alguma técnica de amostragem.
Optou-se pela amostragem por conveniência, que Vergara (2009) define como uma escolha onde os objetos de estudo são selecionados pela facilidade que o pesquisador terá para fazer sua pesquisa. Assim sendo, a amostra foi selecionada dentro de um universo composto pelos maiores supermercados do município, totalizando cinco empresários entrevistados, por volume de compra de gêneros alimentícios transportados através de barcos e balsas e donos de embarcações. Para mensurar esse volume de compras foi feito um pequeno levantamento de dados junto ao órgão responsável pela administração do Porto de Parintins. A partir desses dados foi selecionada a amostra para a pesquisa em questão. A pesquisa se deu entre os meses de julho a dezembro de 2014.
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
4.1 IDENTIFICAÇÃO DOS BARCOS E CHATAS DE FERRO QUE TRANSPORTAM GÊNEROS ALIMENTÍCIOS DE MANAUS À PARINTINS
O transporte de gêneros alimentícios de Manaus à Parintins é feito em sua totalidade através de barcos e balsas que operam nesta rota. Os barcos efetuam viagens diárias saindo do porto de Manaus (Docas) e da Balsa da Manaus Moderna com destino a Parintins e saindo do Porto de Parintins com destino à capital do Estado. As viagens acontecem regularmente durante todo o ano, com exceção apenas nos meses de junho e dezembro por ocasião do Festival Folclórico de Parintins e Natal, respectivamente. Atualmente estão operando nesta rota um total de 6 (seis) embarcações, sendo que cada uma tem um dia específico na semana para realizar sua viagem, conforme demonstra o quadro 03:
Dos barcos supracitados apenas 2 (dois) tem sua estrutura construída em aço naval, os demais são de madeira, possuindo divisões específicas para o transporte de cargas e passageiros. De forma esquematizada temos: na parte inferior da embarcação, conhecido como casco, está localizada a sala de máquina da embarcação, compartimento que alojada a máquina responsável pelo funcionamento da embarcação; os porões são uma espécie de deposito destinado ao alojamento das cargas durante a viagem e está localizado próximo à sala de máquina da embarcação. O acesso aos porões é feito por meio de uma porta de entrada que está localizada no convés principal e que durante as viagens mantêm-se fechadas para evitar que as pessoas que ali transitam possam adentrar ou até mesmo cair nestes locais.
Logo acima da área onde estão localizados os porões e sala de máquina está o Convés Principal e o Convés Superior, espaços destinados ao transporte de passageiros. Por fim, na parte mais alta fica a Área de Lazer, local onde funcionam o bar e lanchonete da embarcação. Dependendo do porte dos barcos esta estrutura pode variar, sendo que a estrutura descrita é a forma mais comum das embarcações que operam no porto de Parintins. Na figura 11 é exemplificada esta estrutura a partir do croqui de um barco de médio porte.
Além dos barcos existem 2 (duas) chatas de ferro operando no Porto de Parintins com viagens no trecho Parintins/Manaus Manaus/Parintins. Essas barcaças diferem-se dos barcos por operarem com demanda somente de cargas, destacando-se no transporte de carros, materiais escolares, confecções, material de construção, bebidas em geral, gêneros alimentícios não-perecíveis, entre outros. Suas viagens acontecem uma única vez por semana, conforme mostra o quadro 04:
Quadro 04: Cronograma semanal de viagens das chatas de ferro
Fonte: Pesquisa de Campo – julho/ 2014
As chatas de ferro são abastecidas em Manaus com as cargas e saem com destino a Parintins, viajando em média 2 (dois) dias, até chegar ao seu destino. Em comparação com os barcos, as chatas de ferro levam o dobro de tempo para fazer o mesmo percurso, por esta razão não são transportados gêneros alimentícios perecíveis nas mesmas.
Há ainda os barcos que aportam no Porto de Parintins oriundos da cidade de Manaus com destino ao Estado do Pará. Essas embarcações têm pouca representatividade dentro do transporte de gêneros alimentícios por transportarem um quantitativo irrisório destes produtos. Isso acontece porque estas embarcações apenas passam pelo município e permanecerem no porto por poucos minutos.
4.1.1Quantitativo de Gêneros Alimentícios Transportados
Os gêneros alimentícios representam mais de 50% do total de cargas transportadas à Parintins por barcos e balsas, conforme demonstra o controle de movimentação de mercadorias desembarcadas no Porto de Parintins registrado pela SNPH durante o ano de 2014, conforme demonstrado na tabela 01.
Ressalta-se que esta movimentação corresponde ao total de cargas oriundas de Manaus e de outras cidades, porém é o único controle disponível na SNPH para mensuração deste quantitativo. O órgão fornecedor das informações esclareceu que os gêneros alimentícios que desembarcam no Porto de Parintins cuja origem do embarque é Manaus, representam cerca de 80% (oitenta por cento) do quantitativo total apresentado no quadro 04.
O transporte de cargas e passageiros é sazonal no município de Parintins, com períodos de intenso e escasso fluxo. Os fatores que interfere diretamente nesse processo são o Festival Folclórico de Parintins, que é realizado no último final de semana do mês de junho, e as festividades de Natal e Ano Novo. Nestes períodos os barcos operam com alta demanda de passageiros e realizam viagens extras, duas variáveis que impossibilitam o transporte de gêneros alimentícios em grande quantidade, pois o tempo de permanência dos barcos no porto de Manaus é menor que nos períodos das viagens normais. Assim os armadores optam por não trazerem cargas, assim não precisarão permanecer muito tempo no porto de Parintins retirando cargas dos porões dos barcos.
Para suprir a necessidade de gêneros alimentícios nos supermercados de Parintins os empresários abastecem o comércio antes do aumento do fluxo de passageiros. O quadro 04 apresentou de forma geral todo o volume de cargas desembarcadas no Porto de Parintins no ano de 2014. É possível que haja um volume muito maior de gêneros alimentícios desembarcados em Parintins nos meses de maio, junho, novembro e dezembro, pois no período de intenso desembarque de cargas o Porto de Parintins não suporta a demanda existente. Porém o campo de pesquisa destes dados limitou-se exclusivamente ao porto da cidade, sem levar em consideração os desembarques que ocorrem em portos particulares, uma vez que estes não dispõem de um controle em arquivo.
4.1.2 Organização e Armazenamento dos Gêneros Alimentícios nos Barcos e Chatas de Ferro
Conforme foi apresentado no capítulo 1 desta análise, os barcos dispõem de estrutura exclusiva para o transporte de cargas, denominado de porão. Os porões são como depósitos para onde toda a carga transportada em grandes volumes são direcionadas. Nos barcos que operam na rota Manaus/Parintins Parintins/ Manaus existe uma disparidade muito grande no tipo de carga transportada para ambas as cidades supracitadas.
Os produtos transportados no percurso Manaus/ Parintins são os mais diversos, sendo: gêneros alimentícios; material de limpeza; materiais de construção; móveis; eletrodomésticos; motos; bicicletas; aparelhos eletrônicos; bebidas em geral; etc. as Figura 12 e 13 demonstram algumas das cargas transportadas nos barcos.
Essas cargas são armazenadas, ainda no Porto de Manaus, nos porões dos barcos à medida que vão chegando. As primeiras cargas a serem armazenadas são as ultimas a serem desembarcadas em Parintins, pois as mesmas são empilhadas e organizadas no fundo dos porões. Esta forma de armazenamento é um fator que causa danos às cargas, pois à medida que necessita tirar cargas do fundo do porão todas as demais cargas que estão na frente são retiradas, primeiramente para o convés principal do barco, e posteriormente são colocadas nos caminhões que fazem o transporte destas até os supermercados. A figura 14 mostra o processo de retirada de cargas do porão para o convés principal de um barco.
Conforme ilustrado nas figuras supracitadas, percebe-se que não existem nas embarcações exclusividade quanto ao transporte de gêneros alimentícios, sendo estes transportados juntamente com as demais cargas.
As chatas de ferro, por sua vez, têm toda sua extensão disponível para armazenar e transportar as cargas, dispondo-as sobre estrados de madeira. Essas cargas são protegidas de sol e chuva por lona plástica que é presa nas laterais da embarcação ou estendida formando uma espécie de teto. Esta forma de acondicionamento apresenta-se inadequada, pois protege as cargas transportadas mais não as isenta de serem expostas ao calor e umidade que atravessam a lona plástica chegando até esses produtos.
Dos barcos e balsas mencionados neste capítulo apenas uma embarcação dispõe de câmara frigorífica para transportar gêneros alimentícios refrigerados, as demais os transportam nos porões, próximos uns aos outros para manter a temperatura equilibrada. Esse procedimento já foi mais utilizado pelas embarcações, sendo que atualmente a Vigilância Sanitária do município tem mantido ações para coibir esta prática. A câmara frigorífica existente na embarcação mencionada é relativamente pequena, se comparada à grande demanda de cargas refrigeradas que são embarcadas em Manaus com destino à Parintins. Seu espaço mede pouco mais que 6m2 com altura aproximada de 2m.
Existe atualmente na rota Manaus/Parintins Parintins/Manaus uma balsa com container onde são transportados alguns gêneros alimentícios refrigerados. A balsa em questão não está presente na pesquisa por utilizar um porto particular para efetuar seu trabalho de desembarque de cargas, sendo que a referida pesquisa limitou-se aos barcos e Balsas que operam no Porto de Parintins.
4.1.3 Transporte dos Gêneros Alimentícios do Porto aos Supermercados
Após serem retirados dos barcos e balsas os gêneros alimentícios são arrumados em carros, caminhões, carretas, triciclos, etc., e transportados até os supermercados ou depósitos. Esse é um processo prejudicial às cargas em geral, pois há manuseio tanto no processo de alocação das cargas no transporte terrestre quanto no descarregamento destas no seu destino.
Durante o trajeto do Porto ao supermercado os veículos deixam expostos ao sol os gêneros alimentícios transportados, expondo estes ao calor. No caso dos alimentos congelados pode ocorrer descongelamento e até perda da carga transportada. Os supermercadistas do município, em sua maioria, optam por terceirizar este serviço e assim não ter que disponibilizar seus colaboradores para efetuarem esta tarefa. Dos supermercadistas entrevistados durante a pesquisa apenas um não terceiriza o serviço, por ter três colaboradores que desempenham esta tarefa.
4.2 VANTAGENS E DESVANTAGENS NA UTILIZAÇÃO DE BARCOS E CHATAS DE FERRO NO TRANSPORTE DE GÊNEROS ALIMENTÍCIOS
Transportar gêneros alimentícios em barcos e balsas é mais que uma opção para os supermercadistas de Parintins, é uma necessidade inerente ao processo de abastecimento dos supermercados. A falta de opções se dá em virtude do município ser uma ilha cujo acesso está limitado ao uso do transporte fluvial ou aéreo. A segunda opção constitui-se como alternativa inviável para o transporte desses gêneros, por apresentar custo elevado de frete, sendo mais utilizado para a condução de objetos cujo valor agregado seja suficiente para custear o transporte.
Em entrevista com os supermercadistas do município diversos pontos foram levantados em relação ao uso do transporte fluvial, sendo apontadas as vantagens e desvantagens decorrentes deste processo.
Com relação às vantagens na utilização do modal fluvial, esta se relaciona à questão do volume de carga transportada. Os entrevistados afirmaram que não há limite de pedido de gêneros alimentícios em decorrência do uso dos barcos e chatas de ferro, pois quando o quantitativo de cargas é elevado e não pode ser acondicionado em uma única embarcação, o fornecedor despacha em outro barco ou chata de ferro.
Outro fator apontado como positivo diz respeito à questão do prazo de lançamento do pedido e a entrega destes nos supermercados do município, o prazo vai de 3 (três) a 7 (sete) dias. Na maioria das vezes o prazo combinado é cumprido, não havendo atrasos, com exceção em dois períodos distintos: Festival Folclórico de Parintins e festividades natalinas. Nesse período restam somente as chatas de ferro, porém suas viagens são lentas (em comparação com os barcos), ocasionando atrasos frequentes. Para tentar contornar esta situação, os supermercadistas do município abastecem seus depósitos no período que antecede essas duas festividades. Assim, o prazo constitui-se como vantagem na maior parte do ano.
As principais desvantagens apontadas pelos entrevistados estão relacionados à falta de estrutura para a condução de gêneros alimentícios refrigerados, uma vez que existe grande demanda no município e apenas uma embarcação dispõe de câmara frigorífica. A balsa que utiliza container para conduzir os gêneros também não é suficiente para atender todos os supermercados, sendo necessário agendar com o proprietário da mesma o transporte dos produtos refrigerados.
Essa situação vem se agravando após intervenção da Vigilância Sanitária do município, que tem mantido ações de fiscalização nas embarcações que operam no Porto de Parintins para tentar inibir o transporte de refrigerados nos porões e convés principal das embarcações. Os entrevistados afirmaram fazer o possível para que suas cargas refrigeradas sejam conduzidas em condições adequadas, porem três deles confirmaram que transportam esses produtos em condições inadequadas.
Outro problema apontado pelos supermercadistas está relacionado à forma de organização dos gêneros alimentícios nos porões e convés principal das embarcações e nas chatas de ferro. As caixas e fardos são empilhados uns em cima dos outros, causando danos e avarias, com latas amassadas, fardos estourados, caixas rasgadas e molhadas. Geralmente quando esses problemas ocorrem o proprietário da embarcação arca com parte do prejuízo, porém o supermercadista, mesmo sendo compensado, fica sem o produto ou com este danificado.
Além dos problemas que ocorrem dentro das embarcações, foram apontadas situações que acontecem pelo uso dos carros para condução dos gêneros alimentícios do porto até o supermercado ou depósito. A maioria desses veículos conduz as cargas expondo-as ao calor por não dispor de estrutura que possibilite protegê-las do sol.
Entre os reflexos da utilização do transporte fluvial no consumidor final foram elencados pelos supermercadistas algumas situações que acontecem com maior frequência:
Os clientes questionam se os produtos refrigerados são transportados em condições adequadas;
Assim, foi possível perceber que existem situações que favorecem o transporte de gêneros alimentícios por via fluvial de Manaus à Parintins, e outras situações que não favorecem, porém esse sistema continua sendo o mais utilizado em decorrência da falta de opções a curto e médio prazo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As conclusões às quais se chegaram após o estudo do tema proposto, abre espaço para considerações e recomendações úteis que a curto, médio ou longo prazo poderão nortear processos de mudanças no transporte fluvial de gêneros alimentícios de Manaus à Parintins. São apenas sugestões que ainda estão destituídas de conteúdos técnicos mais precisos, contudo poderão ser usados para subsidiar esses processos de mudanças.
Como meio de transporte muito utilizado no Estado do Amazonas, o transporte fluvial tem um significado expressivo para a sua população, visto que o rio sempre foi o caminho natural desde as primeiras viagens exploratórias. Neste sentido é notória a necessidade de estruturação deste tipo de transporte visando oferecer qualidade às cargas transportadas.
No município de Parintins, os barcos e chatas de ferro revestem-se de grande importância para a população local, por ser o meio de condução dos gêneros alimentícios que abastecem os supermercados do município.
Observou-se, durante a pesquisa, que há uma necessidade urgente de adequação do transporte fluvial para a condução dos gêneros alimentícios refrigerados. Propôe-se como solução para os barcos a adequação dos porões com instalação de câmaras frigoríficas, e para as chatas de ferro, a utilização de container para condução destas cargas.
Outra problemática identificada está relacionada à forma de organização dos gêneros alimentícios nos porões dos barcos, que poderia ser contornada com o treinamento dos colaboradores, no sentido de orientá-los quanto aos cuidados necessários ao manuseio dos fardos e caixas de alimentos, bem como a organização destes produtos nos porões, evitando o acondicionamento de produtos mais densos sobre caixas e fardos frágeis.
Torna-se relevante ainda que os armadores, em consenso com os supermercadistas do município encontrem mecanismos que possibilitem a condução de cargas no período de alta demanda de passageiros, evitando, com isso a falta de gêneros alimentícios ao consumidor final. Sugere-se neste sentido que as chatas de ferro possam operar com maior frequência para suprir essa demanda.
Quanto a limitações do estudo, todo método tem dificuldades de operacionalização que surgem no decorrer da pesquisa. Em relação a este trabalho, podem-se apresentar algumas questões referentes à obtenção de literatura local/ regional sobre logística fluvial, dificultando o aprofundamento da discussão teórica. Quanto as limitações na coleta de dados, a aplicação dos formulários e entrevistas ocorriam nos próprios ambientes de trabalho dos proprietários dos supermercados, e muitos não permitiam ser incomodados nos finais de semana.
Para as próximas pesquisas nesta área, sugere-se que o estudo seja desenvolvido a partir da visão dos armadores em relação à estrutura dos barcos e chatas de ferro, para que possa haver um comparativo entre a visão destes e o material exposto no presente trabalho. Recomenda-se ainda que possa ser abordado não apenas deste modal na condução de gêneros alimentícios, mas aborde ainda a problemática dos portos onde essas embarcações operam.
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2 Canoa sem quilha usada pelos índios, embarcação leve.
3 Contratador que se encarrega da exploração comercial de um navio.
4 Ajuda financeira ou de outra ordem dada a qualquer empresa ou particular. No caso a empresa recebia ajuda financeira do governo estadual.
5 Catamarã é a designação dada a uma embarcação com dois cascos (vulgarmente chamados "bananas"), com propulsão à motor, que se destaca por sua elevada estabilidade e velocidade em relação às embarcações monocasco.
6 Os navios roll-on-roll-off são aqueles em que a carga entra e sai dos porões, geralmente sobre rodas (automóveis, ônibus, caminhões) ou sobre veículos (carretas, trailers, estrados volantes, etc.).
7 Estaleiro são os lugares onde se constroem ou consertam navios.
8 Espécie de praia que surge no meio dos rios nos períodos de águas baixas; algumas vezes ficam visíveis, sendo mais comum encontrá-los submersos, a poucos metros da superfície. Essas praias mudam de lugar a cada novo período de estiagem, razão pela qual o conhecimento empírico do comandante da embarcação não é suficiente para reconhecer onde o banco de areia irá surgir;
9 Pedrais são barreiras de pedras existentes nos rios, que se constituem como obstáculos para a navegação, além de oferecer riscos de colisão com o casco da embarcação levando-a a submergir;
10 Remoinho ou sorvedouro, formado nos rios pelo embate das correntezas com a massa de águas paradas; espiral formada pelo vento ao encontra a resistência com um corpo que desvia a correnteza aérea; espumarada que a água faz no mar e nos rios.
11 Agência Nacional de Vigilância Sanitária, cuja finalidade institucional é promover a proteção da saúde da população por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados
12 O Código de Boas Práticas para o Transporte de Alimentos da Associação da Restauração e Similares de Portugal - ARESP define as normas gerais e específicas, de higiene e controles necessários para garantir a segurança alimentar da atividade de transporte desde as matérias-primas aos produtos acabados.
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