Observatorio Economía Latinoamericana. ISSN: 1696-8352
Brasil


CARACTERIZAÇÃO SOCIOECONÔMICA DE COMUNIDADES RURAIS AMAZÔNICAS DO ESTADO DO PARÁ, BRASIL

Autores e infomación del artículo

Raynon Joel Monteiro Alves

Altem Nascimento Pontes

Ana Lúcia Nunes Gutjahr

Universidade do Estado do Pará

raynon_alves@yahoo.com.br

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Resumo
Este estudo objetivou definir o perfil socioeconômico de comunidades rurais do município de Marapanim-Pará, por meio da aplicação de questionários estruturados com perguntas objetivas e subjetivas a 139 moradores, amostra estratificada entre os objetos de estudo: Guarajubal (n = 60), Porto Alegre (n = 46) e Cipoteua (n = 33). Utilizou-se a estatística descritiva para a análise dos dados.  A maioria dos moradores das comunidades estudadas mantém relações conjugais instáveis, são nativos e possuem baixa escolaridade. As atividades agroextrativistas têm grande importância para a economia familiar, além de rendas externas, como a do Programa Bolsa Família do governo federal. A organização social e a atuação política são mínimas nesses povoados e há o anseio pela continuidade de estudo e aquisição de trabalhos formais, o que pode incentivar os jovens à desvalorização das práticas tradicionais locais, como notadamente ocorre com a pesca artesanal na comunidade de Porto Alegre. É evidente a necessidade de políticas públicas que visem melhorar a infraestrutura local, as oportunidades de emprego e renda e a manutenção do trabalho agroextrativista, pois a falta de atuação do governo foi considerada a principal dificuldade entre os trabalhadores das comunidades e moradores em geral.
Palavras-chave: Povos da Amazônia, Trabalhadores agroextrativistas, Socioeconomia.

Abstract
This study  aimed to define the socioeconomic profile of rural communities in the municipality of Marapanim Para, through the application of structured questionnaires  with objective and subjective questions to 139 residents, stratified sample between the objects of study: Guarajubal (n = 60), Porto Alegre (n = 46) and Cipoteua (n = 33). Were used descriptive statistics to data analysis. Most of the people studied are not formally married, are native and have low education. The agro-extractive activities are very important for the family economy and too the external incomes, as the Bolsa Família Program. The social organization and political activity are minimal in these communities, apart from that the desire for continued the study and formal work can encourage young people to the devaluation of local traditional practices, as occurs with the traditional fishing on community of Porto Alegre. It needs public policies to improve the infrastructure local, employment opportunities and income and the maintenance of agroextractive work, because the absence of government action is the main difficulty among workers and residents of communities.
Keywords: Amazonian peoples. Agroextractivist workers. Socioeconomics.



Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

Raynon Joel Monteiro Alves, Altem Nascimento Pontes y Ana Lúcia Nunes Gutjahr (2015): “Caracterização socioeconômica de comunidades rurais amazônicas do estado do Pará, Brasil”, Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, Brasil, (julio 2015). En línea: http://www.eumed.net/cursecon/ecolat/br/15/socio-economia.html


  1. Introdução

        A Amazônia caracteriza-se não apenas por sua diversidade físico-natural e biológica, mas também pela diversidade étnica, socioeconômica e cultural, resultante dos inúmeros atores sociais que a povoam, como: indígenas, caboclos, pequenos produtores, população sem terra, trabalhadores urbanos, grandes e pequenos proprietários (FERREIRA & SALATI, 2005). Desde os primórdios, o extrativismo tem contribuído com a formação socioeconômica e política dos povos da região, cujo processo excede o extrativismo vegetal convencional (SOUZA, 2010; HOMMA, 2012).
        Neste contexto, mencionam-se as multiatividades extrativas e agrícolas que consistem em plantio de culturas anuais ou perenes, hortaliças, pecuária, caça, pesca (HOMMA et al., 2014). Estas práticas, embora amplamente difundidas na região amazônica, apresentam-se numa base de desenvolvimento frágil, caracterizada principalmente pelo nível de pobreza dos povos envolvidos (SOUZA, 2010). Em geral, as comunidades, predominantemente rurais, caracterizam-se por reduzido poder político e econômico, vasta dependência de recursos naturais e de ciclos ambientais (OLIVEIRA & MANESCHY, 2014).
              No cenário amazônico, destaca-se o município de Marapanim, assim como os demais que formam a Mesorregião do Nordeste Paraense, a exemplo, Curuçá que apresenta suas relações cotidianas marcadas pela apropriação da natureza pelo homem (SOUZA, 2010) e Maracanã, cuja ocupação e uso do território ocorrem por diversos conterrâneos, tradicionais ou não, e de múltiplos modos como por meio da agricultura, pesca e mariscagem (FIGUEIREDO et al., 2014).
              Caracterizar os aspectos socioeconômicos de comunidades agrícolas como as de Ajó, em Cametá-PA (NOGUEIRA et al., 2011) e de Portel, no Marajó-PA (SANTOS & SANTANA, 2012); bem como de comunidades pesqueiras ao entorno do Rio Tocantins, em Marabá-PA (OLIVEIRA et al., 2011) e da Ilha Bela-SP (RAMIRES et al., 2012) e de extrativistas de caranguejo, Ucides cordatus (Linnaeus, 1763), às margens do Rio Mamanguape, no nordeste brasileiro (ALVES & NISHIDA, 2003) e do município de Bragança-PA (COSTA et al., 2013) é de fundamental importância para aferir a situação socioeconômica desses trabalhadores e da comunidade como um todo, além de consistir num diagnóstico para embasar a implementação de políticas públicas direcionadas, em especial, para a manutenção das atividades de geração de renda e inserção de outras, bem como contribuir para a qualidade de vida da população (TERCEIRO et al., 2013; ALVES et al., 2015). Nesta perspectiva, a finalidade deste estudo foi definir o perfil socioeconômico de três comunidades rurais do município de Marapanim, Pará.

  1. Material e métodos

 

2.1 - Área de estudo

              Este estudo foi realizado no município de Marapanim (0° 43’52’’ S e 47° 41’54’’ W), pertencente à Mesorregião do Nordeste Paraense, Zona Fisiográfica da Microrregião do Salgado. Possui área de ocupação territorial de 795,987 km2 e população de 26.605 pessoas distribuídas nas zonas urbana e rural (IBGE, 2015).
            Precisamente, os locais de coleta de dados corresponderam a três comunidades rurais de Marapanim: Guarajubal (S 00º 43. 948’ W 047º 42. 779’), Porto Alegre (S 00º 39.510’ W 047º 39.864’) e Cipoteua (S 00º 54.278’ W 047º 43.749’), localizadas a 3 km, 8 km e 50 km da sede administrativa municipal, respectivamente (Figura 1). Cada comunidade foi eleita levando em consideração a atividade agroextrativista, de cunho econômico, predominantemente entre os moradores, visto que em Guarajubal é o extrativismo de caranguejo, U. cordatus; Porto Alegre, a pesca artesanal e Cipoteua, a agricultura familiar.

2.2 - Tipo de estudo

              Este estudo consistiu numa abordagem quali-quantitativa de natureza exploratória, cujo levantamento de dados socioeconômicos das referidas comunidades correspondeu à coleta in loco, além da revisão bibliográfica sobre o tema em questão.

2.3 - Delimitação da amostra
              O contingente populacional das três comunidades eleitas correspondeu a 214 famílias, sendo que a comunidade de Guarajubal apresentou 93 delas; Porto Alegre, 70 e Cipoteua, 51. Sabendo-se disso, o tamanho da amostra, no, foi calculado pela Eq. (1), onde  equivale ao erro amostral tolerável (BARBETA, 2008):
                                                              (1)
Para tanto, utilizou-se erro amostral de 5% para obter o famílias. O tamanho da amostra corrigido, n, pode ser obtido por meio da Eq. (2):

                                                            (2)
Desta forma, obteve-se n = 139 famílias a serem investigadas.

              A partir da determinação do n amostral utilizou-se a amostragem estratificada (BARBETA, 2008). Sendo assim, na comunidade de Guarajubal o número de famílias a serem estudadas correspondeu a 60, Porto Alegre, 46 e Cipoteua, 33.

2.4 - Coleta de dados

              Utilizou-se a aplicação de questionários estruturados com perguntas objetivas e subjetivas a um dos chefes de família das comunidades estudadas, de forma aleatória. A coleta de dados ocorreu durante o período de novembro de 2014 a fevereiro de 2015.
              Para caracterizar os aspectos socioeconômicos, as questões pertinentes do questionário foram: gênero, idade, naturalidade, estado civil, tempo de residência no local, composição familiar, escolaridade dos membros da família, principal dificuldade de estudo na comunidade, fonte principal e secundária de renda da família, o destino dos produtos agroextrativos – se ocorresse, envolvimento familiar nas atividades agroextrativistas, auxílio (s) financeiro (s) do governo, renda mensal da família, participação na associação local e atuação do poder público.
              Da mesma forma, buscou-se mensurar em grau de importância (baixa, média, alta ou então sem importância) as principais dificuldades que comumente afligem os trabalhadores agroextrativistas, as quais foram pré-definidas em: ausência de equipamentos de trabalho, de mão de obra e de ajuda do poder público, a baixa produtividade natural, a competição mercantil entre os produtores e o baixo rendimento com a comercialização de produtos agroextrativos. Entretanto, outras dificuldades poderiam ser mencionadas e avaliadas em graus de importância. Sendo assim, esse quesito foi destinado àqueles que praticam a pesca, agricultura e captura/beneficiamento de caranguejo como atividade econômica para prover o sustento do grupo familiar.

2.5 - Tratamento e análise de dados
             
            Os dados foram tratados por meio de estatística descritiva para a determinação de médias, frequências e elaboração de gráficos e tabelas. O software empregado foi o Microsoft Excel 2010. As informações de caráter qualitativo foram discutidas no corpo do artigo como complemento dos resultados quantitativos.

  1. Resultados

3.1 - Perfil socioeconômico da comunidade de Guarajubal

   Entre os 60 chefes de família entrevistados, 45 (75,0%) pertenciam ao gênero feminino e 15 (25,0%) ao masculino, apresentando em média 45,8 anos de idade. Predominantemente, 44 (73,3%) moradores são naturais da própria comunidade; 4 (6,7%), procedem de povoados marapanienses congêneres e adjacentes, como: Arapijó, Boa Esperança, São Vicente e 12 (20,0%) são oriundos de outros municípios, como: Belém, Curuçá, Castanhal, Santa Izabel. De modo geral, a média do tempo de residência desses moradores na referida comunidade correspondeu a 32,4 anos, sendo que a maioria deles, 26 (43,3%), mantém uniões instáveis (amigados); 15 (25,0%) são solteiros; 10 (16,7%) são casados e 9 (15,0%), viúvos. O grupo familiar é composto em média por 3,9 pessoas por família.
   Considerando o número total de indivíduos que formam as 60 famílias estudadas (n = 236), verificou-se que grande parte deles, 155 (65,7%) (Tabela 1) não concluiu o ensino fundamental, enquanto que 31 (13,1%) completaram o ensino básico. Ressalta-se que dessa amostra, 55 (23,3%) indivíduos estão cursando o ensino fundamental ou médio e 22 (9,3%) são crianças que ainda não participam da educação infantil, incluídos na categoria analfabetismo.   
   Quanto à principal dificuldade enfrentada por esses moradores, a maioria, 21 (35,0%), mencionou a falta de transporte escolar no passado, ocasionando o deslocamento a pé ou canoa para as escolas em comunidades adjacentes ou sede municipal; 10 (16,7%) constituíram família, desistindo dos estudos; 7 (11,7%) se vincularam ao trabalho infantil para ajudar os pais nos trabalhos agroextrativistas; 4 (6,6%) citaram as mínimas condições financeiras dos pais para manter os filhos na escola; 3 (5,0%) mencionaram a incompatibilidade de conciliar o trabalho e o estudo, enquanto que 15 (25,0%) não manifestaram nenhum problema nesse sentido.
   Tratando-se da fonte principal de renda das famílias estudadas, a aposentadoria ocorre para 23 (38,3%) entrevistados; seguida da prática de atividades agroextrativistas em 20 (33,4%) casos, sendo o extrativismo e beneficiamento de caranguejo (n = 16), a agricultura (n = 3) e a pesca (n = 1); 9 (15,0%) mencionaram os serviços públicos ou privados; 3 (5,0%), o comércio de gêneros alimentícios e domésticos e somente 5 (8,3%) deles estão desempregados, mantendo-se com o auxílio financeiro do Programa Bolsa Família e/ou de familiares.
   O extrativismo de caranguejo (captura e/ou o beneficiamento do crustáceo) se configura como a atividade econômica de maior frequência entre os entrevistados. Para 27 (45,0%) unidades familiares esse trabalho funciona como fonte primária de renda (n = 16) ou como complemento financeiro (n = 11). Em 12 famílias o homem é responsável pela captura dos caranguejos e a mulher pelo processamento da massa do animal para posterior comercialização aos consumidores em valores que variam de R$ 19,00 a R$ 21,00; em 8 casos, a mulher é incumbida exclusivamente da catação da carne do caranguejo, cuja produção é destinada aos intermediários locais (patrões) no valor de R$ 3,50/kg a R$ 4,00/kg; enquanto que para 5 famílias, o homem captura o crustáceo para a venda a retalho ou para os intermediários; em 1 unidade familiar o homem realiza ambas as tarefas (captura e beneficiamento do animal) e em 1 caso, a mulher é a intermediária que contrata as catadoras para beneficiar o produto e, em seguida, submetê-lo à venda. 
   Por sua vez, a agricultura é desenvolvida por 18 unidades familiares (30,0%), cuja produção agrícola se destina exclusivamente ao consumo próprio (n = 14) ou para o autoabastecimento alimentar e à comercialização (n = 4), configurando-se como primária ou secundária atividade econômica, principalmente a partir da venda da mandioca e de derivados. A pesca, realizada paralelamente à agricultura, é tida para 4 (6,6%) famílias como principal atividade ( n = 2) ou como complemento de renda (n = 2) a partir da comercialização de uma parcela do pescado.  Em geral, 39 (65,0%) famílias desenvolvem alguma (s) atividade (s) agroextrativista (s), havendo envolvimento familiar (n = 24) ou não (n = 15).
   Como complementação de renda doméstica, 41 famílias apresentam outras fontes de finanças, sendo principalmente por meio do Programa Bolsa Família, conforme 19 (46,4%) informantes (Tabela 2); outros, 14 (34,1%), além de receberem esse recurso financeiro, desenvolvem atividades agroextrativistas ou em outros setores, como: o extrativismo e beneficiamento de caranguejo, pesca, comércio de gêneros alimentícios/domésticos e trabalhos provisórios.
   Em relação à atuação do poder público na comunidade de Guarajubal, 52 (86,7%) dos entrevistados alegaram desconhecer tal atuação e somente 8 (13,3%) citaram a coleta de resíduos sólidos, o apoio financeiro às festas populares e a manutenção do Programa Mais Educação. Tratando-se da organização social, 48 (80,0%) informantes são participantes da Associação Comunitária dos Moradores de Guarajubal e apenas 12 (20,0%) dela participam.
   Sobre os auxílios financeiros dados pelo Governo ou concessão de direitos, que geralmente ocorrem simultaneamente, 33 (55,0%) unidades familiares têm o Bolsa Família e 23 (38,3%) a aposentadoria. Quanto à somatória da renda mensal das famílias estudadas, a maioria, 45 (75,0%), obtém o valor compreendido entre 1 e 2 salários mínimos e 15 (25,0%) o inferior a 1 salário.
              Ao analisar as dificuldades vivenciadas no trabalho extrativo pelos extrativistas de caranguejo (n = 27) as de maior grau de importância foram a falta de ajuda do governo, principalmente em relação ao Seguro Defeso inexistente na região (n = 13) (Figura 2), a venda pouco lucrativa da produção de massa de caranguejo (n = 7) e a falta de mão de obra para otimizar a produção (n = 5), a fim de angariar mais lucro. Entretanto, os problemas propostos foram predominantemente concebidos como sem importância, haja vista que a referida atividade não requer instrumentos sofisticados para a captura e beneficiamento do caranguejo, a produção natural dos crustáceos é significativa nos manguezais de áreas próximas, bem como os recursos humanos são relativamente suficientes para o trabalho, garantindo rendimento considerável por meio da comercialização da produção, bastante requisitada pelo mercado consumidor. 

3. 2 - Perfil socioeconômico da comunidade de Porto Alegre

   Entre os 46 chefes de família entrevistados, 35 (76,1%) foram mulheres e 11 (23,9%) homens. Em geral, estes indivíduos apresentaram em média 39,8 anos de idade e 24,6 anos de tempo de moradia no local. Em sua maioria, tais moradores são conterrâneos marapanienses, sendo que 27 (58,7%) deles são nativos do referido povoado; 9 (19,6%) advêm de outras comunidades do município, como: Araticum, Caju, Canavial, Cruzador; 2 (4,3%) procedem da sede municipal e 8 (17,4%) são migrantes de outros municípios nortistas, como: Belém, Bragança, Castanhal, Salinas e Terra Alta. A maioria dos informantes, 20 (43,5%), mantém união instável com os companheiros; 15 (32,6%) são solteiros; 6 (13,0%) são oficialmente casados e 5 (10,9%), viúvos. As famílias estudadas são compostas, em média, por 4,3 pessoas por grupo doméstico.
            Em relação à escolaridade das 200 pessoas que formam as 46 famílias estudadas, em Porto Alegre, 140 (70,0%) indivíduos possuem o ensino fundamental incompleto (Tabela 3) e 3 (1,5%) têm o nível superior completo ou em andamento. Ressalta-se que dessa amostra, 67 (33,5%) estão cursando o ensino básico e superior e 16 (8,0%) são crianças que ainda não iniciaram a educação infantil formal, incluídas na categoria analfabetismo.
            A principal dificuldade de estudo, segundo 10 (21,7%) mulheres entrevistadas, resultou da gravidez precoce, culminando em união instável do casal. Em seguida, 9 (19,6%) citaram a inexistência de transporte escolar que dificultava o acesso às escolas em outras comunidades; 4 (8,7%) mencionaram as mínimas condições financeiras dos pais para a manutenção dos filhos na escola; 4 (8,7%) alegaram a falta de interesse particular em continuar os estudos e para  2 (4,3%) a evasão escolar ocorreu por problemas familiares. Para os demais, 17 (37,0%), não houve dificuldades que interferissem no processo educacional dos mesmos ou então não souberam argumentar acerca disso.
            Quanto à fonte principal de rendimento familiar, a maioria, 13 (28,3%), declarou serem os serviços públicos ou privados, a exemplo: auxiliar de serviços gerais, docente, gari, porteiro; 9 (19,6%) informaram ser a aposentadoria; 9 (19,6%) citaram as atividades agroextrativistas, como: agricultura (n = 4), pesca (n = 4) e captura de caranguejo (n = 1); 5 (10,9%) mencionaram o recebimento de benefício social de algum familiar com necessidade especial; 4 (8,7%) informaram o comércio de pescado por intermediação (são marreteiros) (n = 3) e o de gêneros alimentícios/domésticos (n = 1); 4 (8,7%) chefes de famílias se encontram em situação de desemprego, dependendo sobretudo do Programa de Bolsa Família e para 2 (4,3%) a obtenção de finanças procede de trabalhos provisórios e esporádicos.   
               Destaca-se que a pesca artesanal é a atividade extrativista que ocorre em 17 (37,0%) unidades familiares, sendo que o pescado é direcionado ao consumo familiar e o excedente; à comercialização (n =10) ou então é exclusivo para à alimentação da família (n = 7). Do mesmo modo, a agricultura, ocorrendo simultaneamente à pesca ou não, é praticada por 14 (30,4%) famílias que cultivam principalmente a mandioca para o abastecimento alimentar e comercial (n = 8) ou então somente para o autoconsumo (n = 6). Já a captura e comercialização de caranguejo ocorre somente em 2 (4,4%) grupos domésticos para fins econômicos. De modo geral, essas atividades podem ocorrer conjuntamente em 22 unidades familiares (47,8%), havendo envolvimento familiar (n = 10) ou não (n = 12).
               Como complemento de renda 36 famílias apresentam outras fontes de obtenção de recursos financeiros, sendo que a principal é a transferência de renda do Programa Bolsa Família, conforme 15 (41,6%) entrevistados (Tabela 4). Em sequência, 11 (30,5%), além dessa aquisição de renda, realizam outros ofícios, vinculados ao agroextrativismo (agricultura e pesca), trabalhos temporários e o comércio de gêneros alimentícios/domésticos e de pescado por intermediação.
              Tratando-se da atuação do poder público na comunidade de Porto Alegre, 32 (69,6%) alegaram não haver ações consistentes e apenas 14 (30,4%) mencionaram: a coleta de resíduos, o apoio às festas populares, o atendimento médico no local, a manutenção das ruas e escola pública, a doação de cestas básicas em períodos festivos, iluminação pública, auxílio na limpeza do igarapé e a disponibilidade de ajuda quando solicitado. Quanto à organização social, 32 (69,6%) participam ora da Associação dos Moradores de Porto Alegre ora da Associação Comunitária dos Agricultores e somente 14 (30,4%) não participam delas.
 
   Entre os programas, direitos e/ou benefícios sociais que contemplam essas famílias, de forma simultânea ou não, o mais frequente é o Programa Bolsa Família, conforme 30 (65,2%) informantes; seguida da aposentadoria, 9 (19,5%), e de benefícios sociais, 5 (10,8%). Sobre a renda mensal familiar, a maioria, 34 (73,9%), obtém o valor compreendido entre 1 e 2 salários mínimos e para 12 (26,1%) unidades familiares, uma quantia de até 1 salário.
   Considerando apenas os pescadores estão em constante atividade (n = 10), verificou-se que as dificuldades propostas pela pesquisa são predominantemente classificadas como sem importância (Figura 3), visto que estes trabalhadores detêm a posse das tecnologias de pesca ou se agregam em parcerias, a mão de obra utilizada é suficiente para o trabalho, assim como o pescado e o lucro obtidos são respectivamente satisfatórios para o consumo familiar e aquisição de renda por meio de relações comerciais. No entanto, a ausência de ajuda do governo (n = 4) foi a dificuldade de alta importância entre os pescadores, visto que não há linhas de crédito e financiamentos acessíveis, tampouco ocorre o pagamento do Seguro Defeso no município de Marapanim.

3.3 - Perfil socioeconômico da comunidade de Cipoteua

   Entre 33 chefes de família entrevistados, 17 (51,5%) foram do gênero masculino e 16 (48,5%) do feminino, cuja média de idade entre homens e mulheres correspondeu a 48,6 anos e de tempo de moradia equivaleu a 34,6 anos. Predominantemente, esses moradores, 27 (81,9%), são oriundos da própria comunidade; 4 (12,1%) são naturais de povoados adjacentes e congêneres, como: Remanso, Pedral, Fazendinha e Maranhãozinho e apenas 2 (6,0%) moradores procedem da sede administrativa do município. Grande parte dos informantes, 21 (63,6%), mantém seus vínculos de união instáveis e 7 (21,2%) estáveis; 3 (9,1%) são solteiros e 2 (6,1%) são viúvos. Tratando-se da composição familiar, a média de pessoas é de 3,6 pessoas por família.
   Considerando o contingente populacional das 33 famílias estudadas (n = 120), a maioria dos indivíduos, 88 (73,3%), não concluiu o ensino fundamental (Tabela 5) e apenas 7 (5,8%) completaram o ensino básico. Ressalta-se que dessa amostra, 40 (33,3%) estão cursando o ensino fundamental ou médio e 7 (5,8%) são crianças que não atingiram a idade exigida para iniciar a trajetória escolar, incluídas na categoria analfabetismo.
   Neste contexto, a principal dificuldade que impediu o ingresso e a permanência em instituições formais de ensino da maioria dos entrevistados, 19 (57,5%), foi a ausência de transporte escolar, em tempos pretéritos, para deslocar a demanda estudantil às escolas de comunidades adjacentes, tendo como alternativa o deslocamento a pé; 6 (18,1%) mencionaram o trabalho infantil para ajudar os pais nas atividades agrícolas; 2 (6,1%), a insuficiência financeira dos pais para manter os filhos na escola e 2 (6,1%) foram desistentes porque constituíram família. Em contrapartida, 4 (12,2%) não mencionaram problemas nessa situação.
            Predominantemente, as unidades familiares estudadas, 21 (63,6%) delas, têm a agricultura tradicional como principal fonte de geração de renda; seguida da aposentadoria para 11 (33,3%) e para 1 (3,1%), o funcionalismo público por meio da atuação como docente na escola local. Dessas famílias, 30 apresentam fontes secundárias de renda, principalmente por meio do Programa Bolsa Família, conforme 12 (40,0%) entrevistados (Tabela 6); outros, 9 (29,9%), além desse auxílio financeiro, executam paralelamente outras atividades econômicas, como: trabalhos provisórios, agricultura e comércio de pescado por intermediação.
            A agricultura é a principal atividade desenvolvida na comunidade estudada, sendo a fonte primária ou secundária de renda para 30 (90,9%) unidades familiares, com predomínio do cultivo da mandioca e comercialização de produtos agrícolas; as demais, 3 (9,1%), são inativos, pois se aposentaram e atualmente não dispõem de força física para continuar o trabalho nos roçados. Dos agricultores atuantes o envolvimento familiar ocorre desde o preparo do solo à produção de subprodutos agrícolas (n = 26) ou esses profissionais trabalham isoladamente ou mediante contrato de mão de obra externa ao grupo familiar por meio de pagamento de diária ou como troca mútua de favores (n = 4).
            Quanto à atuação do poder público na comunidade, esta ocorre de forma esporádica e pontual, conforme 23 (69,7%) entrevistados, sendo a manutenção de ruas não pavimentadas e de iluminação pública, patrocínio à festa cultural Carimolhado e a construção de um espaço educativo de ensino fundamental, enquanto que para 10 (30,3%) informaram que a ação do poder público não ocorre na referida comunidade. Em termos de organização social, somente 7 (21,2%) participam ativamente da Associação Comunitária dos Agricultores de Cipoteua – 22 de julho e os demais, 26 (78,8%), não participam, geralmente em razão da inadimplência do órgão na Receita Federal.
            Em relação ao apoio financeiro do Governo por programas e/ou direitos constitucionais, que podem ocorrer paralelamente, 21 (63,6%) famílias participam do Programa Bolsa Família, 11 (33,3%) têm a aposentadoria e 1 (3,1%) recebe benefício social por apresentar necessidades especiais. O rendimento mensal dessas famílias corresponde ao inferior a 1 salário mínimo para 16 (48,5%) deles; 14 (42,4%) têm a aquisição de 1 a 2 salários e para 3 (9,1%), de 3 a 4 salários, correspondendo aos aposentados que trabalham com a agricultura e comércio local e o funcionário público que também é agricultor. 
   Sobre as principais dificuldades que afligem os agricultores atuantes (n = 30), verificou-se que a falta de equipamentos que caracterizam a agricultura moderna (n = 18) (Figura 4), a venda pouco lucrativa da produção de farinha (n = 18) diante do trabalho árduo de produção e beneficiamento da mandioca e a falta de apoio do governo como subsídio financeiro ao pequeno produtor e aprimoramento da atividade agrícola na comunidade (n = 11) constituem os problemas com maior grau de importância. As demais dificuldades propostas pela pesquisa foram avaliados como sem importância, pois esses agricultores vendem diretamente a produção ao comerciante local – intermediário, os solos cultivados são relativamente férteis e produzem de acordo com a capacidade de trabalho desses agricultores e as unidades de produção, em geral, são formadas por familiares e pessoas externas (ajudantes).

  1. Discussão

   O perfil educacional de moradores rurais na Amazônia permite inferir que são mínimas as condições de educação formal em comunidades, caracterizando-se predominantemente por indivíduos que possuem o ensino fundamental incompleto, corroborando os resultados obtidos nas três comunidades estudadas no município de Marapanim. Geralmente, o baixo nível de instrução pode estar relacionado a várias dificuldades enfrentadas pelos estudantes que residem na zona rural do Estado do Pará (RAIOL & ROSA, 2013).
   Nas comunidades em estudo, tais problemas podem ser: a utilização de mão de obra infantil para a execução de atividades agroextrativistas (VIEIRA et al., 2007) ou a opção pelo trabalho, pois particularmente muitos indivíduos constituem família prematuramente, desestimulando a vontade pelo estudo (PEDROSA et al., 2013). Entretanto, pode-se considerar outros motivos, como: a procedência de muitos indivíduos de tempos em que o acesso à escola formal era mais difícil ou então a incompatibilidade de horário entre o trabalho e o estudo, bem como o cansaço decorrente da atividade são fatores condicionantes de altos índices de evasão escolar (SANTOS, 2005; BORCEM et al., 2011).
   Neste contexto, outro problema a ser considerado é a ausência de instituições de ensino nas comunidades e de transporte (VIEIRA et al., 2007). Contudo, as comunidades em estudo atualmente possuem escolas do ciclo primário do fundamental, mas, no passado, um grande entrave era o deslocamento a pé dos estudantes para a sede do município ou comunidades adjacentes, onde estavam situadas as escolas de ensino básico. Melhorias como a inserção de transporte público escolar nas comunidades foram de grande valia para o processo educacional desses moradores, pois, “(...) hoje em dia só não estuda quem não quer, o ônibus passa aqui na frente de casa”, declarou um entrevistado. Inclusive, a proporção de estudantes cursando o ensino básico em escolas regulares é bastante expressiva nas referidas povoações.
   Em relação aos meios de aquisição de renda das famílias estudadas, percebeu-se a heterogênea tipologia profissional – incorporando trabalhos agroextrativistas e/ou serviços públicos ou privados – mais evidentes nas comunidades de Guarajubal e de Porto Alegre, o que pode ser decorrente da proximidade desses povoados com os centros urbanos e consequentemente com outras oportunidades de emprego. Em geral, o rendimento adquirido pela aposentadoria contribui significativamente para o orçamento de muitas famílias e para alguns moradores corresponde ao devido interrompimento de atividades, garantindo relativa estabilidade financeira. Por sua vez, a transferência de recursos financeiros pelo Programa Bolsa Família às unidades familiares de baixa renda contribui para o suprimento de algumas necessidades básicas e a manutenção dos filhos em escolares públicas regulares.
   Neste sentido, a pluriatividade é representada pela diversificação das atividades rentáveis pelos trabalhadores rurais, além daquelas que são características de seu modo de vida (BRANDÃO & PIMENTA, 2013). No cenário brasileiro, a pluriatividade (inserções no mercado de trabalho agrário e não agrário, combinando diversas atividades e ocupações) e as rendas não agrícolas são responsáveis pela sustentação material das famílias rurais (ANJOS et al., 2004).
              Na região amazônica a pesca se destaca principalmente pela biodiversidade de espécies existentes e exploradas, pelas multitécnicas pesqueiras e pela dependência da população a essa atividade tradicional, principalmente dos povos ribeirinhos e costeiros (SOUZA, 2010; BORCEM et al., 2011; SILVA et al., 2012). Neste viés, verificou-se que a pesca nas comunidades em estudo – inseridas em ecossistemas propícios para a prática – tem ocorrência reduzida, particularmente ao se tratar da comunidade de Porto Alegre, que historicamente teve a pesca artesanal como uma de suas bases produtivas. De fato, a atividade pesqueira ocorre, entre a minoria da população, como principal fonte de rendimento ou para complementar a renda familiar, ou então somente para a aquisição de pescado para o autoconsumo – isto de forma esporádica. Em tempos pretéritos, a pesca artesanal em pequenas comunidades cumpria a função de subsistência para o pescador, hoje esta pode ser mais uma das atividades econômicas desenvolvidas para geração de renda (RAMIRES et al., 2012; EVANGELISTA-BARRETO et al., 2014).
  Ao reduzido número de pescadores do povoado de Porto Alegre, consequentemente descaracterizando a comunidade pesqueira, um dos entrevistados relatou: “(...) os pescadores antigos já morreram, os jovens não querem mais pescar”. Este fato pode estar relacionado à modernização dos espaços ditada pelos avanços da economia urbano/industrial e globalização cultural que afeta diretamente a geração mais nova em detrimento ao etnoconhecimento pesqueiro transmitido pelos ancestrais, além da desvalorização das atividades e identidades tradicionais locais (SOUZA, 2010). Assim, induz a suposição de que a proximidade e o contato com o centro urbano tende a extinguir saberes culturais da comunidade, visto que a disponibilidade de produtos industrializados e a oferta de trabalho urbano podem afastar as pessoas do ambiente natural (SANTOS et al., 2014).
              Considera-se também a ausência de incentivos do setor público (EVANGELISTA-BARRETO et al., 2014), uma vez que ações educativas poderiam ser implementadas com o intuito de incentivar os jovens e interessados à pesca sustentável, como forma de angariar recursos financeiros e manter a tradição local, bem como medidas políticas destinadas aos pescadores ativos para melhores condições de vida e de trabalho por meio do acesso facilitado aos direitos trabalhistas da classe. Além de que a carência de linhas de crédito e financiamentos acessíveis e a inexistência do Seguro Defeso em Marapanim são características que remetem a ausência do poder público nas comunidades, correspondendo à dificuldade de maior relevância entre os pescadores ativos de Porto Alegre, segundo esse estudo.
              Os resultados evidenciaram que a agricultura familiar é a atividade mais difundida entre os moradores das comunidades, propiciando a geração de emprego e renda e representando um fator importante para o desenvolvimento municipal como um todo (NABOZNY & RODRIGUES, 2011). A produção agrícola proveniente do trabalho familiar destina-se ao autoconsumo e à comercialização em forma de mercadoria (CONCEIÇÃO et al., 2009), sendo que o principal produto cultivado nas roças locais é a mandioca, visto que dela se extrai a farinha (produto de fácil escoamento e relativamente mais rentável), tucupi, goma e o carimã, além de outros produtos beneficiados como farinha de tapioca e beijus, que são consumidos pelos conterrâneos. Ressalta-se que no Estado do Pará a mandioca tem destaque para a alimentação regional e também à nutrição de animais seja na forma “in natura” ou manufaturada sob forma de ração (SILVA et al., 2014).
   Em particular, os agricultores atuantes na comunidade de Cipoteua consideraram como principal dificuldade a venda pouco lucrativa da farinha de mandioca, pois o esforço de cultivo e a produção do produto não correspondem ao preço vigente de comercialização. No período da pesquisa, a saca da farinha (60 kg) correspondia a R$ 80,00, vendida geralmente aos dois comerciantes locais (intermediários) para ser escoada às cidades de Marapanim e Curuçá, por exemplo. Outro problema citado pelos entrevistados foi a falta de equipamentos modernos, porém, o motor para cevar a mandioca e a prensa são instrumentos que já estão incorporados na comunidade como forma de facilitar o trabalho.
   As atividades agroextrativistas econômicas ainda vêm mantendo o modelo de emprego da mão de obra familiar e/ou de parentes, amigos, vizinhos e compadres, no sentido de atender as suas demandas, além de contribuir, no decorrer dos anos, para o sistema econômico dos povos tradicionais e a reprodução dos ambientes manejados (FURTADO et al., 2006). Essa organização de trabalho de base familiar segue padrão semelhante em muitas comunidades rurais brasileiras, principalmente entre os agricultores (OLIVEIRA, 2012). Apesar disso, nas comunidades estudadas os chefes de família são os principais responsáveis pela prática da agricultura, mas geralmente a prole tem relativa contribuição desde a implantação braçal da roça à produção de alimentos agrícolas ou somente em tarefas específicas.
              Neste aspecto, nos sistemas de produção familiar ocorre a divisão técnica do trabalho agrícola, mas que eventualmente a atividade pode ser complementada pela ajuda mútua de conterrâneos, como o mutirão e a parceria (CONCEIÇÃO et al., 2009), sendo, em alguns casos, uma parte da produção é repassada como forma de pagamento. Também, o trabalho de mão de obra externa ao grupo familiar nas roças foi observado nas comunidades estudadas, embora tenha pouca ocorrência e, em alguns casos, com pagamentos em forma de diária. Vale ressaltar que, nesses sistemas, ocorre a reprodução de conhecimentos técnicos para o manejo agrícola, transmitidos de pais para filhos (OLIVEIRA, 2012). Este fato pode ser corroborado pela fala de um entrevistado: “(...) para o ano os meus filhos vão fazer a tarefa deles”. Da mesma forma, isto é válido para as famílias pesqueiras, cujos ensinamentos são aprendidos no seio familiar.
   Tratando-se do extrativismo de caranguejo, a dicotomia na atividade ocorre na comunidade de Guarajubal, assim como em outros grupamentos sociais do Estado do Pará já estudados, como na Vila de Caratateua (MAGALHÃES et al., 2006) e de outras da Reserva Extrativista Marinha de Caeté-Taperaçu (VIEIRA et al., 2013), ambos no município de Bragança, e no município de Maracanã (FIGUEIREDO et al., 2014). Dessa maneira, o homem captura os caranguejos nas tocas, no manguezal, e realiza a limpeza, esquartejamento e cozimento dos animais, enquanto que as mulheres são encarregadas do beneficiamento do produto – catação manual da massa do animal (CARDOSO, 2000).
   A dificuldade de maior importância entre as trabalhadoras da referida comunidade foi a falta de apoio do poder público, principalmente em relação ao pagamento do Seguro Defeso que não ocorre no local. Este problema está mais relacionado às famílias que têm no extrativismo do caranguejo o meio principal de prover o sustento familiar, sendo que essa atividade pode continuar durante o período de defeso do caranguejo, sob o risco de apreensão do produto durante a fiscalização do IBAMA, assim como já ocorreu na dita comunidade. Outro problema em destaque é o repasse a preço irrisório da mercadoria ao intermediário diante do trabalho árduo das profissionais contratadas para o trabalho de beneficiamento do produto.
   Em todas as famílias agroextrativistas estudadas, verificou-se que o principal incentivo dado pelos pais aos filhos são os estudos para que esses possam ter acesso a uma profissão melhor remunerada e em melhores condições de trabalho. Isto pôde ser observado principalmente na comunidade de Cipoteua, visto que nela a atividade agrícola consiste numa tarefa árdua. Concomitantemente, o etnoconhecimento agrícola assimilado corresponde a uma alternativa para os conterrâneos migrantes que retornam à comunidade e precisam munir o autossustento. Desse modo, o baixo grau de instrução é o fator limitante para a aquisição de atividades com maior nível de remuneração, consideradas entre esses atores sociais como meio de sobrevivência (ALVES & NISHIDA, 2003; VIEIRA & ARAÚJO NETO, 2006). O mesmo ocorre entre as catadoras de caranguejo que não vislumbram outras oportunidades de emprego na comunidade de Guarajubal.
              O estudo evidenciou o papel importante das mulheres, as quais, geralmente, assumem a função de provedoras do sustento da família (PERUCCHI & BEIRÃO, 2007), ou então são contribuintes para a realização das atividades de subsistência, pois é comum a presença de mulheres desenvolvendo atividades ligadas à roça e ao extrativismo (OLIVEIRA, 2012). De modo particular, as mulheres têm função essencial na mariscagem, como ocorre em Guarajubal, onde essas desenvolvem o beneficiamento artesanal da massa do caranguejo para a comercialização. Nesse povoado, é comum a predominância de mulheres adultas, casadas e com filhos no beneficiamento do crustáceo, desenvolvendo paralelamente as atividades do lar, uma vez que o processo ocorre em suas próprias residências e permite a realização simultânea de serviços domésticos (CARDOSO, 2000; DIAS et al., 2007). Entretanto, na pesca, não foi verificada a participação feminina, em especial na comunidade de Porto Alegre, caracterizada pela pesca artesanal, pois nos povoados rurais amazônicos as mulheres estão muito envolvidas à pesca, embora essa atividade seja tradicional e predominantemente masculina (DI CIOMMO, 2007).
   Nos dias atuais ainda é comum verificar que a pobreza, a privação de renda e a vulnerabilidade social afetam muitos produtores rurais e suas famílias (SCHNEIDER & CASSOL, 2014). Essa situação se molda a partir da ausência de políticas públicas e serviços básicos (ROMERO, 2014). Neste contexto, as comunidades desse estudo são alvos apenas do assistencialismo social ou de falácias em detrimento às políticas públicas. Quesitos como pavimentação asfáltica, iluminação pública de qualidade, investimentos em escolas já existentes, geração de emprego e renda, atendimento satisfatório de saúde consistem em aspirações dos moradores locais.
              Ressalta-se a deficiência na organização social dessas comunidades, uma vez que há pouca participação e articulação entre os membros comunitários nas Associações vigentes nas comunidades, contrapondo-se à ideia do associativismo que está fundamentado em interesses comuns e na união dos associados em um ou mais objetivos e encontrar soluções para problemas eminentes em grupos de pessoas com baixo poder político e aquisitivo (NABOZNY & RODRIGUES, 2011; BORIN & LIMA, 2013). A dificuldade em manter relações interpessoais, as desconfianças e a falta de comprometimento com o bem comum podem ser os fatores que descaracterizam a funcionalidade dessas associações comunitárias. Afinal, toda organização requer a formação de caráter solidário entre seus membros, visando o autorreconhecimento destes como parte do mesmo grupo organizacional, tendo direitos, deveres e responsabilidades que devem ser seguidos para o bom êxito da entidade (ROMARCO et al., 2011).

  1. Conclusão

        As comunidades de Guarajubal, Porto Alegre e Cipoteua são formadas predominantemente por nativos que constituíram suas famílias a partir de uniões instáveis. Em geral, o baixo poder aquisitivo dos moradores entrevistados é decorrente de atividades agroextrativistas de base tradicional e/ou pelo baixo grau de instrução que limita as opções de trabalho de melhor remuneração. Nestes locais, as atividades agroextrativistas são de suma importância para a economia e sustento da unidade familiar, sendo a agricultura a mais difundida entre as comunidades. Além disso, ficou evidente a aquisição de renda por meio de inúmeras fontes, sendo a principal delas a do Programa Bolsa Família, geralmente como forma de complementação financeira.
        As comunidades estudadas apresentam insuficiência política em relação à satisfação de serviços básicos (água encanada, energia elétrica, asfalto, educação) e para o desenvolvimento de atividades agrícolas e extrativistas. É notável a tênue organização social para reivindicar direitos, benefícios próprios e valorização a cultura local, visto que atualmente o conhecimento e as práticas tradicionais não têm continuidade pela geração mais nova, como está aparentemente ocorrendo com a pesca artesanal na comunidade de Porto Alegre. Sendo assim, ficou evidente a necessidade de atuação dos atores governamentais em forma de políticas públicas que visem à melhoria da qualidade de vida por meio de aprimoramento de infraestrutura local, geração de emprego e renda e manutenção de trabalhadores agroextrativistas nas atividades nestas comunidades. 
Agradecimentos

  À Capes pela concessão da Bolsa de Demanda Social para o primeiro autor. Aos líderes comunitários e moradores das comunidades estudadas pela atenção e colaboração durante a realização deste estudo.

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Recibido: 19/06/2015 Aceptado: 30/07/2015 Publicado: Julio de 2015

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