Observatorio Economía Latinoamericana. ISSN: 1696-8352
Brasil


A “DOENÇA HOLANDESA” E O PRÉ-SAL BRASILEIRO

Autores e infomación del artículo

Lucélia Ivonete Juliani (CV)

Sinclair Mallet Guy Guerra (CV)

Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões

lucelia.juliani@gmail.com

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Resumo
A energia é a base da sociedade industrializada e o petróleo, dentre todas as fontes, vem se mostrando ao longo do tempo, a maior e mais problemática devido ao seu papel central, ao seu caráter estratégico, a sua distribuição geográfica, ao padrão recorrente de crises em seu fornecimento e finalmente a irresistível cobiça de tomar posse de suas recompensas. Assim, é natural concluir que países com grandes reservas petrolíferas devam tender a níveis de crescimento e desenvolvimento mais elevados do que outros que não o possuem. No entanto, experiências mundiais, tem demonstrado exatamente o inverso, ou seja, o excesso de petróleo associado com altos níveis de empobrecimento e subdesenvolvimento. Esse fenômeno é chamado de “doença holandesa” refere-se ao influxo de capital leva a uma valorização da moeda, barateando as importações e encarecendo as exportações, isso pode em alguns casos impedir o desenvolvimento. Essa temática é de extrema relevância para economia brasileira depois de descobertas as imensas jazidas do Pré-Sal. Por conseguinte, este artigo tem por objetivo estudar o conceito da “doença holandesa” e com isso, traçar alguns caminhos que o Brasil pode tomar a partir do momento que se decidiu explorar e produzir o Pré-Sal. Os procedimentos metodológicos compõem-se de analise qualitativa das teorias, obtida da revisão de bibliografia, além do uso do ferramental econométrico, o modelo de regressão linear múltipla é avaliado quantitativamente as possibilidades de ocorrer do fenômeno. Os resultados obtidos no modelo quantitativo indicam que as variáveis crescimento econômico, poupança, investimento, exportações e importações e a variável Dummy, no momento, demonstram que o Brasil não sofre de “doença holandesa”, o que não significa que não virá a contrair, pois há fortes indícios implícitos na análise que apontam para esse caminho, especialmente quando analisado a diferença entre poupança e investimentos.
Palavras-Chave: doença-holandesa, petróleo, pré-sal brasileiro.

Abstract
Energy is the base of industrial society and oil, out of all sources, has become throughout time, the greatest and most problematic one due to its central role, strategic nature, geographical distribution, the recurring pattern of crisis in its supply, and finally the irresistible greed of taking possession of its rewards. Thus, it's natural to conclude that countries with great oil reserves tend to have higher growing and development levels than those that don't. However, world experiences have shown exactly the opposite, i.e., excess of oil associated with high levels of impoverishment and underdevelopment. This phenomenon, called "Dutch disease", refers to the capital inflow that leads to a currency appreciation, cheapening the imports and increasing exports' prices, this could in some cases hinder the development. This theme is of extreme relevance to Brazilian's economy after the discovery of huge Pre-Salt fields. Consequently, this article aims to study the "Dutch disease" concept and with that, trace some paths Brazil can take from the moment it was decided to explore and produce the Pre-Salt. The methodological procedures are composed by qualitative analysis of theories, obtained from bibliographic revision, beside the use of econometric tool, the multiple linear regression model assesses quantitatively the possibilities of the phenomenon to occur. The results obtained in the quantitative mode indicate that the economic growth variables, savings account, investment, exports and imports and the Dummy variable, at the moment, show that Brazil doesn't suffer from the "Dutch disease", which doesn't mean that the country won't contract it in the future, since there are strong implicit indication in the analysis that points this way, especially when analyzing the difference between savings accounts and investments.
Keywords: disease-Dutch, oil, Brazilian pre-salt.



Para citar este artículo puede uitlizar el siguiente formato:

Lucélia Ivonete Juliani y Sinclair Mallet Guy Guerra (2015): “A “doença holandesa” e o pré-sal brasileiro”, Revista Observatorio de la Economía Latinoamericana, Ecuador, (febrero 2015). En línea: http://www.eumed.net/cursecon/ecolat/br/15/doenza-holandesa.html


INTRODUÇAO

A energia é a base da sociedade industrializada e o petróleo, dentre todas as fontes, vem se mostrando ao longo do tempo, a maior e mais problemática devido ao seu papel central, ao seu caráter estratégico, a sua distribuição geográfica, ao padrão recorrente de crises em seu fornecimento e finalmente a irresistível cobiça de tomar posse de suas recompensas (YERGIN, 2010, p.886).
Assim, é natural concluir que países com grandes reservas petrolíferas devam tender a níveis de crescimento e desenvolvimento mais elevados do que outros que não o possuem. No entanto, experiências mundiais, tem demonstrado exatamente o inverso, ou seja, o excesso de petróleo associado com altos níveis de empobrecimento e subdesenvolvimento.
A atividade petrolífera em países tão diversos como, por exemplo, Angola, Arábia Saudita, Argélia, Congo Equador, Irã, Iraque, Kuwait, Líbia Peru, Qatar e Trinidad e Tobago, fez com que o padrão de vida de suas populações, que já era precário, ficasse ainda pior. A Venezuela tinha a maior renda per capita da América do Sul antes de um enorme impulso do petróleo ocorrido a partir de 1970, e no início da década de 2000, sofria de violência crônica e tinha uma renda per capita menor do que nos anos de 1960 (SHAH, 2007)
A Arábia Saudita é um dos maiores produtores de petróleo do mundo, com relação à expectativa de vida, educação e renda, fica atrás da Romênia e da Tailândia. A Nigéria, apesar dos bilhões de dólares em óleo que corre sob seu território, tem seu Índice de Desenvolvimento Humano entre os dez piores do mundo (SHAH, 2007, p.109).
As organizações de ajuda, os ativistas e até mesmo o Banco Mundial já detectaram a seguinte tendência: o petróleo é descoberto em algum país remoto ou subdesenvolvido. Nesse momento, as empresas surgem e normalmente arranjam barganhas injustas com burocratas esperançosos e inexperientes em negociar com multinacionais. Ao se iniciar o custoso processo de criar infraestrutura para extração, todos são excluídos do jogo, com exceção das elites sociais 1.
Quando o petróleo começa a ser bombeado, essas elites adquirem enormes riquezas e consequentemente mais poder. Os governos aumentam os gastos públicos em projetos ambiciosos para posteriormente descobrir que os preços voláteis do petróleo inviabilizaram seus planos. Para remediar a falta de verbas, muitos fazem enormes empréstimos com o óleo cru, como fiador, e assim os países ficam sufocados em dívidas. Por outro lado, atividades mais sustentáveis como a pesca e o cultivo de grãos, entre outras, perdem atratividade, pois torna-se mais fácil importar do que produzir.
Segundo STIGLITZ (2003, p. 106) o influxo de capital leva a uma valorização da moeda, barateando as importações e encarecendo as exportações, isso pode em alguns casos impedir o desenvolvimento, por meio de um mecanismo denominado “doença holandesa” (Dutch Disease). O nome deriva da experiência da Holanda após a descoberta de gás no norte. As vendas de gás natural fizeram com que a moeda holandesa, subisse, prejudicando seriamente os outros setores de exportação do país.
Essa temática é de extrema relevância para economia brasileira depois de descobertas as jazidas do Pré-Sal, essas com previsão de “pelo menos 104 bilhões de barris em reservas”2 , isso já coloca o Brasil dentre os países detentores de uma das maiores reservas de petróleo do mundo.
A grandeza dessa descoberta pode colocar o Brasil no cenário nacional e internacional como grande produtor e, possível, exportador do óleo. Além disso, permitirá usá-lo como matéria-prima de seus inúmeros derivados e subprodutos. No tocante à renda que será gerada com sua exploração as expectativas são imensas, mesmo com as constantes variações do preço internacional do petróleo.
Dessa forma, abre-se o debate acerca do quanto será possível gerar de crescimento e desenvolvimento com os recursos advindos da produção e comercialização do Pré-Sal. De outro modo quais são as possibilidades do Brasil contrair a “doença holandesa” ?
Este artigo tem por objetivo estudar o conceito da “doença holandesa” e com isso, traçar alguns caminhos que o Brasil pode tomar a partir do momento que se decidiu explorar e produzir o Pré-Sal.
Para alcançar o objetivo desse trabalho é necessário fazer um apanhado bibliográfico de alguns autores que definiram as hipóteses e conceitos do fenômeno da “doença holandesa”, porém, todas as referências bibliográficas foram escritas baseadas em casos empíricos de varias nações com características particulares, aqui são consideradas teorias que foram construídas a partir da realidade da América Latina.
Com isso, a partir da analise qualitativa das teorias, obtida da revisão de bibliografia, é possível fazer um estudo para o caso do Pré-Sal e verificar os possíveis cenários para o Brasil. E com o uso do ferramental econométrico, o modelo de regressão linear múltipla será avaliado quantitativamente as possibilidades de ocorrer o fenômeno da “doença holandesa”.
Assim, este artigo é composto por introdução e da conclusão além de outras quatro partes do seu desenvolvimento. Primeiramente são discutidas as primeiras teorias e hipóteses acerca da “doença holandesa”, com o aprofundamento desses conceitos com as analises de Furtado (2008) e Bresser-Pereira (2009). Por conseguinte, será aplicado, ao caso do Pré-Sal, as deduções teóricas assim como o modelo econométrico para delinear possíveis caminhos para o Brasil.

1.TEORIAS ACERCA DA “DOENÇA HOLANDESA”

O termo “Dutch disease” não advém do meio acadêmico, mas foi citada pelo semanário inglês “The Economist”, para descrever um fenômeno que ocorria na Holanda nas décadas de 1960 e 1970. A tradução literal de “doença holandesa” remete a decadência da indústria holandesa após a descoberta de grandes reservas de gás natural no Mar do Norte (STRAK & AZEVEDO, 2012, p. 68).
O breve artigo publicado no “The Economist” em 1977 descrevia os efeitos do fenômeno tais como: estagnação na produção industrial, diminuição dos investimentos privados, aumento do desemprego, queda nos lucros como proporção de renda nacional, apreciação da moeda e reversão do déficit médio em transações correntes (SOUZA, 2009, p.17).
Porém antes das décadas de 60 e 70, já havia sido detectado em outros países o mesmo fenômeno diagnosticado na Holanda, não com a denominação “doença holandesa”, mas visto como a maldição dos recursos naturais. Dentre os vários estudos, é importante destacar o diagnóstico feito por Celso Furtado sobre a Venezuela quando convidado pelo governo a fazer um estudo sobre a economia venezuelana para a Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) com o objetivo de visualização de uma analise sobre o desenvolvimento do país no decênio anterior (1946-1956).
Os questionamentos da Cepal se davam em razão da Venezuela ser um país com enormes jazidas petrolíferas, o que o levou a ser um exportador de óleo para o resto do mundo e membro fundador da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), porém não conseguia alcançar o status de país desenvolvido. Pelo contrário, as desigualdades sociais geradas pela indústria do petróleo são visíveis, e a democracia não se consolidou ao longo da história.
A Venezuela é a economia subdesenvolvida de mais alto nível de produto per capita que existe atualmente no mundo. Seu produto bruto territorial por habitante se aproximou, em 1956, de 8003 dólares, isto é um nível similar à média dos países industrializados da Europa Ocidental. Mesmo medindo o produto pelo gasto realizado no território nacional – o que implica excluir o saldo positivo do valor das exportações sobre o das importações – chega-se a um montante em torno de 650 dólares, o que é comparável coma renda de países altamente desenvolvidos como Alemanha Ocidental. E superior em mais do dobro à média da América Latina (FURTADO, 2008, 35-36).
Contudo, a Venezuela ainda apresenta características de uma economia subdesenvolvida. Tais características dizem respeito à estrutura de produção e ocupacional da força de trabalho, às grandes disparidades de produtividade entre diferentes atividades produtivas, à distribuição desigual de renda entre as zonas urbanas e rurais e entre grupos sociais em uma mesma zona. As grandes massas de população têm padrões de consumo muito baixo, assim como altos níveis de analfabetismo e cultura em geral. A partir desse cenário Furtado fez um estudo sobre as causas do baixo crescimento econômico com abundancia de recursos naturais (FURTADO, 2008) 4.

1.1 O diagnóstico de Celso Furtado como base para análise da “doença holandesa”

As etapas do rápido crescimento com base em estímulos externos, quando não produzem mudanças estruturais do sistema econômico, tendem necessariamente a um ponto de estagnação. Algumas economias com o impulso em suas exportações crescem muito durante uma ou duas décadas e depois caem numa permanente estagnação. Nesse contexto, há uma oferta de bens importados para substituir a produção interna. Isso se justifica em razão do câmbio interno estar sobrevalorizado e inviabilizar a indústria local.
Para se observar o desenvolvimento venezuelano de forma integrada é preciso identificar como se relacionam e se articulam os principais componentes da demanda global: as exportações, o setor público, os investimentos privados e os gastos dos consumidores. O principal fator dinâmico é constituído pela massa de receitas geradas pelo setor petroleiro (exportações) e transferida ao governo (setor fiscal). Essa massa de receitas apresenta duas características: a primeira é que o governo pode deixar de utilizar seu incremento sem com isso provocar desocupação dos fatores; a segunda reside na sua total cobertura de divisas. O incremento das receitas fiscais derivadas de impostos correntes acarreta redução de demanda no setor privado, provocada pela elevação dos preços (impostos indiretos), ou idêntica redução causada por contração da renda disponível (impostos diretos). Nos dois casos, a contração dos gastos reais do setor privado terá como contrapartida um excedente de oferta, que não é absorvido pelo setor público, e provocará contração cumulativa no nível da atividade.
A situação é diferente quando se trata do incremento de rendimentos fiscais, gerados no setor petroleiro, que têm as características de uma renda gerada fora do país. Na prática, isso significa que se o governo aumenta os impostos correntes para expandir seus gastos, muito provavelmente criará uma pressão inflacionária, dada a relativa imobilidade em curto prazo dos fatores. Os bens adquiridos não poderão ser de oferta inelástica, o que provocará um desequilíbrio com aumento de importações e contração localizada da demanda de bens de produção interna. Mas se a expansão do gasto público é baseada em rendas geradas pelo setor petroleiro, como a oferta interna de determinado produto inelástico, haverá aumento das importações, adaptando-se a estrutura de oferta global à nova composição da demanda.
Suponha as seguintes hipóteses:

  1. O aumento do gasto público seja financiado com recursos originados no setor petroleiro, e admitindo que em caso extremo o governo se limita a aumentar sua demanda de produtos finais de consumo, e que a oferta interna desses é inelástica. Haveria, nesse caso, um aumento de importações na mesma magnitude que o incremento do gasto público, sem mudança na capacidade produtiva da economia. Contrariamente ao que ocorreria caso o governo financiasse o incremento de seus gastos com impostos correntes, aumentaria a oferta de bens e serviços, pois não haveria redução da renda real gerada no setor privado.
  2. O aumento do gasto público ocorra através de uma expansão dos investimentos, e que a oferta interna de bens de investimento seja inelástica. As importações teriam que crescer num montante igual à parte do incremento dos investimentos públicos, que corresponde a materiais de construção e equipamentos. A outra parte correspondente a mão de obra cairia no mercado interno de fatores. Se a oferta de mão de obra for elástica a expansão poderá se realizar sem criar pressão inflacionária.
  3. A expansão do investimento público financiadas com recursos derivados do setor petroleiro atuaria de maneira mais ampla sobre o mercado interno, através da absorção da mão de obra e da compra de materiais de construção de produção interna. Nesse caso, o aumento da renda seria maior, pois incluiria o pagamento aos fatores absorvidos pelas indústrias de materiais de construção. Igualmente maior seria a expansão da capacidade produtiva da economia em seu conjunto, pois as indústrias de materiais de construção teriam a preocupação de se preparar para um novo ciclo de expansão dos investimentos públicos.

Na primeira hipótese, o aumento da disponibilidade de bens e serviços afetaria muito escassamente o nível de renda monetária, mas, na segunda, haveria um incremento de renda correspondente ao montante dos pagamentos a fatores, isto é, mão de obra utilizada nas novas obras públicas. A segunda hipótese, sugere que ao concluir-se o ciclo de expansão dos gastos públicos e a capacidade produtiva do sistema, ou pelo menos do seu capital reproduzível, seria ampliado. O aumento de renda se escoaria parcialmente em maiores importações, mas, parte substancial deste aumento criaria novas oportunidades de emprego para a mão de obra disponível. Já a terceira hipótese, mais próxima da realidade venezuelana, é a expansão do investimento público, financiado com os recursos do petróleo que atua no mercado interno, através da absorção da mão de obra no setor de construção, que também é beneficiário das rendas do óleo.
Ao expandir-se o setor petroleiro gera dois impulsos, um direto e outro indireto. O primeiro corresponde ao montante de pagamentos a fatores que realiza no país, esse impulso é pequeno levando-se em conta a magnitude relativa do setor. O rápido avanço da técnica, ao permitir aumentar a produtividade de mão de obra nessa indústria, age no sentido de reduzir a amplitude do impulso direto, que tende a intensificar o impulso indireto pelo fato peculiar do estado venezuelano beneficiar-se de aumentos da produtividade do trabalho empregada na indústria, que, por fim, determina o aumento relativo na rentabilidade, bem como maiores pagamentos ao governo.
O impulso indireto do setor petroleiro consiste em aumentar a capacidade financeira do governo em expandir simultaneamente a capacidade de importar. A expansão desse setor foi condição necessária, mas não suficiente, para que se desenvolvessem os demais setores. Constituiu-se como o verdadeiro elemento dinâmico a renda transferida ao governo. Por outro lado, é a forma como se utiliza essa renda que determina a intensidade de absorção de mão de obra e recursos naturais disponíveis e de expansão da capacidade produtiva.
De outra parte, uma peculiaridade decorrente de investimentos financiados com recursos petroleiros se concentra em obras de infraestrutura, isto é, em atividades de alta capitalização que não criam fonte permanente de emprego para população. Com efeito, as obras públicas absorvem uma quantidade relativamente pequena de mão de obra por unidade de produto, em comparação à construção privada. Por outro lado, estas não criam um fluxo permanente de renda, pois essas economias tendem a minguar se a infraestrutura de obras públicas é muito superior as necessidades correntes do sistema de produção. Em conclusão disso, investimentos em obras públicas só criam novas fontes de empregos quando se expandem, e geram desemprego quando decresce seu nível, enquanto os investimentos líquidos diretamente reprodutivos criam fontes permanentes de empregos. Em outras palavras, para se manter essas obras é necessário mobilizar recursos gerados em outros setores da atividade econômica.
Quando se iniciou a etapa de grande expansão petrolífera na Venezuela o nível médio de produtividade da economia preexistente devia ser muito baixo. Grande parte da população do país vivia em nível de subsistência e trabalhava no campo com técnica rudimentar. Com a expansão petrolífera, aumentou o produto nacional e elevou-se o nível médio de produtividade no conjunto da economia. Porém, essa elevação de produtividade é simplesmente um dado estatístico sem relação com a produtividade física das demais atividades. O aumento da produtividade geral só se realiza a medida que os investimentos públicos determinem modificações na estrutura ocupacional e criam economias externas às demais atividades. Mas se o processo de aumento de produtividade física e de absorção do excedente de mão de obra foi lento, o impacto do desenvolvimento petroleiro na capacidade para importar é rápido e trará consigo profundas consequências.
Com a expansão dos gastos públicos para cobertura total de divisas e sendo baixo o multiplicador de emprego o desenvolvimento pode se fazer com o aumento do coeficiente das importações, sem criar pressão inflacionária. Nas fases de grande expansão a disponibilidade de divisas terá crescido mais que a demanda global, e para se conseguir que se utilizem as divisas disponíveis sobrevaloriza-se a moeda nacional. Essa sobrevalorização, funciona como um mecanismo de transferência para o conjunto da população de parte dos lucros proporcionados ao governo pelo setor petrolífero. Com isso, aumenta-se a renda real do conjunto da população e, por consequência, o coeficiente de importações.
A elevação do coeficiente das importações possibilitada pela sobrevalorização da moeda interna causa dificuldades para uma economia subdesenvolvida absorver capitais estrangeiros em grande escala, pois tropeça com o problema de indivisibilidade dos processos produtivos de magnitude de mercado e da ausência de economias externas. O que importa de todo esse processo é que a absorção da oferta crescente de divisas se faça com forte sobrevalorização da moeda nacional e que desta resultem salários monetários que passem a ser muito elevados na Venezuela. A consequência disso é que qualquer atividade econômica em que exista a possibilidade de concorrência de importações só pode subsistir mediante forte proteção.
Em síntese, para Furtado, a maldição da abundância dos recursos naturais decorre do fato da descoberta de uma fonte extraordinária de recurso natural que leva a um excedente em transações correntes e a uma taxa de câmbio real incompatível com a preservação da estrutura produtiva preexistente. O que distingue o trabalho de Furtado, é que ele, ao contrário das análises dominantes sobre o tema, não considera a existência do pleno emprego e preços flexíveis, consequentemente, não se limita as mudanças alocativas decorrentes da exportação de petróleo sobre o uso de fatores fixos. Se a população economicamente ativa pudesse ser totalmente empregada na produção de petróleo o problema do subdesenvolvimento estaria resolvido e a valorização dos termos de troca refletiria um aumento de produtividade de uma economia integrada. A questão fundamental é a baixa absorção da força de trabalho no setor petrolífero e o impacto negativo do câmbio valorizado sobre o emprego nos demais setores (MEDEIROS. 2008, p.138) 5.
A problemática discutida por Furtado não ganhou respaldo acadêmico no tocante a discussão da “doença holandesa”, e sim na questão do desenvolvimento econômico da Venezuela. O estudo nem mesmo foi adotado pelo governo para projetar novas diretrizes para o país, pelo contrário, a pesquisa foi descartada e arquivada. Somente a partir do ano 2000 que os antigos rascunhos foram revistos e então publicados.

2 ESTUDOS RECENTES SOBRE A “DOENÇA HOLANDESA”

Dentre os trabalhos que modelaram o fenômeno da “doença holandesa” consagraram-se Booming Sector and De-Industrialisation in a Small Open Economy” escrito por Corden e Neary (1982) e dois anos depois somente Corden publicou “Booming Sector and Dutch Disease Economics: Survey and Consolidation”. O primeiro artigo sintetiza o impacto de um boom de recursos sobre a pequena economia e aberta com três setores (dois de bens comercializáveis, chamados de “energia” e “manufatura” e um de bens não comercializáveis, denominados “serviços”) e dois fatores de produção (trabalho, móvel entre os três setores, e capital).
De acordo com os autores, o primeiro impacto é observado quando o boom de energia aumenta o produto marginal dos fatores móveis empregados nesse setor e retira recursos de outros setores, gerando vários ajustes no restante da economia. Um desses mecanismos é o ajuste na taxa real de câmbio (definida como a razão entre preços de bens não-comercializáveis e bens comercializáveis). Já o efeito gasto que a maior renda real resultante do boom leva a gastos extras com serviços, o que aumenta o preço dos mesmos, causando apreciação cambial e levando a novos ajustes (CORDEN e NEARY, 1982 apud SOUZA, 2009, p. 18).
A partir das teorias citadas e de acordo com o comportamento empírico, o autor brasileiro BRESSER – PEREIRA passou a estudar o fenômeno e coloca que a principal razão que determina que os países de renda média tendem a ter taxas de câmbio sobrevalorizadas é a “doença holandesa”; inicialmente alguns deles crescem rapidamente, enquanto outros ficam para trás. Os primeiros conseguem neutralizar essa falha ou síndrome de mercado resultante da existência de recursos naturais baratos e abundantes, usados para produzir commodities cujas exportações são compatíveis com a taxa de câmbio mais valorizada do que seria necessário para tornar competitivos os outros setores comercializáveis. (BRESSER - PEREIRA, 2009, p. 141).
Conceitualmente a doença holandesa ou maldição dos recursos naturais, é a crônica sobrevalorização da taxa de câmbio de um país causada pela exploração de recursos abundantes e baratos, cuja produção comercial é compatível com uma taxa de câmbio claramente mais apreciada que a taxa média de câmbio que torna economicamente viáveis os setores de bens comercializáveis que usam tecnologia de ponta. É um fenômeno estrutural que cria obstáculos à industrialização ou, se ela tiver sido neutralizada, mas depois deixar de sê-lo, provocando desindustrialização (BRESSER - PEREIRA, 2009, p. 142-143).
Esse fenômeno é compatível com o equilíbrio intertemporal das contas externas e pode, assim, produzir efeitos negativos indefinidamente. É uma falha de mercado, pois o setor que produz bens intensivos em recursos naturais gera uma externalidade negativa nos outros setores da economia impedindo-os de se desenvolverem, apesar de usarem tecnologia de ponta. Essa falha de mercado implica na existência da diferença entre a taxa de câmbio de equilíbrio (taxa de mercado) e a taxa de câmbio que permite a existência de setores econômicos eficientes e tecnologicamente sofisticados (é a taxa à qual a economia prevê que setores eficientes serão viáveis em mercados competitivos) (BRESSER - PEREIRA, 2009, p. 143).
Os países que sofrem da “doença holandesa” possuem duas taxas de câmbio de equilíbrio:

  1. A taxa de câmbio de equilíbrio “corrente” – aquela que equilibra intertemporalmente à conta corrente de um país e, portanto, é também a taxa de mercado para a qual este converge (BRESSER - PEREIRA, 2009, p. 146-147);
  2. A taxa de câmbio de equilíbrio “industrial” – aquela que viabiliza a produção de bens comercializáveis no país sem necessidade de impostos e subsídios. Em outras palavras, é a taxa de equilíbrio que, na média, permite as empresas, que usam tecnologias de ponta, serem lucrativas ou competitivas (BRESSER - PEREIRA, 2009, p. 146-147);

Em relação a estas taxas existe uma discussão entre os economistas ortodoxos e os keynesianos. Os primeiros entendem que a taxa de câmbio flutua docemente em torno desse equilíbrio, enquanto os segundos acham que a taxa de câmbio é volátil. No entanto, o que acontece se a taxa for deixada totalmente livre em países em desenvolvimento é que ela está sujeita a uma tendência cíclica à sobreapreciação, de forma que não é controlado pelo mercado, mas pela crise. Essa tendência aparece no gráfico da seguinte maneira: o processo começa por uma crise no balanço de pagamentos que resulta em violenta depreciação da moeda e esta sobe acima do equilíbrio industrial; em seguida a taxa de câmbio passa a se apreciar gradualmente, atravessa a linha do equilíbrio industrial e do equilíbrio corrente, entra em déficit em conta corrente, sua divida externa aumenta até o momento em que os credores perdem a confiança e surge uma nova crise, que novamente deprecia a moeda de forma abrupta e violenta ( http://www.bresserpereira.org.br/view.asp?cod=3867).
Isso acontece por dois motivos: primeiro, é a questão da “doença holandesa”, que puxa a taxa de câmbio de equilíbrio industrial para o equilíbrio corrente; e segundo, porque os países em desenvolvimento atraem capitais devido a taxas de lucro e juros elevadas. Outra explicação para os déficits em conta corrente e a decorrente apreciação cambial é a política de crescimento com poupança externa, que os economistas e os financistas dos países ricos recomendam, pois estão interessados em investir ou emprestar para os demais que acreditam ser necessária e complementar para a poupança interna (http://www.bresserpereira.org.br/view.asp?cod=3867).
Matematicamente considere ɛ2, a taxa de câmbio de equilíbrio corrente, e ɛ1, a taxa de câmbio de equilíbrio industrial, em um país sem a síndrome holandesa. Nesse caso, as duas taxas são idênticas:

Em um país com a síndrome a taxa de câmbio de equilíbrio corrente será mais apreciada do que a taxa de câmbio de equilíbrio industrial. Se medirmos a taxa de câmbio como o preço da moeda local, em termos da moeda reserva, quanto mais competitivo ele for, mais alta será a taxa e, quanto mais apreciado ele for, mais baixa será a taxa de câmbio. Dessa forma, na presença de “doença holandesa” a taxa de câmbio de equilíbrio corrente será menor do que a taxa de câmbio de equilíbrio industrial. Assim tem-se:

A taxa de câmbio de equilíbrio corrente em um país afetado pela “doença holandesa” é determinada pelo custo marginal em moeda nacional do bem que lhe dá origem – entendido como custo marginal os custos dos produtores menos eficientes que conseguem exportar. Esse custo é igual ao preço em moeda nacional que todos os produtores, inclusive o produtor marginal consegue e aceita exportar (BRESSER - PEREIRA, 2009, p. 148-149).
Quando ocorre a síndrome esse preço é substancialmente menor do que o “preço necessário”, ou seja, o preço que torna economicamente lucrativa a produção de outros bens comercializáveis usando tecnologia de ponta. É, portanto, um preço menor do que aquele que seria necessário para que a taxa de câmbio de equilíbrio corrente fosse idêntica a taxa de câmbio de equilíbrio industrial (BRESSER - PEREIRA, 2009, p. 148-149).
Na medida em que o custo marginal interno é menor do que o “preço necessário” e como a participação dessa commodity na pauta de exportação do país é relevante, a taxa de câmbio de mercado (que é também a taxa de câmbio de equilíbrio corrente) converge para um nível compatível com a rentabilidade daquela commodity e não para um nível compatível com a competitividade do setor industrial, que usa tecnologia de ponta. Quanto maior for a diferença de produtividade de cada produto que dá origem a síndrome em relação a seu preço necessário, maior será a sobrevalorização da moeda e mais grave a “doença holandesa” (BRESSER - PEREIRA, 2009, p. 148-149).
Os fatores que determinam o preço necessário dessa commodity (em moeda nacional) são:

  1. A produtividade média dos bens comercializáveis que usam tecnologia de ponta, mas que não se beneficiam dos recursos naturais (o que define taxa de câmbio de equilíbrio industrial).
  2. As variações do preço internacional desses bens.

Se houver uma renda ricardiana6 (resultante das diferenças de produtividade e da existência de um preço internacional no mercado, correspondente ao produtor menos eficiente), o preço necessário será maior que o preço de mercado. Em outras palavras, a taxa de câmbio de equilíbrio corrente será mais apreciada do que a taxa de câmbio de equilíbrio industrial. As rendas ricardianas que cada país aufere ao tornar o preço de mercado menor que o preço necessário determinam a intensidade ou gravidade da “doença holandesa”.
Segundo BRESSER - PEREIRA (2009) o fenômeno se manifesta com o aparecimento de alguns sintomas entre si, como a commoditização da pauta de exportação, apreciação da taxa de câmbio, decréscimo da participação da indústria de bens comercializáveis no produto total do país e aumento dos salários nos setores de serviços e do “boom” nesse caso o setor petrolífero.

3. POSSÍVEIS CAMINHOS PARA O BRASIL TRAÇADOS PELO PRÉ-SAL

Em meados do ano de 2007, foi descoberto um mega campo de petróleo a quase trezentos quilômetros do litoral do Rio de Janeiro, na Bacia de Campos. Na época, o campo foi batizado de Tupi e a previsão é de que teria reservas recuperáveis de petróleo de cinco a oito bilhões de barris, equivalentes a mais da metade das reservas brasileiras até então. Nesse instante o Brasil conheceu a palavra Pré-Sal, que se trata de uma área rochosa abaixo de uma camada de sal com cerca de dois quilômetros de espessura e que se estende no oceano atlântico, desde o Espírito Santo até Santa Catarina, isto é, abaixo dessa camada de rochas há um reservatório de petróleo com quantidades que só são comparáveis às do Oriente Médio.
A Petrobras prosseguiu as pesquisas na área denominada Pré-Sal e, em 2008, o preço do petróleo estava no patamar de UR$ 100 o barril. O que para o governo brasileiro já era uma grande vitória, tornou-se ainda maior quando foram descobertas mais duas áreas chamadas de Pão de Açúcar e Carioca, que guardam um campo quase cinco vezes maior do que Tupi, com reservas estimadas em pelo menos trinta e três bilhões de barris.
O óleo que se encontra abaixo da camada Pré-Sal está classificado em médio e leve, segundo o American Petroleum Institute, juntamente com a National Bureau of Standards. Essa classificação do grau API dimensiona o preço do produto no mercado. Quanto maior o grau API, maior o valor do produto no mercado, pois o seu refino é mais fácil em função das tecnologias pré-existentes. No caso dos poços já testados e em produção na camada Pré-Sal o grau API varia de 28,5 a 32,6.
Algumas questões de importância estratégica foram visualizadas com o Pré-Sal, a primeira delas diz respeito à segurança energética do país em eventuais crises energéticas mundiais e, segunda haverá a possibilidade, se bem regulamentado a exploração desse óleo, de fortalecimento da economia nacional, através da expansão do parque industrial, da agregação de valor na cadeia produtiva, da criação de novos empregos e da relevância definitiva para a balança comercial. Por conseguinte, a renda petrolífera poderá expandir os recursos nas áreas da saúde, educação, habitação, inovação, pesquisa científica, tecnológica e infraestrutura.
Porém, os elementos acima supracitados podem não ser alcançados com a renda gerada pelo Pré-Sal, pois baseado em experiências internacionais e assim como evidencia a análise teórica alcançar maiores níveis de crescimento e desenvolvimento será uma tarefa árdua a ser cumprida pelas autoridades brasileiras.
Para analisar os possíveis caminhos para o Brasil com a descoberta do Pré-Sal algumas variáveis econômicas podem gerar impactos decisivos para a economia e para sociedade e que vem de encontro com a teoria da “doença holandesa”, são eles: taxa de crescimento econômico, nível de investimentos, nível de poupança, capital humano, exportações, importações e taxa de câmbio. Com o objetivo de medir a relação que existente entre as variáveis é utilizado o método econométrico regressivo com variáveis múltiplas.
A hipótese entendida, a partir da teoria da “doença holandesa” é que o crescimento econômico é dependente do comportamento dos investimentos, poupança, exportações, importações. A variável capital humano não possui um indicador viável para esta simulação, assim será analisada fora do modelo. Já a taxa de câmbio, possui relação direta com a balança comercial, por esta razão é importante entender o impacto da mesma, separadamente do modelo inicial. Além das variáveis já aventadas, considerar-se-á mais um elemento binário, que quando qualificado com o numero um indica a produção nos campos do Pré-Sal, e quando nulo o inverso. Dadas essas considerações, foram coletados os dados para alimentar o modelo do ano de 1994 até 2013 e estão dispostos na tabela 3.1.
Ainda, a fim de seguir as indicações do modelo teórico acerca da “doença holandesa”, é adotada a diferença entre poupança e investimentos, dado pela condição macroeconômica que denota que os investimentos são financiados pela poupança. No mesmo caminho, o saldo entre exportações e importações será utilizado na rodagem do modelo.
De acordo com os resultados obtidos, conclui-se que as variáveis independentes, poupança menos investimentos, e saldo da balança comercial, afetam conjuntamente a variável dependente PIB confirmado pela estatística F. Fc>F (36.75>3.24) com nível de confiança de 95% e 5% de nível de significância.
Isoladamente as variáveis independentes (S-I) e (X-M) estão determinando o comportamento do PIB visto pela estatística t, onde tc (-3.22 e 3.90) > t = (1,73). A variável dummy que esta representando a produção de nos campos do Pré-Sal apresentou a estatística t de 1.70, e quase alcança o t crítico de 1.73. Para este teste o nível de confiança foi de 95% e 5%de nível de significância.
De acordo com o coeficiente de determinação em 87% dos casos as variáveis independentes explicam o comportamento da variável dependente com nível de correlação de 85% aproximadamente constatado pelo R2 ajustado.
Até o momento a estatística comprova a relação macroeconômica que existe entre crescimento econômico, poupança, investimentos, exportações e importações, no entanto, o que chama a atenção no modelo estimado é a influencia negativa apontada pelo sinal do coeficiente (S-I) indicando que à medida que a diferença entre poupança e investimento aumenta o crescimento econômico diminui, e necessariamente deferia ser o inverso, a relação deveria se proporcional. A justificativa para esse resultado esta no fato dos investimentos no Brasil não serem financiados pela poupança e sim por outras formas como por exemplos pelos gastos do governo.
O investimento refere-se à aplicação de recursos em atividades que renderão juros ou lucros em longo prazo. Num sentido amplo, o termo refere-se à compra de máquinas, equipamentos, entre outros, para a instalação de unidades produtivas. No caso do Pré-Sal, de acordo com a Petrobras, os investimentos devem chegar a US$ 82 7 bilhões até 2018, somente com desenvolvimento de tecnologia própria, sondas de perfuração, plataformas de produção, navios e submarinos.
Esses valores de investimentos estão centrados somente na exploração, desenvolvimento e produção do Pré-Sal. Quando, dimensionado para os demais setores, podem multiplicar-se em dobro ou triplo, impactando diretamente na indústria e no comércio brasileiro, ou seja, mais produção, empregos e renda.
Por outro lado, a concentração de investimentos no setor petrolífero pode gerar, em longo prazo, efeitos negativos, uma vez que a taxa de retorno dos mesmos é ascendente no início das atividades e descendente quando se alcança o esgotamento dos poços. Em setores convencionais da economia a taxa de retorno não depende da particularidade dos recursos finitos. Desse modo, os retornos se mantêm ou aumentam na medida em que neles se fazem novas aplicações.
Para tornar os investimentos públicos dedicados ao do Pré-Sal mais eficientes é necessário reinvestir as receitas advindas dele em infraestrutura, porém bem orientada para surtir efeitos sobre a produtividade e o investimento privado, ou seja, é importante obter equilíbrio entre investimentos públicos e privados para não incorrem em desindustrialização dos setores não envolvidos na atividade petrolífera.
Além de reinvestir as receitas do Pré-Sal, é de suma importância para a economia gerar poupança com elas, devendo ser maior comparativamente com países que não possuem recursos naturais em abundância. A taxa de poupança deve ser alta o suficiente para manter o equilíbrio econômico e compensar as gerações futuras que não terão oportunidade de usufruir da renda petrolífera do presente.
A poupança gerada pelas rendas do petróleo deve ser genuína, ou seja, tanto no âmbito público e privado, deve cobrir a depreciação do capital, o investimento em capital humano (medido pelo gasto em educação), o esgotamento dos recursos energéticos naturais e os danos causados pela degradação ambiental. No entanto, a experiência internacional tem evidenciado excessos de consumo em países com elevadas reservas de petróleo, as quais podem induzir a políticas fiscais expansionistas, com o objetivo de estimular a economia. Depois de um período de crescimento rápido e forte a economia retorna rapidamente ao seu estágio inicial com queda em curso e taxas de crescimento negativas (AOUN, 2008, p.122).
Teoricamente a macroeconomia pressupõe que taxas negativas de poupança têm efeitos negativos sobre o crescimento econômico. No entanto, países com abundância de recursos naturais registram crescimento econômico positivo para taxas de poupança negativas, efeito que evidencia claramente a doença holandesa.
No que se refere ao saldo da balança comercial percebe-se que nos últimos 20 anos há saldo positivo, impactando assim positivamente sobre o crescimento econômico, confirmado pelo sinal do coeficiente (X-M) do modelo estimado. Juntamente com essa constatação é importante lembrar que o Pré-Sal passou a ser produzido no ano de 2010 e esta somente apresentando maiores níveis de produção nos anos de 2013 e 2014, isso significa que as exportações de petróleo do ainda não superaram as importações, ou seja, o Brasil compra do exterior óleo leva para produzir subprodutos, que precisam de óleo leve como matéria-prima.
As experiências internacionais tem demonstrado, assim como as previsões do governo brasileiro, que as exportações terão um aumento significativo e superara as importações de petróleo, no entanto, países com grandes reservas de recursos naturais tendem a reduzir o grau de abertura da economia e ter efeitos negativos sobre os termos de troca. Isso porque, à medida que o desenvolvimento do recurso acontece, provoca contração nos demais setores da economia, havendo necessidade de estabelecimento de cotas de importação e tarifas para proteger os produtos nacionais (AOUN, 2008).
O aumento de renda, advinda do setor petrolífero, traz efeitos positivos sobre a demanda doméstica, o que pode implicar em um aumento na taxa de inflação, além da moeda local valorizada, fazendo com que os preços relativos de bens não comercializáveis aumentem e os termos de troca se deteriorem. Assim, as exportações não petrolíferas perdem competitividade e acabam por se reduzir (AOUN, 2008).
Assim, pode-se afirmar que, quanto maior a dependência brasileira para com o Pré-Sal, mais medidas protecionistas deverão ser adotadas para proteger os outros setores da economia, os quais tendem a sofrer pressão interna, em decorrência da diversificação da produção.
Por fim, outra questão latente advinda da discussão do destino dos recursos do Pré-Sal, encontra-se na qualificação do capital humano o qual é constituído pelo conjunto de competências e conhecimento que determinado ser possui ou desenvolve ao longo da vida. Nesse sentido, a educação é elemento fundamental para o desenvolvimento das capacidades do indivíduo, que, com isso, aumentará a sua capacidade produtiva.
O crescimento econômico está diretamente relacionado com a educação, pois, melhora a eficiência do trabalho e incita a afirmação com relação à democracia para uma boa governança. Além disso, tem impacto positivo sobre a saúde e reduz as desigualdades sociais.
Dessa forma, parece claro que países com elevadas reservas de recursos naturais tenham um melhor desenvolvimento de capital humano, no entanto, experiências empíricas demonstram exatamente o contrário. Essa afirmação é explicada da seguinte forma: países dotados de recursos naturais concentram seus esforços na atividade mineradora contraindo outros setores da economia que são intensivos em mão de obra e não requerem alto nível de especialização. Assim, a taxa de retorno dos investimentos em educação nestes são menores comprometendo a expansão dos mesmos e consequentemente atrasando seu desenvolvimento tecnológico (AOUN,2008).
No caso do Pré-Sal há escassez de capital humano, o que segundo especialistas pode ser problemático para o crescimento rápido do setor. O Brasil encontra-se entre os piores do ranking 8 em termos de qualidade da educação do ensino secundário, o que gera impactos negativos sobre a oferta de mão de obra no mercado. Nesse sentido, o texto do novo marco regulatório estabelece uma parcela significativa dos royalties, que compõe as participações especiais, para a educação, no entanto, é necessária articulação política e econômica para que estes possam cumprir o seu papel.
De outra parte, a oferta de empregos, advinda da exploração e produção de petróleo, assim como a obrigatoriedade do conteúdo local, deve aquecer o mercado de trabalho, consideravelmente, de forma direta e indireta. A previsão é que haverá criação de 200 mil empregos diretos e 300 mil empregos indiretos. No setor industrial, 46 mil vagas devem ser abertas até 2015, com salários acima da média dos praticados atualmente. Em função da falta de mão de obra qualificada, trabalhadores apenas com cursos de formação técnica serão contratados e aqueles que já possuem nível superior, além de garantir espaço, devem obter rendimentos três vezes maiores que os atuais 9.

CONCLUSÕES

Constata-se a partir das teorias a cerca da “doença holandesa” assim como em casos empíricos que nem todos os países que possuem reservas de petróleo, de qualquer tamanho, conseguiram alcançar altos níveis de crescimento e desenvolvimento econômico e social. Isso porque, na maioria dos casos, a gestão dos ativos derivados do setor petrolífero não foi bem planejada, isto é, quando países passam a explorar, desenvolver e produzir óleo em larga escala, sua indústria local passa a lhe dar suporte e canalizar todos os esforços no negócio que está dando lucros. As exportações passam a ser elevadas e uma onda de capitais entra no país desencorajando outros seguimentos industriais, uma vez que os produtos importados são mais baratos e fáceis de adquirir. Esse fenômeno conhecido no passado por a maldição dos recursos naturais e contemporaneamente por “doença holandesa”.
As variáveis crescimento econômico, poupança, investimento, exportações e importações e a variável Dummy calculadas pelo modelo econométrico indicam, no momento, que o Brasil não sofre de “doença holandesa”, o que não significa que não virá a contrair, pois há fortes indícios implícitos na análise que apontam para esse caminho, especialmente quando analisado a diferença entre poupança e investimentos.
É importante resaltar, novamente, que o Brasil esta em estagio inicial da produção do Pré-Sal, constatado a fraca influencia sobre o crescimento econômico através da variável Dummy. Isso também pode justificar a falta de efeito da taxa de cambio sobre o PIB, pois a mesma, ainda não sofre oscilações em decorrência do aumento de fluxo de capitais externos.
Finalmente pode-se dizer que o Pré-Sal é uma das melhores coisas que já aconteceu ao Brasil, ou pode se a ruína de sua economia. Deve-se lembrar de que explorar agora esse petróleo significa não tê-lo no futuro, e isso pode comprometer as próximas gerações. Assim, fazer o melhor com as rendas geradas no presente pode garantir uma economia mais forte para superar os obstáculos que certamente surgirão.
Referências Bibliográficas
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FURTADO, Celso. Ensaios sobre a Venezuela: subdesenvolvimento com abundância de divisas. Rio de Janeiro: Contraponto, 2008.
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PERKINS, John. Confissões de um Assassino Econômico – Confessions of na Economics Hit Man. São Paulo: Cultrix, 2005.
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STRACK, Diego; AZEVEDO, Filipe Z. A. A Doença Holandesa no Brasil: sintomas e efeitos. Revista Economia e Desenvolvimento. UFSM. v. 24, n. 2,RS 2012.Disponível em: <http://cascavel.ufsm.br/revistas/ojs-2.2.2/index.php/eed/article/view/6432> . Acesso em 15 de setembro de 2014.
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YERGIN, Daniel. O Petróleo: uma história mundial de conquistas, poder e dinheiro. São Paulo: Paz e Terra, 2010.

1 Ainda que não trate diretamente da indústria de petróleo, verifiquem-se os passos seguidos para a obtenção de recursos e tudo o decorrente em PERKINS, J. “Confissões de um assassino econômico”, São Paulo. Cultriz:2005.

2 Segundo SIQUEIRA, Fernando. A Imensa e Cobiçada Riqueza do Pré-Sal. Disponível em: < http://www.aepet.org.br/site/noticias/pagina/3161. Acesso em: 27 de agosto de 2014.

3 Para fins de comparação internacional admite-se uma taxa de cambio de 3,5 bolívares por dólar e não a taxa corrente de 3,33.

4 O item 1.1 faz parte de uma interpretação dos estudos de Celso Furtado sobre a Venezuela, realizado pela autora do artigo, relatados na seguinte referência bibliográfica: FURTADO, Celso. Ensaios sobre a Venezuela: subdesenvolvimento com abundância de divisas. Rio de Janeiro: Contraponto, 2008. p. 35-138

5 MEDEIROS Carlos Aguiar. Celso Furtado na Venezuela in. Ensaios sobre a Venezuela: subdesenvolvimento com abundância de divisas. Rio de Janeiro: Contraponto, 2008. p. 138.

6 “Nada é mais comum que ouvir falar das vantagens que a terra possui sobre qualquer outra fonte de produção, devido ao excedente que proporciona sob a forma de renda. No entanto, quando a terra é muito abundante, muito produtiva e fértil, não produz renda alguma. Somente quando suas forças diminuem, e quando se obtém menor retomo com o trabalho, uma parcela da produção original das faixas mais férteis é destinada ao pagamento da renda. É curioso que essa qualidade da terra, que poderia ser encarada como uma imperfeição, quando a comparamos com os agentes naturais que auxiliam os fabricantes, possa ser apontada como constituindo sua vantagem particular. Se o ar, a água, a elasticidade do vapor e a pressão atmosférica tivessem diferentes qualidades; se pudessem ser apreendidas e se cada qualidade existisse apenas em quantidade moderada, esses agentes, assim como a terra, dariam origem a renda, à medida que as diferentes qualidades fossem sendo utilizadas”. (RICARDO, 1982, p. 69)

7 Petrobras. Petrobras prevê investir 73 bi no Pré-Sal até 2015. Disponível em < http://www.brasileconomico.com.br/noticias/petrobras-preve-investir-us-73-bi-no-presal-ate-2015_101109.html> . Acesso em : 21 de março de 2014.

8Disponível em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/05/140508_brasil_educacao_ranking_dg.shtml. Acesso em 02/06/2014.

9 Disponível em: http://www.ipe-instituto.org.br/index.php/brasil/1015-pre-sal-brasileiro-petroleo-riqueza-e-empregos. Acesso em 02/06/2014.


Recibido: 10/02/2015 Aceptado: 13/03/2015 Publicado: Marzo de 2015

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